Pesquisar neste blog

Comunicado

Comunico a todos que tiverem interesse de compartilhar meus artigos, textos, ensaios, monografias, etc., por favor, coloquem as devidas referências e a fonte de origem do material usado. Caso contrário, você estará cometendo plágio ou uso não autorizado de produção científica, o que consiste em crime de acordo com a Lei 9.610/98.

Desde já deixo esse alerta, pois embora o meu blog seja de acesso livre e gratuito, o material aqui postado pode ser compartilhado, copiado, impresso, etc., mas desde que seja devidamente dentro da lei.

Atenciosamente
Leandro Vilar

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A Saga Viking

Há mais de mil e duzentos anos na Europa medieval, um povo vindo das frias terras da Escandinávia, se espalhou pelo continente, chegando até mesmo ao norte da África, adentrando a Ásia na direção do Oriente Médio, e indo mais além, cruzando o oceano, e chegando no que viria a ser a América. Consigo levaram a esses lugares, a guerra, o medo, a curiosidade, a esperança e o comércio. Chamados de bárbaros sanguinários, piratas cruéis, pagãos do norte, navegadores, exploradores e mercadores; homens que se vestiam com peles de animais, de modos rudes e bestiais, que usavam elmos com chifres e bebiam hidromel em crânios humanos, foram considerados por longos anos um dos horrores que acometeram a Europa medieval cristã. 

Mas na realidade, quem realmente foi esse povo? Quem realmente foram os vikings? Por que, se tornaram tão famosos por sua barbaridade? Realmente era tudo verdade aquilo que se dizia sobre eles? E qual foi o legado que deixaram para a História, a ponto de  alguns historiadores falarem de uma Idade Viking ou Era Viking?

Nesse texto procurei responder essas perguntas até onde consegui pesquisar acerca, já que livros sobre o assunto não são fáceis de se encontrar em língua portuguesa, mas são abundantes na historiografia inglesa, alemã, francesa, dinamarquesa, sueca e norueguesa.

Os vikings:

Ainda hoje não existe um consenso acerca da origem do termo viking, já que dependendo do local da Europa que esse povo passou, eram chamados por nomes diferentes, como: nórdicos, ashmen, normandos, gall, lochlannach, varegos, varêngios, rhosal-Majus, etc. Entretanto, por volta do século X em relatos ingleses, já aparecia a palavra viking ou wikinge a qual era tanto sinônimo para pirata quanto para os povos da Escandinávia, especialmente da Dinamarca, de onde vieram os primeiros nórdicos que se estabeleceram na Bretanha. 

Tal aspecto gerou um problema de identidade posterior, pois alguns historiadores convenharam e expressar que viking seria uma etnia escandinava, mas na realidade, embora compartilhassem os mesmos costumes e língua, não havia uma noção de identidade em comum entre esses povos, além do fato que eles mesmos não se intitulavam vikings. Isso é comparável ao caso dos gregos antigos, os quais não se reconheciam como gregos antes da dominação romana, mas como habitantes de suas respectivas cidades-Estados. Embora os nórdicos não constituíram cidades-Estados, mas vivessem em comunidades rurais e pequenos reinos, só por volta do século XI quando os reinos escandinavos começam a se tornar mais sólidos, começa-se a se delinear uma noção de pertencimento a aquele reino.

Outro ponto a salientar é que a palavra viking foi utilizada inicialmente como referência a ocupação de alguns homens e não como significativo de identidade étnica. Os ingleses chamavam de viking os homens que viam do Norte assolar suas terras no verão, praticando pirataria, saqueando os mosteiros e vilas ou montando acampamentos de guerra. 

“As etimologias possíveis para vikingr são as seguintes: a) antigo nórdico vik: “baía”, “enseada”, “porto” (HAYWOOD, 1995: 8); b) antigo nórdico vig, “batalha” – como Brøndsted bem resume, “semanticamente plausível, mas duvidosa em termos fonológicos” (BRØNDSTED, S.D: 32); c) latim viccus e anglo-saxão wic, significando “cidade” e “acampamento”; d) de wikan, segundo dialeto da ilha de Runö no Golfo de Riga, designando “caçadores de foca” (apud RUSSOV In: KENDRICK, 1930: 2, nota 04)”. (MUCENIECKS, 2010, p. 3).

De qualquer forma, o termo viking para se referir aos habitantes da Escandinávia desse período só passou a ser casualmente utilizado séculos depois. E hoje alguns historiadores apontam que o termo deva ser utilizado de forma cautelosa, para designar os escandinavos especialmente entre os séculos VIII e XI, período chamado de Idade Viking ou Era Viking, nome por causa do período que foram realizadas as viagens, expedições, saques, guerras e colonização.

Já que após esse período, os nórdicos começaram a constituir reinos mais sólidos, e a desenvolverem uma identidade nacional, passando a se identificarem como noruegueses, dinamarquesessuecos e islandeses. Tal fato também é evidente na língua, a qual na época era praticamente uma só, e posteriormente devido ao surgimento desses Estados e o contato com outros povos, como os  anglo-saxões, bretões, celtas, eslavos, francos, bizantinos, etc., a língua começou a variar, e assim hoje, fala-se norueguês, dinamarquês, sueco, etc.

Quanto a aparência deles, não eram descritos como sendo pessoas totalmente feias, embora que alguns homens deixassem os cabelos e barbas crescerem como forma de impor medo nos inimigos, mas não significava que todos os homens deixassem os cabelos e as barbas ficarem grandes. No geral, os homens e mulheres eram brancos, tinham olhos castanhos claros ou escuros, cinzas ou azuis, o verde era mais raro. Possuíam os cabelos morenos, louros e ruivos. A estatura média das mulheres ficava entre 1,50 e 1,60, e dos homens ia de 1,60 a 1,70. A ideia de que eles fossem um povo bastante alto, já foi desmentida com estudos osteológicos. 

A sociedade nórdica estava divida entre a população livre e escravizada, havendo no caso, a elite formada pela aristocracia rural e comerciante, a nobreza (surgida principalmente com a formalização dos reinos nórdicos), o restante da população que possuía diferentes tipos de renda, por fim, os escravos. De forma clássica a sociedade costuma ser dividida de acordo com as classes apresentadas o poema do Rigstula (O Cantar de Rig), mas essa divisão não deve ser tomada como sendo totalmente real, pois o poema possui um tom satírico. No caso, as classes eram: 
  • Nobreza e aristocracia (jarl)
  • Camponeses, pastores, caçadores, artesãos, mercadores etc. (karl)
  • Escravos (thrall).
O termo jarl também era utilizado para se referir a algum senhor importante, geralmente um rico fazendeiro da aristocracia rural. A ideia de "reis vikings" começou a se tornar mais frequente a partir da segunda metade do século X, quando começaram a surgir alguns importantes reis na Noruega e Dinamarca, como será visto adiante. Embora se encontrem menções há reis nórdicos antes da Era Viking. 

"Antes da época viking, o poder já se concentrava em volta de um punhado de famílias dinásticas que controlavam a riqueza de uma região. O dirigente local era também um chefe militar, chefe religioso, administrador e garantidor da paz dentro da área que controlava". (CLARKE, 2006, p. 41).


Vikings representados no seriado Vikings do History Channel.

Os nórdicos não chegaram a adotar o feudalismo. Entretanto, entre eles havia algo bem similar a suserania e vassalagem, onde serviços eram prestados tanto ao rei como a outros jarlar, algo que foi difundido pelos países feudais. Devo lembrar que nem toda a Europa adotou o feudalismo. No caso viking, os jarl em geral se comprometiam a prestar lealdade ao rei, assim como, atender sua convocação para participar de expedições militares ou de campanhas de guerra. O mesmo era válido para os jarlar, os quais também convocavam entre suas comunidades, homens para servir como guerreiros. Além desse dever bélico, o jarl se comprometiam a pagar tributos ao rei, assim como, os karl também pagavam tributos ao jarl

No que diz respeito a classe dos karl, estes representavam a camada de livres trabalhadores. Pois não teriam recursos suficientes para serem inseridos no patamar dos ricos os quais formavam a nobreza e a aristocracia. Por sua vez, os thralls realizavam vários tipos de ofícios, principalmente relacionados ao trabalho manual e o trabalho doméstico. Os escravos poderiam ser prisioneiros de guerra ou eram comprados no leste, pois os povos eslavos mantiveram um duradouro comércio de escravos pela Idade Média na Europa oriental, não sendo à toa que a palavra inglesa para escravo (slave) deriva do nome eslavo (slav). Os escravos também poderiam ser oriundos de dívidas. Contudo, um escravo poderia ganhar a alforria. 

No que diz respeito ao vestuário deles, as mídias costumam apresentar aqueles guerreiros brutamontes usando peles de animais e elmos com chifres, algo que será comentando lá na frente. Todavia, os nórdicos não se vestiam de forma tão diferente do que de outros povos europeus. Até mesmo tendências da moda medieval, como cortes de cabelos, uso de adornos e tipos de cortes nas roupas fora adotados pelos mais ricos entre aquelas sociedades. 


Quadros apresentando alguns tipos de roupas comuns usados por homens e mulheres na Era Viking. Da esquerda a direita vemos os trajes dos ricos até o dos escravos.

“No vestuário, tanto o homem quanto a mulher usavam sapatos de couro abertos, com forma semelhante à das sapatilhas, e capas de pele e lã. As mulheres utilizavam longos vestidos de lã e anáguas de linho que iam até o tornozelo. Cada classe tinha também uma roupa específica: a alta (karls e jarls) usava um casaco de linho ou blusões cortados e cintados; a classe baixa, geralmente de escravos (thralls), utilizavam roupas folgadas feitas de lã toscamente tecida (Graham-Campbell, 1997, p. 67; Gibson, 1990, p. 20)”. (LANGER; SANTOS, 2001, p. 216)

A Escandinávia: as terras nórdicas

Os nórdicos eram originários da região chamada de Escandinávia que na época medieval compreendia os atuais territórios da Noruega, Dinamarca e Suécia, embora que hoje acrescenta-se os territórios da Finlândia e da Islândia. Mas o acréscimo da Finlândia é contestado por alguns historiadores, pois a cultura finlandesa estava mais próxima da cultura eslava do que da escandinava. Logo, os costumes, crenças, língua, etc., eram diferentes. Além do fato de não se falar de "vikings finlandeses".


Mapa destacando os países escandinavos e nórdicos. 

Os países da Escandinávia, especialmente a Noruega, Suécia e Finlândia, são reconhecidos pelo frio rigoroso, já que ao norte desses países se encontra o chamado Círculo Polar Ártico, a área climática ligada ao Polo Norte, logo, as temperaturas no inverno chegam a vários graus negativos, e mesmo na primavera e no verão, as temperaturas giram em torno dos 5 C a no máximo 20 C, com raras exceções de ter passado disso. No entanto, dependendo da latitude, a variação de clima é bem diferente, nesse caso quanto mais ao norte, mais frio é o clima e mais longos sãos os invernos, por sua vez, os dias se tornam curtos e as noites mais longas. No sul, é o oposto, porém a média fica entre 10 C e 20 C para a primavera e verão.

"A Noruega distingue-se pelo seu litoral imensamente longo - mais de 20000 quilômetros no total -, recortado por grande quantidade de estreitos fiordes (vales glaciários inundados) que se estendem terra adentro por muitos quilômetros entre altas montanhas escarpadas. Há uma enorme quantidade de ilhas perto da costa. O terreno predominantemente montanhoso no país sempre tornou difícil a viagem por terra, e através dos séculos de ocupação as comunicações dependeram, sobretudo, do mar". (CLARKE, 2006, p. 16).

Grande parte dos escandinavos que habitavam o que hoje é a Noruega, viviam em comunidades agrícolas ou em cidades localizadas na costa sul-sudoeste e noroeste, ou nos vales dos fiordes, pois em tais locais o clima era mais ameno, além de que os rios e o mar eram meios de sustento através da pesca e a rota de comunicação. O interior do país que é percorrido por uma cordilheira, ainda hoje é de uma densidade de povoação baixa. 


Vista do fiorde Lysefjorden em Prekestolen, distrito de Ryfylke, Noruega.

"A Suécia tem um comprimento de 1.500 quilômetros de norte a sul. Ao longo da sua fronteira com a Noruega, partilha o seu terreno montanhoso, mas a maior parte do país está menos de 500 metros acima do nível do mar, predominando uma paisagem ondulada e coberta por bosques de coníferas. Abundam os lagos e os rios navegáveis, que através dos séculos serviram-se de artérias para o tráfico fluvial. Ao norte, espalha-se a tundra". (CLARKE, 2006, p. 16).

A posição privilegiada da Suécia para o Mar Báltico garantiu que a região vivencia-se uma forte influência das comunidades nórdicas ao longo de séculos, além do fato de ser uma rota de comércio e contato com o oriente europeu. Na ilha de Gotlândia foram achados artefatos e moedas de regiões asiáticas, como, moedas de origem árabe e até mesmo uma pequena estátua de Buda. Tais artefatos datam do período anterior a Era Viking, mas se sabe que os próprios "vikings suecos" mantiveram rotas comerciais com os eslavos, as quais iam até o Mar Negro, tendo como principal ponto a cidade de Constantinopla, capital do Império Bizantino, além do fato que algumas expedições nórdicas chegaram a adentrar o Oriente Médio, como será visto adiante. 

Um dos trechos do Lago Vänern, o maior lago da Suécia, com 5.580 km2. Foto de Ake Nilsson. 

"A Dinamarca pertence à mesa formação geológica que a Suécia Meridional e as terras planas que bordejavam a costa sul do mar Báltico. As suas terras baixas - o ponto mais alto só está 173 metros acima do nível do mar -, com um litoral longo se se comparar com a massa de terra formada pela península da Jutlândia e centenas de ilhas grandes e pequenas. [...]. Até o final da Idade Média, grande parte da Dinamarca era co berta de árvores de folha caduca. Prados, marismas e pântanos ladeavam os seus numeros rios e rodeavam os lagos, muitos dos quais foram enxutos há pouco tempo". (CLARKE, 2006, p. 18).

Pântano em Klampenborg, Dinamarca. Foto de Christopher Leth.

Os pântanos na Dinamarca contribuiu para que os arqueólogos encontrassem muitos vestígios e até mesmo corpos, pois era prática comum aos nórdicos e antes deles, das pessoas jogarem oferendas votivas nos pântanos e até mesmo sepultar pessoas que haviam sido sacrificadas. Embora que grande parte dos achados arqueológicos advenham dos túmulos e não dos pântanos. 

A vegetação na Escandinávia é predominantemente de taiga ou floresta boreal como também é conhecida, devido há grande quantidade de árvores coníferas, como carvalho, freixos e pinheiros. No entanto, as estações são bem definidas, e na Dinamarca, o clima é temperado, um pouco diferente da taiga, sendo os invernos menos frios e os verões mais quentes. Entretanto, no norte da Noruega, Suécia e Finlândia a vegetação é de tundra, consistindo numa vegetação rasteira, de campos e descampados, sem árvores. 

Floresta boreal ou taiga. Foto tirada no condado de Vestfod, Noruega.

Não obstante, o solo é muito grosso, argiloso e pedregoso em algumas regiões, o que dificultava o cultivo de várias espécies vegetais, além do próprio frio contribuir para isso. Em outros locais o solo era mais macio e fértil, como no caso da Dinamarca e o sul da Noruega e da Suécia. Quanto ao relevo, esse em grande parte é formado por colinas, enseadas e montanhas, especialmente na divisa entre a Noruega e a Suécia. Na Dinamarca e Suécia nota-se um maior número de prados.  

A fauna desses países era bem diversificada, embora hoje parte dela esteja em perigo de extinção. Encontrava-se e ainda se encontra ursos pardos, lobos, renas, caribus, cervos, corvos, esquilos, linces, gansos, patos, focas, raposas, arminhos, martas, furões, falcões, pica-paus, águias, falcões, corujas, cobras, salmões, bacalhaus, etc. 

A águia, o lobo e o urso estavam associados a guerra. No caso dos lobos e das águias, nos mitos se encontram várias referências a tais animais. Os corvos também possuíam um papel mitológico, principalmente estando associados ao deus Odin. 

A abundância de animais como raposas, arminhos, martas, ursos, etc., proporcionou um produtivo e lucrativo mercado de peles, sendo uma das principais mercadorias que os nórdicos exportavam para o restante da Europa e parte do Oriente Médio.

A vida de um nórdicos na Era Viking

A vida de um viking na era fácil, mas também não era totalmente implacável. No século VII e VIII houve um surto populacional, e tal crescimento foi um dos motivos sugeridos por alguns historiadores para que os escandivos cada vez mais se aventurassem por mar e terra a fim de realizarem suas expedições e conquistas,  colonizando outras terras vazias, conquistando territórios inimigos, criando rotas de comércio, como forma de apaziguar o efeito dessa superpopulação, já que embora tenha crescido rapidamente, a produção de alimentos não acompanhou o crescimento populacional, logo, muitos começaram a morrer de fome, e a violência aumentou, devido ao fato de vilas, vilarejos e fazendas serem atacadas para serem saqueadas.

Não obstante, diferente do que comumente é passado por algumas mídias, os nórdicos não eram pessoas voltadas apenas a arte da guerra ou a pirataria, na realidade, eles exerciam trabalhos bem diversos: eram agricultores, pastores, caçadores, pescadores, mercadores, construtores, ferreiros, artesãos, etc. Grande parte da população viking era rural, e outra parte se dedicava ao comércio. Apenas uma parcela menor é que se dedicava a guerra, participando das invasões e da pirataria. No entanto, não se pode desconsiderar o fato de que a guerra esteve bem próxima desse povo. 

