Neste texto procurei falar um pouco da vida e obra de três dos maiores compositores e músicos da história da música clássica e da própria história da música; Johann Sebastian Bach, Wolfgang Amadeus Mozart e Ludwig van Beethoven.
O Mar
"Bach não é um riacho, mas um mar"
Ludwig van Beethoven
Johann Sebastian Bach nasceu no seio de uma tradicional família de músicos originários da Turíngia, Alemanha. A Família Bach se dividia em quatro ramos, Meiningen, Erfurt, Francônia e Arnstadt. Sendo que Johann pertencia ao terceiro ramo. Sua família já se encontrava inserida no ramo da música desde o século XVI, pelo que é conhecido. Seu avô, Christoph Bach (1613-1661), fora músico da corte e da cidade em Weimar, Pretin, Erfurt e Arnstadt. O cargo de músico da corte era uma posição honorifica e de prestígio, embora não fosse um ofício para enriquecimento, assim como os Beethoven descobririam. Christoph tivera dois filhos, ambos seguiram a carreira musical.
Johann Ambrosius Bach, pai de J. Sebastian. |
Em 1685 em Eisenach, nasceu Johann Sebastian, filho de Johann Ambrosius (1645-1695). Seu pai fora violenista e altista em Erfurt em 1667 e posteriormente tornou-se músico da corte e da cidade em Eisenach em 1671. J. Ambrosius casou-se em 1668 com Maria Elisabetha, com quem tivera oito filhos, sendo quatro destes músicos. Assim, Sebastian possuiu três irmãos que eram também músicos, além do próprio pai, avô, tio e bisavô.
O Prodígio
"Há de passar mais de um século até que se desperte um talento igual"
Joseph Haydn
Nascido Joannes Chrysostomus Wolfgangus
Theophilus Mozart em 27 de janeiro de 1756 em Salzburgo, Áustria. Posteriormente passou a adotar uma forma reduzida de seu nome, Wolfgang
Amadeus Mozart. Era o filho caçula do casal Johann Georg Leopold Mozart
(1719-1787) e de Anna Maria Pertl (1720-1778). O casal se casou em 1747 e
tiveram sete filhos, sendo que cinco morreram ainda na infância, restando
apenas Maria Anna (1751-1829) e Wolfgang.
Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791).
Leopold era um violinista e compositor com algum prestígio na região. Seu
cargo mais importante fora o de vice-mestre de capela do príncipe-arcebispo de
Salzburg em 1763. Já sua esposa, era de família burguesa, embora a Família
Perlt já não fosse tão abastada assim na época, mas a família Mozart dispôs de
certo conforto. Tanto Maria Anna, conhecida mais pelo apelido de Nannerl e o pequeno
Wolfgang mostraram logo cedo interesse pela música. Leopold aproveitou tal
interesse e logo cedo pôs a ensinar aos filhos a tocarem instrumentos; Nannerl
aos nove anos, já se mostrava uma pianista promissora, e já sabia também tocar
violino. De fato, fora Nannerl que ensinou Wolfgang a aprender a tocar piano,
isso enquanto o pai estava trabalhando ou fora de casa, já que o mesmo dedicava
várias horas a está ao lado dos filhos os ensinando. Assim, aos cinco anos de
idade, Wolfgang já era um prodígio.
A carreira precoce do "menino-prodígio" começou ainda aos cinco
anos, Leopold estava convencido que seus filhos poderiam se tornar grandes
músicos e isso poderia lhe render muito dinehiro, então decidiu levá-los numa
turnê de apresentações. Leopold que possuía alguns contatos, começou a se
comunicar com estes, dizendo que seus filhos eram verdadeiras crianças
talentosas, isso atraiu o interesse de organizadores de eventos musicais, assim
em 1762, ainda com cinco anos, Os Mozart se apresentaram em Munique, capital da
Baviera, na época pertencente ao Sacro Império Romano-Germânico, hoje Alemanha.
De Munique, eles seguiram para Viena na Áustria e depois se apresentaram em
outras cidades do país. Em duas ocasiões, os irmãos Mozart foram honrados pela
possibilidade de se apresentarem para os monarcas austríacos, a imperatriz Maria
Teresa e o imperador Francisco I.
Pintura de Mozart por volta de seus cinco ou sete anos. O menino prodígio.
Em 1763, os irmãos voltaram a se apresentar, e dessa vez, Wolfgang além
de tocar piano, tocava cravo e violino. Mesmo sendo, jovem, alguns relatos
sugerem que ainda nessa faixa, Wolfgang já teria composto suas primeiras
músicas, embora alguns historiadores aleguem que tais músicas teriam de fato
sido escritas pelo seu pai, na tentativa de colaborar com a construção do mito
do "menino-prodígio". Eles continuaram a se apresentando pela
Áustria, Sacro Império (Alemanha), França, Inglaterra, Holanda, Suíça e posteriormente
na Itália.
