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Leandro Vilar

sábado, 4 de novembro de 2023

A invenção do avião

Voar é um sonho antigo da humanidade, fato esse que nos mitos e lendas encontramos narrativas de deuses, espíritos, seres, monstros e até pessoas que conseguiam voar de diferentes formas. Inventores chineses, persas e árabes tentaram criam meios de fazer pessoas voarem. Leonardo da Vinci elaborou projetos de máquinas voadoras, embora não tenha conseguido fabrica-las e testá-las. Todavia, somente a partir do século XVIII quando surgiu os primeiros balões tripuláveis, começou a oportunidade das pessoas poderem voar. No século seguinte os balões foram sendo aperfeiçoados, assim como, surgiu o dirigível e os planadores, para finalmente chegarmos aos aviões. 

Existe uma polêmica que tenta definir quem inventou o avião, como historiador, a pergunta correta seria: quem foram os pioneiros da aviação? Pois vários homens contribuíram de alguma forma para que o avião fosse criado. 

George Cayley e o planador tripulado (1853)

No século XVIII alguns engenheiros, físicos e inventores que estudavam balonismo escreveram artigos sobre projetos distintos para criar máquinas com asas e hélices, porém, tais projetos nunca saíram do papel. Entretanto, seus estudos foram importantes para conceber a forma básica do avião: uma estrutura comprida com duas asas, movido a motor. Entretanto, no século XVIII o motor a vapor era pesado; por sua vez, motoros a combustão movidos a gasolina e diesel surgiriam somente na segunda metade do século XIX, e esses ainda não tinham a potência adequada para propulsionar as aeronaves, por conta disso, os primeiros aviões eram planadores.

No ano de 1799 o engenheiro e inventor inglês George Cayley (1773-1857) publicou alguns artigos sobre aeronaves com asas e cabine para um piloto. Como os motores a combustão ainda não existiam naquele tempo e os motores a vapor eram pesados, Cayley concebeu sua aeronave movida apenas pela corrente de ar, surgia assim o planador contemporâneo, já que ideias similares já tinham sido cogitadas no passado. Mas diferente do protótipos dos séculos anteriores, Cayley a partir de 1804 começou a construir planadores não tripulados. (DEE, 2007). 

Cayley dedicou a vida a aperfeiçoar os planadores, fazendo vários testes e designers, além de ter escrito artigos sobre aerodinâmica, tendo estabelecido alguns dos princípios desse campo da física, ainda hoje utilizados no voo de aviões e aeronaves similares. Além dessa questão física, Cayley também estabeleceu princípios da fuselagem das aeronaves como duas asas, cabine, cauda de três pontas, trem de pouso etc., embora que nem todos os aviões dos primeiros anos seguissem esse padrão. (DEE, 2007). 

Cayley relutou em construir planadores motorizados, pois em seus testes observou que os motores a vapor não era eficazes para isso. Apesar dessa condição, dois inventores ingleses chamados Wiliam Samuel Honson e John Stringfellow conceberam o Aerial steam carriage em 1842, que consistia numa aeronave motorizada usando um motor a vapor. O problema é que os testes falharam todos. Somente em 1848 um pequeno modelo conseguiu alçar voo de forma segura, mas foi teste não tripulado. O protótipo do aerial voou cerca de dez metros num hangar. (BARROS, 2006). 

Modelo de 1852 de um planador de George Cayley. 

Após vários anos de estudos, fracassos e descobertas, em 1853 um companheiro de Cayley, de identidade desconhecida (talvez algum empregado seu), realizou um teste tripulado, voando num planador por alguns metros em Brompton-by-Sawdon, na Inglaterra. Como o planador possuía trem de pouso, o piloto conseguiu realizar a aterrissagem. Esse é considerado o primeiro teste satisfatório de uma aeronave tripulada que não era um balão ou dirigível. (DEE, 2007). 

Jean-Marie Le Bris e L'Albatros (1868)

Com o sucesso do planador de Cayley, outros inventores ingleses, mas também franceses, alemães e de outras nacionalidades começaram a investir em modelos de planadores. Um que se destacou foi o inventor francês Jean-Marie Le Bris (1817-1872). Influenciado por sua vida costeira, na qual ele observava aves como gaivotas e albatrozes, Le Bris começou a desenvolver seus planadores, fazendo testes bem sucedidos a partir de 1856. (GIBBS-SMITH, 2008). 

