Pesquisar neste blog

Comunicado

Comunico a todos que tiverem interesse de compartilhar meus artigos, textos, ensaios, monografias, etc., por favor, coloquem as devidas referências e a fonte de origem do material usado. Caso contrário, você estará cometendo plágio ou uso não autorizado de produção científica, o que consiste em crime de acordo com a Lei 9.610/98.

Desde já deixo esse alerta, pois embora o meu blog seja de acesso livre e gratuito, o material aqui postado pode ser compartilhado, copiado, impresso, etc., mas desde que seja devidamente dentro da lei.

Atenciosamente
Leandro Vilar

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Ponce de León e a Fonte da Juventude

Lendas sobre águas milagrosas que supostamente concederiam juventude e até mesmo a imortalidade, existem desde os tempos antigos entre diferentes culturas do mundo. No século XVI essa lenda voltou a ficar em evidência na Europa ocidental, durante a exploração das Américas. Ainda no final do medievo os europeus, neste caso, os portugueses os quais foram responsáveis por iniciar a Era dos Descobrimentos, já tinham em mente histórias de vários locais fantásticos: procurava-se as Ilhas Afortunadas e as Ilhas das Hespérides na costa africana ocidental, locais mencionados pelos antigos gregos, os quais seriam descritos como "paraísos terrestres". 

Posteriormente procurou-se na Etiópia, China, Mongólia entre outros lugares, o Reino de Prestes João, um lendário rei cristão que viveria entre terras habitadas por muçulmanos e pagãos. Tais navegantes também procuravam a localização do País da Coconha, lenda medieval que falava numa terra de abundâncias, onde as pessoas não precisariam trabalhar, e nunca faltaria comida e diversão, além do fato das pessoas permanecerem sempre jovens. 

Além de tais locais fantásticos haviam outros, como as Ilhas de São Brandão, a Ilha das Sete Cidades, a Ilha de Avalon, a Ilha de Hy Brazil e até mesmo a mítica ilha ou continente de Atlântida, mencionado por Platão. Assim, quando os europeus passam a explorar as Américas no começo do século XVI novos locais fantásticos começam a adentrar o imaginário geográfico da mentalidade europeia daquele tempo. Alguns vão dizer que essa místicas ilhas ficariam nas Antilhas, nas Bahamas, no Caribe e outros locais das Américas. Posteriormente surge as lendas sobre as cidades feitas de ouro como Eldorado e Cibola. E em meio a toda essa fantasia sobre o desconhecido, a Fonte da Juventude voltava à tona, mas curiosamente ela não teve o mesmo impacto que as lendas sobre Eldorado e Cibola proporcionaram sobre os europeus.

Juan Ponce de León: 

A lenda da Fonte da Juventude das Américas está associada ao nobre, militar, navegador e governador Juan Ponce de León (1474?-1521). Nascido ainda em data incerta no vilarejo de Santervás de Campos na província de Valladolid, vinha de uma família nobre, cuja linhagem remontava pelo menos até o século XIII. Juan Ponce devido ao seu nascimento acabou recebendo uma educação compatível com meninos da sua classe e posteriormente foi enviado a corte, para servir como pajem, tradição essa bastante antiga, além de ser uma forma de aproximar os meninos da realeza e de outros nobres importantes. 

Retrato de Juan Ponce de León, primeiro Governador de Porto Rico (1509-1512), descobridor da Flórida, e supostamente descobridor da Fonte da Juventude. 
Já estando mais velho ingressou no exército, provavelmente tendo lutado no exército de seu tio Rodrigo Ponce de León (1443-1492), na época, Marquês de Cádiz, sendo responsável por promover as campanhas contra o último reduto mouro na Espanha, localizado na cidade de Granada. Após a expulsão dos mouros se desconhece o destino levado por Ponce de León. Alguns relatos antigos sugeriram que ele teria participado da segunda expedição de Cristóvão Colombo, realizada em 1493, tendo permanecido algum tempo em Hispaniola (atual ilha de São Domingos). Mas há controvérsias se ele teria participado dessa expedição.

