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Leandro Vilar

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

O Protetorado: a ditadura de Cromwell (1653-1658)

Oliver Cromwell foi um nobre inglês que ingressou na política ao ser eleito ao Parlamento em duas ocasiões, no entanto, ele se destacou na História por sua participação na Guerra Civil Inglesa (1642-1649), o que o fez surgir como herói de guerra, depois sendo eleito Lorde Protetor, presidindo um projeto republicano do Reino Unido, que acabou se tornando uma ditadura. 

Introdução

Oliver Cromwell (1599-1658) era filho de Richard Cromwell e Elizabeth Steward. Por linhagem paterna, Oliver descendi da baixa nobreza, apesar que seu pai fosse senhor de terras, herdou dívidas de seu pai, legando-as ao filho. Muitos anos depois, já adulto, Oliver teve que vender parte de suas propriedades para quitar as dívidas da família, no entanto, em 1620 casou-se com Elizabeth Bourchier, com quem teve nove filhos. Ela era filha do rico comerciante James Bourchier, o qual abriu as portas para Oliver ao mundo dos negócios. (HILL, 1988). 

Retrato de Oliver Cromwell como Lorde Protetor. 

Graças aos contatos de seu sogro, Oliver conseguiu fazer bons negócios, recuperando parte de sua fortuna e ganhando prestígio na região. Em 1628, ano em que o Parlamento foi reestabelecido pelo rei Carlos I, Cromwell se candidatou ao Parlamento por Huntindgton, sua cidade natal. A candidatura acabou dando certo e Oliver foi eleito, na época com seus 29 anos, ele defendia ideias republicanas. No entanto, sua carreira como político foi breve, pois o rei fechou o Parlamento novamente no ano seguinte. Carlos I era conhecido por ser um monarca absolutista, sendo autoritário. (HILL, 1988). 

Com a suspensão do Parlamento em 1629, Cromwell retornou a se dedicar aos negócios, mas manteve-se presente nos debates políticos da época. Dez anos depois, durante a Guerra dos Bispos (1639-1640), conflito entre escoceses e ingleses, pois Carlos I pressionou a Escócia a adotar o credo anglicano ao invés do credo calvinista que operava naquela parte do reino, uma guerra eclodiu. Precisando de ajuda e recursos, o rei reabriu o Parlamento em 1640. Os parlamentares eleitos anteriormente, incluindo Cromwell, foram convocados. 

O rei em apuros foi pressionado por contrapropostas dos parlamentares para concordar com uma série de concessões, uma delas era que o Parlamento não poderia ser mais dissolvido pelas ordens dele, recuperaria sua autonomia e plenas funções, algo que deu certo. Porém, a contragosto, Carlos I concordou com isso, mas discordou de outras exigências, incluindo sua abdicação diante da crise gerada por ele no país que ainda continuava. O rei abandonou Londres em 1642, indo para Nottingham se reunir com seus servos leais, isso foi considerado um ato de traição pelos parlamentares. Cromwell se uniu aos políticos mais radicais, que declararam guerra ao rei. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

A Guerra Civil (1642-1649)

O país se viu dividido entre duas frentes inimigas: os realistas que formavam os exércitos fiéis ao rei Carlos I e os parlamentaristas que representavam as tropas leais ao Parlamento. Nos meses de 1642 ambos os lados trataram de reunir suas forças, iniciando alguns pequenos conflitos. Para surpresa do Parlamento o rei possuía mais apoio do que era esperado, fato esse que no ano de 1643 as batalhas travadas foram acirradas e algumas delas resultaram na vitória dos realistas. Por sua vez, o Parlamento assegurava o controle de Londres e arredores, enquanto Carlos I estabeleceu-se em Oxford(YOUNG; ROFF, 1973). 

O 3o Conde de Essex, Robert Devereux, tomou a dianteira no comando das forças parlamentares, conseguindo entre 1642 e 1643 reunir 10 mil soldados. Cromwell uniu-se ao conde para comandar também as tropas em algumas batalhas. O ano de 1643 foi favorável para os realistas, especialmente após o Príncipe Rupert do Reno (1619-1682) chegar à Inglaterra para apoiar o rei. Graças aos cavaleiros alemães que ele trouxe, a balança de guerra pendeu favorável aos realistas, que obtiveram importantes vitórias naquele ano. Cromwell notando que uma cavalaria leve e ligeira estava fazendo bastante a diferença no campo de batalha, decidiu montar uma para o exército parlamentar. 