Selo postal retratando uma comunidade viking.

"A maioria dos vikings eram fazendeiros. Até os que fizeram incursões na Europa Ocidental, ou navegaram para oriente ou para ocidente como comerciantes, geralmente regressaram à sua pátria e à sua fazenda, trazendo com eles os seus despojos ou os seus ganhos". (CLARKE, 2006, p. 58). 

No que diz respeito a fauna doméstica, se criavam vacas, ovelhas, porcos, galinhas, patos, cavalos, cães, gatos, etc. Era comum nas casas de fazenda, quando não se havia currais, os animais como galinhas, patos, ovelhas e porcos, dormiam dentro de casa. No que diz respeito ao cavalo, esse curiosamente não era muito utilizado na guerra, pois os nórdicos preferiam a infantaria do que a cavalaria, renegando o cavalo para o transporte, força de tração e alimento, pois em algumas regiões havia o hábito de comer carne de cavalo e até mesmo se fazer brigas de cavalos. 

Acerca da agricultura as principais culturas que os nórdicos cultivavam, era a cevada, centeio e a aveia, os quais compreendiam a base da alimentação. O trigo também foi cultivado, principalmente na Dinamarca, devido ao clima mais quente. Outras plantas cultivadas foram a ervilha, o feijão, a couve e alguns tipos de tubérculos como cenouras e batatas. Grande parte da população se alimentava de vegetais e cereais, o consumo de carne era reservado para questões solenes e principalmente para o inverno, pois costumava-se defumar as carnes para aumentar sua durabilidade, embora que os ricos a consumiam com mais regularidade. Evitava-se de matar os animais, pois eles eram fontes de ovos e leite, principalmente para o período de inverno. O peixe era bastante consumido, principalmente servido de alternativa para a ausência de caça e o baixo número do gado.

Grande parte da população viking vivia no campo, espalhado por fazendas ou vilarejos, pois embora já no século IX houvesse algumas cidades e até o século XI o número de cidades tenha aumentado razoavelmente, ainda assim, a população se mantinha predominantemente rural. A população que vivia nas cidades, eram famílias que se dedicavam ao comércio e a manufatura, produzindo armas, ferramentas, joias, roupas, objetos de luxo, etc. Parte dessa produção era voltada para o mercado interno e outra era produzida para a exportação. Por mais que se costume dizer que o comércio tenha decaído durante a Idade Média, isso não é uma verdade total. O comércio viking, eslavo, bizantino e bretão esteve em alta por alguns séculos, mesmo em pleno período medieval europeu. 

As construções eram na maioria feitas de madeira, devido a abundância dessa pela Escandinávia, logo, o uso de pedras era mais visível na construção de muros, muralhas, fortalezas, alicerces, pontes, estradas, barragens, diques, quebra-mares, fundações, etc. Casas feitas de pedras não foram tão comuns dependendo da região. Em geral a maioria das casas eram feitas de madeira, mas em alguns locais havia casas feitas de tufa, eram construções as quais as paredes eram feitas de terra batida, embora o telhado fosse de madeira, mas dependendo da região, poderia ser coberto com uma camada de terra para ajudar no isolamento térmico da residência, daí que na Islândia e outros lugares, ainda hoje se ver casas com telhados verdes. 

Reconstituição de uma fazenda nórdica para o Festival Viking de Avaldness, Noruega.

As dimensões das casas variavam de região para região, mas normalmente eram construções retangulares e longas, podendo ter mais de 10 metros de comprimento e 3 a 5 metros de largura. O chão era de terra batida, mas havia casos que era revestido com tábuas de madeira ou com pedras. As residências costumavam não possuir janelas, e quando tinham, era bem pequenas. O lar poderia ter um cômodo ou vários cômodos, como sala-cozinha, quartos e depósito. Algumas casas maiores, nota-se a existência de "banheiro" e vestíbulo. No entanto, era comum o estábulo, curral, celeiro, ferraria, quarto dos esravos, etc., ficarem entorno da casa central. Em alguns casos os escravos poderiam dormir na casa central. 

Reconstrução de uma "casa viking". No caso desse exemplo, esse tipo de casa possuía toras para escorar o peso do telhado, evitando que o mesmo viesse a desabar.

As casas na cidade não possuíam essas dependências vistas no campo, e dependendo da cidade, poderiam ser construções menores. Já as casas dos ricos, essas eram maiores, mais bem adornadas e mobiliadas, e costumavam possuir salão (hall) e outros cômodos. No entanto, a localização do fogo no centro da casa era algo comum da cultura viking e de outros locais na Europa medieval. 

"A casa era o centro da vida viking. Ali se encontrava calor, alimento e refúgio. Os habitantes trabalhavam ali na suas tarefas diárias e ali relaxavam com jogos de mesa, tocando música ou escutando histórias contadas pelos poetas sobre os deuses e as façanhas dos antigos heróis. A vida decorria em volta da comprida lareira central". (CLARKE, 2006, p. 66).

Era costume dos nórdicos, principalmente no campo que a família permanecesse unida, logo, poderia se encontrar na mesma casa, avós, filhos e netos, além dos escravos. Quando a família ficava grande para o lar, outra residência era erguida. Como em outras épocas e culturas, a necessidade de uma família rural grande garantiria as chances de sobrevivência, pois eram mais mãos para trabalhar e para defender a propriedade.

Na casa de fazenda os móveis eram raros, em alguns casos não havia nem cama, e as pessoas dormiam num leito forrado com forragem e peles. Os bancos também poderiam servir de cama, sendo forrados para tal intuito ou para receber convidados, pois era costume forrar os bancos quando visitas seriam recebidas. Havia também cadeiras, pequenos bancos e mesas. Baús ou arcas para se guardar roupas e outros pertences; armários não haviam. Já na cidade e na casa dos ricos, se encontravam mais móveis. 

No entanto, é importante dizer que muito das ferramentas, móveis e utensílios que os nórdicos do campo possuíam, eram fabricados por eles mesmos. A fazenda era um local de autossuficiência, da alimentação, ferramentas, utensílios as roupas e calçados, tudo era feito no local, embora que as pessoas pudessem viajar para a cidade ou outros locais e trazer coisas de fora.   

Outra construção comum vista entre os escandinavos era o salão (hall) como mencionado. No qual consistia em um salão comprido, variando de tamanho, podendo ter 20, 30, 50 ou mais metros. Os salões normalmente poderiam ser a residência de um jarl, rei ou de alguma família rica. Poderiam ser locais bem estilizados na arquitetura, além de exibirem armas e escudos nas paredes, peles de animais, tapeçarias, etc. Nos fundos do salão ficava a cozinha e a dispensa, e em alguns casos o quarto dos empregados. Em alguns salões também poderia haver um primeiro andar ou um porão. 

Reconstituição de um salão viking.

Os salões eram utilizados para reuniões, banquetes, realização de festas e cerimônias. Havia longas mesas com bancos onde os homens e mulheres se sentavam para comer, beber, cantar e conversar. Além disso, havia músicos, cantores, poetas e dançarinas. Dependendo do motivo da celebração, as mulheres e crianças poderiam está presentes, pois era entendido como um momento de união entre amigos e familiares. 

Os salões além de serem o local de comunhão, eram também símbolos do poder e de autoridade. Todo governante ou homem importante possuía um salão, no qual reunia seus familiares, amigos, vizinhos, aliados e convidados. Os salões eram locais que representavam a riqueza daquele senhor, mas também sua importância na área e na região. Um senhor ou rei que possuísse muitos guerreiros, poderia convocá-los para um banquete, e, assim teríamos um salão repleto de guerreiros juramentados aquele senhor. Era também no salão que poderia ocorrer a partilha de espólios de guerra, onde os guerreiros que retornavam das campanhas ofereciam o botim ao seu senhor, e esse por sua vez dividiria parte do botim com seus homens. 

“Eram assim esses salões utilizados pela aristocracia para os momentos mais diversos como casamentos, banquetes e comemorações de vitórias em guerra. Aristocracia que tinha como uma de suas funções a proteção dessas cidades e desses centros religiosos e políticos, estabelecendo um controle da organização social e legislativa. Em um momento propenso de saques, como o período viking, devemos lembrar que eram esses aristocratas responsáveis, dentre outras coisas, por manter certa segurança espacial. Isso ocorria de forma a permitir que comerciantes viessem para suas terras e que nelas estabelecessem boas relações. Dessa maneira eles possibilitaram o florescimento do comércio, o enriquecimento dos comerciantes e dos próprios aristocratas que cobravam tributos e taxas. O salão era um símbolo de aristocracia que acabaria por caracterizar as cidades e centros escandinavos”. (AYOUB, 2013, p. 105). 

Reconstituição de um banquete num salão viking.

Arte viking:
 
Embora não foram grandes artistas no sentido mais comum que conotamos a tal palavra, eles foram exímios artesãos, deixando belos trabalhos com metal e madeira. Infelizmente a perecividade da madeira contribuiu para que muitos dos objetos de madeira se perdessem no tempo, no entanto, os trabalhos em metal e na pedra conseguiram sobreviver a ação implacável do tempo. 

"Além de serem fazendeiros, navegantes, comerciantes e piratas, os vikings eram artesãos que fabricavam (além dos produtos de uso diário) joias admiráveis, armas elegantes e práticas, talhas de madeira complexas e pedras gravadas. O alto nível da sua destreza pode observar-se no seu manuseio de materiais muito diferentes, desde metais preciosos até cornaduras e ossos". (CLARKE, 2006, p. 91).

Imagem de um broche de prata viking. Foto tirada do livro Os Vikings, p. 38.

"Hoje, costuma dividir-se a arte viking em seis estilos sucessivos: Oseberg, Borre, Jelling, Mammen, Ringerike e Urnes. Mas, quando estava na moda um estilo novo, este não substituía imediatamente o antigo. Ao mesmo tempo, grande parte das joias fabricadas em série quase não seguiam a corrente principal do desenvolvimento artístico". (GRAHAM-CAMPBELL, 2006, p. 98).

Muito da arte viking foi voltada para o caráter decorativo, fosse para decorar punhos de espadas, escudos, elmos, bainhas; fosse para decorar a casa dos ricos; decorar objetos como caixas de joias e arcas, chifres de beber, pratos, bandejas, copos, taças, pentes, chaves, cadeirões, camas, barcos fúnebres, etc. Além do fato de se confeccionar adornos para o uso das pessoas: colares, cordões, medalhões, brincos, anéis, pulseiras, broches e avelórios. Para isso se usava ferro, prata, bronze e ouro, mas também poderia se utilizar vidro e âmbar, além de joias preciosas. 

Alguns exemplos de joias da Era Viking.

"Os vikings gostavam muito dos adornos. Todos os seus artefatos, incluindo os seus barcos e as suas casas, eram envoltos num fantasioso movimento decorativo, tomando muitas vezes a forma de animais muito estilizados". (CLARKE, 2006, p. 97). 

Detalhe do umbral de uma porta ricamente adornada.

Os navios:

Quanto aos navios, esses se tornaram um marca desse povo, já que afinal, os mesmos são lembrados como grandes navegadores. Os nórdicos desenvolveram vários tipos de embarcações, desde simples canoas para serem utilizadas nos lagos e rios, barcos pesqueiros, até navios de guerra, navios cargueiros e navios para se realizar longas viagens marítimas.

"Grandes ou pequenos, os barcos vikings tinham várias características em comum. Os cascos eram construídos com tábua trincada, feita de pranchas sobrepostas que eram unidas com rebites de ferro e calafetadas para torná-las estanques, geralmente com betume e pelos de animal. Os cascos eram feitos sobre uma quilha comprida e profunda, que formava a armação do barco; uma sobrequilha (ou reforço do mastro) era colocada por cima daquela para suportar a base do mastro". (CLARKE, 2006, p. 74-75). 

Reconstituição de um longboat.

O navio mais comum e conhecido dos nórdicos era o dracar ou drakkar (dragão), tal nome se devia ao fato de que na proa era esculpida a cabeça de um dragão. Inicialmente os dracares não usavam velas, eram movidos a força humana, através dos remos. O uso de velas passou a se tornar comum por volta do século VII, mesmo assim, seus barcos faziam uso de uma única e grande vela retangular, localizada no centro do mesmo. E em viagens apenas pelo mar, alguns barcos não possuíam remos, apenas usavam o vento como propulsor.

O tamanho dos barcos variava, no caso de um exemplar encontrado em Gokstad, o mesmo possuía 23,30 m de comprimento, 5 metros de boca, um calado inferior de 0,90 m e um bordo livre, a meia-nau de 1,13 m, logo, nessas dimensões, tal navio poderia transportar uma tripulação de 15 a 30 homens. Porém, relatos e descobertas apontam navios com mais de 30 metros de comprimento, chegando a transportar pelo menos 50 homens. Nesse caso, tais números, seriam referentes a incursões de ataque.

Reconstituição de um dracar.

"As duas características mais salientes e típicas do barco viking e que todos os modelos, mesmo os piores, apresentam, são as filas de escudos ao longo da amurada e o leme, ou timão, colocado a estibordo e não à popa. A primeira constitui talvez um meio de impor prestígio, nos portos, pois a navegar, à vela ou a remos, dificilmente poderia manter-se aquela posição dos escudos, que dificultaria grandemente as manobras dos barco, sem qualquer vantagem aparente. [...]. Por outro lado, a segunda característica, embora nos pareça estranho, constitui um dos principais factores que contribuíram para tornar a concepção dos barcos perfeitamente funcional. Projectando-se abaixo da quilha, o leme comportava-se como um moderno estabilizador, ao aumentar a resistência lateral do casco e, assim, a eficiência da navegação à vela..." (ARBMAN, 1971, p. 19).

Embora, pareçam simples, os dracares eram uma maravilha da engenharia naval viking. Eram resistentes, ágeis e velozes. Podiam ser utilizados em rios e no mar aberto, daí, alguns ataques feitos a cidades no interior, foram só possíveis graças a essa dupla natureza. Os nórdicos adentravam o país por um rio largo, realizavam o ataque e a pilhagem e retornavam para o mar, voltando para casa. Fora graças a engenhosidade por trás da construção desses navios e nas habilidades de navegação desenvolvidas por eles que os mesmos empreenderam longas viagens por mar, como será visto mais a frente. 

Comércios e cidades:

Quanto ao comércio, esse é outro fator a se destacar. As cidades mercantis surgem propriamente por volta do século IX, mas só começam a crescer de fato no século X em diante. Embora, vestígios arqueológicos apontem a existência de comércio feito com a Germânia e a Rus (Rússia) pelo menos desde o século V. na própria ilha da Gotlândia encontra-se cidades mercantis datadas de pelo menos o século VI ou VII. Algumas importantes cidades mercantis foram: Hedeby, Birka, Helsinborg, OsloKugghamn e Kaupang. Algumas dessas cidades podem ter sua localização vista no mapa abaixo.

Localização das principais cidades mercantis na Escandinávia durante a Era Viking.

"Por mais de 200 anos, os vikings fizeram uso das suas habilidades para a navegação e das suas embarcações de alto-mar para dominar as rotas do Norte da Europa. As matérias-primas locais disponíveis eram muitos solicitadas na Europa ocidental: peles, penas, madeira e alcatrão, minério de ferro, xisto para fazer pedras de amolar (para amolar lâminas), esteatite para os recipientes de cozinha, peixe salgado, peles de foca e marfim de morsa, e o âmbar encontrado nas costas do mar Báltico. Para Bizâncio e para leste exportavam-se peles, mel, cera, marfim e escravos (capturados em incursões no oeste)". (CLARKE, 2006, p. 78).

Não obstante, os escandinavos pelo menos o que estavam sob o governo do rei Haroldo Dente Azul, o qual reinou na Dinamarca de 958 a 986, ele ordenou a construção de uma casa da moeda para cunhar suas próprias moedas de prata. Posteriormente outros reis fizeram isso. No entanto, eles faziam bastante uso de moedas de outras nações. Os vestígios arqueológicos encontraram tesouros contendo moedas de origem franca, inglesa, germana, bizantina, árabe, etc.

Moedas com os selos do rei Haroldo Dente Azul.

Mesmo na presença de moedas, os comerciantes costumavam não considerar o valor monetário delas propriamente, mas considerar seu peso em prata ou ouro. As moedas de prata foram mais comuns nos mercados, logo, as mercadorias eram vendidas a "peso de prata". Para isso eles usavam balanças, então estipulavam o quanto tais mercadorias valeriam a peso de prata. Em alguns casos sabe-se que na ausência de moedas, era oferecidos lingotes ou pedaços de prata para se efetuar o negócio.

Embora cidades escandinavas já existissem desde pelo menos o século VI, foi durante a Era Viking que muitas destas cidades prosperaram e outras cresceram. Através do comércio as pessoas começaram a migrar para essas cidades, passando a trabalhar como mercadores ou na manufatura, produzindo artigos tanto para o mercado interno quanto para o mercado externo. Essas cidades se tornaram também centros econômicos e locais de fluxo de objetos, pessoas e informações. Os missionários cristãos passaram a se dirigir a tais cidades e até mesmo foram nas cidades que se fundaram as primeiras igrejas da Escandinávia.

"Uma grande parte de Hedeby conserva-se ainda e, o que é mais surpreendente, a vasta muralha de terra, semicircular que envolve a cidade, atingindo, em certos pontos, mais de nove metros de altura. Esta não é contemporânea dos níveis primitivos da cidade, e foi reconstruída muitas vezes. Encerra uma superfície de cerca 24 ha, e está ligada, por meio de um sistema de outras muralhas de terra, a Hollingstedt, porto de mar situado a 17,7 km, do lado da península banhado pelo mar do Norte. Este porto situa-se nos bancos do Treene, afluente do Eider, navegado pelos barcos que vêm do mar do Norte. A carga destes barcos era transferida para carros, em Hollingstedt, e levada para Hedeby (por de trás da muralhas de terra que ligam as duas cidades), onde a esperavam os barcos do Báltico. Foi através destes percursos que vieram para a Escandinávia os garridos tecidos multicolores, os artigos de luxo, como especiarias e vidros, provenientes da Frieslândia". (ARBMAN, 1971, p. 39-41. 