De qualquer forma, no ano de 1504, o nome de Ponce de León surge em documentos oficiais relacionados a ilha de Hispaniola. Naquele ano de 1504, o então governador Nicolás de Ovando (1460-1511) estava tendo problemas com algumas tribos indígenas; em 1503 o governador autorizou o Massacre de Jaragua, pondo fim a rebelião dos índios Taínos, no entanto, em 1504 uma nova revolta eclodia em Higuey, na parte leste da ilha. O governador Ovando nomeou Ponce de León para por um fim naquela revolta (HERRERA Y TORDESILLAS, 1726, p. 158).

Localização da ilha de São Domingos, antiga Hispaniola. Atualmente a ilha é dividida em dois países: Haiti e República Dominicana. 
Ponce de León passou os dois anos seguintes morando em São Domingos e a serviço do governador Nicolás de Ovando. Devido ao seu bom  trabalho em ter posto fim a revolta dos indígenas em Higuey, ganhou prestígio por parte do governador e depois do rei, o qual foi comunicado a respeito. Ponce de León recebeu o título de Tenente, Comendador Maior e inclusive foi autorizado a fundar uma vila em Higuey, chamada de Salvaleón (1506), passando a ser o capitão responsável. 

Posteriormente, no ano de 1508, Ponce de León tomou notícia sobre a existência de minas de ouro numa ilha chamada de Boriquen, a qual havia sido nomeada pelos espanhóis de ilha de San Huan de Puerto Rico. Devido a proximidade entre as duas ilhas, os nativos de Hispaniola viajavam para Boriquen e vice-versa, possuindo acordos comerciais a base de escambo, e sendo Ponce de León capitão da Vila de Salvaleón, a então capital da região daquela parte da ilha de Hispaniola foi avisado sobre a existência dessas supostas minas auríferas.

"Dio parte Juan Ponce de León à Nicolás de Ovando, de las nuevas que havia sabido, i le pidiò licencia para pasar à la isla, à inquirir la verdad e tomar trato con os índios, i ver que disposición havia para poblarla, porque hasta entonces, ninguna cosa se sabia de lo que havia dentro de ella, mas de que por defuera hechaban de ver, que era hermosisima, i que parecian mucha gente cada vez que alli pasaban navios". (HERRERA Y TORDESILLAS, 1726, p. 181).

Como o governo espanhol sempre estava a busca de metais preciosos, o governador Ovando autorizou que Ponce de León fosse explorar a ilha de San Juan, a qual embora tivesse sido nomeada pelos espanhóis, ainda não havia sido explorada. Ainda no ano de 1508, Ponce de León viajou para San Juan acompanhado de uma pequena comitiva, indo conversar com o chefe Agueynaba, o qual segundo os relatos recebeu os espanhóis de forma muito gentil. 

Localização de Porto Rico. Anteriormente San Juan de Puerto Rico. 
Ponce de León passou o restante do ano explorando a ilha, além de ter fundado uma feitoria numa baía, a qual ele chamou de San Juan Baptista, devido ser o dia 12 de julho. Ao retornar para Hispaniola em 1509, ele levava consigo presentes oferecidos pelos chefes indígenas, como também uma pequena quantia de ouro, que haviam descoberto. Nicólas de Ovando comunicou o rei Fernando II de Espanha sobre a descoberta de ouro em San Juan de Puerto Rico, então meses depois chegou em agosto daquele ano a autorização do rei, nomeando Juan Ponce de León governador da ilha de San Juan de Puerto Rico, além de instruir que para lá ele se mudasse e desse início a exploração do ouro. 

