As raízes de uma planta que hoje é o Brasil: os
índios e o Estado-nação na era Vargas
Seth
Garfield
Bowdoin College
Bowdoin College
OBS: Os grifos e as imagens foram escolhidos por mim, independente do autor.
Este
artigo analisa as construções culturais por meio das quais o Estado Novo
(1937-1945) buscou dominar a população indígena. Propulsor no processo da
integração nacional brasileira, o Estado Novo foi marcado pela centralização do
poder federal, pela ampla intervenção estatal na economia e na sociedade e por
um programa nacionalista. O exame do modo como funcionários do Estado e
intelectuais criaram e disseminaram noções de indianidade, e de como os índios
nelas se engajaram, abre uma perspectiva interessante sobre o processo de
formação do Estado nesse momento crítico da história brasileira. Inspirado
em The Great Arch de Philip Corrigan e Derek Sayer, este
artigo repensa análises das relações entre o povo indígena e o Estado
brasileiro.
Em
seu estudo sobre a formação do Estado inglês como uma "revolução
cultural", Corrigan e Sayer examinam o papel do Estado ao restringir o
comportamento social e moldar a vida dos seus cidadãos. No entanto, como eles
apontam, o poder do Estado não só restringe e reprime, como por vezes fortalece
e capacita seus súditos2.
Nem o martírio descrito nas histórias institucionais, nem o plano magistral de
um Estado Leviatã de análises revisionistas, a política indígena durante o
Estado Novo delineia-se como um projeto ambíguo moldado por fatores históricos
e atores sociais3.
Os índios emergem não como cifras, mas como interlocutores sociais que seguem
e/ou contestam a política estatal, criando novas possibilidades4.
VARGAS
E OS ÍNDIOS
Em
agosto de 1940, o presidente Getúlio Vargas visitou a aldeia dos índios Karajá
na Ilha do Bananal, no Brasil Central. Foi o primeiro presidente brasileiro a
visitar uma área indígena, ou o Oeste da nação nesse sentido. Três anos antes
ele havia dissolvido o Congresso e abolido todos os partidos políticos,
proclamando um Estado Novo compromissado com o desenvolvimento e a integração
nacional. Como parte de seu projeto multifacetado de construção de um Brasil
novo - mais independente economicamente, mais integrado politicamente e
socialmente mais unificado, Vargas voltou-se para o valor simbólico dos
aborígenes. Diferentemente de "plantas exóticas" do liberalismo
econômico e do Marxismo, os quais o regime autoritário nacionalista procurou
extirpar o solo brasileiro mediante repressão política, censura e intervenção
federal em assuntos regionais, os índios seriam defendidos por Vargas por
conterem as verdadeiras raízes da brasilidade.
Getúlio Vargas e um índio Karaká, trocam cumprimentos. |
Os
Karajá, então sob a responsabilidade de um órgão federal, o Serviço de Proteção
aos Índios (SPI), receberam a delegação presidencial com uma grande cerimônia.
Eles apresentaram rituais "tradicionais" e cantaram o Hino Nacional
diante da bandeira brasileira e Vargas, por sua vez, distribuiu facas,
machadinhas e ferramentas para os índios. Consoante com sua imagem de "Pai
dos Pobres", o presidente segurou um bebê Karajá nos braços. Depois de
explorar a Ilha, Vargas manifestou o desejo de reconhecer o território dos
"Xavante extremamente ferozes" que habitavam as redondezas. Da
segurança de seu avião, Vargas viu, através de binóculos, uma aldeia Xavante
não contactada. Encorajado por essa oposição potencial, o ilustre visitante
esboçou seu plano para o Oeste. Vargas prometeu distribuir terras para os
índios e caboclos que viviam na região. Ao "fixar o homem
à terra", o Estado extirparia as raízes do nomadismo, convertendo índios
e sertanejos em cidadãos produtivos. O SPI iria doutrinar os
índios, "fazendo-os compreender a necessidade do trabalho"5.
A
viagem de Vargas ao Centro-oeste, arquitetada para se assemelhar às ousadas
expedições dos bandeirantes no período colonial, não foi na verdade uma
aventura perigosa. As maravilhas da aeronáutica facilitaram o acesso a lugares
antes inacessíveis ao centro do poder estatal. Além disso, o Departamento de
Imprensa e Propaganda (DIP), encarregado de disseminar as diretrizes culturais
e ideológicas do Estado Novo, assegurou uma viagem tranquila. Um cinegrafista
do DIP acompanhou Vargas, filmando imagens que o regime autoritário
nacionalista procurou tornar relíquias: índios vigorosos, emblemáticos da força
inata dos nativos brasileiros; o "tradicionalismo" das comunidades
indígenas; a camaradagem entre índios e brancos; a bonomia do presidente, epítome
do homem cordial brasileiro; o longo braço do Estado estendendo-se ao sertão
para dar-lhe assistência6.
Os
índios, que representavam uma porcentagem minúscula da população brasileira
situada predominantemente nas fronteiras remotas, foram de repente convocados
para o palco da política. Diferentes fatores provocaram o seu aparecimento: o
esforço do Estado Novo para consolidar o poder e redefinir o território nacional;
e as preocupações da elite sobre as origens da nação e a composição racial da
época. Tudo isso influenciaria uma formulação do Estado sobre a identidade
cultural dos índios e uma política para a sua integração.
A
MARCHA PARA O OESTE E OS ÍNDIOS
A
redescoberta do índio fez parte da campanha governamental para popularizar a
Marcha para o Oeste. Lançada na véspera de 1938, a Marcha para o Oeste foi um
projeto dirigido pelo governo para ocupar e desenvolver o interior do Brasil.
Nas palavras de Vargas, a Marcha incorporou "o verdadeiro sentido de
brasilidade", uma solução para os infortúnios da nação. Apesar do extenso
território, o Brasil havia prosperado quase que exclusivamente na região
litoral, enquanto o vasto interior mantinha-se estagnado - vítima da política
mercantilista colonial, da falta de estradas viáveis e de rios navegáveis, do
liberalismo econômico e do sistema federalista que caracterizaram a Velha
República (1889-1930). Mais de 90% da população brasileira ocupava cerca de um
terço do território nacional. O vasto interior, principalmente as regiões Norte
e Centro-oeste, permanecia esparsamente povoado. Muito índios, é claro, fugiram
para o interior justamente por estas razões. Mas os seus dias de isolamento,
anunciou o governo, estavam contados.
Propaganda da Marcha para o Oeste durante o governo do Estado Novo, após 1940. |
Sob
os cuidados do governo federal, afirmavam funcionários do Estado Novo, o
potencial do sertão não mais seria desperdiçado. A extração dos preciosos
recursos naturais e humanos do sertão asseguraria a prosperidade da nação. Como
observou Vargas, o Brasil não precisava olhar para além de seu próprio quintal
esquecido, "vales férteis e vastos" e "entranhas da terra, ...de
onde os instrumentos de nossa defesa e do nosso progresso industrial seriam
forjados"7.
Ao proporcionar escolas e serviços de saúde para índios e sertanejos, e redes
de comunicação e transporte, o governo consolidaria a nação como um todo
orgânico.
Vargas
incorporou o Brasil central e sua população ao repertório ideológico de seu
regime. O Estado havia arrumado o palco com pioneiros vigorosos e funcionários
valorosos8.
O espetáculo foi até acompanhado por música, variando desde uma composição de
Villa-Lobos até uma canção carnavalesca, de 1939, Marcha para o Oeste9.
Vargas era o personagem principal. Sem mesmo serem ouvidos, os índios receberam
o papel de heróis - embora necessitassem de uma adaptação.
Cândido Rondon |
A
campanha do regime Vargas para glamourisar o índio encontrou um ardente
colaborador em Cândido Rondon. Primeiro diretor do SPI, estabelecido em 1910,
Rondon entusiasmou-se com a atenção do Estado Novo para com os índios e seus
"problemas". Após a revolução de 1930, quando as alocações do
orçamento para o SPI foram reduzidas à metade, o órgão procurou cair nas boas
graças do regime Vargas; em 1944, o orçamento anual do SPI era o segundo mais
alto dos 35 anos de sua história10.