Reconstituição da cidade de Hedeby na época viking. Hoje a cidade fica localizada no norte da Alemanha, e acredita-se que fora abandonada no século XI, quando os vikings foram expulsos dessa região.

"Muito mais espalhados do que as cidades (e por vezes erradamente descritos como tais) eram os centros mercantis, ou emporios, lugares onde se fabricava e comercializava, mas não tinham população permanente ou organização urbana (a povoação de Ribe, do início do século XIII, tinha sido um centro semelhante)". (CLARKE, 2006, p. 83). 

Haviam dois tipos de mercadores: os mercadores ambulantes e os yeoman, os quais eram os mercadores que viviam nas cidades mercantis. Os quais também ao mesmo tempo poderiam ser também artesãos e proprietários de terras. 

Mercadores nórdicos negociando a compra ou venda de peles, tecidos e escravos.

"O primeiro era um profissional do comércio que não tinha outra opção nem lugar de negócio fixo. Vamos encontrá-lo nas últimas sagas a chegar à Islândia no Outono; tendo desaparelhado o seu barco, permanece ali com alguns lavradores, para partir novamente na Primavera seguinte, para os mercador de Verão na Escandinávia. O segundo não era necessariamente menos hábil como marinheiro, mas era um homem para quem as viagens de comércio representavam apenas uma parte de sua actividade". ARBMAN, 1971, p. 48).

Religião, mitologia e rito fúnebre

A religião escandinava ou nórdica, é bem conhecida no mundo, embora algumas pessoas não liguem de imediato tal fato. Os nórdicos, assim como, os povos que os antecederam na Escandinávia, eram politeístas, cultuavam vários deuses, deusas e outras divindades, além de acreditarem em criaturas mitológicas, como gigantes, elfos e anões. Assim, nomes como Odin, Thor, Loki, Frejya, Freyr, Balder, Njord, Asgard, Midgard, Yggdrasil, Valhala, Valquírias, são bem conhecidos em vários outros países, especialmente devido a influência e difusão através da cultura pop em livros, filmes, hqs e jogos. 

Algumas das fontes mais importantes sobre a mitologia escandinava ou nórdica, são as Eddas, narrativas escritas na Idade Média no século XIII, as quais remetem a tradições orais mais antigas. A Edda em Prosa ou Edda Menor foi escrita pelo historiador, poeta e político islandês Snorri Sturluson (1178-1241), já a segunda fonte consiste na coletânea de poemas de autoria desconhecida, intitulada Edda Poética ou Edda Maior, a qual serviu de base para o próprio livro de Snorri, embora esse conte alguns aspectos e detalhes que não constem na Edda Poética. Ambos os livros narram várias histórias ligadas a criação do mundo, a criação da humanidade, deuses, gigantes, anões, os nove mundos, elfos, magia, bruxas, heróis, valquírias e o Ragnarök.  Além das Eddas, existem os poemas escaldos e as sagas

Os poemas escaldos são anteriores a escrita das Eddas, mas também remetem a poesia transmitida oralmente. Os principais conhecidos datam dos séculos X e XI. Os escaldos eram poetas profissionais que apresentavam seus serviços para algum senhor, estando interessado em cantar os feitos daquele homem. Por sua vez, a sagas são livros posteriores ao período viking, mas remetem a histórias verídicas e lendárias da Época Viking. As sagas abordam histórias de heróis, mitos, linhagens de famílias nobres e viagens. Algumas das principais sagas são de origem islandesa, como a Ynglinga Saga escrita também por Snorri Sturluson.

Thor, o deus dos trovões e raios, um dos principais deuses cultuados pelos nórdicos.

Para os escandinavos as forças da natureza eram provocadas pela vontade dos deuses ou de outras criaturas, assim, quando se ouvia trovões era Thor que os mandava; quando o inverno chegava, era Skadi que o havia enviado ou os gigantes de gelo; quando acontecia uma tempestade no mar, era Njord, Ran ou Thor que a enviara, e assim por diante. Não obstante, eles acreditavam que em certos lugares habitavam outras criaturas, nesse caso, os gigantes viviam nas montanhas, os elfos nas florestas e os anões em cavernas. 

Eles concebiam o mundo dividido em noves partes ou "nove mundos", ou "nove reinos", sendo que cada local estaria associado ao lar dos seres que habitavam o universo. 
  • Asgard: A terra dos Aesir, a principal família de deuses. 
  • Vanaheim: A terra dos Vanir, a segunda família de deuses.
  • Midgard: Conhecida como "Terra Média" ou "Terra do Meio", era o lar da humanidade. 
  • Jotunheim: Localizado no leste, era o lar dos gigantes da montanha (jotuns). 
  • Alfheim: Localizado no oeste, era o lar dos elfos. 
  • Svartalfheim: O lar dos elfos escuros. Ficava localizado no subterrâneo.
  • Nidavelir: O lar dos anões. Também ficava localizado no subterrâneo. 
  • Musphelhein: Localizado no sul, era a terra de fogo, governada pelo gigante de fogo, Surtur ou Surt. 
  • Niflheim: A terra das neblinas. Ficava localizado no norte, era o lar dos gigantes de gelo e outras criaturas. Era o local para onde ia parte dos mortos. 

Entre os escandinavos e os germânicos havia a noção de alma (hamr) e de espírito acompanhante (fylgja). Os fylgja lembram os daemons dos gregos antigos, em ambos os casos eram espíritos que acompanhavam os seres humanos,  mas também habitavam lugares, não sendo necessariamente espíritos em forma humana. Era dito que estes fylgja podiam assumir até mesmo a forma de animais. 

O hamr poderia durante o sono, a catalepsia, hipnose e meditação deixar o corpo, e poder viajar pelo espaço e tempo, e até mesmo assumir outras formas. Daí, alguns mitos falarem que pessoas se transformaram em lobos (lobisomens), ursos, águias, etc. Ou relatos de que a pessoa foi vista em dois lugares ao mesmo tempo. Essa condição é importante, pois justifica que o corpo era apenas um repositório, e quando este morria, o hamr o abandonava de vez. 


"A flygja é uma entidade sobrenatural (espírito tutelar), geralmente feminina, que está ligada a um indivíduo e que lhe acompanha pela vida toda, sendo visível quando a morte aproxima-se, sendo espíritos tutelares com as funções semelhantes as das valquírias, dises e hamingja". (LANGER, 2005, p. 64 apud BOYER, 1995, p. 104-108). 


Os nórdicos e germânicos também acreditavam que as famílias possuíssem espíritos protetores, guardiães, tutelares. Eram chamados de hamingja aettarfylgia. Em algumas sagas como a Viga-Glúmr, relata que o protagonista em seu leito de morte encontrara o hamingja de sua família, figurado como uma giganta. 


Um terceiro aspecto era o do hugr ("alma externa"), essa "alma do mundo" conectava-se com as pessoas de diferentes formas, podendo serem aspectos positivos ou negativos. Dizia-se que os sonhos, aparições, visões, pesadelos, eram ações do hugr sobre a pessoa. O ato de espirrar, bocejar, coçar-se, tossir, etc., embora seja reações biológicas, para estes povos era uma reação ao hugr


"A fé nórdica não possuía nenhum livro sagrado, nenhum dogma principal, nenhuma estrutura centralizadora de pensamento e coesão filosófica, a exemplo de outras religiões não-reveladas e politeístas da Europa. Pelo contrário, cada região e período da Escandinávia conheceu crenças diferentes, com variações também a nível social. Não existiam conceitos absolutos de bem e mal. Desse modo, a religiosidade era muito mais baseada no culto do que no dogmático e metafísico; estruturada em atos, gestos e ritos significativos, girando em torno do sacrifício. O paganismo nórdico era de natureza tolerante, sem fanatismos nem adoração extremada e, ao contrário do que se imagina com frequência, manteve contato com a Europa cristã. Foi fruto de uma sociedade profundamente rural, realista e pragmática e que concedia privilégio a uma magia fatídica". (LANGER, 2009, p. 132). 

Os nórdicos acreditavam na imortalidade da alma, em reencarnação, metempsicose (transmutação da alma humana para animais), acreditavam em mundos de pós-morte como o palácio de Odin, Valhala, o palácio de Freyja, Folkvang, o palácio de Thor, Bilskirnir, os quais ficariam localizados em Asgard. Por outro lado, eles também acreditavam que as almas também poderiam ir para o palácio submarino da deusa do mar Ran, e para o palácio frio da deusa Hel. A ideia de paraíso e inferno não existia, e só foi introduzida com a conversão ao cristianismo. 

Desenho representando Valhala. O local para onde os guerreiros honrados e valorosos iriam quando morressem com glória no campo de batalha.

"Basicamente as concepções de vida após a morte são divididas em torno de dois grandes espaços: os que morrem em batalhas, indo para o palácio do Valholl juntar-se às valquírias e ao deus Odin; e de outro lado, os que morrem de doenças, velhice ou acidentes e vão para os subterrâneos do reino de Hei. Também existem algumas variações: algumas fontes relatam que as mulheres virgens iriam para o palácio de Gefyon, outras, que elas dirigiam-se para o de Freyja. Escravos e fazendeiros seriam destinados ao reino de Thor". (LANGER, 2009, p. 134). 

A maioria dos deuses não possuíam templos, e hoje se desconhece muito das práticas ritualísticas. Os deuses Odin e Thor eram os mais adorados, tendo sido encontrados várias informações e vestígios sobre os ritos feitos para esses deuses. Sabe-se que se construíam templos para eles, como também esculpiam-se estátuas, além de se associar florestas, lagos, rios, cavernas, etc., como sendo locais sagrados e de culto para tais divindades. Sacrifícios de animais, oferendas de tesouros, cerveja, hidromel, comidas, armas, etc., eram oferecidas. 

A prática de sacríficos humanos também foi algo recorrente, sacrifícios de homens e mulheres eram feitos a Odin, Thor e outros deuses, as pessoas eram enforcadas em carvalhos, árvores associadas a Odin e Thor, eram perfuradas por lanças (rito associado a Odin), eram estranguladas, envenenadas, etc. O sacrifício humano poderia ser feito com prisioneiros de guerra ou com voluntários, já que para o voluntário seria uma honra ser sacrificado, além de se garantir um pós-morte tranquilo.

Nos ritos usavam-se também runas e outros objetos simbólicos, como lanças associadas a Odin e martelos associados a Thor. Embora, fossem poucas as pessoas que soubessem ler e escrever em runas, tais palavras eram escritas na pedra ou na madeira, e geralmente se escrevia para indicar um evento que aconteceu em determinado lugar, ou uma referência a alguma pessoa ou fato, pedidos aos deuses, um aviso para viajantes ou inimigos, entre outras coisas. A runas também eram usadas num sentido mágico, embora hoje se desconheça como era feito isso.

Rocha com uma inscrição rúnica. Dinamarca.

As runas também eram utilizadas pelos oráculos, bruxas e videntes, nesse caso, eram pequenas pedras, com palavras escritas nas mesmas, e eram utilizadas para prever o futuro e entre outras questões em comum com a vidência. Assim como o seu uso mágico, também se desconhece como era feita a vidência com o uso das runas.

A respeito dos ritos fúnebres, os nórdicos são conhecidos pelo fato de enterrarem seus mortos em barcos, junto com seus tesouros, mas na realidade isso não era algo comum para toda a sociedade. Em geral, eles queimavam seus mortos, e as vezes junto a eles, queimavam seus pertences, depois recolhiam as cinzas e as guardavam ou as despejavam em algum local. No entanto, outros sepultavam os mortos em covas simples ou em covas maiores e mais bem construídas, nesse caso, as pessoas que ali eram sepultadas, eram pessoas de certa importância para aquela comunidade.

Quanto aos barcos túmulos, nesse caso, apenas pessoas bem importantes como chefes, senhores e reis, eram dessa forma sepultada, embora que houvesse duas maneiras: na primeira, colocava-se o corpo no barco, trajando sua melhores roupas, e enchia o barco com os pertences do mesmo: armas, tesouros, além de colocarem comida e bebida, então incendiavam o barco e deixava a correnteza do rio ou do mar levá-lo. A segunda forma, era similar, porém ao invés de queimar o barco se enterrava-o. Neste caso, havia também o costume de se sacrificar uma das escravas para que acompanhe-se o seu senhor. A escrava se oferecia para o ritual.

Foto da década de 30 mostrando o sítio arqueológico de um barco túmulo. 

Por volta do século VIII e IX o Cristianismo começou a chegar a Escandinávia, entretanto, os cristãos que haviam naquelas terras eram na sua maioria estrangeiros. Os nórdicos relutaram por várias décadas a se converterem a nova religião e mesmo depois que o cristianismo havia se espalhado pela Escandinávia, alguns ainda mantinham o culto aos antigos deuses. A cristianização não fora homogênea ou ocorreu na mesma velocidade em todas as terras nórdicas, porém já no século XII, grande parte dos escandinavos já estavam convertidos

Igreja de madeira (staverkike), em Heddal, Noruega. Fundada no século XIII.

O guerreiro e o bárbaro:

Por mais que a maioria dos nórdicos exercessem outras tipos de profissões, a guerra era algo bastante presente na sua cultura em vários aspectos. Os principais deuses: Odin, Thor, Tyr e Freyr ou eram guerreiros ou estavam de alguma forma associado ao combate, a força, coragem, virilidade e poder. Todo homem viking aprendia a lutar, mesmo que ele não se torna-se um soldado, fazia parte da cultura aprender a lutar, e até mesmo as mulheres também aprendiam como se defender, principalmente as que viviam nos campos, onde a segurança dependia dos membros da família. 

Os homens livres poderiam portar armas sem nenhuma restrição, além do fato que em caso de guerra, eles seriam convocados para compor os exércitos de seu jarl ou do rei. Havia alguns homens que se dedicavam exclusivamente ao combate, atuando como guarda-costas, capangas e mercenários. Prestando serviços aos jarl, ricos aristocráticos, ou a senhores de terras estrangeiras. 

“O combate geralmente era feito a pé, utilizando-se a espada, a lança e o machado de combate, e mais raramente, facas, arcos e flechas. As cotas de malhas de ferro eram privilégio somente dos mais ricos, sendo herdadas de pai para filho. A espada era a principal arma, sendo também símbolo de posição social. A segunda arma preferida era o machado. Enquanto a espada foi comum para toda a Europa medieval, as achas eram utilizadas no continente preferencialmente como objetos cerimoniais e heráldicos. Mas para os escandinavos tornou-se uma arma característica: "A pedra de Lindisfarne traz um entalhe de Vikings em coluna de marcha carregando suas duas principais armas, o machado e a espada, erguidos bem acima de suas cabeças." (Brøndsted, s.d., p. 99). O mais importante equipamento de defesa era o escudo, geralmente de madeira e redondo. Era pintado e reforçado no centro por uma argola de ferro”. (LANGER; SANTOS, 2001, p. 216). 

Alguns achados arqueológicos. Um elmo, quatro espadas, quatro pontas de lança, quatro lâminas de machado e um escudo.

A fama de bárbaro sanguinário, impiedoso, pirata cruel, pagão terrível, acompanharam os nórdicos ao longo da História, e ainda hoje certas mídias continuam a difundir essa imagem construída na Idade Média e desenvolvida com o Romantismo no século XIX. De fato, alguns grupos realmente realizaram atrocidades, mas os romanos, gregos e egípcios também fizeram o mesmo e nem por isso foram chamados de bárbaros. No caso, o grande desencadeador da identidade de bárbaro, foi o Cristianismo.

Em seus primeiros saques na Inglaterra, França e Países Baixos, os mesmos atacaram mosteiros que ficavam próximo ao mar, logo, eles matavam os monges, roubavam tudo que tinha de valor e em alguns casos incendiava o mosteiro. Daí, os sobreviventes começaram a espalhar a má fama de tal povo, e em muitos casos, começou a surgir histórias que os demonizavam ainda mais. Assim, os escandinavos já por volta do século X, eram vistos em certos locais da Europa, sob tal prerrogativa, porém apenas após o século XII, é que a literatura iria acentuar tais características.

Dessa forma, temos o guerreiro viking retratado portando machados e escudos, vestindo peles de animais, ou armaduras de couro, ou apenas usando calças; com o corpo cheio de cicatrizes ou pintado. Eram barbudos, cabeludos, sujos, fedorentos e rudes. Além de usarem o icônico elmo com chifres. 

Pintura retratando a imagem clássica dos vikings, com o famoso elmo com chifres.

 O elmo com chifres passou a se tornar popular não no período medieval propriamente, mas sim a partir do século XIX com o Romantismo, o qual influenciou uma onde de nacionalismos europeus, onde pintores passaram a pintar sobre os ancestrais de seus países. Pelo fato de que a arqueologia ainda estava se desenvolvendo naquele século, muito sobre a história viking e seus costumes e cultura era desconhecido, e o pouco que se sabia advinha de alguns relatos escritos, principalmente de estrangeiros, pois os nórdicos não usaram o alfabeto rúnico para escrever sua história. 