Mas antes que Ponce de León pudesse se mudar, ele enfrentou alguns problemas. Ainda naquele ano, o mandato de Nicolás de Ovando havia terminado, e em seu lugar assumia o almirante, vice-rei das Índias e governador Diogo Colombo (1480?-1526), filho mais velho de Cristóvão Colombo. Diogo herdara os títulos e direitos de seu pai, logo passava a exercê-los. Em agosto chegou a autorização do rei nomeando Ponce de León como governador de Porto Rico, mas Diogo Colombo foi contra tal ordenança, e nomeou dois homens de sua confiança, Juan Ceron e Miguel Diaz

Retrato do almirante, governador e vice-rei da Índia, Diogo Colombo, filho mais velho de Cristóvão Colombo. 
Os dois se mudaram para a ilha e passaram a governar até março de 1510, quando uma nova carta do rei Fernando II determinava que Ponce de León era quem havia sido nomeado para o cargo de governador e deveria tomar posse imediatamente, assim como, determinava que Ceron e Diaz fossem presos e enviados para Espanha. O vice-rei Diogo Colombo que nunca teve uma relação amigável com o rei, acabou acatando a medida para evitar problemas maiores. Assim Ponce de León assumiu o cargo e permaneceu neste até 1512. 

Histórias sobre a fonte da juventude:

Finalmente neste ponto do texto daremos início ao principal assunto em questão, a lenda da Fonte da Juventude. Após deixar o cargo de governador de Porto Rico, o rei Fernando II incumbiu que Ponce de León reuni-se uma tripulação e partisse para explorar o restante do Mar do Caribe. Ele reuniu uma tripulação a ser dividida em três navios, e estando abastecidos, zarparam do porto de San Germàn, na ilha de San Juan de Puerto Rico numa quinta-feira, 3 de março de 1512. A missão era seguir para o norte a fim de explorar aquelas águas e mapear as ilhas ali existentes. (HERRERA Y TORDESILLAS, 1726, p. 246). 

Nesta viagem ele descobriu o pequeno arquipélago das Ilhas Bimini, hoje parte das Bahamas. De acordo Pons Fábregues (1912, p. 109), as ilhas Bimini já eram conhecidas pelos espanhóis, embora não haviam sido visitadas ainda, pois conhecia-se sua existência a partir do relato de alguns indígenas que habitavam o que hoje é Cuba. Sendo assim, Ponce de León teria viajado já tendo em mente que haveria terras situadas ao norte-nordeste da ilha de Cuba. A descoberta das Bimini não teria sido sorte. 


Localização das Ilhas Bimini. 
Tal descoberta ocorreu no ano de 1512 e na ocasião, ao tomar contato com os nativos do arquipélago de Bimini, Ponce de León teria tomado conhecimento sobre uma milagrosa fonte natural que supostamente recobraria a juventude. De acordo com Gonzalo de Oviedo y Valds (1851, p. 482), o capitão Ponce de León teria dedicado pelo menos seis meses investigando aquele arquipélago atrás da suposta Fonte da Juventude. 

Como as histórias dos indígenas não forneciam um local exato, a expedição de Ponce de León começou a ampliar sua área de cobertura, e no ano de 1513 (alguns autores falam que foi em 1512) ele acabou descobrindo mais terras, dessa vez se tratava de uma "grande ilha" como supostamente imaginou de início. Devido a sua flora abundante, Ponce de León nomeou aquelas terras com o nome de Flórida. Outra versão sugere que o nome venha da expressão "Pascua Florida", pois quando os espanhóis chegaram a península, era o dia 2 de abril, e naquele ano, época da Semana Santa (HERRERA Y TORDESILLAS, 1726, p. 247). Posteriormente descobriu-se vários anos depois, que se tratava de uma península e não de uma ilha. 

Com a descoberta da Flórida, Ponce de León decidiu explorar aquelas novas terras, as quais ele revindicou como passando a pertencer ao rei de Espanha. O relato sobre essa exploração, praticamente é desconhecido, pouco se sabendo a respeito. Após a sua chegada, Ponce de León passou o restante do mês de abril e o começo de maio explorando a costa da Flórida, o que incluiu ter visitado vários locais que hoje se desconhece com exatidão, embora se saiba que ele chegou a contornar o Cabo da Flórida, o qual na época chamou de Cabo das Correntes devido as fortes correntes marítimas. As ilhas que ficam situadas diante do cabo foram nomeadas por Ponce de León com o nome de Mártires (HERRERA Y TORDESILLAS, 1726, p. 247)

Além disso, sabe-se que ele e seus homens acabaram tendo contato com alguns indígenas, e as relações não foram amistosas, embora há quem diga que Ponce de León chegou a perguntar acerca da Fonte da Juventude, e alguns teriam o guiado selva adentro atrás da tal fonte. Alguns historiadores questionam se Ponce de León chegou a Flórida porque estava a procura da Fonte da Juventude, ou simplesmente porque buscava novas terras como ditava a missão que lhe foi incumbida pelo rei. 