Passaram cerca de três anos viajando por estes países em sua turnê. Ao
longo de suas viagens, Wolfgang e Nannerl adoeceram várias vezes, algo que
comprometeu os planos da turnê, atrasando a viagem em semanas ou até mesmo um
ou dois meses. Na Inglaterra, teria conhecido Johann Christian Bach, um dos
três filhos músicos de J. Sebastian Bach. Depois desta turnê, eles retornaram
para Salzburgo e passaram cerca de um ou dois anos em casa, antes de partirem
em uma nova turnê, agora pela Itália, dessa vez foram apenas pai e filho. A
turnê na Itália começou em 1769, nessa época com treze anos, Mozart já era
conhecido como pianista, cravista e violinista e já era um compositor de fato.
A viagem pela Itália assim como fora na Inglaterra, foram de suma importância
por terem influenciado cada uma de seu jeito o estilo musical do artista, fato
este que diferente de Bach, Mozart, chegou a compor óperas, com base no estilo
italiano, tido como o mais apreciado da Europa, seguido, depois pelo francês e
austríaco.
Pintura da Família Mozart. Na época sua mãe já havia falecido.
Por volta de 1773, Mozart já um tanto cansado de ficar viajando pela
Europa em turnês obrigadas pelo seu pai, decidiu ficar em Salzburgo e
desenvolver sua carreira por conta própria, embora que de forma esporádica
fosse convidado a se apresentar em outra cidade ou em outro país. Nessa época,
Mozart tornou-se empregado do príncipe-arcebispo Colloredo, com quem manteria a
parceria até 1777. Nesse meio tempo, ele continuou a compor, de fato começou a
compor suas primeiras óperas e peças musicais, além de vários outras
composições para piano, cravo, violino, etc. Mozart, tentou em 1774, de forma
infrutífera arranjar um cargo na Corte, em Viena, capital do país.
Em 1777, ele rompeu com Colloredo, e passou os dois anos trabalhando de
forma autônoma, mas isso acabou não dando certo. Em 1778, sua mãe faleceu, e
isso o abalou profundamente. No ano seguinte, voltou a trabalhar para o
príncipe-arcebispo, mas por poucos meses, quando a recebeu a noticia que sua
ópera Idomeneu (escrita em 1781,
baseada na personagem da mitologia grega, Idomeneo, o qual havia sido um rei de
Creta durante a Guerra de Tróia), era um sucesso em Munique. Convencido que a
fama não tardaria a chegar, deixou o cargo de músico da corte em Salzburgo,
para quem trabalhava para o príncipe-arcebispo e se mudou de vez para Viena,
onde passaria os próximos dez anos.
Uma das questões interessantes sobre Mozart era o fato de ele nunca
chegou a ser um "super astro" como nos dias de hoje, por muito tempo
foi relegado a um status secundário. Durante suas turnês na infância ao lado
de sua família, ele ganhou fama, por ser o "menino-prodígio", algo
inegável de fato, mas quando cresceu, deixou de ser esse menino e se tornou
apenas mais um entre tantos outros músicos da época. A competitividade no
ramo musical na Europa dos séculos XVII ao XIX era imensa, fato esse que Bach
por muito tempo não foi um músico popular, e ganhou fama após a morte, e o
próprio Beethoven, só começou a ser um nome de destaque perto dos trinta anos.
Dessa forma, Mozart acabou deixando de ganhar dinheiro e em alguns casos
sua situação financeira ficou bem grave, devido aos custos de algumas viagens
que fizera para se apresentar, mas não fora bem recompensado da forma esperada. Durante sua longa estadia em Viena, se tornou músico da corte, embora que
cargo fosse de baixo prestígio, algo que lhe gerou insatisfação como fora
visto, nas cartas que escrevia para seu pai e sua irmã. Nessa época, ele se
tornou amigo da Família Weber e chegou a se apaixonar por duas das três filhas
do casal, sendo que tivera um caso amoroso rápido com Aloysia e posteriormente
em 1782, casou-se de fato, com Constance Weber (1762-1842), com quem tivera
quatro filhos e duas filhas.
Constanzia Weber, esposa de Mozart.
Os irmãos Mozart, Carl e Franz.
Posteriormente se tornou amigo do barão Van Swieten, grande admirador da
música erudita, a quem apresentou a Mozart, os trabalhos de G. F. Handel e J.