Logo, alguns destes relatos referiam-se a eles como cruéis bárbaros do Norte, que assolavam mosteiros e os mares com a pirataria. Que matavam cristãos a sangue frio e com resquícios de crueldade. Além disso, os pintores que desconheciam a história viking foram buscar inspiração em outros locais, logo, passaram a pintá-los com elmos adornados com asas (algo característico dos celtas, pois havia capacetes adornado com asas, mas era algo ligado a ornamentação, e não ao uso prático no campo de batalha). 

Todavia, as asas foram substituídas pelos chifres, por parecerem mais apropriados a imagem "diabólica" daquele povo, além do fato, que na Idade Média, os chifres eram associados ao mal, aos demônios e a Satã. Logo, tomando como referência relatos cristãos que falavam de selvagens do Norte que pareciam ter saído do Inferno, o elmo com chifres caiu de forma apropriada para esse imaginário que continuou a ser reelaborado pelo século XIX e XX, e ainda hoje, se encontra presente em algumas representações e fixado no imaginário comum. No entanto, muitos livros e produções recentes estão combatendo essa visão deturpada da vestimenta viking e de alguns aspectos da sua cultura.

Entretanto, o guerreiro viking se vestia de outra forma. Sua vestimenta era bem similar a de outros guerreiros da Europa da mesma época. Como visto, eles usavam roupas comuns e não necessariamente feitas de formas toscas com peles de animais; eram pessoas que gostavam de se manter arrumadas e razoavelmente limpas (embora isso não era válido para todo mundo). Os karl e os thrall normalmente estariam mais sujos devido as suas atividades diárias do que os ricos. Além disso, os guerreiros em campanhas, também não ficariam perdendo tempo em se preocupar se estariam arrumados ou bem limpos.

Quando o comerciante árabe Ibn Fadlan encontrou em 920, alguns nórdicos no rio Volga (hoje território russo), os descreveu como homens imundos e fedorentos. Todavia, outros relatos como também do árabe At-Tartuschi, o qual viajou até a cidade viking de Hedeby, relatou que eles eram pessoas limpas, alguns andavam bem vestidos, e não eram tão bárbaros assim, como ele havia ouvido falar.

“Tratando dos suecos, Bremen destacou principalmente a grande hospitalidade para com os estrangeiros. Também esse escritor medieval descreveu o arquétipo do homem viking, uma das imagens que mais aproxima-se do verdadeiro guerreiro: "cada um deles tem um machado, uma espada e uma adaga. Um manto cobre a metade do corpo, enquanto o outro braço permanece exposto." (apud: The viking saga, 1998)”. (LANGER; SANTOS, 2001, p. 217).

Homens ensaiando uma batalha viking em Dublin, Irlanda. Aqui pode-se ver os mesmos trajando as roupas que os guerreiros normalmente usavam na realidade.

É importante mencionar que o uso de armaduras entre os nórdicos não foi algo comum. O uso de cota de malha se devia principalmente aos que tinham condições financeiras para comprá-la, pois era algo caro, ou teria a herdado do pai, do avô, ou a roubou. Muitos iriam para o campo de batalha utilizando suas vestes normais, ou até mesmo poderiam ir sem camisa.

Na questão bélica, os escandinavos faziam grande uso da infantaria, os arqueiros não eram tão abundantes em seus exércitos, já que para eles era mais honroso e bravo combater cara-a-cara do que matar a distância. A cavalaria também não era amplamente utilizada, embora que nas guerras em territórios inimigos, os nórdicos usassem cavalos, e em alguns casos, chegaram até mesmo a transportar cavalos em seus navios. Devido ao fato de não usarem muito a artilharia e a cavalaria, isso rendeu derrotas para eles, especialmente em batalhas em campo aberto e nas florestas, onde os arqueiros eram mais favoráveis em alguns casos para  as emboscadas. 

Outro fator que teria levado a demonização dos vikings teria sido através da figura dos berserker, guerreiros afetados por um estado de grande agressividade, os quais segundo relatos, lutavam apenas de calça, exibindo cicatrizes e cortes feitos por si mesmo no corpo, como forma de mostrar que estavam além da dor; além de também alguns deles usavam peles de lobos ou de ursos, animais caracterizados pela força e agressividade. Tais guerreiros empunhavam grandes espadas ou machados e avançavam junto a vanguarda, demonstrando não terem medo. Não se sabe ao certo do porque tais homens entrarem em tal frenesi ou transe, mas isso estaria associado a algum tipo de rito relacionado a Odin, o senhor da guerra, aquele que concede o furor aos guerreiros. 


Estátua colecionável, representando um berserker com manto de lobo.

Um último aspecto a ser mencionado diz respeito as mulheres guerreiras. Se popularizou na literatura a ideia de mulheres indo para a guerra, participando da pirataria, das invasões, etc. A verdade não era bem assim. A arte da guerra era algo considerado uma ocupação masculina, pois embora os mitos falassem das valquírias (que eram guerreiras), não significa que houvesse mulheres guerreiras propriamente. Por mais que algumas mulheres aprenderam a lutar para se defender, isso não significa que elas participassem das atividades bélicas. 

Os relatos nórdicos e estrangeiros, não mencionam a presença de mulheres nas batalhas. E embora mencionou-se que havia mulheres em navios nas expedições, geralmente se tratava de expedições de colonização. Muitas mulheres migraram para a Islândia e a Bretanha. Essa ideia de guerreiras começou a surgir nos séculos XIX e XX, e ainda é mantida no século XXI, vide o caso do seriado The Vikings do History Channel, onde aparece a personagem Lagertha e outras mulheres indo para as batalhas. Isso é mera ficção.

Para os nórdicos, as mulheres tinham um grande papel relacionado ao lar. Quando o marido estava fora, ela era a senhora de tudo. Era a responsável por manter a segurança, a paz e a ordem. Logo, era mais importante manter as mulheres cuidando da casa, da propriedade e do restante da família, do que levava-las para o campo de batalha. Em caso do marido morre-se, era a esposa que se tornava dona de tudo, até o filho mais velho poder assumir a propriedade. 

A SAGA

Os motivos para os nórdicos se aventurarem por mar e terra são vários, mas alguns que são comumente mencionados pela história são: excesso populacional,  interesse de reis em conquistar terras e ampliar seus domínios; descobrir-se ilhas e novas terras para colonização; empreender amizade com outros povos, ampliando as rotas comerciais; desentendimento entre chefes guerreiros com reis, o que levou a grupos a deixarem o reino e agirem por conta própria; fuga da violência e das difíceis condições de vida na Escandinávia, etc. 

Grã-Bretanha:

"Não é grande a distância que separa as Ilhas Britânicas da Escandinávia, através do mar do Norte, e quando no século VIII, se iniciaram as expedições dos Vikings, estes estavam diante de costas que já lhes eram familiares. É possível também que conhecessem a situação política dos povos que atacaram, por quanto era notório o período de fraqueza e lutas internas que atravessavam a Inglaterra, a França e a Rússia e, sendo assim, este conhecimento prévio deve ter contribuído eficazmente para o êxito do ataque dos Vikings". (ARBMAN, 1971, p. 55).

Segundo um relato contido nas Crônicas da Saxônia Ocidental, diz que no ano de 787, nórdicos haviam realizado um ataque a Bretanha, no entanto, hoje vários historiadores põem em dúvida a veracidade de tal relato, devido ao fato de não encontrarem provas que o sustentem e corroborem esse ataque, no entanto, não se descarta que os nórdicos possam ter mantido contato comercial com os reinos anglos ao longo do século VIII ou até mesmo antes disso. Porém, sabe-se que no ano de 793, uma expedição viking atacou e saqueou a igreja e mosteiro de São Cuteberto em Lindisfarne, localizado em uma pequena ilha ao longo da costa da Nortúmbria. Tal ilha era famosa pelo mosteiro e seu patrono, São Cuteberto. E ainda hoje é chamada de Ilha Sagrada (Holy Island). Porém no ano de 793, o mal caiu sobre ela. Sobre isso, o relato de um contemporâneo da época diz o seguinte:

"Nós e nossos antepassados vivemos aqui há 350 anos e nunca presenciámos na Grã-Bretanha tão grandes horrores como os pagãos nos infligem. Ninguém ousaria supor que fosse possível tamanha devastação". (ARBMAN, 1971, p. 55).

"793: neste ano apareceram presságios terríveis na Nortúmbria, que assustaram muito as pessoas. Consistiam em imensos torvelinhos e relâmpagos, e viam-se dragões chamejantes voando pelo ar. Aqueles sinais foram imediatamente seguidos por uma época de grande fome, e pouco depois, em 8 de junho do mesmo, ano os homens pagãos destruíram a igreja de Deus em Lindisfarne, saqueando e matando". (PRICE, 2006, p. 122). 

Estátua contemporânea de St. Adain diante das ruínas da igreja e mosteiro de São Cuteberto em Lindisfarne, Inglaterra.

O ataque e a pilhagem de Lindisfarne marcou para muitos historiadores o início das invasões vikings as Ilhas Britânicas. A notícia se espalhou rapidamente entre os reinos anglos, deixando grande parte da população aterrorizada com tal atrocidade, pois nunca antes na história conhecida deles, algo do tipo havia acontecido. Parte da população sabia que pagãos viviam no norte do continente, mas não imaginavam que viriam até a Bretanha e atacar uma das "casas de Deus". Tal fato contribuiu para que os relatos sobre os vikings os demonizassem.

Em 794 uma nova incursão viking retornou a Nortúmbria e dessa vez o alvo teria sido um mosteiro em Monkwearmouth ou Jarrow, o qual foi saqueado, os monges foram mortos e por fim, os piratas o incendiaram. Em menos de dois anos dois mosteiros haviam sido roubados e queimados, e seus clérigos brutalmente assassinados. De acordo com Price (2006, p. 124) começou a surgir entre a população histórias de que as aqueles pagãos seriam um "castigo de Deus", pois o Senhor estaria descontente com os pecados dos bretões, então teria ordenado aquela praga como castigo. 

Tal ponto de vista é interessante pois fez parte de um senso comum do homem antigo e medieval cristão: a invasões de "povos bárbaros" eram vistas como um castigo divino. Os cristãos romanos no século V consideraram os hunos sob esse aspecto, até mesmo chamaram Átila, o Huno de o "Flagelo de Deus". No século final do século VIII e ao longo do IX, temos o relato dos ingleses acerca dos nórdicos, assim como, também temos o relato dos povos ibéricos sobre a invasão dos árabes a Península Ibérica. No século XIII os cristãos do leste europeu vão relatar sobre a ameaça dos mongóis, que cavalgavam como "cavaleiros do Inferno", destruindo tudo em seu caminho. 

Todavia, passado esses dois ataques a Nortúmbria, por quase 30 anos, segundo Price (2006, p. 124) os reinos anglos não voltariam a ser ameaçados , já que parte da suas incursões se dirigiram nesse meio tempo, para o norte da Escócia e para a Irlanda, algo que será visto adiante.

Já no século IX, na década 830 começariam a se intensificar as expedições vikings aos reinos anglos, o que iniciaria um estado de guerra de mais de um século de duração, mas tendo momentos de paz durante seu percurso.

"Depois de passar um verão com incursões vitoriosos ao longo da costa frísia (a atual Holanda) no ano anterior, em 835 uma grande força dinamarquesa desembarcou na ilha de Sheppey, no estuário do Tâmisa, de onde assolou a zona circundante. Desde então e até 850, a costa meridional foi devastada por uma série de ataques, que incluíram incursões em Londres e Rochester, Kent. Houve batalha campais com os vikings em Dorset e Southampton, e também se levaram a cabo incursões na costa oriental, no reino de Lindsey e mais para o norte, na Nortúmbria". (PRICE, 2006, p. 125).

Pintura medieval retratando um exército viking.

Uma das vantagens que eles possuíam em teoria, era o fato de que a Grã-Bretanha estava dividida sob o governo de vários pequenos reinos. Nesse caso, alguns desses reinos eram inimigos um do outro, logo não iriam socorrer seus vizinhos, mesmo se estivessem sendo atacados e invadidos. Isso acabou gerando um duplo efeito: primeiro, isso garantia que os nórdicos que o reino vizinho provavelmente não iria interferir em seus ataques, já que ambos reinos eram rivais ou inimigos. Segundo, isso também abria espaço para a negociação, algo que os nórdicos fizeram várias vezes. 

Sendo assim, houve momentos nos quais chefes vikings decidiram usar seus bandos de guerreiros, lutando como mercenários nestes reinos anglos, ou propuseram acordos, onde eles se comprometiam em ajudar a invadir o reino rival ou inimigo. Pensar que os escandinavos eram completamente ignorantes, é uma visão reducionista e preconceituosa. Alguns chefes foram astutos em se valer dessa divisão política para seus interesses.

Mapa da Grã-Bretanha no ano 800, retratando a localização dos vários reinos da época.

Da década de 830 até o ano de 850, por quase vinte anos as expedições vikings se tornaram regulares. A cada verão novas levas de navios e tropas retornavam a costa ocidental da Grã-Bretanha, pois era uma prática dos povos europeus não lutar no inverno devido aos vários problemas gerados pelo frio. Logo, nos verões e primaveras as incursões se realizavam, durando dias ou semanas, dependendo de quantos alvos seriam atacados, mas no entanto, após conseguirem o saque, as expedições retornavam a Escandinávia.

Todavia, no ano de 850 isso foi diferente. Um exército viking montou acampamento de inverno na ilha de Yhanet na foz do Tâmisa, e ali passou o inverno na Bretanha. Tal prática passou a ser realizada por outros chefes, o que daria início anos depois as ideias de ocupação efetiva, ou colonização como alguns historiadores chamam.

"Durante 15 anos (até 865) os ataques regulares continuaram, e nesse ano se faz referência pela primeira vez ao pagamento de danegeld, um termo empregado para descrever uma soma que os escandinavos exigiam dos ingleses como dinheiro de proteção, mediante o pagamento do qual deixariam em paz a população. Os vikings tinham descoberto que a extorsão era potencialmente mais lucrativa que a luta, e menos arriscada". (PRICE, 2006, p. 125).

No ano de 866 tropas que lutavam no Império Carolíngio no continente, se dirigiram para Grã-Bretanha, tais tropas ficaram conhecidas na Crônica anglo-saxã como micel here, normalmente traduzido como "Grande Exército", embora não saibamos quantos homens compunham suas forças exatamente. No entanto, com a chegada desse exército, a forma de como se travava as batalhas mudaria. Pois se antes, pequenos grupos iam atacar esporadicamente, agora exércitos se fixariam em território inimigo, o ocupariam e e manteriam uma guerra regular até meados do século IX.

De 866 a 870, num espaço curto de quatro anos, o "Grande Exército" empreendeu uma série de campanhas pelos reinos da Nortúmbria, Ânglia Oriental, Essex e o leste de Mércia. No ano de 870, esses três reinos já estavam sob controle viking, consistindo Mércia (ao centro) e Wessex (no sul) como os dois grandes reinos anglos ainda dominantes. Quase metade da Bretanha estava sob o domínio viking.

"Os anos 872-874 viram que os vikings mudavam os seus objetivos. Agora os seus esforços se dirigiam contra a Mércia, que consistiram depois de três anos de luta. Em 875, o Grande Exército dividiu-se de novo, e uma parte deslocou-se para o norte, do Humber ao Sul da Escócia, para atacar os reinos celtas de Pictland e Strathclyde, enquanto a outra hoste mantinha o controle sobre o Centro do Inglaterra". (PRICE, 2006, p. 130).

No ano de 877 um comandante viking chamado Healfdene dividiu terras na Nortúmbria entre seus homens, os quais trouxeram suas famílias ou constituíram famílias com os ingleses, e assim começou a se formar uma ocupação efetiva do território conquistado. O mesmo foi feito no sul das terras conquistadas. Em 879 os nórdicos aceitaram a trégua proposta pelo rei Alfredo de Wessex, então seu reino ficaria em paz até 885. De qualquer forma, na década de 870 o Danelaw como ficaria conhecido os domínios nórdicos na Inglaterra, se estabelecia de vez.  

Danelaw é um nome encontrado nas Crônicas Anglo-Saxônicas que refere-se aos domínios governados pelos nórdicos, o que incluía o Reino de York, os Cinco Municípios (Boroughs): Leicester, Nottingham, Derby, Stamford e Lincoln, e o Reino Dinamarquês da Ânglia Oriental. O nome tem origem em língua nórdica, Danelagen, mas fora transladado para o inglês medieval, ficando Danelaw. O que significa "danes" (dinamarqueses) e law significa lei em inglês, logo, Danelaw significava "sob jurisdição dinamarquesa". Tal fato não fora por mero acaso, esse nome se dera devido ao fato de que nessas terras passaram a imperar as leis nórdicas oriundos da Dinamarca, em oposição as leis inglesas da região. Foi um período de forte miscigenação cultural entre os nórdicos e os anglos.

O Danelaw no ano de 890 e sua fronteira com o reino de Alfredo, agora, senhor de Wessex e Mércia.

Ainda hoje grande parte da história do Danelaw é desconhecida, pois os nórdicos não criaram um relato escrito, e as fontes inglesas possuem informações vagas sobre como se dava a organização política nas terras do Danelaw, como foi a aceitação dos ingleses que ali viviam, agora tendo que passar a obedecer leis estrangeiras, quais mudanças sociais e culturais se efetuaram, pois se sabe que parte dos nórdicos que passaram a habitar aquelas terras começaram a adotar o cristianismo, além de se notar influência no estilo artístico, surgindo uma mistura de estilo anglo-escandinavo; a adoção de palavras escandinavas para o língua inglesa, pois ainda hoje muitas localidades nessas regiões preservam os nomes de origem viking, até palavras usadas no cotidiano são de origem viking. Por exemplo, wednesday (quarta-feira) significa originalmente "Dia de Odin" e thuersday (quinta-feira) significa originalmente "Dia de Thor". 