Gravura alemã do século XIX, retratando Ponce de León e seus homens a procura da Fonte da Juventude na Flórida. 
Após sua descoberta, Ponce de León retornou a Porto Rico em junho de 1513. Ele teria incumbido o capitão Juan Perez de Ortubia e o piloto Antonio de Alaminos a retornar a Bimini e a Flórida para dá continuidade a exploração daquelas terras. Enquanto isso o próprio Ponce de León viajou a Espanha a fim de notificar pessoalmente o rei acerca da sua descoberta. O rei Fernando II ficou bastante contente com o sucesso da expedição de Ponce de León, o qual reivindicou ao monarca o direito de explorar e colonizar aquelas terras, todavia tal direito demorou vários anos para sair. 

O último retorno a Flórida:

Ponce de León permaneceu os anos de 1513, 1514 e parte de 1515 na corte espanhola. Embora tivesse interesse em retornar a Flórida, tal objetivo acabou sendo adiado, pois o rei Fernando II solicitou que Ponce de León voltasse a governar Porto Rico, cuja colônia estava passando dificuldades administrativas, Ponce acabou aceitando a oferta do rei e retornou para Porto Rico, assumindo o cargo de governador por um segundo mandato, indo de 1515 a 1519. 

Concluído seu mandato Ponce decidiu solicitar do rei o direito de ir explorar a Flórida, no entanto, Fernando II havia falecido em 1516, sua filha a Joana sucedeu-lhe o trono, enquanto agia como co-regente de seu filho Carlos I. Tanto a rainha quanto o jovem príncipe herdeiro não tinham interesse na exploração da "ilha da Flórida", além disso, Hernán Cortés havia dado início a campanha que resultaria na conquista dos Astecas. Os monarcas espanhóis tinham mais interesse nas grandes riquezas do Império Asteca no que numa "ilha" cheia de florestas e pântanos, e que não se sabia se haveria minas de metais preciosos ou de joias raras. 

Sendo assim, Ponce de León decidiu realizar sua última expedição a Flórida por conta própria. Ele passou o ano de 1520 reunindo recursos, então contratou 200 homens, comprou alguns cavalos, vacas, ovelhas e porcos, reuniu tudo em três navios e zarpou ainda ano de 1520 para montar assentamento na Flórida, o qual seria o núcleo inicial de colonização daquelas terras (PONS FÁBREGUES, 1912, p. 83). 

Todavia a colonização que Ponce de León tentou promover acabou não dando certo. As tribos indígenas locais eram bastante hostis aos europeus e começaram a atacar com regularidade o assentamento erguido por Ponce de León. Depois de vários dias sendo atacado e vendo que a situação não era favorável para se erguer um assentamento ali, o capitão ordenou que todos e tudo fosse embarcado e partissem. Ponce de León deixava para trás seu sonho de colonizar a Flórida, e saia sem riqueza e com alguns ferimentos. Ele acabou viajando para Cuba, onde veio a morrer em julho de 1521. 

A lenda da Fonte da Juventude para a posteridade:

Embora Ponce de León tenha sido o primeiro governador de Porto Rico, e o responsável por declarar a posse espanhola sobre as Ilhas Bimini e a Flórida, no entanto ele passou os anos seguintes sendo associado a lenda da Fonte da Juventude. Todavia, o historiador americano Douglas T. Peck o qual estudou a associação dessa lenda com o capitão espanhol, chegou a conclusão após ler as cartas redigidas pelo próprio Juan Ponce de León, que em momento algum ele cita a existência de uma Fonte da Juventude fosse localizada em Bimini ou na Flórida. 