S. Bach. Em 1784, tornou-se membro da Franco-Maçonaria. De 1785 a 1787, sua
carreira se mantivera estável, porém era pouco rendosa. Os gastos aumentavam
com o crescimento da família, e Mozart começou a recorrer a empréstimos.
Posteriormente, sua carreira voltou a maré de azar. Mozart dizia que a Corte e
a sociedade de Viena não reconheciam seu talento, que ele era uma estrela
ofuscada pelo pensamento cinzento da sociedade.
"Entre abril e junho de 1789, viajou para Dressden, Leipzig e
Berlim, onde foi recebido pelo rei da Prússia. Frederico Guilherme II. Após um
período pouco produtivo, em 1791 sua atividade criadora teve uma extraordinária
renovação. Mozart esperava que a estréia de A
flauta mágica relançasse sua carreira, mas isso não ocorreu, pois morreu em
5 de dezembro, deixando o seu Requiem
inacabado". (Grande Enciclopédia
Larousse Cultural, 1998, p. 4110).
Além de A flauta mágica que ele
chegou a concluir, Mozart também concluiu a ópera a Clemência de Tito, a qual se tornara bem popular em Praga (hoje
capital da República Checa). A flauta
mágica, a qual de início não fora bem recebida, depois se tornou um
sucesso, mas quando isso aconteceu, o artista já havia falecido. Já o Requiem, acabou ficando inacabado, e de
acordo com os estudiosos, se tivesse sido concluído, teria sido uma grande
obra.
Capa do livreto de A flauta mágica, 1791.
A respeito de sua morte, ainda é incerto a sua causa. Quando, o mesmo
faleceu, várias teorias surgiram, dentre algumas, sugeriam suicido por
envenenamento, outras diziam que ele havia sido envenenado, e outras cogitaram
febre tifóide, febre reumática, etc. De fato, não se tem uma conclusão
derradeira sobre as causas de sua morte. Um estudo recente, aponta que Mozart
teria sido vitima de infecção bacteriológica, daí a febre ter sido um dos
sintomas, já que é um recurso utilizado pelo organismo para se defender do
contágio invasor. Como naquela época ainda não existiam antibióticos, sua vida
fora ceifada aos 35 anos.
"Em sua produção musical, Mozart, pela perfeição de sua escritura,
pela riqueza, originalidade, acuidade e sensibilidade, transcendeu todos os
esquemas estabelecidos pelos antecessores e contemporâneos. Assimilou as mais
diversas influências (sinfonias concertantes francesas, singspiel alemão, música de câmara vienense, música dramática
italiana) com uma extraordinária facilidade e realizou uma síntese que revela
toda a sua genialidade". (Grande
Enciclopédia Larousse Cultural,1998, p.
4110).
Sua obra fora abrangente, ele deixou cerca de 50 sinfonias, dentre as
quais Haffner (1782), Linz (1783) e Praga (1786) e algumas outras que não fora nomeadas ou numeradas. Compôs
várias serenatas e divertimentos, marchas, danças e 27 concertos para piano (um
para dois pianos e um para três pianos), 5 concertos para violino (1775), dois
para flauta (1778), um para flauta e harpa (1778), um para clarinete, oboé e
fagote, etc.
Na música de câmara, deixou 23 quartetos para cordas, seis quintetos para
cordas, dois quartetos para piano e cordas, além de outras 30 sonatas para
piano e violino. Deixou, 16 missas, além de algumas cantatas e oratórios.
Na ópera, alguma de suas principais obras foram: Idomeneu (1781), O rapto do
Serralho (1782), As bodas de Fígaro (1786),
Don Giovanni (1787), A flauta mágica (1791) e a Clemência de Tito (1791). Compôs também
outras óperas e cerca de 40 árias de concerto para soprano, Lieder e cânones. Mozart pode não ter tido a glória e a fama que esperou em vida, mas
inegavelmente fora um compositor prolífico e grandioso. Sua arte fora marcante.
"Mozart
foi um meteoro que passou, brilhou e marcou".
Leandro Vilar
O Surdo
"No paraíso eu vou ouvir!".
Ludwig van Beethoven
Ludwig
nasceu como a terceira geração de músicos da Família Beethoven, embora que seu
bisavô Michael van Beethoven (1684-1749) foi um comerciante flamengo, o qual
após entrar em falência, vendeu tudo e se mudou para Bonn no Sacro Império
(Alemanha). Michael era casado com Maria e tivera três filhos com esta, sendo
que um morreu, sobrevivendo apenas
Ludwig e Cornelius (1708-1764), o qual se tornou fabricante de velas e
posteriormente um rico comerciante de Bonn, tendo casado com uma viúva rica da
cidade.
Ludwig van Beethoven (1770-1827).