Não obstante, enquanto os governantes escandinavos mantinham seu governo sobre o Danelaw, o rei vizinho, São Alfredo, o Grande (849-899), como passou a ficar conhecido, há anos vinha combatendo os nórdicos, e da mesma forma que ele conseguiu expandir seus domínios de Wessex para Mércia, os escandinavos também fizeram o mesmo, e agora ambos eram as duas potências dominantes na Bretanha. 

Estátua do rei São Alfredo, o Grande em Winchester, Inglaterra.

Em 885 o rei viking Guthrum (?-890), o qual governava o Reino da Ânglia Oriental rompeu com o tratado de paz de Wedmore feito com Alfredo em 879. Então Guthrum invadiu Kent na tentativa de marchar em direção a Wessex. Algumas batalhas ocorreram, mas no fim, em 886 o exército de Guthrum foi derrotado, e Alfredo conseguiu ratificar o tratado de paz com o rei viking de York e os jarl do restante do Danelaw. No entanto, se até então os dinamarqueses eram os principais inimigos dos anglos, os noruegueses entraram nesse conflito também.

Não obstante, embora os nórdicos  dinamarqueses tenham sido os responsáveis por conquistar e colonizar grande parte das Ilhas Britânicas, os noruegueses chegaram ao arquipélago e começaram a exercer influência e domínio no final do século IX, sob o governo do rei Haroldo I da Noruega (850-943). 

Tapeçaria retratando o rei Haldfan, o Negro (esquerda) e seu filho e herdeiro, Haroldo, Cabelo Belo.

Com a morte de Haldfan, o Negro, Haroldo assumiu o trono norueguês em 872, e tratou nos anos seguintes de subjugar os reinos vizinhos que se encontravam pela Noruega. Assim, ele conseguiu unificar parte da Noruega sob seu domínio. Após tal feito, Haroldo dirigiu seu interesse sobre o arquipélago britânico, assim durante seu longo governo, ele enviou tropas para a Grã-Bretanha, Irlanda, França, etc. Entretanto, os exércitos de Haroldo não obtiveram grande êxito em conquistar terras para seu rei, devido ao revés que o Danelaw começaria a sofrer após a morte do rei Alfredo, o Grande.

"Desde o estabelecimento do Danelaw até a sua morte em 899, Alfredo governou Wessex com a ameaça permanente no norte dos exércitos do Danelaw escandinavo. Durante os últimos 10 anos da sua vida, Alfredo reconstruiu os centros religiosos de ensino e cultura que tinham sido destruídos ou abandonados durante as longas guerras dinamarquesas e assegurou a sua sobrevivência por meio de uma cadeia de fortificações construídas através da Inglaterra Meridional. Estes burhs parecem ter sido uma combinação de pontos de refúgio para a população em épocas de guerra, mercados fortificados e centros administrativos". (PRICE, 2006, p. 131).

De 892 a 900 uma nova onda de invasões contra o reino de Alfredo, estourou, e várias batalhas foram travadas. Mas após a sua morte, seu herdeiro, Eduardo, o Velho (877-924) deu continuidade aos planos de seu pai em construir burhs para defender as fronteiras do reino. Sob seu governo, o rei Eduardo empreenderia uma série de campanhas na tentativa de desmantelar os reinos nórdicos do Danelaw e assim conquistar aquelas terras para si.  

Representação de um burh. Os burh poderiam ser simples fortalezas ou cidades e vilas fortificadas.

"No início do século X, tanto os povos anglo-saxões como os escandinavos estavam esgotados por décadas de guerra. No entanto, enquanto os dinamarqueses consolidavam o seu domínio sobre o Danelaw, Wessex - então governado por Eduardo, filho de Alfredo - começou uma lenta campanha de desgaste contra os dinamarqueses, com pequenas mas contínuas incursões no outro lado da fronteira. Fizeram-se campanhas mais importantes em 903, 906 e 909, quando os vikings se aliaram aos dirigentes ingleses hostis ao trono de Wessex, mas os exércitos e Eduardo mantiveram-se firmes". (PRICE, 2006, p. 142).

Embora ambos os lados tenham vivenciados suas vitórias e derrotas, as forças escandinavas foram quem sofreram mais nessa guerra constante. A estratégia de fortificações (burh) amplamente utilizada pelo rei Eduardo garantiu que já em 920, mais da metade do território do Danelaw tivesse sido conquistado, renegando o restante ao Reino de York. Os nórdicos sem usar armas de cerco ou adotar um maior uso da cavalaria se viraram cada vez mais sem possibilidades de investir contra o crescente número de burh que se espalhavam pelo reino de Wessex. Após a morte de Eduardo, seu filho Athelstan (c. 893-939) continuou a pressionar cada vez mais o Reino de York até que em 927 a capital, York foi invadida e tomada. 
 
"Dois anos antes da morte de Aethelstan, a situação em Iorque tornou-se muito instável, apesar de um dos seus efémeros reis se ter intitulado, numa cunhagem de moeda, rex totius Britanniae. Olavo Kvaran teve dois reinos, como os teve o famoso Eric Blood-Axe, depois da sua expulsão da Noruega, por excessiva crueldade. O seu assassínio em Stainmoor (provavelmente quando fugia de Iorque), no ano de 954, marca o fim do reino viking de Iorque, onde, como no resto de Danelaw, se desenvolveu uma civilização anglo-escandinava, muito mais produtiva do que noutras regiões, com uma cultura resultante da fusão de duas tradições". (ARBMAN, 1971, p. 69).

Eric Machado Sangrento (885-954), governou a Noruega de 930 a 934, mas devido a sua grande crueldade e autoridade, fora deposto por um golpe de Estado dado por um de seus irmãos, assim fora banindo da Noruega. Tornou-se rei de York entre 937 e 938, fora deposto novamente e expulso, no entanto retornou anos mais tarde e passou a governar em 952. Porém, nessa época, a influência viking havia caído drasticamente, e suas defesas estavam fragilizadas. York fora cercada, e Eric foi executado em 954, tendo sido o último rei viking de York. Com a derrocada dos nórdicos, o rei inglês, Eadred passou a dominar quase toda a Grã-Bretanha, no entanto acabou falecendo no ano seguinte, sendo sucedido por seu irmão Edmundo I.  

Moeda do rei Eric Machado Sangrento de York. Na moeda se ver uma espada e uma inscrição em latim: "Eric Rex", que significa Rei Eric.

Do ano de 955 até o ano de 980 a Grã-Bretanha se viu livre praticamente dos ataques vikings, a não ser por expedições ocasionais, principalmente vindas da Ilha de Man e da Irlanda, locais ainda sob o domínio escandinavo. Nesse período, os reinos nórdicos passaram a dar atenção a outros locais do continente e a outras ilhas. No entanto, a partir de 980 os ataques retornaram. Alguns reis e chefes estavam decididos a recuperarem a Inglaterra. 

De 980 até o final do século, vários ataques realizados no sudeste e sudoeste do país se sucederam. Entretanto, em alguns casos, os chefes estavam mais interessados em saquear do que conquistar, mesmo assim, o número de navios que foram enviados em algumas expedições foi relativamente grande para algumas dessas expedições, um exemplo ocorreu em 991, quando Olavo Tryggvasson (c. 960-1000) - posteriormente rei da Noruega -, enviou 93 navios com mais de dois mil guerreiros à bordo. 

Algumas medidas encontradas pelos nórdicos para se evitar o aumento das derrotas que estavam sofrendo para os ingleses, foi retomar as antigas alianças com os ingleses, através de casamentos ou do protetorado, onde se enviavam filhos, primos, sobrinhos, netos, para outra Corte e visse versa. Tal prática passou a ser bastante adotada pelas monarquias europeias de várias nações ao longo da Idade Média. Para alguns historiadores, isso era mas como uma prática de manter reféns nas Cortes, a fim de ter certa garantia de que se seus parentes fossem mortos, os deles também seriam. 

Outra forma encontrada fora a cobrança de um tributo anual, para que as cidades inglesas não voltassem a serem atacadas. Aqui percebemos o retorno da cobrança do danegeld. Nos relatos contido no Old English, há menção a esses valores pagos em libras. Em 994, o tributo era de 16 mil libras; em 1007 já custava 36 mil libras, e em 1012, o valor era de 48 mil libras. Em valores atuais, isso estaria na casa dos milhões. E tais cobranças eram pagas em ouro ou prata.

Tais práticas acabaram dando certo, e parte do antigo território do Danelaw havia voltado, já que alguns nórdicos haviam conseguido se estabelecerem em antigas terras que havia conquistado, e ao mesmo tempo, a população local, era formada por anglo-escandinavos, isso contribuiu muito para que os ingleses viessem a aceitar um rei viking como seu novo governante. E assim, ocorreu. 

No ano de 1013, o rei Svein I da Dinamarca (c. 965-1014), chegou ao Danelaw e ali se estabeleceu. Svein Barba Bifurcada como também era conhecido, ao se mudar para a Inglaterra, foi um dos poucos "reis vikings" de fora, que passou a viver em terra estrangeira. Ainda no ano de 1013 e 1014, empreendeu algumas batalhas, tendo como objetivo expandir seus domínios pelo país, mas acabou falecendo naquele ano. Em seu lugar lhe sucedeu seu filho Canuto II (995-1035), o qual acabaria tendo bastante sorte.

"Os últimos dois anos do reinado de Ethereld decorreram com ele lutando numa guerra perdida de antemão com Canuto, o filho de Svein, que tinha ficado no Danelaw com o seu exército. Quando Ethereld morreu em 1016, o seu filho Edmundo opôs uma feroz resistência aos vikings". (PRICE, 2006, p. 209).

No ano de 1016, o rei inglês Ethereld II faleceu e ainda naquele ano, seu filho Edmundo veio também a morrer. Assim, o trono inglês estava livre, então Canuto aproveitou para tomá-lo. Fazendo uso de seu exército e aproveitando o estado caótico com a vacância do trono, Canuto se autoproclamou rei da Inglaterra, tornando-se o primeiro rei viking assumir esse título, algo que posteriormente lhe rendeu a alcunha de Canuto, o Grande.


Canuto, o Grande. Rei da Dinamarca, da Inglaterra e da Noruega.

Embora fosse um viking, Canuto era um cristão desde nascença, pois nessa época muitos dos escandinavos já haviam se convertido, e tal fato se ressalva quando vemos algumas representações do rei ligada a símbolos cristãos. Canuto acabou se casando com a viúva do rei Ethereld II, Emma ou Elfgyfu, como forma de reforçar seu direito ao trono inglês. Ordenou uma atualização do código legal do país, mandou cunhar moedas com sua efígie, as quais eram utilizadas tanto na Inglaterra quanto na Dinamarca.

Em 1018, tornou-se rei da Dinamarca, pois até então seu filho Haroldo era o soberano oficial. Em 1028, conseguiu anexar a Noruega e uma parte da Suécia, tornando-se assim o rei viking com o maior império já visto na história viking. Embora tenha vivido a maior parte da vida na Inglaterra, viajou para a Escandinávia algumas vezes e até mesmo para Roma, onde foi recebido pelo papa e outros nobres cristãos como sendo um dos seus. Por mais que ele fosse um viking, ele não era um viking pagão, mas um viking cristão.

"No entanto, como pode acontecer com muitos empreendimentos criados com a ambição pessoal, o império de Canuto desintegrou-se com a sua morte. O seu filho, Hardacnuto, que o sucedeu tanto no trono inglês como no dinamarquês em 1040, não fez muito para travar o seu declínio. Depois da sua morte num banquete em 1042, a coroa inglesa regressou à antiga linha real, quando Eduardo, o Confessor, o único filho sobrevivente de Ethereld II, foi proclamado rei, após seu regresso de um exílio de 25 anos na Normandia". (PRICE, 2006, p. 211). 

Com a morte de Eduardo, o Confessor em 1066, dois reis disputaram o trono inglês. De um lado o rei viking da Noruega, Haroldo Siguardarson (1015-1066), mais conhecido como Haroldo Hardradi, e no outro lado,  o conde Haroldo Godwinson (c. 1022-1066). Hardradi acabou falecendo em combate, então Godwinson assumiu o trono inglês, tendo sido o último monarca inglês de descendência viking a assumir o trono, adotando o nome de Haroldo II. Todavia, seu governo foi breve, tendo governado de janeiro a outubro de 1066, quando foi derrotado e morto em combate contra Guilherme da Normandia (1028-1087), bisneto de um viking, o qual ficaria conhecido mais como Guilherme, o Conquistador

Rei Guilherme I da Inglaterra.

Haroldo II tomou o trono inglês para si, se autoproclamando rei da Inglaterra, mas Guilherme que também almejava o trono inglês, não aceitou tal fato e partiu com seu exército, cruzando o canal da Mancha e invadindo a Inglaterra. Ainda naquele ano os dois se confrontaram e Haroldo II morreu em combate. No natal de 1066, Guilherme, o Conquistador foi coroado rei da Inglaterra, pondo fim ao governo viking e inglês, iniciando uma nova dinastia real. Embora fosse descendente de nórdicos, mas devido a pertencer a quarta geração de sua família, ele se considerava um normando e não um descendente dos nórdicos.

Escócia, Ilha de Man e Irlanda:

"Assim como aconteceu com outras regiões da Europa Ocidental no final do século VIII, a Escócia sofreu incursões temporárias dos vikings ao logno das suas costas. Como na Inglaterra e na França, os bens religiosos corriam especial perigo. Registraram-se ataques a vários centros monásticos, e a abadia na diminuta ilha de Iona, fundada em 563 pelo irlandês S. Columba, foi assaltada três vezes em pouco mais de dez anos, em 795 (dois anos depois do primeiro ataque viking registrado, em Lindisfarne), 802 e 806; o perigo era tanto, que parte da comunidade se retirou para Kells, na Irlanda (fundada em 807), para maior segurança". (BATEV, 2006, p. 148).

Diferente do que ocorreu na Inglaterra e na Irlanda, no caso da Escócia, os nórdicos não conseguiram ter sucesso em ocupar toda a região, tendo se limitado ao sul da Escócia, a qual acabou fazendo parte do Reino de York, no norte, na região de Caithness. No entanto, a maioria das possessões escandinavas se restringiam aos arquipélagos localizados no norte e oeste. Foi nessas ilhas que as comunidades se estabeleceram por mais de três séculos. 

Naquela época a Escócia era habitada por três povos de origem celta: os escoceses, os bretões e os pictos. Tais povos foram um forte empecilho para a conquista viking da região. Os bretões se concentravam no sul, os escoceses no centro-leste, e os pictos no oeste e norte. Os nórdicosacabaram fazendo guerras contra eles. No entanto, é importante ressalvar que nesse tempo, tais povos já estavam cristianizados a várias décadas.


Em marrom escuro os domínios vikings no arquipélago das Órcades e das Shetlands. Em vermelho os domínios vikings nas Hébridas Exteriores e Interna, na costa ocidental escocesa e na Ilha de Man, durante o século XI. Nessa época o sul e o norte da Escócia já haviam sido perdidos.

Algumas das ilhas nas Órcades, Shetlands e nas Hébridas já eram habitadas por agricultores, mas outras eram desabitadas e acabaram sendo povoadas pelos nórdicos. Enquanto as expedições vikings para a Inglaterra e Irlanda se concentraram em vários anos no intuito da pirataria, as expedições aos arquipélagos escoceses tomaram o caminho da colonização. 

As evidências arqueológicas encontraram vestígios de várias fazendas por tais ilhas e até mesmo na região de Caithness no norte da Escócia, o que marcou uma ocupação longa dos escandinavos, assim como, sua miscigenação com os escoceses e pictos. Nesse caso, as ilhas tiveram inicialmente um papel como local de passagem para os viajantes que seguiam da Noruega e Dinamarca para a Ilha de Man, Irlanda e a costa oriental da Bretanha, como também, um local de passagem para aqueles que iam da Bretanha e Irlanda para a Islândia, ou faziam o caminho contrário. 

Todavia, foi ainda no século IX que alguns nórdicos decidiram se estabelecer permanentemente nessas ilhas com suas famílias, fundando fazendas e vilas (não houve fundação de cidades), misturando-se com os povos locais ou ocupando regiões desabitadas. Tais homens passaram a viver da agricultura e da pecuária, pois o comércio foi bastante irrisório devido a falta de mercadorias para serem comercializadas. Todavia, a ocupação viking e sua influência nessas ilhas escocesas foi bem mais duradoura, tendo alcançado, segundo Batev (2006, p. ) o século XII, onde se encontravam resquícios da cultura viking. 

"No meio do mar da Irlanda, na altura da costa noroeste da Inglaterra, a ilha de Man está situada para atrair influências de uma área considerável. É uma pequena ilha de apenas 48 quilômetros de norte a sul por 16 quilômetros de leste a oeste. Seu interior elevado é coroado pelo Snaeffel, que significa "montanha de neve" - o nome que os vikings lhe deram. Uma grande planície costeira estende-se para norte, e uma faixa costeira relativamente fértil envolve toda a ilha". (BATEV, 2006, p. 154).


Localização da Ilha de Man.

As terras relativamente férteis para a agricultura e a pecuária, a existência de mosteiros e vilas, além da posição estratégica, atraiu alguns viajantes para se fixarem na região. Man foi ocupada por mais de dois séculos pelos nórdicos, e até mesmo se tornou rota de comércio entre a Irlanda e a Bretanha. Com a ascensão do rei viking de Dublin, a ilha se tornou subordinada ao seu governo, mas antes ela possuía um governo próprio.