Para Peck, essa associação se deu mais por historiadores espanhóis tendo começado no ano de 1535. A primeira menção conhecida sobre uma Fonte da Juventude foi redigida no livro Decades de Orbe Nova (1516) de autoria do italiano Peter Martyr d'Anghiera (1457-1526). Nota-se que a obra foi publicada logo após a descoberta da Flórida por Ponce de León, mas embora Peter Marytr mencione a fonte ele não diz que Ponce de León a tivesse descoberto. De acordo com Peck (2008, p. 6), Peter Martyr teria conhecido Ponce de León e inclusive conversado com este, pois ele menciona suas descobertas em seu livro. Sendo assim, por que ele não mencionou a suposta fonte que León procurava?


Peter Martyr d'Anghiera foi o primeiro a mencionar a existência de uma Fonte da Juventude nas Américas. Todavia, ele não diz que Ponce de León a descobriu e nem associa o nome dele a tal história. Além disso eles foram contemporâneos e talvez tenham se conhecido na corte espanhola. 
A resposta para isso de acordo com Douglas Peck é que essa associação só veio a ocorrer vários anos depois, inclusive Peter Martyr sugeriu que o primeiro a tomar conhecimento sobre essa fonte foi Juan de Solis (1470-1516) o qual empreendeu viagens de reconhecimento de Honduras a Argentina, inclusive lhe é creditado a descoberta do Rio da Prata. Para Peter Martyr, Solis teria desembarcado próximo a uma ilha chamada Boinca (também conhecida como Boyunca e Ananeo) onde supostamente ficaria a Fonte da Juventude que ele faz menção. 

Neste ponto, Peck (2008, p. 6) chama atenção para a confusão gerada posteriormente. Sabe-se que Juan de Solis visitou o que hoje é a costa da Nicarágua, logo, de acordo com Peter Marytr a tal ilha de Boinca ficava próximo das terras visitadas por Solis, sendo assim, ela ficaria próxima da Nicarágua, bem distante das Bahamas e da Flórida. Para Peck a ideia de que Boinca pudesse ser Bimini foi uma invenção ou um equívoco cometido por Gonzalo Fernandes de Oviedo, autor da obra Historia general y natural de las Indias (1535), em cujo livro se encontra a primeira menção de que Ponce de León teria partido em busca da Fonte da Juventude, navegando pelas águas em torno das Ilhas Bimini e até posteriormente chegar a Flórida. 


Detalhe da gravura Fountain of Youth. Sebald Beham, 1535. 
A obra de Oviedo foi publicada 22 anos após a descoberta da Flórida realizada por Ponce de León, e nestas duas décadas não se encontrou nada associando seu descobridor com a história da fonte. Além disso Peck (2008, p. 7) defende que tal associação foi uma escolha de Oviedo, embora não se saiba exatamente por quais motivos ele tenha feito isso, mas uma das pistas está associada curiosamente com a suposta impotência sexual de Ponce de León. 

Em seu livro Oviedo diz que a Fonte da Juventude além de recobrar a juventude, também curava impotência sexual, e de acordo com seu relato, Ponce de León procurava os dois, porém isso não tem fundamento. Ponce foi casado com Leonor, com quem teve quatro filhos, além de ter uma amante chamada Juana Jimenez que viajou com ele em algumas ocasiões. Ora, um homem com quatro filhos e que mantinha uma amante por perto, teria problemas de impotência? E mesmo que tivesse, isso justificaria uma viagem ao desconhecido? 

Por outro lado, antes de Ponce de León ter feito sua última viagem a Flórida, outros navegadores haviam se dirigido para lá: Hernández de Córdoba (1517), Juan de Grijalva (1518), Alonso Álvarez de Pineda (1520), foram alguns que voltaram a navegar pela costa da Flórida e até percorrer suas terras a fim de melhor explorar a região, no intuito de saber se tratava de uma ilha ou seria parte do continente, e inclusive procurar por vestígios de ouro, prata e joias. Todavia não há menções que tais homens haviam ido a Flórida em busca da Fonte da Juventude. 