Seu avô Ludwig (1712-1773) nasceu em Malines na Bélgica, e logo cedo
ingressou na vida artística. Estudou de 1717 a 1725 na Schola Cantorum (Escola de Canto) da Igreja de St. Rombaut,
formando-se como músico, logo encontrou emprego em várias igrejas, como diretor
de corais, pianista, organicista, violinista, além de assumir outros cargos. Em
1733 a pedido do eleitor Clemens August, arcebispo de Colônia, mudou-se para o
protetorado, se estabelecendo na cidade de Bonn, onde se tornou mestre-de-capela
(kapellmeister), espécie de diretor
musical de uma igreja ou de uma corte. Cargo que mantivera até o final de sua
vida. Além disso, também fora um pequeno comerciante de vinho, legado de seu
pai. Casou-se em 1733 com Maria Josepha Poll (1714-1775), a qual lhe dera três
filhos, sendo que apenas um sobreviveu, Johann van Beethoven (1739/40?-1792). O
casamento não fora alegre, dois filhos morreram ainda em tenra idade, e Maria
revelou-se uma alcoólatra desenfreada, o que obrigou ao seu marido enviá-la
para um convento, onde viveu até o fim da vida, daí o fato de Beethoven mau
citar em seus diários a sua avó.
Ludwig desamparado com a separação forçada de sua esposa, criou por conta
própria o jovem Johann. Ludwig, não aceitou se divorciar de sua esposa embora
seu estado de separação, e também não tomou nenhum outra mulher para viver
consigo. Educou rigidamente seu filho, o qual também se tornou músico.
"Johann van Beethoven recebera educação elementar e fora colocado
numa classe preparatória do Colégio dos Jesuítas, onde não logrou qualquer
progresso. Aos 12 anos, ingressara na capela da corte como soprano. Seu pai
ensinara-o a cantar e a tocar o cravo, e também aprendera piano com alguma
competência". (SOLOMON, 1987, p. 31).
Johann van Beethoven casou-se com Maria Magdalena Kaverich (1746-1787). Ele
a desposou em 1767, a mesma se encontrava no estado civil de viúva. Maria havia
se casado aos 15 anos com Johann Leym, criado do eleitor Trier. Ela tivera um
filho dele aos 16 anos, mas perdeu a criança no mesmo ano, e quando fizera 19
anos, seu marido morreu. Posteriormente conheceu Johann van Beethoven, e
casou-se com o mesmo dois anos depois. Seu futuro sogro era contra o casamento,
e a mãe da noiva, também não era a favor do matrimônio dos dois.
Os dois tiveram seu primeiro filho em 1769, chamado Ludwig Maria, o qual
faleceu seis dias após ter nascido. A data da morte de seu irmão se tornaria um
dilema na vida de Ludwig por vários anos, o qual acreditou não se sabe porque,
que teria nascido em 1772 e não em 1770, Ludwig por vários anos teimou com a
família e os amigos, que a data de seu nascimento era incorreta. Além dele,
seus pais tiveram mais cinco filhos, Caspar Anton Carl (1774-1815), Nikolaus
Johann (1776-1848), Anna Maria Franziska (1779), Franz Georg (1781-1783) e
Maria Margaretha Josepha (1786-1787).
Outro dilema que envolveu o nascimento de Ludwig, diz respeito a um boato
de que ele era um filho bastardo, que na realidade, sua mãe tivera um caso com
o rei Frederico Guilherme II. Não se sabe ao certo, de onde tal boato surgiu,
mas passou a ser disseminado por volta de 1810. Beethoven nunca deu muita
atenção a este boato, algo que lhe fez levar algumas criticas por parte de
amigos e familiares, que diziam que ele não estava defendendo a honra de sua
falecida mãe.
A situação do jovem Ludwig piorou ainda na infância. Quando seu avô
morreu em 1773, seu pai sentiu profundamente a perda dele, algo que mudou seu
comportamento pelo resto da vida. Johann tornou-se indisciplinado com seu
trabalho, mentiroso e caiu no alcoolismo. Foi sua mãe quem tomou a
frente dos negócios da família de quem Johann herdou o comércio de vinho do
pai.
"A morte de seu pai trouxe à tona os sentimentos hostis de Johann.
(Não foi, certamente, uma desesperada necessidade de dinheiro que o levou a
empenhar o retrato do falecido pai.). A mediocridade de sua própria carreira
deve ter demonstrado a Johann o abismo
entre suas capacidades e as de seu pai". (SOLOMON, 1987, p. 33).
Diferente de Bach e Mozart, Beethoven não contou com grande apoio de seu
pai para inseri-lo no ensino musical, Beethoven teve que trabalhar duro por
conta própria para desenvolver seu talento, algo alcançado tardiamente, se
comparado a Bach e Mozart.