Prezando os índios e o seu valor ideológico para o Estado Novo, Vargas nomeou
Rondon diretor do Conselho Nacional de Proteção aos Índios (CNPI), um órgão
criado em 1939 para promover a conscientização pública sobre a cultura indígena
e a política estatal11. Num
discurso intitulado Rumo ao Oeste, difundido pelo DIP em setembro de 1940,
Rondon enalteceu as contribuições indígenas para a história brasileira, e o
inestimável papel do Estado para a sua integração. Amigo, guerreiro, confidente
e parceiro sexual, o índio deu assistência vital ao português em seu
estabelecimento no Brasil, afirmou Rondon. "Eles nos deram a base do novo
caráter nacional", exultou ele, "resistência, bravura, generosidade e
honestidade trazidos pelo índio à formação do nosso povo, eis o que
consideramos precioso, tanto no passado como ainda no presente"12.
Inventando
tradições, Rondon omitiu a deslealdade do índio para com o português e
minimizou atrocidades cometidas contra os índios13.
Por exemplo, ele distorceu a narrativa da guerra dos portugueses contra os
holandeses, ocorrida no século XVII no Nordeste. Ao citar relatos históricos,
Rondon exaltou que índios e caboclos confrontaram não só os holandeses como
também uma coroa portuguesa covarde, prestes a render-se e a entregar o sagrado
território brasileiro.
Apesar
da insistência de Rondon de que "foi essa a primeira manifestação heroica da nossa existência nacional", o índio teve um papel muito mais complexo
que o de proto-patriota durante a invasão holandesa. De fato, muitos índios
ficaram ao lado dos holandeses e, com a derrota e a expulsão dos
holandeses,
lamentaram o seu abandono14.
Estas verdades foram empurradas para debaixo do tapete pelo governo: elas eram
inapropriadas para a imagem do nobre selvagem e de uma nação que procurava pôr
a casa em ordem.
Do
ponto de vista de Rondon, "no conjunto de preciosidades com que nos
deparamos nessa nova Marcha para o Oeste, todas elas relevantes para a grandeza
do Brasil, nenhuma ultrapassa o índio"15.
Lá, na fronteira, o Brasil poderia beneficiar-se da essência cultural dos
índios não contactados (e portanto incorruptos): paciência, fidalguia e
orgulho. Para garantir a sobrevivência dos índios, o SPI demarcaria suas
terras, tais como estabelecido pela Constituição Federal de 1937. Mas, como a
cultura e identidade indígenas eram vistas como transitórias - um estágio
evolutivo -, os lotes demarcados não seriam necessários para manter o seu modo
de vida16.
Rondon, positivista ortodoxo, junto com seus colegas ideólogos no SPI,
acreditava no progresso inevitável das sociedades como evolução dos chamados
estágios de primitivismo ao racionalismo científico ou "positivo".
Num
futuro dourado, Rondon poderia antever "índios emancipados",
dividindo as terras de suas reservas em parcelas individuais, ou até residindo
com não-índios nas colônias agrícolas que o governo estabeleceria como parte da
Marcha para o Oeste. Os índios certamente deveriam ser integrados à sociedade
brasileira; como declarou o SPI: "Não queremos que o índio permaneça
índio. Nosso trabalho tem por destino sua incorporação à nacionalidade
brasileira, tão íntima e completa quanto possível"17.
A integração não beneficiaria apenas os índios, mas também a nação, que não
poderia desperdiçar recurso tão valioso. Assim, Vicente de Paulo Vasconcelos,
diretor do SPI em 1939, declarou:
É
claro que os índios, assim como o negro, terão que desaparecer um dia entre
nós, onde não formam 'quistos raciais' dissolvidos na massa branca cujo afluxo
é continuo e esmagador; mas do que se trata é de impedir o desaparecimento
anormal dos índios pela morte, de modo o que a sociedade brasileira, além da
obrigação que tem de cuidar deles, possa receber em seu seio a preciosa e
integral contribuição do sangue indígena de que carece para a constituição do
tipo racial, tão apropriado ao meio, que aqui surgiu18.
A
PRODUÇÃO CULTURAL DA INDIANIDADE
O
Estado Novo representou a relação entre os índios e o Estado-nação numa ótica
romântica. Em 1934, consagrando um ícone cultural, Vargas decretou que o dia 19
abril seria o Dia do Índio. Nos anos seguintes, o Dia do Índio ocasionou
numerosos eventos culturais e cerimônias públicas. Numa verdadeira blitz,
o Estado organizou exibições em museus, programas de rádio, discursos e filmes
sobre o índio - tudo isso com assistência do DIP.
O
conjunto de textos dos indianistas publicados nesta era de censura estatal
revela o interesse intelectual pelo índio e o seu suporte tácito pelo Estado.
No seu livro sobre o Oeste brasileiro, Agenor Couto de Magalhães aclamou o
índio por auxiliar na "construção de uma grande nação, dando sangue e
trabalho aos portugueses para a formação da raça atual"19.
Francisca de Bastos Cordeiro afirmou que o território brasileiro teria sido o
verdadeiro local das civilizações antigas do Oriente Médio, e que os índios
seriam descendentes das nações bíblicas20.
Afonso Arinos de Mello Franco, o futuro ministro das Relações Exteriores,
argumentou que os índios brasileiros, com suas sociedades igualitárias,
contribuíram para o nascimento do liberalismo, sobre o qual os europeus agora
alegavam a paternidade exclusiva21.
Angyone
Costa, professor de arqueologia, superou todos os seus pares com Indiologia,
uma celebração do índio publicada em 1943. O índio, enfatizava Costa, forneceu
aos brasileiros:
a
mansidão, a delicadeza no trato, certa ironia que dispensamos às pessoas, a
meiguice para os animais, a acuidade para todas as coisas. Veio-nos também a
força no sofrimento, a ternura contemplativa pela terra, o apego excessivo às
crianças, a sensibilidade com que envolvemos em nossa simpatia o mundo que nos
cerca.22
Capa do livro Indiologia de Angyone Costa, 1943. |
Os
atributos dos indígenas transmitiam também uma outra mensagem. Junto com a
exibição dos índios, e não muito sutilmente, estavam a "benevolência"
do regime de Vargas e a onipotência do SPI. O Estado iria "civilizar"
índios que viviam no sertão remoto. A exibição de fotografias e documentos
traziam à luz a aculturação dos índios sob a direção do SPI23.
Reificando o Estado-nação, os funcionários do governo brasileiro representavam
uma entidade consolidada, na qual os índios seriam integrados24.
De fato, o cenário era muito mais complexo: os esforços para integrar o índio
faziam parte do processo de consolidação do Estado - um processo, veremos
adiante, no qual os próprios povos indígenas tiveram um papel formativo.
O
RETORNO DO NATIVO
Restam,
no entanto, algumas questões relativas à celebração do índio pelo Estado. Por
que as elites construíram a imagem do índio desta maneira? A que propósito
servia a retórica enaltecedora da contribuição indígena para o "caráter
nacional"? Ao analisar-se a propaganda governamental, percebe-se que,
apesar das narrações românticas sobre o passado e das visões utópicas sobre o
futuro, o Estado Novo construiu a imagem do índio a partir de preocupações do
momento.
A
paixão do Brasil pelo índio na era Vargas fez parte de um movimento continental
de expansão do interesse pela cultura indígena e pelas políticas indigenistas.
O Dia do Índio, por exemplo, foi promovido no Congresso de Pátzcuaro em 1940,
reunião internacional patrocinada pelo governo mexicano que tinha por meta
desenvolver a compreensão cultural dos povos indígenas e projetos para a sua
integração. Mas, se o México liderou o movimento indigenista continental,
sobretudo com a organização do Instituto Indigenista Interamericano,
este movimento também encontrou adeptos no Brasil25.
De fato, o imponente monumento do líder asteca Cuauhtémoc, dado pelo governo
mexicano à cidade do Rio de Janeiro, veio a inspirar as festividades
brasileiras do Dia do Índio.
Os
índios, assim denominados por força da crença européia de que eram asiáticos,
agora eram celebrados por sua americanidade. De fato, Zoroastro Artiaga,
diretor do Museu Histórico de Goiás, afirmou em seu livro que o índio
brasileiro originou-se na América do Sul, e não na Ásia26.