"Segundo os Anais irlandeses, a primeira incursão viking ao longo da costa irlandesa se deu em 795, num lugar chamado Rechru. É costume identificar esse lugar com a ilha de Rathlim, e ele encontra-se exatamente na ponta da Irlanda. Até 820 houve uma série de ataques intermitentes. Depois a amplitude desses atos aumentou. A partir de 830, registra-se um movimento para o interior, e em 839 há informações da primeira invernada em Lough Neagh, e as primeiras colônias permanentes (conhecidas como longphorts) estabeleceram-se em 841 em Dublin e provavelmente em Annagassan, na baía de Dundalk". (BATEV, 2006, p. 160). 

"Os Anais de Ulster dizem em 820: 'O oceano lançava torrentes de estrangeiros sobre Erin, de tal sorte que não havia um porto ou ancoradouro, um forte ou ponto estratégico que não tivesse rodeado de esquadras de escandinavos e piratas'". (ARBMAN, 1971, p. 75).

"Na Irlanda, havia mais que o suficiente para atrair os vikings. As maiores concentrações de colônias eram grandes mosteiros complexos, às vezes, denominados de "cidades", que estavam situados no meio de uma paisagem de fazendas dispersas. Outros centros de riqueza importantes se encontravam em ilhas feitas pelos homens nos terrenos pantanosos". (BATEV, 2006, p. 160).

Em 836, 120 navios noruegueses navegaram pelos rios Boyne e Liffey, chegando a Meath a qual fora pilhada e destruída, então eles se dirigiram para Dublin e ainda no mesmo ano a conquistaram, fundando a primeira colônia nórdica na Irlanda.

Reconstituição da cidade de Dublin sob o governo viking. Irlanda.

"Durante o século X, Dublin enriqueceu fazendo comércio com outros centros em volta do mar da Irlanda como Chester e Bristol. As escavações revelaram vários edifícios de madeira bem conservados, que remontam à época viking. Muitos deles continham as oficinas nas quais os ferreiros, curtidores, fabricantes de pentes e talhadores de madeiram exerciam o seu ofício". (BATEV, 2006, p. 163).

Muito da riqueza conseguida pelos vikings na Irlanda, adveio do comércio e em parte dos saques. A agricultura e a pecuária contou com o investimento viking, mas pelo que parece predominou a presença irlandesa, pois eles ficaram restritos a costa oriental da Irlanda e as cidades, o restante da ilha era ocupado pelos irlandeses.

Em 841, uma muralha e outras fortificações foram construídas em Dublin, e ao mesmo tempo outras cidades foram saqueadas e conquistadas, como: Narrow Water, Linn Duachail, Louth e Linn Roio. Em 839, Turgeis ou Turghils havia se proclamado rei viking da Irlanda, porém se desconhece até onde ia realmente sua autoridade, mas sabe-se que em 845 ele fora deposto e afogado. Após a sua morte, uma rebelião estourou pela ilha e segundo os relatos das Crônicas, cerca de 12 mil guerreiros foram mortos. Os números não são certos e talvez exagerados, mas sabe-se que os irlandeses empreenderam vários ataques aos domínios nórdicos, mas não conseguiram expulsar seus captores. 

Mapa da Irlanda, mostrando as principais localidades do período viking. Mapa retirado do livro Os Vikings, página 77.

Em 850, tropas de dinamarqueses chegaram a Dublin e a atacaram. Vários guerreiros noruegueses foram derrotados e os dinamarqueses conquistaram o controle de Dublin. E no ano de 853, Amlaibh ou Olaf Huiti, chegou a Irlanda e proclamou-se rei de Dublin e seus domínios, governou por 18 anos e regressou para Noruega. Embora fosse norueguês, os dinamarqueses mostravam respeito por sua pessoa. Em seu lugar governou seu irmão Ivar

Ivar, levou a cabo a estabilização do reino viking na Irlanda, realizando casamentos entre as famílias nobres irlandesas e nórdicas, além de propor acordo e alianças, isso contribuiu para assegurar o domínio viking por mais de um século. Enquanto o mesmo governava a Irlanda, entre 865 e 870, Olaf enviou exércitos para a Escócia, conquistando algumas cidades. 

No século X os domínios nórdicos da Irlanda se estenderam para a ilha de Man e o Reino de York, como já mencionado, além de possuírem comércio com cidades portuárias do País de Gales. No final do século X, Dublin a principal cidade nórdica na Irlanda havia sido retirada do controle escandinavo, e recuperada pelos irlandeses. No século seguinte, os escadninavos começariam a deixar de retornar para a ilha, e a cultura irlandesa acabaria assimilando a "cultura viking", embora hoje ainda se encontre resquícios linguísticos e de alguns costumes.

Império Carolíngio

Na época que os nórdicos começaram suas incursões pelo Mar do Norte e as expedições de conquista nas Ilhas Britânicas, a França era o coração do Império Carolíngio, governado pela Dinastia Carolíngia há quase cinquenta anos. No período que eles começaram a empreender viagens pela costa da Frísia (hoje na Alemanha) e na costa francesa, o então soberano carolíngio era Carlos Magno (742-814) um dos mais famosos reis da Idade Média. Em seu governo o império chegou ao auge, a ponto de chegar as fronteiras da Dinamarca e a costa do Mar Báltico. 


O Império Carolíngio em sua máxima extensão até o ano de 814.

Para alguns historiadores, a ameaça dos francos de invadirem a Escandinávia, pode ter sido um dos motivos para o rei da Dinamarca, Gottfrid (Godofredo) ter iniciado ataques aos domínios carolíngios. Uma das conquistas mais importantes realizadas, fora a tomada da cidade comercial de Reric na Frísia. A região da Frísia era um importante centro comercial do norte do continente, assim detendo o controle daquela região ter-se-ia acesso a um amplo mercado. Porém, Gottfrid temendo um contra-ataque de Carlos Magno, por ter invadido seu império, ordenou a transferência de todos os mercadores de Reric para a cidade de Sliesthorp, na Dinamarca, e ao sul desta ordenou a construção de um muro, separando seu reino do de Carlos Magno. 

"Os Anais Francos descrevem assim essa medida: 'Ordenou [Gottfrid] que a fronteira de seu reino com os Saxões fosse fortificada com uma muralha que, estendendo-se do braço do mardo do lado leste, a que os Dinamarqueses chamavam de Báltico (literalmente "água salgada do leste") até o oceano ocidental, protegesse toda a margem norte de Ejder, ficando apenas com uma porta onde pudessem entrar e sair os carros e os cavaleiros'". (ARBMAN, 1971, p. 82). 

Em 810, Gottfrid novamente atacou a Frísia e derrotou os exércitos de Carlos Magno em três localidades. Para evitar que mais derramamento de sangue continuasse, ele propôs um acordo, o pagamento de 700 libras de prata (em valores de hoje, algo em torno de centenas de milhares de libras), em troca de os nórdicos se comprometerem a não mais atacar os domínios carolíngios. Carlos Magno aceitou a proposta e a pagou. Com a sua morte em 814, o império passou para o seu filho Luís, o Pio, o qual conseguiu manter a ordem no império e a trégua com os nórdicos, pelos anos seguintes. 

Em 834, os francos abandonaram a cidade de Dorestad após um ataque viking, assim os escandinavos tomaram Dorestad a qual era um importante centro comercial, hoje localizado nos Países Baixos. Com a conquista de Dorestad, os reis dinamarqueses focariam parte de sua atenção  em aumentar as incursões de pirataria pelo Império Carolíngio.

Algumas das principais cidades que Dorestad mantinha comércio.

"Depois da morte de Luís, o Pio, seus filhos envolveram-se numa luta encarniçada pela posse do império e os Dinamarqueses, aproveitando-se das circunstâncias, enviaram uma esquadra, sob o comando de Asgerr, que penetrou no Sena e incendiou Ruão, pilhando, pelo rio acima, até Saint Denis, tudo quanto pôde. Tempos depois a mesma esquadra saqueou Quentowic, importante porto de comércio inglês". (ARBMAN, 1971, p. 82).

Luís, o Pio morreu em 840, deixando três filhos, Lotério, Carlos, o Calvo e Carlos, o Germânico. Os três filhos se confrontariam para conquistar a coroa deixada por seu pai, e tal guerra entre irmãos prejudicou as defesas do império. Os anos que se seguem, os nórdicos continuaram com suas expedições de saque, atacando, Nantes, a ilha de Noirmoutier, adentraram a região do rio Loire; em 845, o rei Horek da Dinamarca, enviou uma esquadra de seiscentos navios que subiram pelo rio, atacaram, pilharam e incendiaram Hamburgo (hoje na Alemanha). Ainda no mesmo ano, o comandante Ragnar Lodbrók teria chefiado uma expedição que cruzou o rio Sena, chegando a atacar Paris (existe controvérsias quanto a identidade de Ragnar). Sobre os acontecimentos da época, Ermentarius de Noirmoutier, relatou o seguinte: 

"O número de navios aumenta: a torrente interminável de vikings parece não parar. Por toda a parte os cristãos são vítimas de suas chacinas, incêndios e espoliações. Os Vikings, no seu caminho, tomam tudo e ninguém lhes resiste: apoderam-se de Bordéus, Périgueux, Limoges, Angoulème e Toulouse. Angers, Tours e Orleãs são aniquiladas e uma esquadra numerosa sobre o Sena e o perigo torna-se mais intenso em toda aquela região. Ruão perde-se, saqueada. Paris, Beavauis e Meaux são tomadas, a resistente fortaleza de Melun é arrasada, Chartres ocupada, Evreux e Bayeux são saqueadas e todas as cidades sitiadas. Raras são as cidades e os mosteiros que escapam: toda a gente foge e poucos ousam dizer - ficai e lutai pelas nossas terras, pelas nossas crianças, pelos nossos lares! Na sua inconsciência, preocupados com rivalidades, resgatam com tributos o que deveriam defender com a espada, e fazem perigar o reino dos cristãos". (ARBMAN, 1971, p. 87). 

Embora o tom dramático e crítico de Ermentarius, a situação não estava tão longe do que ele descreveu. Os três príncipes, chegaram a se unirem a chefes, os contratando como mercenários, para ajudarem nas lutas contra seus irmãos, e embora Carlos, o Calvo tenha saído vitorioso dessa guerra fraternal, e tendo governado por mais de trinta anos, nesse tempo, não conseguiu impedir que os nórdicos ainda continuassem a invadir seu império, saqueando, matando e destruindo. 

Em 845, Carlos, o Calvo pagou o tributo (danegald, o qual também fora cobrado na Inglaterra), a fim de ver os ataques se encerrarem. O rei da Dinamarca aceitou o tributo e cessou por sete anos os ataques as terras dos carolíngios, embora que algumas expedições ocasionais ainda continuaram a acorrer. Em 852, dois chefes, Sydroc e Gottfrid, estabeleceram a cobrança do danegald aos senhores da região do Sena, os quais continuaram a pagar o tributo até 860. No entanto, isso não assegurou que novos ataques voltassem a acontecer na França. Em 857, o chefe Björn, Costa de Ferro atacou e saqueou Paris.

Porém algo inusitado aconteceu. Alguns chefes começaram a entrar em confronto entre si, e alguns passaram a apoiarem o rei Carlos, o Calvo e seus sucessores. Nesse caso, os chefes que apoiavam o rei franco, cobravam terras e dinheiro, para derrotarem seus compatriotas, tais conflitos entre os próprios nórdicos perduraram pelos anos seguintes, chegando até o século X. E quanto os conflitos entre eles ocorriam, outros continuavam a saquear e destruir.

"Esta espoliação do Reino dos Francos continuou até o ano de 926. Treze danegeld foram impostos pelos vikings aos Francos e o total de sete destes, cujas importâncias se conhecem, é de 39 700 libras de prata; em 866 incluíram a alimentação e o vinho e foi especialmente determinado que a prata fosse pesada segundo as medidas escandinavas; se um escandinavo era morto era obrigatório o pagamento de indenizações; os Vikings podiam conservar os escravos presos e se algum deles fugisse tinha de ser restituído ou pago". (ARBMAN, 1971, p. 89).

Sabe-se que a partir desse acordo, no começo do século X, o então rei dos carolíngios, Carlos, o Simples doou terras como pagamento para alguns chefes vikings e seus guerreiros, na costa francesa, onde eles se estabeleceram, fundando fazendas, vilas, povoados, fortalezas e depois cidades. Tais terras passaram a compreender a região denominada de Normandia ("terra dos normandos"), já que os francos tinham costume de chamarem os nórdicos de normandos ("homens do norte").

Mapa com a atual divisão administrativa da França. Em destaque a Normandia.

Hoje a antiga região da Normandia é dividida em duas regiões administrativas, a Alta Normandia e a Baixa Normandia. Sendo que a alta possui dois departamentos e a baixa, três, a tornando um pouco maior do que a outra. 

No entanto, o estabelecimento dos nórdicos na Normandia não agradou a todos os francos, alguns condes e duques, se rebelaram contra o ato do rei Carlos, o Simples, e se opuseram ao domínio do mesmo, ganhando apoio de seus vassalos e alguns senhores feudais. Dessa forma, a Normandia fora atacada várias vezes, daí se encontrarem na época, relatos de várias fortalezas e fortificações, mesmo assim os escandinavos ainda continuaram a viver na Normandia até o final do século, antes de serem expulsos, embora que alguns acabaram se convertendo ao cristianismo e adotando a cultural dos francos, e ali permaneceram. 

"Quando a Normandia ficou sob a administração nórdica, novos grupos de escandinavos chegaram e, através dos topônimos e termos agrícolas da região, parece que, pelo menos em parte, vieram do Danelaw, em Inglaterra". (ARBMAN, 1971, p. 90).

Mas enquanto permaneceram em sua colônia na França, os nórdicos aproveitaram para comercializar com a Inglaterra, Irlanda e até mesmo empreender viagens para o sul, em direção ao Mediterrâneo.

A Península Ibérica e o Mediterrâneo:

Nessa época não existia ainda os reinos de Portugal e Espanha, a península estava dividida entre os Reinos Hispânicos e o Emirado Omíada de Córdoba, governado pelos árabes e mouro, logo, quando os nórdicos chegaram propriamente a península, realizaram ataques tanto nesses reinos, quanto ao emirado. Os relatos mais antigos conhecidos apontam que por volta de 840, a primeira expedição importante chegou a costa da Galícia, hoje na Espanha, de lá eles continuaram a seguir pelo sul margeando a costa, atacando e saqueando os portos e as cidades. 

Sabe-se que em 844, os vikings atacaram a cidade de Gijón, depois Lisboa; chegaram a subir pelo rio Gualdavequir, atacando Cádiz e Sevilha, onde mantiveram um cerco de sete dias, pilhando e matando. Com o saque em mãos regressaram aos navios e foram embora. Os historiadores árabes os chamavam de al-majus, algo referente a pagão no dialeto árabe. 

A Península Ibérica no século X. Grande parte do território era dominado pelos árabes e mouros, e ao norte estava o Reino de León, o qual havia conquistado os reinos hispânicos vizinhos. 

Sobre as expedições vikings a Ibéria ou Al-Andalus, como os árabes chamavam, notou-se que eles não chegaram a fundar colônias propriamente, embora chegaram a tomar o controle de algumas cidades no norte da península. Os historiadores apontam que após o cerco a Sevilha e outras cidades em 844, os árabes reforçaram suas defesas, isso dificultou muito eles voltarem a invadir a região e lutar para conquistá-la. Mas, embora a conquista da península fora dificultada por esses motivos, os nórdicos ainda continuaram a visitá-la para saquear e chegar ao Mediterrâneo.

De acordo com o relato do historiador árabe Ibn al-Quitiyah, ele conta que os nórdicos chegaram a saquear algumas cidades na costa do atual Marrocos, e visitaram algumas ilhas no Mediterrâneo, tendo passado pela Sicília e em 859, uma expedição liderada por Hasteinn e Björn, chegou a Alexandria no Egito, a fim de fazer comércio. Sabe-se que tal missão realmente aconteceu, e que em 862, a expedição liderada pelos dois chefes, retornou a Normandia. 

No entanto, nesse período que a expedição transcorreu, surgiram histórias de que os nórdicos teriam atacado e saqueado Roma, mas na realidade, teria sido a cidade de Luna, a qual eles teriam achado que era Roma. Porém, não há comprovações por parte dos romanos de que um ataque tenha acontecido a cidade, mas sabe-se que os nórdicos atacaram à Sicília, Córsega, Sardenha e o sul da Itália, dentre as cidades atacadas estiveram Pisa e Nápoles

Entretanto os ataques a Itália, Espanha, Portugal, e a África do Norte, não fora regulares. Depois que a esquadra de Hasteinn e Björn retornou em 862, apenas décadas depois é que novas expedições foram realizadas. Um motivo dado, fora que os árabes e mouros temendo que os nórdicos voltassem a atacar seus domínios, reforçaram suas cidades e fortalezas, e passaram a vigiar o Estreito de Gibraltar. Tal fato se concretizou, já que por longos anos não se encontram relatos de novas expedições vikings a Ibéria e ao Mediterrâneo. Em 966 e 970, são encontrados relatos de novos ataques no que hoje é a costa norte da Espanha e em algumas áreas da costa portuguesa, e posteriormente no século XI, encontram-se relatos de ataques no sul da Itália.

"Algumas moedas árabes encontradas em tesouros da Idade Viking na Noruega foram cunhadas em Espanha e no Norte de África e presumivelmente chegaram à Noruega via Irlanda. Quando em 968 tomaram Limerick aos Nórdicos, os Irlandeses encontraram um espólio em que havia entre outras coisas, selas estrangeiras ricamente ornamentadas e uma variedade enorme de magníficas peças de vestuário de seda, de cores vermelha e verde". (ARBMAN, 1971, p. 96-97).