Ao longo da vida Beethoven desenvolveu uma grande admiração pela figura
de seu avô, já que seu pai tornou-se um alcoólatra e um péssimo exemplo para a
família, assim como sua mãe dizia. De fato, Johann tentou ser um bom professor
para o filho e um bom pai, mas fracassou em ambas as tentativas.
O único professor que de fato ele tivera, propriamente falando, foi Christian Gottlob Neefe (1748-1798), o qual se tornou organicista da corte em
Bonn em 1779, e tornou-se professor de Ludwig de 1781 até 1792. Neefe
acreditava que Ludwig tinha tudo para ser um grande músico, então começou a
instruir o menino, Ludwig passava horas e horas tocando piano, cravo, violino e
outros instrumentos. Neefe, também apresentou ao jovem os trabalhos de Bach, os
quais Beethoven tivera contato a primeira vez, por volta de seus treze anos,
fato que ele nutriu uma grande admiração pelo falecido músico. Nessa época ele
também compôs suas primeiras obras, mas não foram bem recebidas pelo público.
Em 1786 a situação financeira da família começou a piorar novamente, ele
como irmão mais velho, sentiu-se obrigado em ajudar nas despesas, já que seu
pai já não fazia isso como de costume, devido ao seu alcoolismo. Beethoven,
passou a tocar piano, violino ou cravo em festas, bailes, igrejas, escolas,
apresentações, etc, para conseguir dinheiro a fim de ajudar nas despesas da
casa.
"Escreveu Schiller: "O próprio Beethoven, por via de regra, não
falava de sua vida de criança e, quando o fez, pareceu vacilante e
confuso". (SOLOMON, 1987, p. 42).
Em 1789, aos 19 anos, ingressou na Universidade de Bonn, Beethoven estava
decido em seguir a carreira musical assim como fizeram seu avô e seu pai, mas
principalmente devido ao primeiro, o qual o via como um herói.
No ano de 1791 uma triste notícia o acometeu, Wolfgang Amadeus Mozart, a quem
nutria uma grande admiração e o sonho de ter sido seu discípulo, havia
falecido. Com a morte de Mozart, Beethoven decidiu procurar outros mestres
para lhe ensinar, assim, em 1792, ele partiu para Viena, onde estudou com J.
Hadyn e depois com A. Salieri. No mesmo ano seu pai faleceu.
"Beethoven estava agora envolvido no trabalho do mundo e procurava
nicho firmemente delineado em sua comunidade, esperando estabelecer para si um
lugar determinado na sociedade". (SOLOMON, 1987, p. 52).
Entre a movimentada sociedade da Viena dos fins do século XVIII, Ludwig van Beethoven começou a ganhar destaque. Tendo se mudado em 1792, passou a ganhar
reconhecimento nos fins de 1793, quando conseguiu tocar em alguns de suas
apresentações, obras suas, já que até então, tocava obras de Mozart, Bach,
Hadyn, Salieri, dentre outros.
Pintura de uma das ruas de Viena no final do século XVIII.
A música que Beethoven criaria pelos anos seguintes, teria uma forte
influência romântica advinda da literatura, especialmente da poesia de
Friedrich Schiller e das ideias iluministas, que despontaram em 1789 com a
Revolução Francesa. De fato, Beethoven apoiava os ideais da revolução, e
posteriormente o próprio imperador Napoleão, a quem dedicou o concerto número
cinco para piano, intitulado Imperador.
"Beethoven atingiu aos poucos a perfeição até hoje incomparável de
suas sinfonias, concertos e sonatas. Em 1794, porém, uma publicação destinada à
critica musical já o incluía em um ranking dos 40 mais brilhantes músicos
daquele tempo, sem economizar elogios ao jovem promissor: "Um gênio
musical que escolheu Viena como residência nos dois últimos anos. [Beethoven] é
admirado pela velocidade incomum de suas mãos sobre o teclado, sendo
impressionante como ele domina as maiores dificuldades com a maior facilidade.
Ele parece já ter ingressado no santuário da música, distinguindo-se por sua
precisão, sentimento e gosto; o que faz com que sua fama aumente
consideravelmente a cada dia"". (PORTELA, 2009, p. 52).
Em 1795 ele se apresentou em grande concerto solo em Viena, no ano
seguinte foi convidado a se apresentar na França, Inglaterra e Alemanha, a sua
turnê durou dois anos. E isso lhe rendeu fama imediata. O jovem menino que
havia trabalhado duro, finalmente era reconhecido pelo seu esforço.
Beethoven aos 33 anos. Dono de uma carreira promissora e de um futuro nublado.