Oswaldo Aranha, ministro das relações exteriores, aclamou "o herói
anônimo, histórico, indígena, ou cósmico, filho valente do Mundo Novo"27.
Artigos de jornal saudavam o índio desde "Yukon até a Patagônia"28.
No seu discurso no Dia do Índio de 1944, Rondon censurou os antigos
colonizadores europeus pela exploração da população indígena29.
Ao
difamar o europeu e consagrar o indígena, os ideólogos e intelectuais
brasileiros da Era Vargas inverteram ou subverteram a concepção eurocêntrica da
história da cultura e do destino nacional, vigente na elite brasileira. A
essência da brasilidade havia sido redefinida por membros da elite e da intelligentsia:
ela não atravessou mais o Atlântico, mas brotou do solo da nação, da sua fauna,
flora e de seus primeiros habitantes.
Esta
tática não era nova. No século XIX, José de Alencar e Gonçalves Dias celebraram
o nascimento de uma cultura brasileira própria, com narrativas altamente
romantizadas dos índios30.
Mais recentemente, na sequência da Semana de Arte Moderna de 1922, em São
Paulo, o poeta modernista Oswald de Andrade abraçou simbolicamente a cultura
indígena com o Manifesto Antropofágico (1928), criticando a imitação de estilos
europeus na arte brasileira e endossando a síntese do autóctone e do
estrangeiro31.
Embora afastados de Andrade, intelectuais do movimento de direita Verde-amarelo,
tais como Plínio Salgado, Menotti del Picchia e Cassiano Ricardo, rejeitaram os
europeus completamente; ao mesmo tempo em seus textos nacionalistas que
glorificavam o passado anterior ao descobrimento, endossavam o estudo da língua
Tupi e defendiam o índio como símbolo nacional32.
No início dos anos 30, Gilberto Freyre louvou a contribuição indígena para a
formação da cultura brasileira33.
Deste modo, os intelectuais da era Vargas podiam se apropriar de uma rica
tradição brasileira de homenagem aos índios34.
No
entanto, não só os motivos, como também o tom e o timbre destas homenagens aos
índios variaram com o tempo. Se, por exemplo, o nativismo do século XIX teve
como meta a separação de Portugal e a literatura romântica serviu para camuflar
a instituição da escravidão africana, sob o regime Vargas a retórica
indigenista transmitiu outras mensagens. Durante o Estado Novo, o Estado
orquestrou ou promoveu um discurso indigenista que ecoava todas as questões
proeminentes na política mundial da época: racismo, xenofobia e chauvinismo.
Numa
época de crise econômica mundial e nacionalismo exacerbado, os brasileiros
foram criticados por admirarem ideologias estrangeiras. O marxismo e o
liberalismo, afirmavam os funcionários do Estado Novo, eram inapropriados às
realidades nacionais. O mesmo valia para as teorias europeias de superioridade
racial, as quais eram criticadas por provocar ultraje - para não mencionar
desconforto, uma vez que muitas famílias influentes careciam de ascendência
puramente branca. Como Angyone Costa ironizava, apesar das deferências e
pretensões da elite, todos os brasileiros eram considerados pelos europeus como
"povo situado pouco acima dos negroides, abaixo dos amarelos e infinitamente distanciados dos brancos". Costa, portanto, convocava a
nação para valorizar suas raízes indígenas:
Nós
não chegaremos a ser um grande país, realmente com espírito e formação nacional
próprios, se não nos orientarmos, social e politicamente, fora dos moldes
alheios, numa firme diretriz americana, com o sentido de amor à terra, de
compreensão e valorização do índio, seu legítimo dono35.
No
entanto, Costa e sua coorte ideológica continuavam a antiga prática das elites
brasileiras de pensar com "modelos externos" a realidade doméstica36.
O Estado Novo, apesar de proclamar autenticidade própria, fez exatamente o
oposto, ao adotar amplamente um modelo corporativista europeu em seus esforços
para reordenar a sociedade brasileira. No seu discurso sobre a raça, o regime
de Vargas também difundiu doutrinas europeias, mas redefinindo os grupos considerados indesejáveis.
Com
sua esmagadora população inter-racial, o Brasil não poderia abraçar com
credibilidade uma ideologia que depreciasse todos os não-europeus. Os
brasileiros não-brancos deveriam não só ser defendidos mas aceitos37.
O SPI afirmava que, ao se falar de raça, "inferior" era sinônimo de
"atrasado", substituindo assim a noção de inferioridade racial
inerente pela de aperfeiçoamento racial38.
Defendendo a estirpe do índio brasileiro, o SPI apontou: "A alma indígena
está sujeita às mesmas paixões a que está sujeita a alma européia, mostrando,
porém, superioridade na temperança, na energia paciente e até, digamos a
verdade, na justiça e na caridade"39.
Se
alguém menosprezasse a mistura racial no Brasil, o antropólogo Roquette-Pinto
contestava:
Para
contradizer a opinião daqueles que creem na má influência do cruzamento sobre a
vitalidade da raça, devemos apontar, entre muitos outros exemplos, a população
do nordeste do Brasil (Ceará, etc.) que é a região de grandes e fortes famílias
de homens corajosos e ativos, conquistadores das florestas da Amazônia, quase
todas com algum sangue índio e branco40.
Além
disso, para que estes argumentos dissipassem os temores sobre a composição
racial e a coesão social do Brasil, e as elites pudessem renovar sua antiga
crença no "branqueamento" do índio, as políticas do SPI sustentaram a
quimera de que integração e miscigenação, um dia iriam finalmente chegar. O
obstáculo ao progresso nacional se escondia, ao invés, no "imigrante
inassimilável", que residia (ou tentava residir) no Brasil, deteriorando
sua harmonia racial41.
O índio, entretanto, desde a conquista portuguesa, fortificara a nação
brasileira através de alianças sexuais e militares.
O
ÍNDIO COMO SENTINELA
Conquista
e fortificação foram temas que preocuparam os brasileiros durante a época
turbulenta da Segunda Guerra Mundial. A guerra, na qual o Brasil entrou
formalmente em 1942, proporcionou um constante pano de fundo para as imagens
projetadas do índio. A conquista portuguesa foi reexaminada à luz das últimas
ameaças europeias à soberania nacional. Sempre fiéis ao Brasil, os índios mais uma vez estavam provando seu patriotismo, contribuindo para os esforços de
guerra através da produção agrícola e de borracha42.
A retórica do governo sublinhava que, dado o amor do índio a seu território,
seu amor ao Brasil seria uma "simples extensão"43.
Numa
época em que o governo falava no crescimento da nação determinado pela
proporção de homens saudáveis "dotados de maior energia", o índio representava
um patrimônio44.
Os tributos ao índio louvavam sua "higidez física, comparável à beleza
masculina dos helenos das olimpíadas"45.
Quem poderia proteger melhor as fronteiras desprotegidas e "espaços
vitais" das "nações cobiçosas" que buscavam um depósito para
seus "excessos de população" do que o índio?46 Rondon, orgulhoso da força e patriotismo indígena, endossou o serviço militar
para os índios.47
Além
disso, a incorporação na sociedade brasileira evitaria a possibilidade de que
"seja nossa população indígena atraída para os países limítrofes"48.
O medo de uma quinta coluna indígena - de atração para "países
limítrofes" -, demonstrou que por todo seu simbolismo nacionalista, os
índios apresentavam um problema complicado também para as elites. Os índios,
como primeiros habitantes do Brasil, desafiavam as instituições e tradições do
Estado-nação. Apresentavam uma alternativa às leis brasileiras e ao sistema
sócio-econômico - em suma, a tudo em que a legitimidade do governo se apoiava49.
Ao heroicizar o índio, o Estado Novo buscou camuflar este conflito que sugeria
não ser a lealdade indígena inata nem iminente.
Nem
todos os funcionários do governo escondiam suas apreensões. Na posição de
oficial do exército perto da fronteira ocidental, o Coronel Themístocles Paes
de Souza Brasil concluía sobre o índio:
Nada
produz, nem suficiente para o próprio conforto, é nômade, não obedece a leis e
nem deles tem conhecimento, não tem a noção de Pátria... tem o cérebro pouco
evoluído, não estando em condições satisfatórias para assimilar de modo
completo a educação e as outras exigências da nossa civilização50.