Europa oriental:

Se os dinamarqueses e noruegueses foram responsáveis pelas expedições, ataques, conquistas na Europa ocidental, no oriente, foram o suecos os responsáveis pela expansão da influência viking, principalmente mediante ao comércio. Acerca das história sobre os suecos no oriente, duas fontes importantes que narram tais fatos, são: As Crônicas Nestorianas e a Saga Varêngia

"As expedições do Suecos para o Oriente foram muito diferentes das dos Noruegueses e Dinamarqueses no Ocidente. Estes navegavam no mar alto, enfrentando reinos organizados, apesar de desunidos. A riqueza dos países estava concentrada, o que constituía um estímulo e facilitava a pilhagem. Para leste os Suecos tiveram que seguir pelo curso dos rios, através de extensas regiões habitadas apenas por tribos finlandesas e eslavas, antes de contactar com os Árabes e o Império Bizantino. A riqueza disponível era os recursos naturais de peles e escravos, que podiam ser comerciados com o Oriente. Mais, tarde, os Suecos recorreram com êxito ao lançamento de impostos sobre a população nativa e no século X houve alguns actos de pirataria do tipo dos do Ocidente". (ARBMAN, 1971, p. 98).

Os nórdicos eram chamados por esses povos de varengos ou varêngios, por sua vez eles se referiam a esses povos como eslavos (slav) e rus (que se tornou russos). Um fato curioso, é que a palavra inglesa para escravo, slave, vem da palavra slav (eslavo), tal fato se deve ao comércio de escravos que os escandinavos empreendiam na Europa oriental, tendo os eslavos e rus, como fonte desse negócio, embora que esses próprios povos também fizessem uso da escravidão de seus semelhantes. 

Os povos da Europa oriental não adotaram o feudalismo, como visto em parte do ocidente, lá eles mantiveram tradições pré-feudais, o que incluía o comércio e a escravidão, a qual era diferente da servidão feudal. De fato, embora houvessem várias vilas na região, os nórdicos se depararam também com muitas cidades mercantis, construídas por esses povos, logo eles aproveitaram tal fato para se inserirem no comércio da região. 

O primeiro local conhecido do estabelecimento dos nórdicos no território dos rus, fora nas terras nos arredores dos lagos Ladoga e Onega. Nesse caso, o lago Ladoga é o maior lago da Europa. A partir desses lagos, eles fundaram mercados, postos comerciais ou se estabeleceram em algumas das vilas e cidades que haviam na região. A vila e posteriormente cidade mercantil de Aldeigjuborg, hoje chamada de Staraja Ladoga, fora fundada no século VIII, sendo um dos vestígios mais antigos da ocupação viking naquela região. Descobertas arqueológicas revelaram antigas muralhas que cercavam a cidade, além de um grande cemitério, e muitas casas, revelando que a cidade deveria ser bem próspera na época.


Os lagos Ladoga e Onega, na Rússia, próximo com a fronteira da Finlândia. No começo do século IX, os vikings já estavam estabelecidos nessa região. 

A partir dessa base entre os lagos, barcos seguiam para o norte, leste e para o sul. Os escandinavos passaram a utilizarem rios como o Svir, Volkov, Sias, Voronega, Neva e o próprio Volga, como suas rotas comerciais, daí serem conhecidos mais como mercadores do que guerreiros nessas terras. 

"Do final do século IX até dentro do X, a região de Ládoga foi sendo gradualmente colonizada por suecos, sempre em boas relações com a população nativa, provavelmente finlandesa, que eles encontraram já ali fixada. Só nestas condições puderam  expandir-se com segurança, como fizeram no século X, provavelmente a partir de Staraja Ládoga, par toda a região a Sudoeste do lago Ládoga". (ARBMAN, 1971, p. 103). 

No século IX, os nórdicos já haviam chegado a cidade de Búlgar, no antigo Estado da Búlgaria do Volga, localizando entre os rios Volga e Kama, embora que hoje o país Bulgária, não ocupa mais esse território, o qual pertence atualmente a Rússia. Da cidade de Búlgar, os guerreiros começaram a seguir para o leste em direção ao Império Khazar (hoje Cazaquistão) na Ásia, e para o sul em direção ao Principado de Kiev, sendo que hoje Kiev é a capital da Ucrânia. De Kiev, eles seguiam para o sul em direção a Constantinopla, capital dos bizantinos. 

Domínios do Principado de Kiev (Kievan Rus) entre os séculos VIII e IX. Durante o governo viking a partir de meados do século X, os domínios foram ampliados para o sul em direção ao Mar Negro, embora que parte da porção ocidental fora perdida.

Nos tempos de cheia do rio Dnieper entre os meses de abril e julho, os escandinavos carregavam seus barcos com mercadorias e partiam de Kiev para Constantinopla, onde iam vender peles, armas, mel, cera, ferro, escravos, etc., em troca, traziam consigo, joias, tecidos, prataria, especiarias, etc. Porém, nem sempre as relações entre os nórdicos de Kiev e os bizantinos foram amigáveis, dois relatos apontam que nos anos de 860 e 941, ataques foram realizados a Constantinopla, mas devido as suas poderosas muralhas e posição estratégica, os nórdicos não tiveram a mínima chance de invadi-la, mas tais incidentes não acabaram com as relações entre os dois povos. Alguns imperadores bizantinos contrataram guerreiros ecandinavos como mercenários e até mesmo chegaram a criar uma guarda pessoal, conhecida como a Guarda Varângia ou Guarda Varegue, a qual durou por vários anos.

Gravura retratando bizantinos e a Guarda Varângia, formada por nórdicos.

"Durante o século X foi certamente Bizâncio que mais influiu na cultura de Kiev, onde os Rus contactavam com um mundo de riqueza e de luxo que parece tê-los impressionado grandemente. Quando o corpo da Guarda Varângia, de Constantinopla, começou a ser recrutado entre os homens das melhores famílias da Escandinávia e da Inglaterra, os laços entre os Rus e Bizâncio foram-se naturalmente fortalecendo. Isto aconteceu nos começos do século XI e, apesar de ocasionalmente ter havido um ou outro contacto hostil entre eles, sem Bizâncio, Kiev não podia sobreviver e era através de Kiev que a cultura bizantina exercia uma influência de desenvolvimento da Rússia, alguns séculos mais tarde". (ARBMAN, 1971, p. 115).

"Para os escandinavos estabelecidos na Rússia, Novogárdia era tão importante como Kiev. Segundo a Crônica de Nestor, foi no ano 862 que Rurik e os primeiros escandinavos se fixaram ali, na região de Volkhov, ao norte do lago Ílmen. Desde os tempos desses varângios que a região de Novogárdia tem sido a terra dos Rus". (ARBMAN, 1971, p. 106).

Novogárdia ou Novgorod, fora uma importante cidade russa dominada pelos nórdicos, e após o fim da Era Viking, a cidade se tornou capital de uma vasta república. Vestígios arqueológicos apontam que no ano de 900, a cidade era relativamente grande, e fazia parte das rotas do comércio de peles e escravos, das quais algumas estradas levavam as cidades de Búlgar, Kiev, Moscovo (atual Moscou), Wladimir, entre outras cidades da região e indo até mesmo mais longe, em direção ao Império Khazar. Do século XII em diante, a cidade cresceria muito se tornando um dos principais mercados da Rússia. Novogárdia era um dos pontos de ligação dos escandinavos estabelecidos nas terras dos Rus, com os búlgaros do Volga. 

Ásia:

No século IX encontram-se relatos de alguns historiadores árabes falando a respeito dos nórdicos, os quais iam comercializar com os búlgaros do Volga, os bizantinos, os khazares e até mesmo faziam comércio pelo Mar Cáspio.

"Ibn Khurdadhbih (meados do século IX) descreve estes mercadores como uma espécie de Saqalibab, europeus que traziam espadas, e peles de castor e de raposa preta, das suas longínquas terras a região do Mar Negro. O imperador grego cobrava dízima sobre as suas mercadorias e, se eles viessem através da região do Don e passassem por Khamlij, a capital dos Khazars, o príncipe destes também cobrava dízima. Ao alcançarem o mar Cáspio, tomavam novamente o barco, apesar de algumas vezes fazerem transportar a sua mercadoria de camelo, de Jurjan até Bagdade, onde eunucos eslavos lhes serviam de intérpretes". (ARBMAN, 1971, p. 103).

Não se sabe ao certo em que ano os nórdicos chegaram a cidade de Bagdá como é mencionado em alguns relatos de historiadores árabes, porém sabe-se que desde o inicio do século IX, já haviam mercadores escandinavos no Mar Negro e nos fins do século, no Mar Cáspio, sendo que esses nórdicos chegavam a região através do rio Volga, sob o domínio dos búlgaros. 

"No final do século IX, ouve-se falar, pela primeira vez também de incursões de pirataria viking no Oriente. De 910 a 912, uma esquadra viking de dezasseis navios atravessou o mar Cáspio e atacou Abaskun, matando muito dos seus habitantes maometanos". (ARBMAN, 1971, p. 104).

O Império Khazar de 618-1048. Entre os séculos IX ao XI os vikings empreenderam comércio com os khazares e realizaram alguns ataques e saquearam cidades.

Outros relatos de 912 e 943, falam a respeito de novos ataques a cidades na costa do Mar Cáspio. No entanto, os nórdicos não conseguiram estabelecer colônias nessa região, devido a força do Império Khazar, e nem na região do Volga, devido aos búlgaros, e ao sul do Mar Negro, devido aos bizantinos. Na essência, eles não chegaram propriamente a tomar terras na Ásia, apenas a visitaram através de expedições mercantis, diplomáticas e de pirataria. 

Islândia e Groenlândia:

Embora não tenha sido descoberta pelos nórdicos, o atual nome Islândia que conhecemos, Iceland em inglês, advém da língua nórdica, que na época significava "Terra Gelada", daí no inglês haver uma alusão direta a esse fato. Segundo o relato de Ari, o Sábio (1067-1148), a Islândia já era habitada antes da chegada dos nórdicos, sendo ocupada por cristãos de origem irlandesa e talvez escocesa. Tal relato é corroborado, pelas descobertas arqueológicas de vestígios de casas, objetos e ferramentas com características irlandesas. Não obstante, alguns historiadores acreditam que os primeiros navegadores que chegaram a ilha tem recebido indicação do caminho a tomar, dado por navegadores irlandeses e/ou escoceses. 

Mapa atual da Islândia com a localização de sua capital e principais cidades.  Os nomes que designam as cidades e locais é de origem escandinava, principalmente norueguesa.

A Islândia conta com 103 mil km2, tendo um clima frio comparável ao da Noruega e Suécia. A ilha embora seja a segunda maior da Europa, grande parte de seu território é impróprio para a agricultura, pecuária e habitação. Não Islândia há muitos vulcões, alguns ainda ativos; gêiseres; fiordes pela costa; apenas cerca de 23% da superfície possui cobertura vegetal; em geral o clima é bastante frio, invernos rigorosos, solo vulcânico, arenoso e pedregoso em algumas áreas.

"A região central da Islândia é um deserto de lava, e a população vivia mais da criação de rebanhos, da pesca e da caça de aves selvagens que do cultivo da terra. Aproveitavam-se muito das pastagens de Verão (o sistema saeter de economia doméstica) e por isso a população estava muito espalhada, pelo que o cavalo, como meio de transporte, desempenhava um papel muito mais importante na Islândia do na Noruega, onde o tráfego costeiro era muito mais fácil. Embora a arborização fosse mito mais densa do que actualmente - limitada a duas ou três pequenas regiões - madeira foi sempre rara na Islândia, e os troncos atirados à praia pelo mar eram sempre cuidadosamente recolhidos, para serem aproveitados. A maior parte das casas era construída de pedra e turfa, deixando por isso mais vestígios do que as construções de madeira". (ARBMAN, 1971, p. 118-119).

Réplica de um antigo posto de pesca em Bolungarvik, Islândia. As casas possuíam grama nos telhados devido ao fato de usarem turfa e/ou terra para revesti-los, ajudando a manter o calor preso no interior. Logo, na primavera e verão a grama crescia também nesses lugares. 

Acerca da história da colonização viking da Islândia três importantes fontes documentais referem-se a essa época: a Landnámabók, a História Eclesiástica, escrita pelo frei Beda e as Sagas Islandesas. A Landnámabok, foca o início da colonização e traz um relato e uma genealogia das primeiras famílias e seus descendentes até o século XIII; a História Eclesiástica também refere-se a questão colonial e genealógica, mas foca a introdução do cristianismo na ilha, o qual se deu no século XI. Quanto as Sagas Islandesas, são as histórias mais conhecidas da época viking, onde consistem num misto de fatos reais e lendas. 

"Segundo a tradição, foram dois os descobridores da Islândia: Gardar, um sueco, que o vento desviou da sua rota, quando se dirigia as Hébridas, e Naddod, um norueguês fixado em Faeroe, no seu regresso à Noruega". (ARBMAN, 1971, p. 116).

A Islândia dista cerca de 970 km da Noruega, no entanto não se sabe ao certo em que ano, Gardar e Naddod chegaram a Islândia, mas sabe-se que a primeira expedição oficial registrada data do começo do século IX, e fora realizada por Floki Vilgerdarson, o qual lhe é atribuído a condição de ter batizado a ilha pelo nome de Islândia. Entretanto, anos depois da visita de Floki, um novo navegador, chamado Ingolf Arnarson dirigiu uma expedição de colonização. Dessa vez, ele levou consigo mulheres, crianças, animais e ferramentas. Sabe-se que em 874, Ingolf fundou uma vila na ilha, dando início a colonização. Acredita-se que os irlandeses que ali viviam foram expulsos, ou fugiram ou acabaram se sujeitando ao seu governo. 

Ao centro, Ingolf Arnarson, o iniciador da colonização da Islândia.

Depois que a colonização se estabeleceu na Islândia, no final do século seguinte, a Islândia era praticamente independente da Noruega, tal fato de que oficialmente ela só passou a compreender o território norueguês por volta do século XV ou XVI, até lá, os islandeses se viam como uma nação independente. Embora a legislação e a política fossem baseadas nas leis e no modelo norueguês, a forma de como essa era aplicada e fora desenvolvida, diferenciava muito da Noruega.

"A Islândia permaneceu pagã até á decisão de Althing, no ano 1000, de aceitar o cristianismo. Era de se esperar, por isso, que existissem trinta e nove templos paroquiais (um para cada godi)". (ARBMAN, 1971, p. 119).

Os godi seriam ao mesmo tempo um tipo de sacerdote e funcionário legal do Estado islandês. Em cada comarca que a ilha se dividia, 39 ao todo, possuía um godi

Não obstante, foi a partir da Islândia que os nórdicos acabaram descobrindo a Groenlândia. De acordo com as Sagas Islandesas, no ano de 900, o navegador Gunnbjörn, teve seu navio desviado do curso e acabou sendo levado para o noroeste, deparando-se com rochedos, que hoje recebem seu nome. Gunnbjörn, não chegou a explorar mais a região e voltou para casa. Desde dia em diante, oitenta anos depois é que se voltaria a ouvir a falar dessas terras. 

Por volta de 984, Erik, o Vermelho, o qual havia nascido na Noruega, tinha sido banido da mesma por ter matado um homem, então ele se mudou para a Islândia e constituiu família. Porém não se sabe ao certo os motivos que levaram ele a assassinar outro homem na Islândia, então o governo decidiu bani-lo da ilha. Erik, indignado, pegou sua tripulação e se aventurou pelo norte, tendo descobrir as terras vistas por Gunnbjörn. Em 985, ele retornou a Islândia, dizendo que havia descoberto novas terras, e as batizara de Groenlândia ("Terra Verde"), em inglês o nome da ilha é Greenland. 


Em verde a Groenlândia, descoberta em 985 por Erik, o Vermelho. A ilha vista a sudeste é a Islândia.

Tal nome se dera pelo fato de que Erik provavelmente avistou os pastos da ilha durante a época da primavera ou do verão, e possivelmente tenha acreditado que houvessem muitos pastos e florestas no restante da ilha, a qual por sinal é a segunda maior do mundo. Embora, tenha descoberto novas terras, isso ainda não desconsiderava o crime que havia cometido e a punição dada pelo governo, no entanto Erik, o Vermelho, negociou a proposta de fundar uma colônia nas terras que havia descoberto, e em 986, ele partiu com vinte e cinco navios, embora que nove afundaram no caminho. Chegando a Groenlândia ele deu início a colonização dessa. A ilha dista da Islândia cerca de 267 km, um pouco mais do que 200 milhas. E alguns dizem que pode ser avistada da Islândia de cima de suas montanhas, usando binóculos. 

Erik, o Vermelho
Os nórdicos se estabeleceram na porção oriental e no sul da ilha, devido ao clima de lá ser mais ameno do que até mesmo visto na própria Islândia, devido a latitude onde se encontravam. No entanto, alguns cientistas acreditam que o clima daquela época era mais quente do que hoje, devido a alguns vestígios da flora encontrado na ilha. Porém, mesmo sendo um pouco mais quente do que na Islândia, o solo não era propício para a agricultura de vários tipos de plantas, logo, eles sobreviviam basicamente da pecuária e da pesca, além do comércio, já que comercializavam peles de urso polar e presas de morsa, os principais produtos dali exportados; em troca iam comprar o que lhes faltava, na Islândia ou até mesmo na Noruega. As casas na Groenlândia eram bem similares as da Islândia, sendo feitas de pedra e turfa. Até as leis eram praticamente as mesmas. 