Ainda em meados de 1643, Oliver Cromwell criou um regimento de cavalaria chamado Ironside, do qual se tornou seu principal comandante, obtendo êxito no segundo semestre daquele ano e aumentando seus números em 1644, resultando nas importantes vitórias da Batalha de Marston Moor (2 de julho) e na Segunda Batalha de Newbury (27 de outubro). Os Ironside não apenas foram cruciais para que o exército parlamentar sobrepujasse o exército realista, mas também garantiram fama a Cromwell como liderança militar e herói de guerra. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

Batalha de Marston Moor(1644). Pintura de J. Baker, 1886. 

No ano de 1645, os nobres parlamentares Thomas Fairfax e Edward Whalley, os quais comandaram tropas na guerra civil, baseados no desempenho e organização das tropas do Ironside propuseram uma reforma militar conhecida como Novo Exército Modelo (New Model Army), que consistia na reconfiguração dos regimentos, batalhões e demais divisões do Exército, além de hierarquias de comando, quantidade de tropas, táticas militares etc. Cromwell foi um dos quais contribuiu para essa reforma militar, a qual resultou em êxito com novas vitórias na Batalha de Naseby (14 de junho) e na Batalha de Langport (10 de julho). (HAYTHORNWAITE, 1994). 

A primeira parte da guerra civil entrou numa trégua em 1646, quando o rei Carlos I foi capturado e preso na Escócia, onde havia fugido para se esconder e reunir reforços. Ele seria levado a julgamento por seus crimes, porém, isso demorou meses para acontecer. O monarca ficou preso em Londres, aguardando o tribunal que o julgaria, mas ele conseguiu escapar com a ajuda de apoiadores e fugiu para a ilha Wight no sul do país, onde permaneceu protegido pelo restante do ano de 1646 e 1647. Enquanto isso, ele expediu várias cartas para seus aliados, incluindo negociar com o Parlamento Escocês, o qual acabou fechando acordo e enviou um exército chamado Engagers (ou Engagement) para invadir a Inglaterra em 1648(YOUNG; ROFF, 1973). 

No entanto, o novo exército inglês controlado pelo Parlamento, era forte, unido e eficaz, conseguindo barrar as tentativas escocesas de resgatar o rei e levá-lo vitorioso a Londres, onde ele pretendia sitiar a capital e forçar a dissolução do Parlamento. Entretanto, Cromwell e os outros parlamentares obtiveram vitórias ao longo de 1648, minando qualquer chance do rei Carlos I conseguir reassumir o trono, resultando novamente em sua captura. Dessa vez, o esquema de vigilância sobre o rei foi melhorado e ele não conseguiu escapar. O monarca foi condenado a pena de morte por seus crimes num tribunal formado por 100 juízes, sendo executado diante do Palácio Whitehall em 30 de janeiro de 1649(YOUNG; ROFF, 1973). 

Apesar da morte do rei tirânico, o país não ficou em paz. Revoltas ainda ocorriam na Escócia e na Irlanda, levando o Parlamento a ter que enviar tropas para lá. Cromwell pessoalmente viajou com alguns regimentos dos Ironside para a Irlanda, ainda em 1649, e depois entre 1650-1651 para Escócia. Em ambos os casos ele foi criticado pelo excesso de violência aplicado fora das batalhas, autorizando saques e massacres. (YOUNG; ROFF, 1973). 

Mas enquanto a guerra civil ainda não chegava ao fim, o Parlamento convocou sessões para deliberar pelo controle do país, vetando a eleição de um novo rei e criando a Comunidade da Inglaterra (Commonwealth of England), um projeto de estabelecer uma república parlamentarista, primeiramente sobre Inglaterra e Gales, mais tarde estendido para a Escócia e a Irlanda.

Brasão de armas da Comunidade da Inglaterra. 

Assim, entre 1649 e 1653, período em que a guerra civil ainda perdurava na sua terceira fase, a singela "república" inglesa ainda não havia conseguido se firmar como um poder reconhecido pelo Commonwealth. Esse período ficou conhecido como Parlamento Manco (Rump Parliament), nome dado aos desentendimentos gerados nos primeiros anos da jovem "república" inglesa, em que os parlamentares ainda se desentenderam quanto as mudanças políticas a serem implementadas, destacando-se crises políticas envolvendo uma reforma tributária e a liberdade de credo. Diante de tais problemas, Cromwell, um parlamentar respeitado devido aos seus serviços prestados durante a guerra civil, decidiu deixar o campo de batalha e se centrar na política. (WOOLRYCH, 1982). 