Do
mesmo modo, Ildefonso Escobar, um antigo membro do Conselho Nacional de
Geografia, via o índio como um peso morto para a nação. Após quatro séculos,
denunciou Escobar, os índios permaneciam "ingênuos e contemplando a
natureza enquanto todos os outros brasileiros trabalhavam para o progresso da
nação"51.
DEFENDENDO
O NOBRE SELVAGEM
A
figura do selvagem ignóbil e de sua contraparte nobre tinha raízes profundas
que se vinculavam à conquista europeia, durante o período colonial e no século
XIX52.
Esta dicotomia se originou da ambivalência europeia para com as suas próprias
sociedades, ambivalência esta que foi projetada nas populações indígenas. As
várias respostas dos povos indígenas em relação aos europeus foi um outro fator
que contribuiu para esta dicotomia53.
Ambas as imagens, de fato, continuavam a ter credibilidade entre a população
brasileira. Assim, ao construir sua imagem do índio como cidadão brasileiro
primevo, o regime Vargas selecionou uma das várias imagens existentes54.
Mas como, então, poderia o Estado rebater as acusações feitas contra o selvagem
ignóbil, cujo comportamento, em séculos anteriores, teria justificado uma
"guerra justa"?55
Quando
o SPI reconheceu "a ferocidade dos nossos índios", como os Xavante,
ele culpou os civilizados por provocarem a agressão dos índios. Por
natureza "mansos e afáveis", os índios não puderam tolerar o que
"em sua compreensão constituía uma afronta ou falta de respeito"56.
Tal ponto de vista protegia a imagem consagrada do bom selvagem. No entanto,
também furtava ao índio seu papel histórico, despindo-o das diretrizes sociais
complexas e agendas políticas que marcaram sua interação com o mundo branco.
Além disso, o modelo de relações interétnicas do Estado sugeria que, assim como
a malevolência branca poderia desfigurar as sociedades indígenas, a
benevolência branca poderia surtir o efeito contrário.
O
governo, afinal, deu uma grande tarefa aos índios: tornar o interior produtivo,
impedir as tramas imperialistas e garantir a "formação étnica" do
Brasil. Para assistir os índios, o Estado iria ampliar para o sertão a rede de
transporte, a saúde pública e educação para o sertão. Outros
"problemas" tais como nomadismo, falta de disciplina no trabalho e a ausência
de sentimento cívico seriam também remediados pelo governo.
O
DUPLO LEGADO DE VARGAS
Os
defensores do governo Vargas aplaudiram a sua iniciativa de redimir os
desfavorecidos rurais. Finalmente, os índios - "os modestos mas dedicados
trabalhadores da floresta, a verdadeira sentinela da fronteira, os vigilantes
soldados da nação" - seriam incorporados definitivamente como
trabalhadores para a glória nacional57.
O governo federal exaltou o diretor do SPI José Maria de Paula em 1944 e
prenunciou uma era promissora para os índios58.
Esta
linguagem protecionista refletiu a tendência do Estado Novo de outorgar noções
de cidadania e de direitos aos grupos sociais previamente marginalizados59.
De fato, o abraço simbólico do índio pelo Estado Novo acabou por sufocá-lo.
Esmagados pela retórica do governo, os índios teriam de lutar para expressar
seus próprios pontos de vista em relação a sua terra, comunidade, cultura e história.
Sob
Vargas, o Estado continuou a cultivar uma relação com os grupos indígenas
fundamentada na legislação ditada décadas antes. O Código Civil de 1916 definiu
os índios como "relativamente incapazes" em relação a questões civis.
Em 1928, eles foram colocados sob um sistema de tutela federal, administrado
pelo SPI. Em teoria, a tutela se destinava a proteger os grupos indígenas -
muitas vezes despreparados ou não familiarizados com o sistema sócio-econômico
brasileiro - da exploração. Quando o SPI defendia comunidades indígenas, como
João Pacheco de Oliveira ilustra na sua etnografia sobre os Ticuna, os índios
se beneficiavam e valorizavam a assistência governamental60.
Neste mesmo espírito de boa vontade, o regime Vargas enobrecia os seus
tutelados, dotando de prestígio cultural os grupos indígenas ao consagrá-los
como os primeiros brasileiros.
Mas,
ao mesmo tempo, a tutela e outras políticas paternalistas endossadas pelo
regime Vargas possibilitavam o abuso e a repressão pelo Estado. O sistema de
tutela permitiria o descuido sistemático dos interesses indígenas; políticas
foram implementadas pelo Estado sem consulta aos grupos indígenas, considerados
incompetentes para cuidar de seus próprios assuntos. Como o SPI pronunciava em
1939: "O índio, dado seu estado mental, é como uma grande criança que
precisa ser educada"61.
Os esforços para disciplinar a força de trabalho e eliminar o nomadismo -
disfarçados em temas de redenção - exemplificavam este tratamento autoritário;
nesse sentido o Estado procurou redesenhar as fronteiras do território indígena
com a Marcha para o Oeste.
Embora
aproximadamente duzentos grupos diferentes vivessem no Brasil com diversas
culturas, línguas e relações com a sociedade brasileira, o Estado reduziu-os
todos a "índios", uma construção cultural que incorporou objetivos e
ideias dos brancos. Rica em seu valor simbólico, a invenção estadonovista do
índio contradizia as realidades atuais e passadas dos índios. Além do mais, os
objetivos quixotescos e as instituições governamentais seriam sistematicamente
lesados pela corrupção burocrática, pela oposição da elite e pela resistência
indígena. Não obstante, os índios, junto com o governo e seus críticos, teriam
de lidar com as imagens e políticas ambíguas popularizadas na era Vargas
durante muito tempo.
No
entanto, desde o início da Marcha para o Oeste, grupos indígenas engajaram-se
num projeto do Estado que tentava programar seu destino.
Alguns
índios rejeitaram totalmente a política governamental. Outros colaboraram com
os esforços do Estado para "civilizar" a fronteira, aliando-se aos
funcionários do SPI, que lhes ofereciam a promessa de uma vida melhor. Contudo,
outros abraçaram a retórica indigenista do Estado Novo, apesar de criticarem a
atuação do Estado e de proporem alternativas. De fato, a variedade das
respostas indígenas demonstra, como apontou William Roseberry, que a hegemonia
cria não uma ideologia partilhada, mas uma matéria-prima comum e uma estrutura
significativa para lidar e atuar diante das ordens sociais caracterizadas pela
dominação62.
OS
XAVANTES E A MARCHA PARA O OESTE
Em
1941, um ano após Vargas ter sobrevoado a área dos "Xavante extremamente
ferozes", uma equipe de "pacificação" do SPI partiu para
contactar os índios. Os Xavante não seriam uma audiência fácil de convencer. Em
primeiro lugar, eles se autodenominavam A'uwe, que em sua língua Gê
significa "as pessoas". Outros grupos não poderiam aspirar tal
humanidade; o etnocentrismo do governo brasileiro encontrara seu par. Além do
mais, os Xavante tinham dolorosas recordações da dominação branca.
Índios Xavante em celebração. |
Quando
os bandeirantes aventureiros começaram a penetrar Goiás em busca de ouro, no
século XVIII, os A'uwe se tornaram alvo de ataque militares,
caçadores de escravos, ataques de colonizadores e projetos de aldeamento. As
guerras, doenças, migrações e aldeamentos desagregaram as comunidades A'uwe63.
Por volta de 1840, segundo David Maybury-Lewis, aconteceu uma cisão definitiva.
Um grupo, que se tornaria conhecido como Xerente, estabeleceu-se perto do rio
Tocantins, onde manteria contacto contínuo com o mundo branco. Outro grupo,
hoje conhecido como Xavante, fugiu de Goiás para Mato Grosso, atravessando o
rio Araguaia para escapar de exploração dos colonos64.
Os
Xavante apropriaram-se de um extenso território do norte do Mato Grosso. Por quase
um século, difundiram o terror na região, amendrontando garimpeiros,
fazendeiros e outros índios que invadissem seu território65.