Le Bries inicialmente fez testes não tripulados, usando cavalos para rebocar os planadores fazendo-os alçar voo. Em 1857 um de seus experimentos permitiu que um de seus protótipos alcançasse uma altura de cerca de 100 metros e percorresse 200 metros de distância. Ainda no mesmo ano, Le Bries fez um teste tripulado, mas a aterrissagem foi brusca e ele fraturou uma das pernas. (GIBBS-SMITH, 2008). 

Após esse acidente ele se tornou prudente, pois poderia ter morrido na aterrissagem insegura. Assim, ele passou a década seguinte aperfeiçoando seus planadores e desenvolvendo o sistema de pouso e controle, para finalmente em 1868 ele realizou novo teste com o L'Albatros, que embora tenha ficado ligeiramente avariado na aterrissagem, Le Bries conseguiu voar nele por mais de cem metros de distância. 

Le Bries abordo do L'Albatros em 1868. Fotografia de Pépin. 

Embora tenha conseguido voar, o L' Albatros apresentou instabilidade no voo por conta de seu formato, apesar disso, o projeto de Le Bries chamou atenção do Exército francês, já que em 1870 teve início a Guerra Franco-Prussiana (1870-1971), da qual ele participou, embora não tenha conseguiu desenvolver de forma satisfatória planadores para reconhecimento do campo de batalha. Vale ressalvar que a ideia de usar máquinas voadoras para isso não era nova, pois antes balões foram usados para fazer isso. 

Os irmãos Du Tample e o Monoplano (1874)

Na década de 1870 vários projetos para se criar aviões motorizados combinando o conceito dos planadores de Cayley, Le Bries e outros inventores, foram desenvolvidos. Como os motores a combustão tinham se desenvolvido melhor, acreditava-se que agora seria possível criar aviões que pudessem voar sem precisar serem rebocados ou catapultados. Na prática isso ainda levaria décadas para ser resolvido. 

Os irmãos Felix e Louis Du Tample de La Croix desde a década de 1850 vinham estudando planadores, mas sem sucesso conseguiram produzir algo eficaz e seguro. Entretanto, no começo dos anos 1870 eles investiram em novos projetos e desenvolveram o Monoplano, um avião feito com estrutura de alumínio, tendo 13 metros de envergadura, pesando cerca de 80 quilos. Ele possuía uma hélice e um motor movido a gasolina. (GIBBS-SMITH, 2008). 

Usando uma rampa, os Du Tample conseguiram lançar o Monoplano que obteve sucesso ao voar e depois aterrissar, consistindo num primeiro avião primitivo a conseguir fazer isso utilizando um motor. Porém, a aeronave não era tripulada e ainda precisou usar uma rampa para ganhar velocidade e altitude. 

Réplica do Monoplano dos irmãos Du Temple, 1874. 

O projeto dos Du Tample inspirou outros inventores a investirem em aviões motorizados, algo visto com Alphone Pénaud e Victor Tatin, que conseguiram construir seus modelos, mas todos eram não tripulados e os motores a vapor e a combustão não detinham potência suficiente para fazer o avião decolar por conta própria, além de permanecer alguns minutos voando. Os voos de testes duravam apenas segundos. (GIBBS-SMITH, 2008). 

Clément Ader e o Avión III (1897)

Clément Ader (1841-1925) foi um inventor e engenheiro francês que na década de 1880 passou a investir em projetos de planadores e aviões. Baseado nos estudos daquela década, em que existiam vários projetos da construção de aviões motorizados, Ader concebeu o Éole em 1890, um protótipo não tripulado, tendo um motor a vapor de 20hp, que conseguiu erguer a aeronave de 300 quilos por uma distância de 50 metros, mas apenas a 20 centímetros acima do solo. Insatisfeito com aquilo, Ader passou os anos seguintes criando novos protótipos e motores mais potentes, mas todos os testes foram sem tripulação. (LISSARAGUE, 1990). 