O Lorde Protetor (1653)

Descontente com a crise do governo do Parlamento Manco, Cromwell voltou a assumir suas funções parlamentares ainda em 1652, no ano de 1653, valendo-se de sua autoridade e influência conquistados ao longo dos anos de guerra civil, o que o levou a ser visto como um herói de guerra por alguns, ou um comandante sanguinário por outros, de qualquer forma, Cromwell soube se valer de articulações políticas para firmar seu caminho até o poder. (HILL, 1998). 

Neste caso, com o apoio de seus aliados foi estabelecido o Parlamento Barebone, uma referência a Praise-God Barebone, um dos parlamentares de Londres, apoiador de Cromwell. O novo parlamento contou com a eleição de novos membros no intuito de se criar uma nova gestão, dessa vez mais eficiente do que a do Parlamento Manco. Entretanto, sem chegar a um consenso quanto a isso, parte dos novos eleitos eram favoráveis a Cromwell, então decidiram sugerir seu nome para liderar o governo. (HILL, 1998). 

Assim, criou-se o cargo de Lorde Protetor, uma espécie de primeiro-ministro ou presidente, mas no caso, com autoridade acima do comum. Cromwell deliberou sobre essa oferta e fez o juramento de aceitar essa honra e missão em dezembro de 1653. Assim, ele oficialmente se tornou o Lorde Protetor da Comunidade da Inglaterra, Escócia e Inglaterra, reunindo em si autoridade civil e militar, embora ele ainda devesse governar dependente ao Parlamento. Cromwell jurava em servir o país pelo bem da nação e do povo, dedicando a protegê-lo de ameaças externas e internas. 

O Protetorado: a ditadura de Cromwell (1653-1658)

No ano de 1654, Oliver Cromwell colocou seu gabinete para trabalhar numa reforma política geral para a república, algo que levou meses para ficar pronto, começando as propostas a serem votadas apenas em setembro daquele ano. A ideia era realizar algumas mudanças na diplomacia, acordos comerciais, tributação, liberdade de credo, entre outros assuntos, mas de forma moderada. No entanto, algumas das suas propostas encontraram críticas negativas, especialmente as voltadas ao seu projeto militar no exterior na guerra contra os holandeses, além de instaurar um governo militar no país. (WOOLRYCH, 1982). 

Cromwell insatisfeito com a oposição surgida no Parlamento, em janeiro de 1655, suspendeu o mesmo, já que o cargo de Lorde Protetor permitia ele fazer isso. Tal decisão foi um sinal claro de que o autoritarismo dele estava se instalando definitivamente. Após a suspensão do Parlamento, proibindo de votar as reformas políticas e outros assuntos, Cromwell passou a governar sozinho por alguns meses. Ele dividiu o país em quinze regiões militares governadas cada uma por um major-general, os quais tinham autoridade para usar a força para manter a ordem, a paz, a justiça e o controle, e se reportavam diretamente ao Lorde Protetor. (WOOLRYCH, 1982). 


Brasão de Armas do Protetorado. 

O projeto de Cromwell foi malvisto por parte dos políticos e da população, considerado um ato e autoritarismo. Hoje tal decisão é até mesmo vista como uma prática de uma ditadura militar. Todavia, a estrutura de regiões administrativas civis-militares acabou fracassando por falta de organização, sendo suspensa em 1656, principalmente devido as críticas dos políticos e de parte da população, os quais denunciavam os abusos de poder cometidos pelos major-generais e seus homens. (HILL, 1998). 

Enquanto Cromwell saía derrotado quanto a tentativa de reorganizar a divisão administrativa do país, ele tentou uma jogada política interessante no quesito econômico. Vendo que os judeus foram responsáveis em parte por impulsionar a economia da Holanda, Cromwell decretou que os judeus poderiam retornar a Inglaterra, já que haviam sido expulsos muito tempo antes. Além de incentivar a migração judia e permitir a liberdade de credo, isso foi feito pensando no quesito econômico, já que seu interesse era atrair os ricos comerciantes judeus, não os judeus pobres. Apesar do projeto ser voltado para impulsionar a economia, a população mais conservadora e intolerante não aceitou de bom grado o retorno dos judeus ao país, vistos como um povo ardiloso e praticantes de uma fé herege. (WOOLRYCH, 1982). 