Com a Marcha para o Oeste, a necessidade de contactar ou "pacificar"
os Xavante tornou-se urgente. Bem no centro do território brasileiro existia um
grupo indígena hostil, sem sentimento cívico ou ética de trabalho
"apropriada", alheio à língua portuguesa, impedindo a expansão e o
desenvolvimento econômico do Oeste. Lá, no cerrado impenetrável, também se
encontrava um valioso recurso humano. Por seu valor, os Xavante incorporavam o
ideal das elites de uma essência indígena com suas contribuições potenciais
para o então chamado caráter nacional brasileiro. Como afirmava um jornal:
"Os Xavantes são os grandes índios do Brasil, os índios realmente
representativos, os índios que deveriam ser eleitos como o símbolo da raça
nativa - ao invés da criação romântica de José de Alencar".66
Genésio
Pimentel Barbosa liderou a expedição do SPI que estabeleceu um "posto de
atração" próximo a uma aldeia Xavante no Rio das Mortes. A equipe do SPI,
que consistia de cinco brancos e três índios, incluindo dois Xerente recrutados
para servir de tradutores, ofereceu roupas, ferramentas e outras bugigangas
como proposta de paz, marcando o início da assistência estatal67.
Os Xavante, no entanto, desconsideraram o discurso nacionalista de Vargas. Em
novembro de 1941, assassinaram Pimentel Barbosa e cinco de seus assistentes a
bordunadas. Os tradutores Xerente e outros membros da equipe, que se
encontravam fora do acampamento no momento do ataque, encontraram seus
companheiros mortos68.
Os corpos ensanguentados de seus companheiros serviram de testemunhas da
resposta dos Xavante; eles não desejavam ser colocados em pedestais nem
reconstruídos pelo Estado.
A
Marcha para o Oeste encontrara um obstáculo e o governo correu para mascarar a
rejeição dos Xavante. Preservando a imagem do índio como bom selvagem e
patriota inato, Cândido Rondon declarou: "O índio é uma criatura dócil de
inteligência primária que só necessita de meios brandos para se render aos
nossos apelos. Só posso, por isso, atribuir, o gesto impensado dos Xavante a
alguma represália".69
O
"gesto impensado" de fato, formou parte de um complicado universo
nunca investigado com seriedade pelo governo: a cultura indígena. A estratégia
Xavante de ataques surpresa manteve invasores à distância durante décadas. A
defesa de extenso território foi essencial para manter sua economia mista
baseada na caça e coleta e, em menor escala, na agricultura. Embora o governo
Vargas retratasse o Oeste como uma utopia, os Xavante conheciam a variabilidade
do clima e a pobreza do solo da região, que faziam da agricultura um
empreendimento arriscado70.
Por requisitar um extenso território para a caça de animais e coleta de frutas,
babaçu e raízes, a comunidade Xavante combatia qualquer invasor que ameaçasse
acesso ao precioso recurso natural.
Além
disso, do ponto de vista dos índios, a importância de tal demonstração de
força, longe de ser um "gesto impensado", estendia-se para além do
campo de batalha. A força física, valorizada entre os jovens Xavante, definia
masculinidade e posição social. Tal como a caça, a expressão mais comum de
virilidade, a guerra requeria resistência e agilidade. Apesar de os homens
Xavante orgulharem-se de sua força física - validando as homenagens do Estado
Novo à força "natural" dos índios brasileiros - dificilmente
aspiravam ser sentinelas da fronteira. A exibição pública de masculinidade
serviu para reforçar as divisões de gênero e hierarquia de idade que
estruturava a ordem social Xavante.
Devido
às suas diretrizes sociais, orientação cultural e memória histórica, o amor dos
Xavante pelo Brasil apenas podia ser "uma simples extensão" do amor
que sentiam pelo seu território. A aldeia Xavante no Rio das Mortes não seria
"pacificada" até cinco anos mais tarde - quando um grupo do SPI mais
equipado, abençoado pelo suporte aéreo, retornou à região.
"TODOS
OS ÍNDIOS ESTÃO A SERVIÇO DO BRASIL"
Nem
todos os grupos indígenas, no entanto, gozavam da autonomia que permitiu aos
Xavante rejeitar a oferta do governo. Os índios explorados por fazendeiros,
barões da borracha, contratadores de mão-de-obra, missionários ou por outros
grupos indígenas não poderiam aspirar a tal teimosia. De fato, os Karajá talvez
não tivessem se voltado tão impetuosamente para Vargas se não estivessem cada
vez mais rodeados por brancos e atacados por seus inimigos mortais - os
Xavante.
Do
mesmo modo, embora não saibamos as motivações pessoais que impeliram alguns
Xerente a colaborar na "pacificação" dos Xavante, conhecemos os
problemas sócio-econômicos que atingiam suas comunidades na época. Quando Curt
Nimuendaju realizou sua pesquisa etnográfica entre os Xerente, em 1937,
encontrou um grupo indígena rodeado por colonos brancos. A aldeia nativa, ela
observou, tinha se tornado "um local de escassez" e os Xerente
deixaram de trabalhar, exercendo a mendicância e roubando dos brancos71.
A Marcha para o Oeste, no entanto, ofereceu a alguns Xerente a oportunidade de
emprego e aventura no SPI e o glamour de contactar seus
famosos parentes distanciados numa grande campanha patriótica.
O
Estado Novo, com suas promessas de longo alcance de proteção e assistência
estatal, oferecia um raio de esperança para vidas precárias como as do Xerente
e Karajá. Há muito vistos como "brutos" pelos seus vizinhos
"civilizados", os índios agora podiam se orgulhar de serem os
primeiros brasileiros, além de antever novos aliados na sua luta. Podiam até se
dirigir ao presidente da nação, que havia demonstrado tanto interesse pessoal
em seus problemas. Em setembro de 1945, Lírio Arlindo do Valle, um índio Tembé,
fez exatamente isso. Em uma carta de dez páginas para Vargas, Valle agradeceu o
presidente pela "promessa feita aos índios do Brasil" e narrou o
sofrimento dos índios nas mãos dos fazendeiros no Pará, seu estado natal. Valle
escreveu, no entanto, não somente para expressar gratidão, mas para se
autopromover: ele desejava ser nomeado inspetor do SPI do Pará, cargo então
ocupado por um funcionário branco. Na sua tentativa de mobilizar apoio do chefe
da nação, a carta nos revela uma fascinante perspectiva sobre o papel do índio
no processo da formação do Estado brasileiro. Mesmo não sendo amplamente
representativo de todos os povos ou comunidades indígenas, este texto merece
uma análise mais minuciosa, uma vez que evidências escritas pelos índios
documentando sua resposta ao Estado Novo e à Marcha para o Oeste são
extremamente fragmentárias.
Nascido
em 1895 numa aldeia Tembé, de mãe indígena e pai desconhecido, Valle estudou
quando jovem num seminário católico em Belém. Em 1911, um inspetor do recém
fundado SPI recrutou Valle para o escritório do Pará. Desestimulado pela falta
de pagamento, ele abandonou seu trabalho, retomou os estudos e passou um breve
período na Marinha. Ao retornar ao SPI em 1934, foi nomeado para um posto entre
os índios Anaubé, no Rio Carari, mas trabalhou "sem conforto, sem a proteção
do SPI e nada ganhando". Em 1941, Valle foi nomeado delegado do SPI na
região de Moju, no Pará72.
Em 1945, viajou para o Rio de Janeiro para participar do movimento queremista, o
grande movimento popular em apoio à candidatura de Vargas nas próximas
eleições. Em sua peregrinação para a capital, Valle passou pelo estado de Minas
Gerais, pedindo apoio para Vargas e popularizando a causa indígena. Para dar provas
de suas últimas campanhas pelo presidente, Valle incluiu depoimentos dos
políticos locais.
Aristide
Sousa Torres, um funcionário da cidade mineira de Conde Lafaiete, afirmou que
em abril de 1945, Valle entreteve um sindicato com canções e costumes indígenas
e agradeceu o cuidado e a proteção dispensados pelo Estado Novo para com os
trabalhadores, índios e crianças. Neste mesmo mês, o auto-nomeado porta-voz
indígena discursou em Barbacena, cujo prefeito elogiou o "cacique Lirio do
Valle, [que] demonstrou ser um grande patriota e amante do crescente
desenvolvimento de nossa querida Pátria".
No
seu apelo a Vargas, Valle articulou idéias que devem ter agradado os habitantes
de Minas Gerais. Ele ressuscitou Poti - um guerreiro Potiguara que resistiu à
invasão holandesa no século XVII - uma inspiração para todos os índios e
brasileiros "que amam a liberdade e sabem lutar por ela"73.