"Em um primeiro momento, Beethoven ganhou a sincera simpatia do
público; logo, conquistou o respeito até dos críticos mais exigentes;
subitamente, passou a ser verdadeiramente idolatrado". (PORTELA, 2009, p.
52).
Se por um lado ele galgava cada vez mais em sua carreira profissional,
sua vida pessoal e social não era uma das melhores. Amigos e outros conhecidos,
em relatos da época, diziam que seu gênio era tempestuoso, impulsivo, que as
vezes, tendia a se isolar em seu estúdio e ficava se falar com ninguém até
mesmo por dias, apresentando um ar de antissocial.
Gravura retratando o estúdio de Beethoven. Descrito por seus amigos como bem bagunçado e sujo.
Outro dilema enfrentado pelo
jovem promissor, foi o amor. Beethoven não chegou a se casar ou a deixar
herdeiros, todos os seus romances foram fracassos e frustrações,
algo curioso, já que o mesmo havia sido um expoente do Romantismo no campo
musical. A única mulher por quem ele realmente se apaixonou, não se conhece o
nome, só se conhecem as cartas que ele escreveu para ela, cartas escritas
durante o mês de julho, onde ele refere-se a ela como Minha Amada Imortal.
Beethoven não revelou o local, ano e o nome desta mulher. Embora tenha sido um
romântico frustrado, ele conheceu muitas mulheres em vida e as flertou, mas a
mulher que lhe tomou o coração ainda é um mistério na História. Possívelmente ela fosse casada e alguém importante da sociedade, por conta disso, para evitar escanda-los para si e ela, Beethoven decidiu omitir seu nome.
E para completar este período de desânimo, em 1796, reclamando de dores
no ouvido, ele foi consultar um médico da cidade, o médico diagnosticou que
ele tinha uma obstrução do canal auditivo, algo que com o tempo o levaria a
surdez completa. Hoje sabe-se que ele possuía uma doença degenerativa que lhe
tirou a audição.
Para um jovem com seus 26 anos saber que ficaria surdo e ainda mais sendo
um músico, isso foi uma catástrofe. Inconformado com o diagnóstico ele passou
a consultar outros médicos e a tentar tratamentos para curar seu problema, mas à medida em que os anos passavam sua surdez ia se agravando. Beethoven, como
deixou escrito em seu diário e em cartas para os amigos, pensou em até mesmo
cometer suicídio. Quando havia iniciado sua cavalgada para a glória, o futuro
se revelou cruel. Como um jovem com um futuro promissor, poderia conviver
com esta terrível e inevitável situação?
"Devo viver como um exilado. Se me acerco de um grupo, sinto-me
preso em uma pungente angústia, pelo receio que descubram meu triste estado. E
assim vivi este tempo em que passei no campo... Mas que humilhação quando, ao
meu lado, alguém percebia o som longínquo de uma flauta e eu nada ouvia! Ou
quando alguém comentava sobre o canto de um pássaro e eu nada escutava! Esses
incidentes levaram-me quase ao desespero e pouco faltou para que, por minhas
próprias mãos, eu pusesse fim à minha existência. Somente a arte me
deteve". Trecho do testamento de Beethoven. (PORTELA, 2009, 54).
Ele dizia que sua paixão pela música era tão grande que estava decidido
que enquanto ainda lhe restasse audição ele continuaria compondo até onde fosse
possível. Beethoven contou com o apoio de amigos como a Família Brunswick, o
arquiduque Rodolfo, o príncipe Lichnowsky e o violinista Schuppanzigh.
No inicio do século XIX, Beethoven se tornou ainda mais famoso. Em 1802,
ele escreveu uma carta para seus dois irmãos, Caspar e Nikolaus; a carta ficou
conhecida como Testamento de
Heilingenstadt, devido a cidade de onde escrevera. Nesta carta, ele falou
sobre sua doença, sobre sua fama, sobre sua frustração, dilemas, mágoas e
dúvidas, até mesmo na tentativa de suicídio que tentou cometer anos antes.
Hoje, a carta é um dos documentos mais importantes deixados pelo artista.
Testamento de Heilingenstadt, 6 de outubro de 1802.
Os anos que se seguem de 1802 a 1812 foram bem produtivos para a carreira
de Ludwig, ele compôs várias sinfonias para piano, sonatas, concertos e até
mesmo óperas. Tal década é chamada por alguns historiadores de período áureo ou
período heróico, uma alusão a exaltação do heroísmo feita por Beethoven em seus
trabalhos. Conheceu o importante e renomado escritor e pensador Johann Wolfgang von
Goethe (1749-1832), amigo de Friedrich Schiller (1759-1805) e do filósofo Georg
W. F. Hegel (1770-1831). Fora através desta rápida conversa que os dois
trocaram assuntos acerca do Romantismo, de poesia, literatura, música e da vida
política européia, a qual estava por ser abalada pelo reinado de Napoleão. No
passado, Beethoven havia aclamado as iniciativas de Bonaparte, mas a medida que
o mesmo prosseguia com seu reinado e sua fase de guerras pela Europa, isso
gerou-lhe uma crise de crença, o homem que ele admirava se mostrou bem
diferente do que ele pensava ser.