Sendo assim, a conclusão que se chega é que Ponce de León provavelmente possa ter ouvido falar da lenda da Fonte da Juventude, no entanto, dizer que ele se empenhou em descobri-la ou a teria achado são afirmações sem fundamento, e o que indica que foram invenções relatadas por Oviedo vários anos depois. Mas embora tal história tenha sido inventada acabou influenciado outros historiadores e até mesmo escritores e pintores. Neste caso a influência foi diversa: uns acreditavam que Ponce de León havia descoberto a fonte ou teria tentado encontrá-la; outros falam que a fonte existiria, mas não mencionam Ponce de León. 


The Fountain of Youth. Lucas Cranach, o Velho, 1546. 
Por exemplo, Francisco López de Gomora, em seu livro Historia general de las Indias (1551) menciona a fonte, mas diz que ela ficava numa ilha chamada Guanahani, a qual seria habitada por amazonas. Além disso, ele fala que foi Cristóvão Colombo a tomar ciência dessa fonte e não Ponce de León (PECK, 2008, p. 9). 

Posteriormente Hernando de Escalante Fontaneda em suas Memórias (1575), volta a mencionar a suposta existência dessa fonte e chega a associar sua descoberta a pessoa de Ponce de León. 

"Don Hernando d’Escalante de Fontaneda was the next historian to write about the Ponce de Leon-fountain of youth legend. Fontaneda was shipwrecked on the Florida Keys about 1549. Probably because of his youth (13 years) the Indians did not murder him as they did most shipwrecked sailors and he lived among them for 17 years until he was finally rescued on the west coast of Florida by Pedro Menendez de Aviles in 1566. At a later date (circa 1575) he wrote the memoirs of his life among the Indians which contained the account of Ponce de Leon’s search for the fountain of youth". (PECK, 2008, p. 9).

A menção ao "Rio Jordão" é uma referência clara ao relato de Oviedo, o qual de acordo com Peck surge como uma piada. Pois de tanto Oviedo e Fontaneda por mais que aludem a lenda da fonte e a associem a Ponce de León, fizeram isso com tom de ironia. Fontaneda chega a dizer que Ponce esteve procurando "tolamente" pelo "Rio Jordão da Flórida". 


Fountain of Youth. Erhard Schön, 1535. 
Alguns anos depois, Garcilaso de la Vega em seu livro Florida of the Inca (c. 1580) diz que as histórias sobre Ponce de León procurando uma fonte que faria rejuvenescer eram sem fundamento, e não possuiriam nenhuma base histórica. (PECK, 2008, p. 10). 

O historiador Antonio de Herrera y Tordesillas em seu livro Historia general de los hechos de los castellanos (1621), mesmo tendo se passado um século após a morte de Ponce de León ainda fazia menção a essa lenda da fonte por ele descoberta, inclusive Herrera y Tordesilla chegou a dizer que embora os índios de Cuba e Hispaniola contassem histórias sobre essa fonte ou rio, o qual chamavam de "Jordão", e que inclusive membros das suas tribos teriam migrado a Flórida atrás de tais águas milagrosas, Herrera y Tordesillas entendeu aquilo apenas como uma lenda, além do fato de dizer que Ponce de León teria prosseguido com sua exploração não por causa da fonte. 

Considerações finais: 

A lenda sobre a Fonte da Juventude das Américas surge no século XVI, sendo o relato mais antigo datado de 1516 e citado pelo cronista italiano que vivia na Espanha, Peter Martyr. Na ocasião ele diz que a fonte ficaria numa ilha chamada Bouinga. Outros autores fariam menção a outras ilhas, no entanto, conservou-se a ideia de que seria uma ilha situada na América Central, na região caribenha ou nas Bahamas. 

Além disso, alguns relatos ora falam de uma fonte, mas outros dizem que se trataria de um rio, o qual foi chamado de "rio Jordão", pois supostamente ser batizado com aquele nome em homenagem ao rio Jordão de Israel e Jordânia, pois sua "suposta" descoberta teria ocorrido em 24 de junho, dia de São João Batista. 