Prometeu integrar os índios e fazê-los cidadãos brasileiros
"respeitáveis". Finalmente, Valle abraçou a imagem do índio genérico,
o que buscava parceria com os brasileiros: "Sou um índio conhecedor de
todos os costumes dos índios do Brasil e falo o idioma oficial entre eles, e
todos os dialetos de suas tribos". Apesar de suas pretensões
antropológicas, é improvável que Valle conhecesse "todos os costumes"
de aproximadamente 200 grupos indígenas. Nem é provável que seu talento
linguístico o capacitasse a falar todos os seus dialetos.
O
que Valle certamente conhecia, baseado nas suas declarações, eram os costumes
dos funcionários brancos. Assim como os propagandistas do Estado Novo, Valle
não fez distinções entre grupos indígenas. Articulou uma narrativa européia da
história indígena, começando com a conquista portuguesa, enriquecida por índios
mitificados e focalizou a contribuição indígena para o "caráter
nacional" do Brasil. A afirmação de Valle de que "nós índios somos a
raiz de uma planta que hoje é o Brasil" e sua promessa de que "os
índios estão de pé pelo Brasil" parece ter sido escrita por um ideólogo do
DIP.
REINTERPRETANDO
O ÍNDIO E O ESTADO-NAÇÃO
Como
podemos entender a relação entre os índios e o Estado Novo? As narrativas
celebratórias da política indigenista brasileira podiam saudar a assistência e
a redenção proporcionada pelo Estado aos povos indígenas, tais como os Karajá e
os Xerente. Os revisionistas, por outro lado, podem denunciar o projeto
hegemônico do Estado em relação aos Xavante e seus efeitos sobre o
comportamento e a identidade de índios como Valle. Para nos deslocarmos para
além desta dicotomia - na qual o Estado substituiu o índio como a síntese tanto
do bem como do mal - devemos não só reconhecer a ambiguidade do projeto estatal
como também prestar mais atenção à variedade e às nuances da reação indígena ao
poder do Estado.
Assim
como os Xavante rejeitaram o governo Vargas, os Karajá, Xerente e Tembé
ajudaram a reforçá-lo. No entanto, mesmo enquanto representavam o papel que lhes
foi designado, alguns grupos indígenas procuraram editar o script.
De fato, um exame mais detalhado da carta de Valle revela como alguns índios
promoveram o projeto estatal, ao mesmo tempo em que buscavam emendar o seu
formato.
Os
anos de trabalho sem pagamento e recursos adequados no SPI levaram Valle a
criticar não a missão do Estado de proteger e integrar os índios, mas seu modus
operandi. O tradicionalismo indígena não arruinou o seu trabalho nos postos
do SPI, afirmou, mas sim a corrupção dos oficiais do SPI, que roubavam as
verbas alocadas. Além do mais, Valle denunciou o racismo no SPI: "o SPI
ultimamente não se enteressa [sic] pelos índios, por que lá só trabalham
brancos e os brancos não se enteressa [sic] pelos índios". Na agência
estatal remodelada por Valle, os índios iriam ocupar cargos superiores. Com
Valle no comando e outros "índios competentes e civilizados"
responsáveis pela diretoria, a verdadeira integração dos povos indígenas
poderia ocorrer. Voltando à fábula de Poti, Valle o imbuiu de novo simbolismo.
Poti ainda vivia nas comunidades indígenas na sua luta para repelir não só o
estrangeiro, mas o "invasores [sic] brancos do SPI, brancos
desonestos".
O
discurso de Valle revela como os índios brasileiros, com outros grupos
subalternos, tanto apropriaram-se dos símbolos dominantes como os desafiaram74.
Ao celebrar a proteção do governo aos povos indígenas, Valle difundiu as noções
elaboradas pela elite sobre um caráter essencialmente indígena, um ícone
proto-patriota cultural. O ataque Xavante confirmara que nem todos os índios
viam Vargas como seu salvador nem o Brasil como sua pátria. No entanto, a
elaboração de Valle, mediada pela sua experiência pessoal, não era de modo
algum acrítica. A corrupção e o racismo dos funcionários do SPI coloriram as
percepções de Valle sobre o governo, galvanizando sua exigência por um órgão
liderado por índios.
Se
Valle exibia o que Gramsci define como "conscientização
contraditória" de grupos subalternos - abraçando uma essência indígena
consagrada pelas elites, desprezando os brancos enquanto procura sua
assistência - vários fatores explicam tal comportamento75.
Em primeiro lugar, o Estado Novo enviou sinais contraditórios aos povos
indígenas. Políticas protecionistas endossadas pelo regime foram burladas pela
prática social. O índio perfeito louvado por ideólogos foi uma criação que uniu
o bom selvagem ao brasileiro genérico. Sobretudo, as correlações de força na
sociedade brasileira circunscreviam opções de índios tais como Valle. Sem o
domínio territorial e a autonomia dos Xavante, tais índios "competentes e
civilizados" tentaram fazer o máximo de um projeto governamental ambíguo.
Uma vez despidos da sua capa protetora, índios como os Xavante e vários outros
na região Amazônica seriam forçados a seguir uma estratégia similar. E assim o
fizeram.
NOTAS:
1 O autor deseja agradecer a Emília Viotti da Costa,
Gil Joseph, Jeff Lesser e Vivian Flanzer por suas valiosas observações e
sugestões na elaboração deste artigo, originalmente publicado no Journal
of Latin American Studies, nº 29, 1997, pp. 747-768.
2 CORRIGAN, P. e
SAYER, D. The Great Arch: English State Formation as Cultural
Revolution. Oxford,
1985. [ Links ]
3 Para um relato celebratório das origens e objetivos
do SPI - se não necessariamente de seus sucessos - ver RIBEIRO, D., Os
Índios e a Civilização. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1970. [Links]Para uma análise revisionista
inspirada em Foucault, que enfatiza o papel repressivo do Estado ao controlar
questões indígenas, ver LIMA, A. C. de Souza. Um grande cerco de paz:
poder tutelar, indianidade e formação do Estado no Brasil. Petrópolis,
Vozes, 1995. [ Links ]
4 No decorrer deste artigo, utilizo o termo
"índio" tal como definido na legislação brasileira, para se referir a
um indivíduo que é descendente de povos pré-colombianos e que se identifica e é
identificado como pertencendo a um grupo étnico cujas características culturais
são distintas da sociedade nacional. Utilizo o termo "branco" tal
como é popularmente empregado no contexto das relações interétnicas
brasileiras, para se referir a todos os não-índios.
5 Departamento de Imprensa e Propaganda. Rumo
ao Oeste (n.d.), p. 04. Sobre o DIP ver CARONE. O Estado Novo
(1937-45). São Paulo, Difel,1997, pp.
169-172. [ Links ]
6 A fotografia de Vargas segurando um bebê Karajá foi
distribuida aos postos indígenas por todo o Brasil. Ver Serviço de Proteção aos
Índios (SPI) Boletim 20, jul. 1943, p.
196.[ Links ]
7 Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. Goiânia. Rio de Janeiro, 1942, p.