Após 1812 sua surdez progrediu consideravelmente e ficava cada dia mais
difícil falar com ele sem gritar. Em 1814, Beethoven se afastou dos palcos, seu
estado não o permitia mais ir tocar piano ou outro instrumento em concertos e
outros espetáculos. Passou os anos seguintes trabalhando na composição de
outras obras.
"A dissolução do estilo heróico não ocorreu subitamente ou mesmo de
um modo espetacular; tampouco se pode ter a certeza de que Beethoven estava
consciente do processo que vinha ocorrendo". (SOLOMON, 1987, p. 305).
Em 15 de dezembro de 1815, seu irmão Caspar Carl, faleceu vitima de tuberculose,
deixando esposa e um filho de nove anos, chamado Karl. Ludwig tomou a guarda do
sobrinho para si, contudo, sua cunhada, Johanna não quis abrir mão do filho,
assim eles passaram os cinco anos seguinte, lutando na Justiça pela guarda da
criança, até que Ludwig saiu vitorioso. Contudo, como apontam os relatos, a
relação entre tio e sobrinho não era uma das melhores, dizia-se que Ludwig era
muito protetor, tal fato ficou bem claro quando em 1826, Karl, tentou cometer
suicídio. Beethoven passou cerca de seis anos em um hiato de crise criativa e
pessoal, entrando em depressão.
A partir de 1818, ele retomou o ânimo e voltou a compor, foi nesse
período que compôs muita de suas grandes sonatas e até o fim de sua vida ele
ainda surpreenderia o mundo mesmo estando praticamente surdo. Entre 1822 a 1824 baseado no poema Ode
à Alegria de Friedrich Schiller, Beethoven compôs o que é para muitos sua
obra prima, a Nona Sinfonia.
Em 1825, Beethoven foi convidado pela Sociedade Filarmônica de Londres
para supervisionar uma série de concertos dedicados as suas obras, contudo ele
acabou adoecendo em abril do mesmo ano. O médico lhe sugeriu que deixasse o ar
sujo e o barulho da cidade e se retirasse para o campo, ele se mudou para
Baden, mas continuou a viajar para Viena até outubro. Sua saúde ainda continuou
debilitada pelos dois anos seguintes. E para piorar, ele cada vez mais se
desentendia com seu sobrinho o qual tentou cometer suicídio em 1826.
Em 1826, sua saúde voltou a se agravar ainda mais. Seu irmão, Nikolaus
Johann, escreveu que Ludwig estava com falta de apetite, logo mal se
alimentava, queixava-se de muita sede, e ao invés de beber água, tomava vinho,
o que acabou lhe gerando diarreia. Ele também se queixava de dores abdominais
(possivelmente cólicas), e seus pés ficaram inchados, retendo líquido.
Preocupado com a condição do irmão, Nikolaus decidiu levá-lo de volta a Viena
para se tratar o quanto antes. O médico de Beethoven, o dr. Wawruch, disse o
seguinte acerca de sua condição em 5 de dezembro.
"Encontrei Beethoven atacado com graves sintomas de inflamação dos
pulmões. Tinha o rosto congestionado, cuspia sangue, a respiração ameaçava
sufocá-lo e uma pontada na ilharga fazia com que ficar deitado lhe fosse um
insuportável tormento".
O médico conseguiu tratá-lo naquele momento lhe aliviando os sintomas,
mas Beethoven sentia que a morte estava perto, e não tardaria a morrer. Em 26
de março de 1827 ele veio a falecer, a causas de sua morte ainda não são
certas, alguns sugerem que ele padecia de tuberculose, cirrose, hepatite, tifo,
ou teria se envenenado com os medicamentos, os quais na época se usava chumbo,
altamente nocivo ao organismo.
De qualquer forma, quando morreu aos 57 anos em Viena, alguns amigos e
familiares, como seu irmão, sua cunhada Johanna e seu sobrinho Karl, estavam
na hora do falecimento. O funeral de Beethoven foi assistido por mais de vinte
mil pessoas que seguiram seu caixão como em uma procissão pela cidade. Diferente
de Mozart e Bach que ganharam mais fama após a morte, Beethoven quando faleceu,
já era um gênio da música, um ícone, um mestre, um ídolo.