Em 1897 ele criou o Avión III (ou Éole III), possuindo dois motores de 30hp, movendo duas hélices. Seu avião tinha a estranha forma de asas de morcego, que Ader julga ser mais aerodinâmico que asas lisas. Em 14 de outubro de 1897 um teste com piloto foi realizado num campo diante de representantes do Exército francês, o qual patrocinava o trabalho de Ader. Entretanto, o Avión III não conseguiu alçar voo, apenas realizou alguns saltos. (LISSARAGUE, 1990). 

Fotografia do Avión III (1897) de Clément Ader. 

Embora os projetos de Ader tenham fracassado em não conseguir criar um avião tripulado que conseguisse decolar, voar e pousar, no entanto, ele ficou famoso por ter criado a palavra avión, que originou o termo avião em alguns idiomas como o português e espanhol. Além disso, observa-se novamente o interesse das forças armadas em desenvolver aviões para fins militares, algo que somente se concretizou com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). 

Os irmãos Wright e os aviões catapultados (1900-1905)

A partir de 1900 os irmãos Wilbur (1867-1915) e Orville (1871-1948) que eram empresários do ramo de bicicletas, passaram por hobby a se interessar por aeroplanismo, assim começaram a estudar a respeito, tendo como principais influências os artigos de George Caylay, o aeroplano de Chanute-Herring e os experimentos de Otto Lilienthal com planadores. Dessa forma, os Wright começaram a construir em 1901 seus planadores sem motor, mas que conseguiam voar dezenas de metros de distância, assim como, eram pilotados por um dos irmãos, normalmente o Wilbur. (HOWARD, 1998). 

Wilbur Wright no planador Wright 1 em 1901. 

Com os voos promissores do Wright 1, os irmãos investiram em novos modelos revendo os dados fornecidos por Lilienthal, na época uma referência em planadores. Além disso, Wilbur e Orville construíram um pequeno túnel de vento para testar a aerodinâmica de modelos em escala, fazendo alterações no formato das asas. 

Após dois anos de testes e vários voos, em 1903, os dois decidiram testar o Wright Flyer 1, um avião motorizado, que realizou um voo de demonstração em 14 de dezembro, mas sofreu uma queda segundos depois, tendo que ser reparado. Finalmente no dia 17 de dezembro, Orville e Wilbur realizaram quatro voos que duraram segundos, percorrendo dezenas de metros, mas a baixa altitude. No último voo, o avião não aterrissou de forma segura e ficou danificado, mas Wilbur não se feriu. Cinco homens, incluindo um jornalista e um fotógrafo testemunharam os voos. (HOWARD, 1998). 

O Wright Flyer 1 em teste de voo rasante em 1903. Orville o pilotava na época, enquanto Wilbur assistia. 

Embora os quatro voos tenham sido satisfatórios, apesar da baixa altitude, entretanto, o Wright Flyer 1 dependia de suporte para levantar voo. Os Wright usavam uma combinação de trilhos para rebocar ou catapultar seus aviões. Isso levou a algumas controvérsias, fato esse que nas primeiras décadas os dois não eram creditados como os inventores do avião, pelo menos, de um modelo eficiente. (ANDERSON, 2004). 

Com o sucesso do Flyer 1, o Flyer 2 foi lançado em 1904 e depois o Flyer 3 em 1905. Esses dois modelos voaram mais longe e mais alto do que o seu antecessor. E finalmente o reconhecimento público e oficial que os Wright aguardavam somente veio a partir de 1905, após os testes do Flyer 3, que conseguiu em sua última volta, voar por 39 km antes de ter que pousar devido ao término do combustível. O voo histórico de longa distância foi realizado sobre Huffman Praire, tendo o avião sido pilotado por Orville, pois Wilbur havia se ferido em uma queda nos testes anteriores. (ANDERSON, 2004). 

O Flyer 3 pilotado por Orville Wright em 1905. 

Apesar do sucesso desse voo, alguns jornais americanos questionavam a veracidade do feito. Seria possível que um avião que não conseguia levantar voo sem ser ajudado, poderia ter potência para percorrer uma longa distância como eles dois e as testemunhas na fazenda alegaram? Essa dúvida chegou aos jornais europeus, especialmente os franceses que contestavam as longas distâncias que os aviões do Wright teriam percorrido. 

Fato esse que Wilbur e Orville passaram os dez anos seguintes tentando provar a veracidade de seus experimentos, o que incluiu demonstrações públicas e idas à Inglaterra e França. No entanto, somente a partir de 1908 é que os aviões dos Wright passaram a decolar sem ajuda externa, mas nesse período eles já eram famosos, especialmente nos Estados Unidos onde eram creditados como os inventores do avião. (ANDERSON, 2004). 

Santos Dumont e o 14-bis (1906)

O engenheiro e inventor brasileiro Alberto Santos Dumont (1873-1932) vivia a vários anos em Paris, sendo uma figura pública famosa por conta de seus experimentos com balões e dirigíveis. Dumont então influenciado por aeroplanistas franceses, alemães e ingleses decidiu desenvolver seu modelo de avião. Dumont diferente dos Wright que estudavam planadores desde 1900, não tinha familiaridade com esses veículos, já que sua especialidade eram os balões e dirigíveis, apesar disso, ele montou em 1906 o 14-bis, um avião bem estranho, pois as asas e a hélice ficavam na traseira. (BARROS, 2006). 

De julho a novembro de 1906, Dumont realizou vários testes com o 14-bis, resultando em voos fracassados e até acidentes leves. O avião não tinha potência para conseguir alçar voo, tendo sido atirado de um lugar alto para planar e depois acionar os motores. Condição essa que Dumont trocou de motor e alterou alguns detalhes da estrutura para conceder maior estabilidade. Vale ressaltar que nesses meses ele conseguiu voar várias vezes curtas distâncias, mas o desafio proposto pelo Aeroclube da França era que o avião deveria levantar voo por conta própria (uma clara indireta aos voos do Wright, que já era conhecidos naquela época). 

Assim, após meses de testes e reformulações do projeto do 14-bis (conhecido em francês como Oiseau de Proie), finalmente o avião de Dumont conseguiu voar. Ao longo dia 12 de novembro de 1906, Dumont realizou cinco voos com o 14-bis, sendo demonstrações públicas, as quais milhares de pessoas assistiram, além de juízes do Aeroclube. O último voo realizado foi o mais extenso, percorrendo mais de 200 metros e passando dos 35 km/h. (FONTES; FONTES, 1967). 

Matéria de um jornal francês de 12 de novembro de 1906, noticiando o voo histórico de Santos Dumont com o 14-bis. 

Os Irmãos Wright ficaram abismados com o relato dos voos de Santos Dumont, em Paris. Eles cobraram descrições e dados a respeito, pois estavam incrédulos como um piloto que não tinha experiências com aqueles veículos conseguiu em cinco meses tamanha façanha, algo que os Wright passaram anos estudando e não tinha obtido sucesso similar. (BARROS, 2006). 

Dumont ainda chegou a realizar outros voos com o 14-bis até que numa queda em 1907 o avião ficou tão danificado, que ele desistiu de consertá-lo, então passou a trabalhar em outro modelo. Apesar disso, os jornais franceses e de outros países europeus creditavam ao brasileiro Santos Dumont a criação do avião, ou pelo menos o reconhecimento de sua proeza. (FONTES; FONTES, 1967). 

Gabriel Voisin e o biplano (1907-1908)

O empresário e piloto Gabriel Voisin (1880-1973) inspirado pelo sucesso dos voos dos Wright e de Santos Dumont decidiu investir no mercado de aviões, com isso ele contratou engenheiros para auxiliá-lo, incluindo seu irmão Charles Voisin, vindo a criar o Voisin I, o primeiro modelo bem sucedido de avião produzido em massa, lançado poucos meses antes do Demoiselle de Santos Dumont. 

Assim, Voisin usou sua empresa a Appareils d'Aviation Les Frères Voisin para produzir aviões para pilotos de testes, aviadores e ricos que gostavam de aventura. Entre esses destacaram-se Leon Delangrange (1872-1910), piloto e escultor que se destacou nas competições de voo e Henri Farman (1874-1958), piloto e empresário que ganhou fama em participar de competições de voo, mas ele ficou tão interessado por aviões que abriu a própria empresa para produzir motores e peças para aviões. Farman passou a fazer negócios com Voisin, ambos cooperaram para as melhorias dos aviões. (GIBBS-SMITH, 2008). 

Henri Farman voando num Voisin I em 1908. 

Santos Dumont e o Demoiselle (1907-1909)

Após o sucesso do 14-bis, Dumont decidiu mudar totalmente seus projetos de aviões, vindo a desenvolver o Demoiselle N. 19, também chamado de Libellule. O primeiro nome se devia que o designer do avião era bonito e delicado, já o outro nome se referia a condição de ser uma aeronave leve e frágil. De fato, o Demoiselle pesa somente 56 kg, o que o torna o primeiro ultraleve eficiente da História. (FONTES; FONTES, 1967). 

Em 1907, Dumont realizou alguns voos com seu Demoiselle pelos céus de Paris, mesmo que fosse a distâncias inferiores a 200 metros, o motivo se devia a capacidade de combustível da aeronave, que ainda era pequena. Apesar disso, ele construiu nos anos seguintes alguns modelos dessa aeronave, cada um aperfeiçoava problemas do anterior. Em 1909 o Demoiselle N. 22 foi considerado a melhor versão desenvolvida por Dumont. Com esse modelo ele realizou vários voos por Paris e cidades nos arredores, percorrendo pela primeira vez, alguns quilômetros de distância. O aviador estava tão habituado aos passeios aéreos que viajava de uma cidade para a outra para ir almoçar ou jantar com admiradores e amigos. Vale ressalvar que nessa época voo longos não era incomuns, além de haver competições aéreas na França. (FONTES; FONTES, 1967). 

Santos Dumont voando no Demoiselle em 1909. 

A ideia de um avião tão pequeno e leve advinha do sonho do aviador brasileiros de tornar os aviões em veículos baratos e acessíveis ao público. Para Dumont, havia a expectativa que nas décadas seguintes voar fosse algo comum, além de que as pessoas teriam seus aviões como tinham carros, condição essa que ele liberou as patentes do Demoiselle, tornando-as públicas para que qualquer pessoa pudesse construir a aeronave. Diferente do que fez empresários como Voisin, os Wright e Farman. 

No ano de 1910, após uma queda com o Demoiselle N. 22, Dumont desistiu de continuar pilotando, mesmo que não tenha sofrido ferimentos graves. Entretanto, o aviador sofria de outros problemas de saúde como vertigens agudas quando passava muito tempo voando.  

Louis Blériot e o voo sobre o Canal da Mancha (1909)

O empresário, inventor e aviador Louis Blériot (1872-1936) ganhou fama mundial ao sobrevoar a França para a Inglaterra, cruzando o Canal da Mancha. Blériot começou a construir seus aviões ainda em 1905, mas sem muito sucesso, de fato, os melhores exemplares foram surgir em 1907. Assim, em 1908 ele teve interesse em participar de uma disputa de voo proposta pelo jornal Daily Mail que oferecia 500 libras esterlinas para o aviador que cruzasse o Canal da Mancha. Alguns candidatos cogitaram participar da disputa, incluindo Wilbur Wright, que na época estava na Europa divulgando sua empresa e aviões. Todavia, ele e outros concorrentes desistiram. (ELLIOT, 2000). 

Assim, em 1909, como o prêmio havia sido aumentado para 1000 libras esterlinas, Blériot decidiu se arriscar, pois seria um voo de mais de 30 km de distância e sem nenhum lugar para aterrissar em caso de pane. Cair no mar seria morte certa. Apesar disso, Blériot escolheu seu melhor modelo de avião, o Blériot IX, ele partiu antes das 5h da manhã do dia 25 de julho, levando 36 minutos para chegar em Dover na Inglaterra. Apesar do voo curto, Blériot relatou que foi a meia-hora mais demorada de sua vida, inclusive ele não levou bússola, tendo que se guiar pela visão, enquanto seguia um navio que atravessava o canal. (ELLIOT, 2000). 

Louis Blériot no Blériot IX em 1909. 

Blériot ganhou o prêmio de 1000 libras e fama, se tornando o primeiro homem a cruzar o Canal da Mancha num avião. Ele nos anos seguintes como Voisin e Farman, desenvolveu sua fábrica de aviões, investindo na construção desses. 