01. [ Links ]
8 Otávio Velho argumenta que a Marcha serviu para
evitar a reforma estrutural do coronelismo nas áreas rurais brasileiras. Ver
VELHO. Capitalismo autoritário e campesinato. São Paulo,
Difel, 1976, pp. 148-151. [ Links ]De modo similar, Alcir Lenharo
aponta que a Marcha, com sua retórica e ostentação, criou um sentimento
ilusório de participação política popular numa sociedade marcada por um regime
ditatorial. Ver LENHARO. Colonização e trabalho no Brasil: Amazônia,
Nordeste e Centro-Oeste - os anos 30. Campinas, Papirus,
1986. [ Links ]
9 Ver LENHARO. Sacralização da Política. Campinas, Papirus, 1986, pp. 53-73. [ Links ]
9 Ver LENHARO. Sacralização da Política. Campinas, Papirus, 1986, pp. 53-73. [ Links ]
10 De acordo com o relatório anual do SPI de 1954, o
orçamento anual da agência entre 1910 e 1930 variava (com reajustes em cruzeiros)
desde a quantia mínima de CR$300.000 (1915) até a quantia máxima de
CR$3.880.000 (1930). A média variava em torno de CR$1.000.000. Em 1931 o
orçamento caiu para CR$1.560.000, caindo para menos de um milhão em 1940, mas
aumentando constantemente de 1941 a 1944, quando atingiu CR$3.703.000. SPI,
Relatório das Atividades do Serviço de Proteção aos Índios durante o ano de
1954. Rio de Janeiro, 1954, p. 117.
11 Para uma discussão mais completa sobre as origens e
trajetórias do CNPI, ver FREIRE, C.A. da Rocha. Indigenismo e
Antropologia - O Conselho Nacional de Proteção aos Índios na Gestão Rondon
(1939-55), Dissertação de Mestrado, UFRJ-Museu Nacional,
1990. [ Links ]
12 RONDON, Cândido Mariano da Silva. Rumo ao
Oeste: Conferência Realizada Pelo General Rondon no D.I.P. em 3-IX-40 e
discursos do Dr. Ivan Lins e do General Rondon, pronunciados na Associação
Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, 1940, pp.
21-22. [ Links ]
13 Sobre invenções de tradições pelo governo para
naturalizar processos e relações sociais, ver HOBSBAWM, Eric J. and RANGER,
Terence. (eds.). The
Invention of Tradition. Cambridge University Press,
1983. [ Links ]
14 Ver HEMMING,
J. Red Gold: The Conquest of Brazilian Indians, 1500-1760. Cambridge University Press, 1978, pp.
292-311. [ Links ]
15 Ao colocar os índios no centro das representações
do Oeste, a tática de Rondon se diferia da imagem do índio no discurso dos EUA
sobre a colonização do Oeste americano no fim do século XIX. Richard White
focaliza as duas principais imagens empregadas. A tese clássica de Frederick
Jackson Turner sobre a fronteira dos EUA marginalizou os índios da história da
colonização do oeste americano. Bufalo Bill, por outro lado, estigmatizou os
povos indígenas como selvagens sanguinários. Ver WHITE. "Frederick
Jackson Turner and Buffalo Bill". In GROSSMAN, James, (ed.). The
Frontier in American Culture. Berkeley, 1994, pp.
06-65. [ Links ]
16 Ver LIMA, A.C.
de Souza. "A identificação como categoria
histórica". In OLIVEIRA, João Pacheco de, (ed.). Os poderes e as
terras dos Índios. Rio de Janeiro, s.n., 1989, pp.
139-197. [ Links ]
17 SPI, "Memórias sobre as causas determinantes
da diminuição das populações indígenas do Brasil". Paper apresentado no IX
Congresso Brasileiro de Geografia, 29 de Julho, 1940, p. 02. Fundação Nacional
do Índio (Brasília) Documentação SPI/Documentos
Diversos. [ Links ]
18 Vasconcelos, citado no Departamento Administrativo
do Serviço Público (DASP). Revista do Serviço Público, vol. 03, nºs
1-2, jul.-ago. 1939, p.
34. [ Links ]
19 MAGALHÃES, A. Couto de. Encantos do Oeste. Rio
de Janeiro, Imprensa Nacional, 1945, p.
42. [ Links ]
20 CORDEIRO, F. de Bastos. Brasilidades. Rio
de Janeiro,Niemeyer,
1943. [Links]
21 FRANCO, A. Arinos de Mello. O Índio Brasileiro e a Revolução Francesa. Rio de Janeiro, José Olympio, 1937. [ Links ]
21 FRANCO, A. Arinos de Mello. O Índio Brasileiro e a Revolução Francesa. Rio de Janeiro, José Olympio, 1937. [ Links ]
22 COSTA, A. Indiologia. Rio de
Janeiro, Gráfica Laemmert, 1943, p.
13. [Links]
23 Conselho Nacional de Proteção aos Índios
(CNPI). 19 de Abril: O Dia do Índio - as Comemorações Realizadas em
1944 e 45. Rio de Janeiro, 1946. [Links]
24 Os historiadores do Estado Novo enfatizaram uma
manipulação ideológica similar na repressão contra os imigrantes alemães, por
presumirem sua simpatia ao regime nazista. Os governantes falavam de uma
"nacionalidade brasileira" ameaçada de destruição por um grupo étnico
subversivo; na realidade, a construção de uma "nacionalidade
brasileira" era fundamentada na eliminação das distinções étnicas. Ver
SCHWARTZMAN, S.; BOUSQUET BOMENY, H M. e COSTA, V.M. Ribeiro. Tempos de
Capanema. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1984. [Links] O caso dos índios difere do
imigrante alemão, no entanto, pelo fato de que a maioria das publicações e
pronunciamentos governamentais não retratava o índio como um inimigo, mas como
um ícone.
25 Para uma discussão mais completa sobre a relação
entre o indigenismo mexicano e as políticas do governo
brasileiro ver FREIRE. op. cit., pp. 57-68.
26 ARTIAGA, Z. Dos Índios do Brasil Central. Uberaba,Triângulo,
n.d., pp. 13-26. [Links]
27 Oswaldo Aranha, no prefácio da tradução brasileira
de PADILHA, E. O homem livre da America. Trad. Fernando Tudé de
Souza, Rio de Janeiro, 1943. [Links]Como o título sugere, o livro de
Padilla era uma homenagem ao pan-americanismo.
28 O Dia,
Abril 1945, p. 15. [ Links ]
30 BROOKSHAW,
D. Paradise Betrayed: Brazilian Literature of the Indian. Amsterdam,
1988, p.75. [Links]
31 GONZALEZ, M e
TREECE, D. The Gathering of Voices: TheTwentieth-Century Poetry of
Latin America. London, 1992, pp. 96-101. [Links]Para uma discussão sobre a adoção do
"primitivismo" por intelectuais brasileiros - e suas influências europeias - durante a Semana de Arte Moderna, ver JACKSON, K.D. A prosa
vanguardista na literatura brasileira: Oswald de Andrade. São Paulo,
Perspectiva, 1978, pp.
09-18. [Links]
32 O símbolo do movimento Verdeamarelo era o curupira,
o protetor Tupi-guarani do sertão. Ver VASCONCELOS, G. Ideologia
Curupira: Análise do Discurso Integralista. São Paulo,
Brasiliense,1979, p. 20. [Links]
33 FREYRE,
G. The Masters and Slaves. Berkeley,
1986, pp. 81-184. [Links]
34 De fato, o Estado Novo não só foi influenciado
pelos movimentos ideológicos dos anos 20, como incorporou alguns de seus
intelectuais mais proeminentes (de todas as correntes políticas) no regime. Ver
OLIVEIRA, L. Lippi; VELLOSO, M. Pimenta e GOMES, A. Castro. Estado Novo,
Ideologia e Poder. Rio de Janeiro, Zahar, 1982, pp.
10-11. [Links]
36 Para uma discussão sobre a adesão seletiva das
elites brasileiras do século XIX às idéias liberais europeias, ver COSTA, E.
Viotti da. The Brazilian Empire: Myth and Histories. Chicago University Press,
1985, pp. 53-77 [Links]e
SHCWARTZ, R. Misplaced ideas: Essays on Brazilian Culture. Londres,
1992, pp.19-31.
37 SKIDMORE. Black
into White: Race and Nationality in Brazilian Thought. Durham, 1993, pp. 205-207. [Links]Skidmore observa os manifestos de
doze intelectuais brasileiros proeminentes contra o racismo e em 1942 pela
Associação Brasileira de Antropologia e Etnologia.
38 Os eugenistas brasileiros, com o mostra Stepan,
rejeitam as noções de supremacia racial e abraçam a fé lamarckiana no
aperfeiçoamento através da mudança ambiental. Ver STEPAN, N. Leys. "The
Hour of Eugenics: Race, Gender and Nation in Latin America". Ithaca,
1991. [Links]
39 SPI, "Memória sobre as causas", pp.
01-02. [Links]
40 PINTO, E. Roquette. "Contribuição a
antropologia do Brasil". In Revista de Imigração e Colonização,
vol I, nº 03, jul. 1940, p.