Túmulo de Beethoven, Viena, Áustria.
"Em 1852, W. de Lenz propôs a divisão em três estilos para o estudo
de sua obra. A primeira época (até mais ou menos 1804) sofre influência de
Haydn, Mozart e Clementi; a segunda já revela um pensamento mais amplo e mais
subjetivo; a terceira, a partir, de 1819, mostra uma forma livre e uma
linguagem audaciosa". (Grande
Enciclopédia Larousse Cultural, v. 3, São Paulo, Nova Cultural, 1998, p. 703).
Seu trabalho fora monumental e revolucionário. Beethoven deixou 32
sonatas para piano, compostas de 1795 a 1822, onde se destacam: Patética, Appassionata, Ao luar, Hammerklaiver (homenagem ao kaiser); 10
sonatas para piano e violino; 5 sonatas para piano e violoncelo; 17 quartetos
para cordas (1800-1826); 5 concertos para piano e orquestras (1795-1809); 9
aberturas (entre as quais Coriolano, Fidelio, Ruínas de Atenas e Prometeu);
2 balés; 8 cantatas; 24 lieder; 2 missas (em dó e Missa Solemnis); 6 óperas (A
amada longínqua (1816), três versões de Fidelio
(1805-1814)); 5 trios para piano, violino e cello; 3 trios para violino, viola
e cello; 15 variações para piano, violino, violoncelo, etc; 9 sinfonia, dentre
as quais destacam-se: número 3 "Heróica", número 5 "Do
Destino", número 6 "Pastoral", número 7 "Movimento" e
a número 9 "Coral" ou "Ode à Alegria". Além de uma outra
gama de trabalhos não enumerados e alguns já perdidos nos dias de hoje.
A Quinta Sinfonia composta entre 1804 a 1808 em Dó menor, imortalizou na
história quatro notas que ficariam bem conhecidas "tan tan tan
taaan!". Já a Nona Sinfonia, baseada no poema de Schiller, é considera sua
obra máxima, e quando fora escrita entre 1822 e 1824, sua surdez já estava em
um estágio bem avançado. Hoje, a Nona Sinfonia, é o hino oficial da União Europeia,
e é considerado por alguns como hino à humanidade.
"Pondera Leonardo Martinelli, compositor, critico musical e
professor de história da música na UniFMU-FAAM. Segundo Martinelli, antes de
Beethoven, a música tinha necessariamente uma função social a cumprir, e a
tarefa do compositor era criar uma música adequada a uma certa ocasião, fosse
ela uma reunião entre amigos, um casamento ou um concerto público. "A
partir dele, a música deixa de ser tratada como mero utensílio para, enfim,
virar arte em seu sentido mais pleno. Em outras palavras, sua atitude retira o
compositor e uma posição de serviçal e eleva-o a de artista",
argumenta". (PORTELA, 2009, p. 55).
"As
mágoas, paixões, ilusões, dilemas, sonhos e dúvidas de Beethoven soaram em um
grito abafado aos seus ouvidos. Mas ecoaram em uma melodia grandiosa aos
ouvidos do mundo".
Leandro Vilar
NOTA: A Alemanha só se tornou uma nação unificada em 1870, antes disso, por vários séculos, fora um conglomerado de pequenos Estados, reunidos sob o Sacro Império Romano-Germânico.
NOTA 2: O bisavô de Beethoven, era natural de Flanders, região no norte da Bélgica, onde chama-se os nascidos ali, de flamengos.
NOTA 3: Diferente de Bach e Beethoven, Mozart fora enterrado em uma cova simples, sem nenhuma pompa.
NOTA 4: Existe um filme inspirado na vida de Mozart, intitulado Amadeus (1984), do diretor Milos Forman e roteiro de Peter Shaffer.
NOTA 5: Sobre Beethoven, existem os filmes: Minha Amada Imortal (1994) e O Segredo de Beethoven (2007).
NOTA 6: Quem tiver mais interesse sobre a vida e obra destes três artistas, recomendo: Beethoven, de Maynard Solomon; Wolfgang Amadeus Mozart, de Richard Baker e Johann Sebastian Bach de Karl Geiringer.
NOTA 7: Nas páginas da Wikipédia, referente a estes artistas, está disponível links para se ouvir trechos de suas músicas. No You Tube, há videos com apresentações de suas obras.
Referências Bibliográficas:
SOLOMON, Maynard. Beethoven. Tradução Álvaro Cabral, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1987.
PORTELA, Carine. Dôssie: Beethoven. Revista BBC História. v. 12, São Paulo, Tríada, 2009. p. 50-55.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 3, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 17, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
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