"Há testemunhos arqueológicos que nos levam a crer que o cultivo de alguns cereais fora tentado, mas a exploração doméstica de animais foi a sua principal fonte econômica, tendo sido encontrados ossos de bois, carneiros, cabras e porcos. Os produtos da caça e da pesca (baleias, focas, peixes, ursos e renas) tinham grande importância para a sua alimentação". (ARBMAN, 1971, p. 121). 

No século XII, já haviam igrejas cristãs na ilha e até mesmo uma arquidiocese. No entanto, no século XV a colônia viking entrou em colapso, em muitos dos seus habitantes a abandonaram, regressando para a Islândia e Noruega. Mas antes que isso viesse a acontecer, eles empreenderam a última etapa de sua longa jornada, a América do Norte.

América do Norte:

Nos anos seguintes, sob o duro frio da região o povo conseguiu se estabelecer e formar algumas pequenas vilas. Porém, Erik ainda estava determinado a encontrar terras verdes naquele lugar branco. E a descoberta dessas terras foram passadas de geração a geração, até serem escritas por volta do século XIII. Sendo assim, em duas obras islandesas, encontramos menções as terras descobertas, em a Saga de Erik, o Vermelho (Eriks Saga rauda) no livro Hauksbók e a Saga Groenlandesa (Groenlendinga Saga) no livro Flateyjarbók

Em ambas as sagas, conta-se que Bjarni Herfjulfsson, viajava da Islândia para o sul da Groenlândia quando acabou se perdendo em uma neblina que o desviou do caminho. Bjarni e sua tripulação passaram mais de uma semana perdidos, embora tenham avistado várias ilhas no caminho. Em 986 ou no ano 1000 (há dúvidas acerca da data exata), Leif Eriksson um dos filhos de Erik, o Vermelho, intrigado com a história das descobertas de Bjarni, lhe comprou o seu navio e partiu para encontrar novamente tais terras. Leif as batizou de Helluland ("Terra Pedregosa") e ao sul dessa a Markland ("Terra da Floresta"). Leif, continuou a seguir a costa de Markland para o sul, até chegar a uma outra terra, que ele batizou de Vinland ("Terra das Vinhas"). Leif retornou ainda no mesmo ano para casa, narrando a confirmação das terras descritas por Bjarni, e sua descoberta de novas terras. Daí, hoje credita-se a Leif Eriksson a descoberta de tais terras na América do Norte.

Localização das terras descobertas pelos nórdicos na América do Norte. Em amarelo a rota realizada por Leif Eriksson até a Vinland.

As três terras descobertas, hoje se encontram no atual Canadá. Helluland, compreende o sul da atual Ilha de Baffin; Markland corresponde a Costa do Labrador e Vinland a ilha de Newfoundland. Leif retornou para casa contando a novidade, isso interessou o seu irmão Thorvald o qual decidiu viajar para essas terras, em especial a Vinland, a qual segundo a descrição era mais fértil, verde e de clima mais agradável do que as outras. Nessa terra, Leif disse que encontrou uvas, daí chamá-la de Vinland ("Terra das vinhas"). 


Estátua de Leif Eriksson em Reiquiavique, capital da Islândia. Credita-se a Leif Eriksson a descoberta do Canadá e da América do Norte.

"Na Vinlândia viveram durante dois anos, até Thorvald ter sido morto, depois do primeiro contacto que tiveram com os Skraelings ou os nativos do país. Ali o sepultaram os seus companheiros, com uma cruz à cabeceira e outra aos pés. A intenção desta expedição era claramente o estabelecimento na Vinlândia, pois nas expedições anteriores não tinham sido encontrados habitantes naquela região". (ARBMAN, 1971, p. 125).

Os vikings ao chegarem a América, chamaram os índios de skraelings ("feios"), devido ao fato de não se enquadrarem ao seu padrão de beleza, diferente do que os espanhóis e portugueses viriam a dizer séculos depois.

Mesmo com a morte de Thorvald, a colônia viking em Vinlad, chamada de Leifsbudir se manteve por mais alguns anos antes de ser totalmente abandonada. Nas sagas, há vários outros relatos sobre outras expedições como a de Thorfinn Karlsefni, o qual visitou Vinland e Markland, vivendo por alguns meses em ambas as terras. Nas sagas, também descreve a paisagem, dizendo que as florestas de lá eram abundantes em caça, que o clima era mais agradável do que na Groenlândia e na Islândia, e a terra poderia ser cultivada. Ao mesmo tempo, nas sagas também diz que Thorfinn e sua gente chegaram a comercializar com os indígenas.

"Uma manhã avistaram nove canoas de pele e os homens que vinham a bordo agitaram os remos. Era, evidentemente, uma visita pacífica e os escandinavos foram ao seu encontro, com escudos brancos em sinal de paz, e os homens, de pequena estatura, com cabelos desgrenhados, grandes olhos e faces largas, vieram à praia. Ali permaneceram por pouco tempo, mostrando-se surpreendidos, e depois afastaram-se, remando nos seus barcos". (ARBMAN, 1971, p. 126).

Esse contato entre europeus e ameríndios, ocorreu por volta do século XI, sendo escrito no século XIII, de qualquer forma, séculos antes de Cristóvão Colombo pisar no Novo Mundo, as Américas. No entanto, as sagas apontam que desavenças levaram a guerras entre os nórdicos e os skaerling. Com isso eles tiveram que abandonar suas colônias em Vinland, porém não significa que eles deixaram de continuar a visitar o continente. As histórias apontam expedições feitas para extrair madeira, conseguir caça e pescado, continuaram a serem feitas pelo menos um século depois de Leif Eriksson ter realizado suas descobertas.

Desde o século XIX com a divulgação das sagas descobertas na Islândia que falavam sobre Vinland e as outras terras, algumas pessoas tentavam comprovar a existência de Vinland e procuravam por vestígios arqueológicos que corroborassem isso. Os americanos se dedicaram a procurar por vestígios que atestassem a presença nórdica em seu país. 

"Quando as narrativas sobre a aventura dos vikings vieram a público, surgiu uma grande quantidade de teorias por parte dos acadêmicos. Nos anos seguintes a 1830, alguns arqueólogos acabaram descobrindo os sítios da Groenlândia, além de algumas placas de madeira com inscrições em rúnicas. Mas nada de provarem a presença viking nas Américas". (LANGER, , p. 29).

Posteriormente, alguns estudiosos americanos dos estados de Boston e Filadélfia tentaram procurar vestígios de que Vinland seria por aquelas terras, a ideia era provar que europeus viveram ali muito tempo antes de Colombo chegar. A ideia começou a ganhar adeptos ao ponto de que ao longo do século XIX e começo do XX chegou-se ao ponto de se falsificar indícios. Foram encontrados lajes rúnicas Kensington, Heavener e Maine. 

Na Nova Escócia encontrarem-se supostas machadinhas de pedra que teriam sido feitas pelos nórdicos, mas descobriu-se que eram machadinhas indígenas. Em 1959 a Universidade de Yale nos Estados Unidos, comprou um misteriosos mapa que ficou conhecido como "O Mapa de Vinland" a qual acreditou-se que datava do século XVI, retratando essa terra, porém testes químicos provaram que o mapa era falso e havia sido feito recentemente. 

O falso Mapa de Vinland

Mesmo sem descobrir vestígios reais e mesmo com as falsificações reveladas, um arqueólogo norueguês chamado Helge Ingstad (1899-2001) decidiu mesmo assim empreender expedições ao Canadá a fim de localizar Vinland. 

"Com a ajuda de mapas do século XVI, leitura atenta das sagas e incursões aéreas pelo litoral do Canadá, Ingstad acabou chegando à ilha de Terra Nova. Por ali, soube por meios dos moradores, da existência de habitações em ruínas, o que despertou ainda mais suas suspeitas. Entre 1961 e 1968, uma equipe sob sua liderança descobriu vários vestígios arqueológicos que definitivamente comprovariam a presença de escandinavos naquela região. Os objetos mais importantes encontrados foram um alfinete de bronze e uma polia de fuso em pedra-sabão, itens conhecidos em sítios islandeses e groenlandeses". (LANGER, 2009, p. 30).

Helge Ingstad foi o responsável na década de 1960 em coordenar expedições a Terra Nova em busca de encontrar vestígios que atestassem a presença viking na região. Tais vestígios foram encontrados, comprovando a presença viking em quase cinco séculos antes da expedição de Cristóvão Colombo (1492). 

Em L'Anse aux Meadows encontraram na década de 1960 vestígios arqueológicos de uma vila viking, comprovando a ocupação do local por esse povo e a veracidade de suas histórias sobre Vinland, embora não se tenha certeza se essa vila é a Liefburd. A vila fica localizada na baía de Epaves próxima ao riacho Black Duck Brook, fonte de água doce para a população que ali habitou. 

No sítio encontrou-se o vestígio de cinco casas, fornos, telheiros, uma forja e uma ferraria. As casas eram feitas de madeira e barro, com telhado de taipa revestido com vegetação, a qual era usada para manter o calor dentro, algo comum visto em alguns lugares da Escandinávia. Estimou-se que as casas poderiam abrigar bastantes pessoas. 

Hoje a vila consiste em Patrimônio Mundial da Humanidade, pela UNESCO. Os vestígios encontrados datam de cerca do ano 1000, período que os nórdicos haviam se estabelecido em Vinland. Embora, alguns historiadores questionem se a Terra Nova seria Vinland ou Markland. Mas de qualquer forma, tal vila ou assentamento como alguns sugerem, comprova a presença viking na América do Norte.

Reconstituição de uma vila viking na antiga Vinlad, hoje ilha de Newfoundland, Canadá. A atual vila é conhecida pelo nome francês de L'Anse aux Meadows. 

No entanto não se sabe ao certo do por quê, a história sobre as terras de Vinland, Markland e Helluland, não terem sido divulgadas entre outros povos. Devido a reclusão dos escandinavos da Groenlândia e da Islândia, tais histórias ficaram guardadas para si, porém mesmo assim, alguém poderia ter divulgado elas. Um motivo para isso não ter acontecido, é que muitos passaram acreditar que se tratasse de ser apenas lendas, outros vinham os islandeses e os escandinavos como bárbaros, e não queriam se aproximar deles. Os próprios ingleses e irlandeses, romperam nos séculos seguintes relações com a Escandinávia. 

Isso tudo e outros fatores contribuíram para o "ocultamento" dessas terras e dessa história. Daí, Cristóvão Colombo ser creditado como o "descobridor" da América, tendo chegado a Ilha de San Salvador nas Bahamas em 12 de outubro de 1492, quase cinco séculos depois dos nórdicos já terem estado no que hoje é o Canadá. Outro fator que contribui a Colombo a descoberta, fora que a partir da suas quatro expedições, a Espanha efetivou o processo de colonizar a América, depois os portugueses vieram a fazer o mesmo com o Brasil. Diferente dos nórdicos, que acabaram desistindo da colonização, os espanhóis e os portugueses vieram para extrair os recursos, conquistar e ocupar. 

Considerações finais:

Por fim, fica evidente que os nórdicos da Era Viking não foram esses bárbaros sanguinários como geralmente são referidos, mas foram uma sociedade bem mais organizada e desenvolvida no que normalmente se pensa.

Aqui podemos perceber que a ideia de "Idade das Trevas" (Dark Age) que os ingleses gostam de usar, não foi tão sombria assim, mas inegavelmente não podemos dizer que ela foi tranquila. Sem sombra de dúvidas foi uma fase de guerras que compreendeu a primeira metade da Idade Média, mas que também se alastrou nos séculos seguintes. 

Por outro lado, as expedições mercantes nos revelam uma outra visão do comércio medieval, o qual por várias décadas historiadores defenderam que o comércio havia praticamente sido extinto na Europa, devido ao feudalismo, guerras, pestes e a insegurança das estradas. Na realidade não foi bem assim. 

Outro aspecto que vai de encontro com algumas coisas que aprendemos nas escolas, era a ideia de reclusão da população, estando essa limitada ao campo. As cidades não deixaram de existir por todo o continente, e embora a população rural sempre foi predominante desde a Antiguidade, o contanto regional e nacional foi mantido através do comércio, da diplomacia e da guerra. Os nórdicos não eram os únicos que perambulavam pelo continente, pois encontramos mercadores italianos, francos, ingleses, germanos e eslavos por outros países. É evidente que o comércio continental voltou a florescer no século XII, mas o comércio viking foi o seu antecessor. 

NOTA: Oficialmente a Idade ou Era Viking, é delimitada entre o final do século VIII a meados do século XI. Muitos historiadores especialmente de origem inglesa, consideram a derrota de Haroldo II da Inglaterra para Guilherme, o Conquistador, como o final do período de colonização e expansão viking. No entanto, outros apontam o século XII como o final desse período, já que os normandos ainda chegaram a ocuparem por pouco tempo a Sicília e o sul da península Itálica.
NOTA 2: Os historiadores ingleses costumam traduzir jarl por earl, que por sua vez passa a significar "conde". O problema dessa ressignificação é que não havia títulos nobiliárquicos entre os nórdicos, e passou-se erroneamente a se considerar os jarl como sendo condes.
NOTA 3: Em homenagem a Leif Eriksson foi criado o Dia de Leif Eriksson, o qual é comemorado em 9 de outubro. Onde celebra-se o "primeiro europeu a chegar a América". 
NOTA 4: Erik, o Vermelho era chamado assim pelo fato de ser ruivo. 
NOTA 5: No jogo Age of Mythology, existe uma fase em mapa aleatório que retrata Vinland. O nome da fase não é Vinland, mas o lugar é uma referência a essa. Tal condição é reforçada pelo fato de haverem personagens chamados de skraelings, nome dado aos povos indígenas que os nórdicos conheceram em Vinland.
NOTA 6: O filme Desbravadores (Pathfinder), retrata a história de um viking criado entre os indígenas norte-americanos, por volta do ano 1000.
NOTA 7: Na Noruega existe um time de futebol chamado Viking Fotballklubb.
NOTA 8: Em referência ao seu caráter expedicionário e desbravador, a Nasa criou o Programa Viking na década de 70, tendo lançado duas naves, a Viking I e a Viking II, para fotografar o planeta Marte. 
NOTA 9: O filme O Guerreiro Silencioso (Valhala Rising) de 2009, o grupo de personagens centrais partem em uma viagem rumo a Jerusalém, a fim de realizarem uma Cruzada, mas acabam se perdendo e chegando a América do Norte. 
NOTA 10: Tive a oportunidade de conhecer o historiador Johnni Langer e ser seu aluno. O mesmo é um dos principais especialistas no Brasil nos estudos escandinavos. 
NOTA 11: O canal History Channel vem exibindo a série Vikings, criada por Michael Hirst em 2013. A série conta a história do semilendário herói, líder e rei Ragnar Lothbrok, o qual teria vivido entre os séculos VIII e IX. Além disso, a série trata das primeiras incursões vikings a Bretanha, ainda no final do século VIII, as quais iniciaram a Era Viking. Todavia, muito da história do seriado é ficcional, pois a Saga de Ragnar, na qual é baseada o protagonista, conta uma história diferente. Além disso, o seriado possui vários equívocos históricos, além de não possuir uma cronologia histórica verossímil. Alguns dos monarcas que aparecem na história, não foram contemporâneos. 
NOTA 12: Existem vários livros, jogos e filmes que abordam a cultura, história e mitologia dos vikings. Mais em geral, não são fiéis aos fatos e características reais, estando impregnados dos estereótipos surgidos nos séculos XIX e XX.

Referências Bibliográficas:
ARBMAN, Holger. Os Vikings. Tradução de Jerônimo Ludovice. São Paulo, Editora Verbo, 1971. (Coleção História Mundi).
AYOUB, Munir Lutfe. Salões de cultos e banquetes: a compreensão dos espaços escandinavos. Revista Crítica Histórica, ano IV, n. 7, 2013, p. 99-113.
BATEV, Collen. O mundo celta. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Capítulo 8).
CARDOSO, Ciro Flamarion. Aspectos da Cosmogonia e da Cosmografia Escandinavas. Revista Brathair, v. 6, n. 2, 2006, p. 32-48. 
CLARKE, Helen. A terra, o clima e os povos. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006.  (Capítulo 1).
CLARKE, Helen. Sociedade, realeza e guerra. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Capítulo 3).
CLARKE, Helen. A vida cotidiana. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Capítulo 4).
CLARKE, Helen. Cidades, comércios e ofícios. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Capítulo 6).
GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Coleção Grandes civlizações do passado). 
LANGER, Johnni; SANTOS, Sérgio Ferreira dos. Fúria Odínica: a criação da imagem oitocentista dos vikings. Varia História, Belo Horizonte, n. 25, jul, 2001, p. 214-230.
LANGER, Johnni. Religião e Magia entre os Vikings: Uma sistematização historiográfica. Revista Brathair, v. 5, n. 2, 2005, p. 55-82.  
LANGER, Johnni. Vikings. In: FUNARI, Pedro Paulo (org.) As Religiões que o Mundo esqueceu. São Paulo, Editora Contexto, 2009. p. 130-143. 
LANGER, Johnni. Vikings na América. Revista desvendando a História, ano 2, n. 10, 2009, p. 28-30.
PRICE, Niel S. The Viking Way: religion and war in late Iron Age Scandinavia. Uppsala, Department of Archeology and Ancient History, 2002.
PRICE, Niel S. A Europa Ocidental. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Capítulo 7).

PRICE, Niel S. O final e a época pós-viking. In: GRAHAM-CAMPBELL, James (org.). Os Vikings. Barcelona, Ediciones Folio, S.A, 2006. (Capítulo 10). 
SOMMA, Isabelle. A fúria viking. Civilizações, São Paulo, Aventuras na História, edição 47, 2007, p. 38-43.  




Links relacionados:
A Era Feudal na Europa
Vida após a morte na mitologia escandinava