440. [ Links ]
41 Ver, por exemplo, PADILHA, Leão. O Brasil
na posse de si mesmo. Rio de Janeiro, Gráfica Olímpica, 1941. [Links]Para análises históricas sobre
políticas imigratórias durante a Era Vargas, que tinha por objetivo evitar um
grupo "indesejável", os judeus, ver LESSER, J. Welcoming the
Undesirables. Berkeley, 1994 [ Links ]e
CARNEIRO, M. L. O anti-semitismo na era Vargas (1930-1945). São
Paulo, Brasiliense, 1988. O tratamento diferencial dado pelos intelectuais
brasileiros aos índios em relação a outros grupos "não-europeus", é
talvez mais fortemente revelado no trabalho de Afonso Arinos de Mello Franco. O
mesmo autor que celebrou a herança indígena brasileira e as contribuições para
a civilização ocidental também escreveu o anti-semita Preparação ao
nacionalsimo: Cartas aos que têm vinte anos. Rio de Janeiro,
Civilização Brasileira, 1934, que opunha a entrada de judeus no Brasil.
42 CNPI, Relatório. Rio de Janeiro,
1946, p. 54. [Links]
43 Relatório do Diretor do SPI, Coronel Vicente de
Paulo Teixeira da Fonseca Vasconcelos (1940?). Museu do Índio, Rio de Janeiro,
Setor de Documentação (MI/SEDOC) Filme 237/Fot 1237-1273.
44 LYRA, João. "Raça, educação e desporto".
In Estudos e Conferências. nº 14, dez. 1941, p.
32. [ Links ]
45 BARROS, Olegário Moreira de. "Rondon e o
Índio". In Revista do Instituto Histórico de Mato Grosso, vol.
22, nºs 43-44, 1940, p. 17.[Links]Para uma discussão sobre o projeto
de educação física do Estado Novo para forjar cidadãos robustos, ver CARNEIRO,op.
cit., pp.139-142.
46 Revista de Imigração e Colonização. vol. I nº 02, abr. 1940, p.
207. [Links]
47 SPI, "Memória sobre as causas", p.
29. [Links]
48 DASP, Revista do Serviço Público. vol.
03, nº 03, set. 1943, p.
84. [Links]
49 Para uma discussão sobre a relação conflituosa
entre índios e o Estado-nação, ver URBAN, G. e SHERZER, J. "Introduction:
Indians, Nation-States, and Culture". In URBAN, Greg e SHERZER,
Joel (eds.). Nation States and Indians in Latin America. Austin, 1991, pp. 01-18; [Links] e
DURHAM, E. Ribeiro. "O lugar do índio". In Comissão
Pró-Índio/SP, O Índio e a Cidadania. São Paulo, Brasiliense,
1983, pp. 11-19.
50 BRASIL, T. Paes de Souza. Íncolas
Selvícolas. Rio de Janeiro, 1937,
pp.65-69. [Links]
51 ESCOBAR, I. A Marcha para o Oeste: Couto
Magalhães e Getúlio Vargas. Rio de Janeiro, 1941, p.
116. [Links]
52 Sobre o período colonial, ver PERRONE-MOISÉS, B. "Índios
Livres e Índios Escravos: Os Princípios da Legislação Indigenista do Período
Colonial (Séculos XVI-XVIII)". In CUNHA, Manuela Carneiro da (ed.). História
dos Índios no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras, 1992, pp.
115-132; [Links]sobre
a dicotomia do século XIX entre o Tupi "pacífico" e o Tapuia
"feroz", ver CUNHA, M. Carneiro da. "Prólogo". In: CUNHA,
Manuela Carneiro da (ed.). Legislação Indigenista no Século XIX: Uma
Compilação 1808-1889. São Paulo, EDUSP, 1992, pp.
07-08. [Links]
53 Ver BERKHOFER
JR, R.F. The White Man's Indian: Images of the American Indian from
Columbus to the Present. New
York, 1978. [Links]
54 Tucci Carneiro fornece uma extensa revisão sobre os
pensadores brasileiros influenciados por teorias racistas europeias que
estigmatizavam os índios, negros e mestiços. Ver CARNEIRO, Tucci. op.
cit., pp. 83-154.
55 Sobre a escravidão de índios inimigos durante o
período colonial, ver PERRONE-MOISÉS.op. cit., pp. 123-128.
56 O tema do índio corrompido pelo branco mau, comum
nas publicações do SPI durante este período, seria reiterado por MARÇAL,
Heitor. Moral Ameríndia. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional,
1946, um texto publicado pelo Ministério da Educação e
Saúde. [Links]
57 RONDON, J. O Índio como sentinela das
nossas fronteiras. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1944, p.
34. [Links]
58 PAULA, J.M. de. Terra dos Índios. Rio
de Janeiro, 1944, pp.90-91. [Links]
59 Para um exame sobre como o governo Vargas engajou a
classe trabalhadora, ver GOMES, A. de Castro. A Invenção do
trabalhismo. Rio de Janeiro, IUPERJ, 1994, p.
185. [Links]
60 Ver OLIVEIRA FILHO, J. Pacheco de. 'O Nosso
Governo': os Ticuna e o Regime Tutelar. São Paulo, Marco Zero, 1988, pp.
176-192. Sobre a assistência do SPI aos Mundurukú, [Links]ver
ARNAUD, E. O Índio e a expansão nacional. Belém, CEJUP,
1989, p. 203-255.
61 SPI, Relatório,
(1939), p. 03. [Links]
62 ROSEBERRY, W.
"Hegemony and the Language of Contention". In JOSEPH, Gilbert M. and
NUGENT, Daniel (eds.). Everyday Forms of State Formation: Revolution
and the Negotiation of Rule in Modern Mexico. Durham, 1994, p.
361. [Links]
63 Ver SILVA, A. Lopes da. "Dois Séculos e meio
de História Xavante". In História dos Indios no Brasil. pp.
362-365. [Links]
64 MAYBURY-LEWIS,
D. Akwe-Shavante Society. New
York, 1974, p. 02. [Links]
65 Idem, pp.
167-170. Ver também GIACCARIA, B. e HEIDE, A. Xavante (aúwe Uptabi:
Povo Autêntico). São Paulo, Dom Bosco, 1972, pp.
36-43. [Links]
66 A Noite,
24 Agosto 1944, p.
01. [Links]
67 SOUZA, L. de. Os Xavante e a Civilização. Rio
de Janeiro, 1953, p.
31. [Links]
70 Sobre a ecologia do Brasil Central e as adaptações
dos Xavante a ela, ver FLOWERS, N. "Forager-Farmers: The Xavante Indians
of Central Brazil". Tese de doutorado, City University of New York,
1983. [Links]
71 NIMUENDAJU,
C. The Serente. Los
Angeles, 1942, p.
08. [Links]
72 Carta de Lírio Arlindo do Valle para Getúlio
Vargas, Rio de Janeiro, Setembro de 1945. MI-SEDOC, Documentos
Avulsos. [Links]
73 Para um resumo biográfico de Poti, ver ALMEIDA,
Geraldo Gustavo de. Heróis Indígenas do Brasil. Rio de
Janeiro, 1988, pp.
105-106. [Links]
74 Para maiores discussões sobre a natureza
contraditória da cultura popular ver JOSEPH, G. e NUGENT, D. "Popular
Culture and State Formation". In Everyday Forms of State Formation: Revolution
and the Negotiation of Rule in Modern Mexico. Durham, 1994, pp.
21-22. [Links]
75 GRAMSCI,
Antonio. Selections from the Prison Notebooks. Trad. Geoffrey Nowell Smith, New York, 1971, p.
333.
Blog encantador,gostei do que vi e li,e desde já lhe dou os parabéns,
ResponderExcluirtambém agradeço por partilhar o seu saber, se achar que merece a pena visitar o Peregrino E Servo,
também se achar que mereço e se o desejar faça parte dos meus amigos virtuais faça-o
de maneira a que possa encontrar o seu blog,irei seguir também o seu blog.
Deixo os meus cumprimentos, e muita paz.
Sou António Batalha.
Obrigado por seus elogios, e é bom saber que mais pessoas possam tirar proveito dessa iniciativa que comecei há quase cinco anos.
ExcluirSou Bisneta do Lírio Arlindo do Valle,tenho mais "Histórias" desse grande Guerreiro que desafio seu próprio tempo e coragem para servir nosso Pais!
ResponderExcluir