Os irmãos Nieuport e o Nieuport IV (1911)

O piloto e empresário Édouard Nieuport (1875-1911) junto com seu irmão Charles fundaram a empresa Société Anonyme Des Éstablissementes Nieuport em 1909, para produzir aviões. Inicialmente eles produziram aviões para participar das competições aéreas, bastante comuns na França, fato esse que Édouard ganhou algumas disputas, especialmente as de velocidade, que eram suas preferidas. Todavia, com a eclosão da Guerra Ítalo-Turca (1911-1912), o governo italiano negociou com a empresa de Nieuport para fornecer aviões para fins de reconhecimento do território inimigo. (SANGER, 2002). 

Naquela época o modelo Nieuport IV era a melhor versão da empresa, mas além do uso para reconhecimento, a aeronave também foi a primeira da História a ser usada para ataque, atuando como bombardeio, quando pilotos italianos bombardearam acampamentos turcos. A ideia rapidamente se espalhou e a Turquia tratou de fazer o mesmo, além disso, países como França, Alemanha, Inglaterra e Rússia também demonstraram interesse nesse modelo de avião para fins militares. (SANGER, 2002). 

Um Nieuport IV.G em fotografia de 1911 ou 1912. 

Édouard morreu num acidente aéreo, não vivendo para ver seus aviões serem amplamente empregados na Grande Guerra, porém, seu irmão Charles seguiu comandando a empresa, tendo feito negócios com vários países para fornecer suas aeronaves. O modelo Nieuport IV e suas variantes foram usados ao longo da guerra. Além disso, foi o primeiro modelo de avião a definir alguns padrões de designer que seriam adotados por outras empresas durante a guerra. 

Considerações finais

Com o sucesso de aviões inventados pelos Wright, Santos Dumont e outros inventores baseados neles, países como Alemanha, Inglaterra, França, Estados Unidos e Itália começaram a investir em aviões de guerra. Lembrando que a ideia para isso já existia no século XIX. Os próprios irmãos Wright trabalharam para o Exército produzindo modelos para fins militares. Santos Dumont foi convidado a fazer o mesmo pelo governo francês, mas recusou a proposta por ser um pacifista, inclusive foi um crítico ao uso de aviões na guerra. 

As empresas de Farman, Voisin, Blériot e Nieuport ganharam muito dinheiro com a guerra, produzindo aviões, motores e peças. Fato esse que além de produzir motores e peças para as aeronaves, algumas dessas empresas também faziam isso para carros, motos e caminhões. A Grande Guerra impulsionou a indústria de veículos terrestres, náuticos e aéreos. Dessa forma, milhares de aviões foram produzidos em quatro anos, sendo testados em condições extremas. 

Entretanto, durante a guerra os aviões já estavam bem mais avançados do que eram cinco anos antes, permitindo realizar manobras rápidas, voos de longa distância, atingir velocidades superiores aos 200 km/h, possuir uma maior dirigibilidade, poder carregar armamento, e em alguns casos havia aviões que levavam dois a três pilotos, embora o usual fosse apenas um piloto. A guerra com toda sua infelicidade em destruição e morte, ajudou a consolidar a invenção do avião. 

Aviões modelo Albatros D.IIIs e Jasta 11 do exército alemão em uma pista de pouso na França, em 1917. 

Referências bibliográficas:

ANDERSON, John D. Inventing Flight: The Writgh Brothers and Their Predecessors. Baltimore, John Hopkins Univrsity Press, 2004. 

BARROS, Henrique Lins de. A invenção do avião. Rio de Janeiro, Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT/Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas - CBPF, 2006.

DEE, Richard. The Man who Discovered Flight: Geroge Cayley and the First Airplaine. Toronto, McCelland and Stuart, 2007. 

ELLIOT, B. A. Bleriot, Herald of An Age. Stroud, Tempus, 2000. 

FONTES; Ofélia; FONTES, Narbal. A vida de Santos Dumont. 3a ed. São Paulo, Reper Editora, 1967.

GIBBS-SMITH, C. H. Aviation: An historical survey. London, NMSI, 2008.  

HOWARD, Fred. Wilbur and Orville: A biography of the Wright brothers. New York, Ballantine Books, 1998. 

LISSARAGUE, Pierre. Ader, inventor of Aeroplanes. Toulose, Edition Privat, 1990. 

SANGER, Ray. Nieuport Aircraft of World of War. Wilthshire, Crowood Press, 2002. 

Links relacionados: 

Santos Dumont: o brasileiro que ganhou os céus

O Barão Vermelho e os primórdios da guerra aérea

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