Não obstante, as representações artísticas, das quais algumas foram mostradas neste texto nos revelam um visual fantasioso e totalmente anacrônico sobre a fonte, mostrando indígenas em meio a construções que lembram o estilo greco-romano, ou mostrando europeus numa fonte que lembra uma piscina num cenário que não lembra a geografia americana. Tal motivo acabou por se tornar recorrente nas representações artísticas até o século XIX, por outro lado no século XX surgem novas interpretações e representações sobre a fonte.

A ideia de que a fonte ficasse na Flórida é uma atribuição bem posterior datando de 1535, quando Gonzalo Oviedo publicou seu livro onde associava a fonte de Bimini estando situada na Flórida, pois acreditava-se inicialmente que a Flórida fosse uma ilha, logo, fizesse parte do arquipélago de Bimini. Por sua vez, o relato de Oviedo é o primeiro no qual se encontra o nome de Juan Ponce de León associado a lenda da fonte, alegando-se embora que de forma irônica, que o navegador esteve em busca desta fonte. 

Por outro lado, houve alguns cronistas que relataram que as Ilhas Bimini descobertas por Ponce de León, não seriam o "país Bimini" mencionado por índios da ilha de Cuba, mas seriam outras ilhas ainda desconhecidas no século XVI. Entretanto, independente da condição se a fonte estava localizada numa ilha ou na Flórida, nota-se que tal lenda não motivou uma "corrida" a sua procura como aconteceu com Eldorado e Cibola, cidades lendárias que foram intensamente procuradas pelos espanhóis e portugueses ao longo do século XVI. 

Além disso, as histórias sobre Eldorado e Cibola são posteriores a da fonte e conquistaram maior credibilidade, ou seja, as pessoas daquele tempo mesmo envoltas em superstição, achavam mais crível a existência de cidades feitas de ouro ou ricas em ouro, do que uma fonte que fazia rejuvenescer. 


Entrada do Parque Arqueológico Fonte da Juventude, situado em St. Augustine, Flórida, Estados Unidos. Baseado na lenda associada a Ponce de León e sua procura pela fonte, este parque foi criado no local onde talvez Ponce de León aportou a primeira vez na Flórida em 2 de abril de 1513. 
NOTA: O filme Piratas do Caribe: Navegando em Águas Misteriosas (Pirates of the Caribbean: On Stranger Tides) de 2011, alude a lenda da Fonte da Juventude, e menciona que Ponce de León havia há muito tempo ido em busca dela. Dessa vez o capitão Jack Sparrow coagido pelo infame Barba Negra realizam a missão de encontrar essa fonte. 
NOTA 2: No jogo Age of Empires III (2005) no Modo Campanha, no Ato I, conta a história do escocês Morgan Black, o qual viaja a América em busca da Fonte da Juventude. 
NOTA 3: Em vários outros filmes, livros, quadrinhos, jogos, etc., há referências a Fonte da Juventude e sua associação ou não com Ponce de León. 

Referências Bibliográficas:
HERRERA Y TORDESILLAS, Antonio de. Historia general de los hechos de los castellanos en las islas y tierra-firme del mar oceano. 2a ed. Editado por Andrés Gonzalez de Barcia Carbadillo y Zuñiga. Madrid, Imprensa Real de Nicolas Rodiquez Franco, 1726. 
OVIEDO Y VALDÉS, Gonzalo Fernandes de. História general y natural de las Indias, islas y tierra-firme del mar oceano. 2a ed. Madrid, Imprensa da Real Academia de História, 1871.
PECK, Douglas T. "Misconceptions and Myths related to the Fountain of Youth and Juan Ponce de Leon's 1513 exploration voyage". New Word Explorer, Inc., Retrieved, 2008. 
PONS FÁBREGUES, M. Los conquistadores da América: Vasco Nuñez de Balboa, Hernán Cortés, Francisco Pizarro, Cristóbal de Olid, Fernando de Magallanes, Juan Ponce de León, Sebastián Calbot, etc. Barcelona, Imprensa de Henrique y Cia, 1912. p. 81-83. 

Links relacionados: 
O mito de Eldorado
Por uma geografia mitológica: a lenda medieval do Preste João, sua permanência, transferência e “morte”
Hernán Cortés e a conquista dos Astecas (1519-1521)

Nenhum comentário: