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Leandro Vilar

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

São Leandro de Sevilha

Hoje, dia 27 de fevereiro é a data litúrgica ortodoxa de São Leandro, um santo pouco conhecido, apesar de fazer parte de uma família ilustre, na qual contou com quatro santos. No caso, Leandro era irmão de São Fulgêncio (?-630), Santa Florentina (?-612) e São Isidoro (c. 560-636), sendo que o último é o mais famoso dos quatro devido a ser um doutor da igreja, tendo escrito várias obras importantes. Todavia, a proposta desse breve texto é contar um pouco da história desse santo que foi bispo de Sevilha, além de ter ajudado na "reconversão" dos Visigodos ao credo católico, já que na época eles eram seguidores do arianismo

Origem: 

Pouco se sabe sobre a origem de Leandro e de seus irmãos. Embora ele seja chamado de Sevilha, no entanto, isso se refere ao fato de ele ter sido bispo naquela cidade. No caso, Leandro nasceu em Cartagena, cidade no sudoeste da atual Espanha, na província da Múrcia. No passado Cartagena foi fundada pelos cartagineses e depois ocupada pelos romanos, condição essa que se diz que a família de Leandro era de origem romana. Seu pai era Severino e a mãe chamava-se Teodora, sendo de origem visigótica. Se desconhece o sobrenome dos mesmos, mas aponta-se que Severino advinha de uma família hispano-românica rica e Teodora teria ligação com a nobreza local. (SUAU, 1910)

Leandro foi o primeiro filho do casal, tendo nascido em 534, em data incerta. Ainda criança, a família mudou-se para a "nova" Cartago, já que a antiga foi destruída pelos romanos, séculos antes. Ali seu pai assumiu um cargo político por vários anos. Por volta de 554 a família mudou-se para Sevilha, embora não se saiba exatamente por quais motivos ocorreu. Suspeita-se que eles tenham fugido da invasão bizantina ocorrido à cidade. Os hagiógrafos não sabem informar se nesse tempo que a família mudou-se para Sevilha, todos os quatro filhos já haviam nascido, até porque se desconhecem as datas de nascimento de Fulgêncio e Florentina, e Isidoro supostamente nasceu por volta de 560, o que o colocaria como tendo nascido em Sevilha. (SUAU, 1910). 

A vida em Sevilha:

Desconhece-se por quais motivos Leandro decidiu ingressar na vida religiosa, se teria sido uma escolha própria, uma vocação ou por influência de seus pais. Seja qual tenha sido o motivo, seus irmãos seguiram pelo mesmo caminho. No caso de Leandro, em data incerta, ele ingressou na Ordem dos Beneditinos. Nesse ponto se desconhece como foi sua trajetória até se tornar bispo. Porém, existem indicativos que Leandro tenha se tornado padre e professor nos seminários sevilhanos, e talvez tenha sido até mesmo professor de seus irmãos Fulgêncio e Isidoro, já que Florentina entrou para um convento na época. 

No ano de 579, com seus 45 anos, Leandro foi eleito ao Bispado de Sevilha, cargo muito importante na época. Data desse período o início da sua atividade em converter nobres visigodos ao catolicismo. E no caso, neste mesmo ano Leandro com a ajuda da princesa Ingunda, converteu o marido dela, Hermenegildo (c. 564-585). A conversão de Hermenegildo foi problemática na época, não pela dificuldade em si, até porque o príncipe já era cristão, mas pelo fato de que quando ele decidiu tornar-se católico, isso enfureceu seu pai, o rei Leovigildo (?-586), que era ariano. O rei indignado com a conversão do filho e acreditando que isso tratava-se de um complô político para os católicos se apossarem de seu governo, entrou em guerra contra o próprio filho. O conflito se alastrou por anos e acabou gerando problemas para Leandro, o qual foi ameaçado pelo rei Leovigildo, mas o monarca visigodo para não matar o bispo, enviou para exílio em Bizâncio(VOLTÁ, 1977, p. 41). 

São Leandro com o traje bispal, imaginado segundo uma pintura do século XVII. 
Essa parte da história de Leandro também é pouco compreendida, pois não se sabe exatamente quando ele foi enviado para exílio e por quanto tempo permaneceu exilado. Os autores apontam que ele teria voltado em 582, ou 584 ou 586, e durante o exílio ele teria conhecido o papa Gregório Magno. Todavia, Hermengildo tentou ir também para Bizâncio, mas não tendo conseguido, enviou sua esposa e filho, mas Ingunda acabou falecendo na viagem. Hermenegildo que mantinha controle de Sevilha desde 581 pelo menos, teve que abandonar a cidade em 583. O príncipe foi encurralado em Córdoba no ano seguinte, sendo preso e executado em 585(VOLTÁ, 1977, p. 42). 

O protetor do bispo Leandro estava morto, e naquele momento provavelmente ele deve ter temido por sua vida novamente, pois era bem capaz que o rei iria atrás dele novamente. No entanto, no ano de 586, Leovigildo faleceu de causas desconhecidas. Sendo sucedido por seu filho Recaredo (550-601). Assim como seu irmão Hermenegildo, Recaredo apresentou interesse pelo credo católico, e através das conversas com o bispo Leandro aceitou converte-se novamente, algo que ocorreu em data incerta no ano de 587. A partir desse ponto, Leandro com o apoio do novo rei, deu início a campanha evangelista para reconverter os visigodos e suevos ao credo católico. (VOLTÁ, 1977, p. 45). 

Pintura do século XIX imaginando a aparência do rei Recaredo I dos visigodos e suevos. 
O III Concílio de Toledo (589)

No século VI a pequena cidade de Toledo, hoje próxima a Madrid, acerca de 1h de trem, era naquela época capital do reino desde Leovigildo, e no caso, seu filho Recaredo manteve Toledo como capital. Na ocasião de 8 de maio de 589, o rei com o apoio do bispo Leandro de Sevilha realizaram um concílio regional cujo tema era tratar da conversão oficial do Reino Visigodo ao catolicismo, já que até então ele era adepto do arianismo, considerado uma doutrina herética. 

O concílio daquele ano convocado pelo rei e o bispo foi inclusive incentivado e apoiado pelo papa Gregório Magno (540-601), um dos mais famosos papas do período. O concílio foi presidido pelo próprio Leandro, contando com a presença do rei, de setenta dois bispos - incluindo os bispos arianos -,  os quais propuseram 23 cânones que explicavam porque o Arianismo era uma heresia, porque deveria ser combatido, além de sugerir novas regras monásticas e ações a serem tomadas para a reconversão da população. (THE SAINTS COLLECTION, 2015, p. 997). 

Terceiro Concílio de Toledo. José Martí y Monsó, 1862. Ao centro ver-se o rei Recaredo e do lado esquerdo, em pé, apontando para ele, o bispo Leandro. 
As decisões propostas no concílio foram acatadas e Recaredo no mesmo ano decretou o Reino Visigótico como pertencente a cristandade oficial. Ele também despachou uma carta ao papa Gregório comunicando sobre a decisão. Após o concílio o rei teve que tratar de alguns problemas políticos e militares, mas conseguiu solucioná-los. Os bispos arianos mantiveram suas dioceses e títulos, tal decisão evitou que revoltas fossem geradas pelas famílias dos bispos ou por eles mesmo. Isso foi importante naquele período de transição não apenas religiosa, mas também política, pois Recaredo somente estava há dois anos e alguns meses no poder, além de que pela frente tinha que cuidar de problemas oriundos do governo de seu pai. (VOLTÁ, 1977, p. 45). 

Os últimos anos:

Se desconhece como foram os últimos anos de Leandro, embora sabe-se que ele manteve-se no cargo de bispo até morrer. Ao todo, Leandro permaneceu trinta anos como bispo de Sevilha, tendo presidido alguns pequenos sínodos, mas seus grandes feitos foram as conversões de Hermenegildo e de Recaredo, e a vitória no III Concílio de Toledo. No ano de 599, para celebrar os dez anos do concílio, Leandro recebeu o pálio, capa comemorativa inicialmente reservada aos papas, depois concedidas aos bispos e arcebispos que agiram em prol da ordem e união da Igreja e da cristandade. Leandro faleceu em 13 de março de 600 ou 601, aos 66 ou 67 anos, de causas não definidas. Ele foi sucedido na diocese por seu irmão Isidoro de Sevilha, o qual manteve a política de assegurar que o arianismo não retornasse. Não se sabe exatamente onde seus restos mortais foram sepultados. (SUAU, 1910). 

Pintura na Catedral de Sevilha imaginando o encontro dos irmãos São Leandro (esquerda) e São Isidoro. Ambos trajam vestes de bispo e usam o báculo bispal. 
NOTA 1: O rei Leovigildo governou entre 572 e 586. 
NOTA 2: O príncipe Hermenegildo foi no século XVI canonizado, tornando-se São Hermenegildo, o padroeiro dos convertidos. 
NOTA 3: O Arianismo foi desenvolvido pelo presbítero Ario da Líbia (256-336), o qual passou a defender uma doutrina antitrinitária, negando alguns preceitos da Trindade, assim como, negava que Jesus fosse Deus encarnado. Apesar que em vida Ario foi criticado e perseguido pelos bispos, ainda assim, suas ideias encontraram apoiadores entre o clero e foram difundidas nos séculos seguintes. 
NOTA 4: Dentre os escritos conhecidos de São Leandro, dois deles se destacam: De institutione virginum et contemptu mundi, que versa sobre regras monásticas para freiras e dedicado a sua irmã Florentina. Homilia de triumpho ecclesiae ob conversionem Gothorum, que consiste num comentário sobre o êxito do III Concílio de Toledo. 
NOTA 5: Algumas fontes apresentam a data de nascimento de Leandro, erroneamente voltada para 520 ou 550. 
NOTA 6: Leandro e seus irmãos são conhecidos como os Quatro Santos de Cartagena. Mesmo que haja dúvidas se todos os quatro nasceram ou não naquela cidade. 
NOTA 7: São Fulgêncio de Cartagena se tornou bispo de Ástigis, atualmente Écija
NOTA 8: São Leandro foi canonizado em data incerta, sendo considerado santo devido não a milagres realizados ou martírio, mas por ter dedicado a vida a causa cristã. O que é chamado de culto imemorial. 
NOTA 9: San Leandro é uma cidade na Califórnia, Estados Unidos. Surgida como uma fazenda espanhola no final do século XVIII, tornou-se uma vila e em 1872 foi reconhecida como cidade.  
NOTA 10: São Leandro possui dois dias litúrgicos: 27 de fevereiro e 13 de março.

Referências bibliográficas: 
MANZARES, César Vidal. Dicionário histórico do Cristianismo
VOLTÁ, Gabriel García. El mundo perdido de los visigodos. Barcelona, Editorial Bruguera, S. A, 1977. 
THE Saints Collection. St. Leander, Bishop of Seville, Confessor. New York, Catholic Way Publishing, 2015, p. 996-998. 
SUAU, Pierre. St. Leander of Seville. In: The Catholic Encyclopedia, vol. 9. New York, Robert Appleton Company, 1910. Disponível em: http://www.newadvent.org/cathen/09102a.htm


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