Quanto a Escócia e a Irlanda, ambos foram escanteados no governo de Cromwell, o qual não deu atenção a tais regiões, as quais ainda nutriam raiva pelo que ele mandou fazer durante o final da guerra civil. Além disso, o Lorde Protetor também gastou dinheiro com campanhas no exterior, apesar de vencida a Primeira Guerra Anglo-Holandesa (1652-1654), os acordos comerciais externos seguiam enfraquecidos, além de que a Inglaterra ainda estava desenvolvendo suas colônias na América do Norte e disputando algumas ilhas no Caribe e Antilhas

No ano de 1657 alguns parlamentares propuseram que Cromwell se tornasse rei, numa tentativa de melhorar sua reputação diante do povo, já que desde sua origem a Inglaterra sempre foi uma monarquia. A então república parlamentarista (na prática, uma ditadura civil-militar) não era bem vista pelo povo, a nobreza e os políticos. Entretanto, Cromwell recusou ser entronado como rei, no entanto, aceitou honrarias similares, ao passar por uma cerimônia que reafirmava seu cargo como Lorde Protetor. (WOOLRYCH, 1982). 

Dessa forma, dava-se início a um novo momento de seu governo autoritário e visivelmente em crise desde 1656, no entanto, Cromwell acabou adoecendo de forma inesperada em fins de agosto de 1658, vindo a falecer em 1658. A causa de sua morte é inconclusiva. Alguns sugerem que ele adoeceu e assim morreu, mas alguns cogitaram que ele possa ter sido envenenado, já que devido ao seu governo ditatorial, Cromwell conquistou muitos inimigos. 

Crise sucessória e a volta da monarquia (1658-1660)

A morte de Oliver Cromwell aos 59 anos tomou o país de surpresa, já que até então ela não aparentava estar doente a bastante tempo. Assim, uma crise sucessória se instaurou: o cargo de Lorde Protetor seria encerrado? Um novo protetor seria escolhido? Ou o Parlamento reassumiria sua função como visto entre 1649 e 1653? A resposta foi que os aliados da família Cromwell decidiram manter ela no poder. 

Richard Cromwell (1626-1712) era o terceiro filho de Oliver, não tendo desenvolvido uma carreira militar e política de destaque. Ele como seus irmãos, viveram à sombra do prestígio e fortuna adquiridos por seu pai. Em 1657, Richard foi nomeado reitor da Universidade de Oxford e no ano seguinte ganhou um assento no Conselho de Estado. Por ser na época o filho mais velho de Oliver, cogitou-se que ele seria seu sucessor político. (HILL, 1988). 

Richard Cromwell, o segundo Lorde Protetor do Protetorado. 

Assim, após o sepultamento de Oliver em setembro de 1658, o Parlamento do Protetorado deliberou passar o cargo de Lorde Protetor para Richard, mas isso foi questionado pelo comando militar e os políticos. Lembrando que o protetor era um chefe civil-militar. Assim, o Exército não viu de bom grado a indicação de Richard, pois ele não era militar, tampouco lutou na guerra como seu pai fez. Já os políticos também apontaram a falta de experiência de Richard na política. Apesar disso, uma assembleia foi convocada em novembro e em dezembro Richard Cromwell foi votado como novo Lorde Protetor. 

Em janeiro de 1659 ele presidiu a primeira sessão do Parlamento do Protetorado, no entanto, Richard enfrentou uma série de oposições, intrigas e problemas envolvendo desavenças entre os parlamentares civis e militares. A falta de carisma, autoridade e experiência em lhe dar com o jogo político levou Richard a pedir demissão em maio de 1659. (HILL, 1988). 

Com a saída de Richard Cromwell do poder, o Parlamento assumiu suas funções do Executivo, governando pelo restante de 1659, sendo deliberado encerrar o projeto republicano em 1660, quando o príncipe Carlos foi convocado do seu exílio na França, chegando em maio daquele ano a Londres, onde foi coroado rei Carlos II. Dessa forma, o sonho republicano na Inglaterra durou dez anos, se mostrando um fiasco, já que parte desse período, especialmente durante o governo de Oliver Cromwell, vigorou uma ditadura civil-militar. 

Referências bibliográficas

HAYTHORNWAITE, Philip. The English Civil War 1642-1651. An Ilustrated Military History. London, Brockhampton, 1994. 

HILL, Christopher. O eleito de Deus: Oliver Cromwell e a Revolução Inglesa. Tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura. São Paulo, Companhia das Letras, 1988. 

WOOLRYCH, Austin. Commonwealth to Protectorate. Oxford, Clarendon Press, 1982. 

YOUNG, Peter; ROFF, Michael. The English Civil War. London: Osprey, 1973. 

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