sexta-feira, 3 de abril de 2020

O nome do pai: os patronímicos

No mundo, distantes povos e culturas possuem o hábito criar nomes, mas principalmente sobrenomes a partir da descendência masculina, em outras palavras, a linhagem paterna. Embora tal prática remonte desde a Antiguidade, ainda hoje é comumente utilizada. O presente texto é mais para um sentido de curiosidade do que a história dos patronímicos. Sendo assim, procurei apresentar os principais patronímicos mais comumente usados atualmente, separando-os por caso de país ou cultura. 

Brasil

No Brasil diferente de Portugal, o emprego das palavras Júnior, Filho, Neto e até mesmo Bisneto e Sobrinho é mais recorrente. De forma menos usual, encontra-se também o emprego das palavras segundo e terceiro para se referir ao filho e neto, já que tanto em Portugal quanto no Brasil, proibiu-se o uso dos numerais romanos para os nomes próprios. 

Embora os portugueses no passado tenham usado essas palavras para compor os patronímicos, com o tempo eles abandonaram tal uso. Porém, no Brasil isso continua bem comum.

Por exemplo: Luís José da Silva Júnior ou Luís José da Silva Filho. Por sua vez, se o nome completo dele for Luís José da Silva Neto, significa que seu pai chamava-se Luís, e o pai dele era Luís também. Essa é a lógica dos patronímicos brasileiros. 

Outro exemplo é Carlos Henrique Macedo Segundo para se referir ao filho, e Carlos Henrique Macedo Terceiro, para se referir ao neto. 

Curiosamente, no Brasil também possuímos o matronímicos como Filha, Neta e até Sobrinha. Por exemplo: Maria Assunção Oliveira Filha ou Maria Assunção Oliveira Neta, ou Maria Assunção Oliveira Sobrinha. 

O uso desses patronímicos no Brasil é tão comum, que em muitos casos o filho e o neto são chamados pelos familiares e amigos não por seus prenomes ou sobrenomes, mas simplesmente de Júnior, Filho ou Neto. 

Tradição ibérica

Durante o medievo em Portugal e nos reinos hispânicos (pois a Espanha formou-se no século XV), os patronímicos eram formados com o uso de sufixos como ez, z, iz, es. Assim, um Juan Martinez era Juan filho de Martin. Já Pedro Marques era Pedro filho de Marcos. Com o tempo esses patronímicos ibéricos acabaram se tornando sobrenomes de famílias como as famílias Gomes, Álvares, Fernandes, Lopes, Marquez, Núnez, Sanches, Soares etc. 

Atualmente esse costume foi abandonado. Os portugueses e espanhóis quando querem nomear o filho com o mesmo nome do pai, geralmente adotam a palavra Júnior ou a sigla Jr. Ou nem se quer usam ao sufixo ou termo para diferenciá-los, pois nos países de língua hispânica não há o hábito de usar as palavras hijo ou nieto para os sobrenomes. 

Itália

No caso da Itália o uso de patronímicos decaiu muito, mas geralmente ainda é feito com o uso da letra i. Sendo assim, nomes como Paolo Rossi (Paulo filho de Rosso) ou Marco Lorenzoni (Marco filho de Lorenzo), pois o i significa "filho de". Porém, é preciso sublinhar que nem todo nome terminado em i significa um patronímico, há casos como Lombardi (da Lombardia) e Castelli (do castelo), cujos sobrenomes são de origem geográfica. 

Irlanda

Os patronímicos irlandeses são famosos por usarem não sufixos, mas prefixos, no caso destacam-se o mc e mac para filho e o uso do o' para neto. Devido a migração de irlandeses para à Inglaterra, Escócia e Estados Unidos, não é incomum encontrar pessoas desses países tendo patronímicos irlandeses como sobrenomes. Sendo assim, Clint McJohn significa Clint "filho de John", ou Liam MacLiam, que significa Liam "filho de Liam". O patronímico irlandês era usado tanto quando o filho tinha o mesmo nome do pai, ou apenas para dizer quem era o pai dele. Condição essa que alguns desses patronímicos como McTurk, McArthur e McDonald se tornaram sobrenomes de família. 

Quanto ao uso do o' para se referir a neto, temos o exemplo de John O'Ryan, que corresponde a dizer que aquele era John "neto de Ryan". Da mesma forma que alguns patronímicos com mc e mac se tornaram sobrenomes, temos também patronímicos com o' que se tornaram sobrenomes como O'Callaghan, O'Brien, O'Donell

Países escandinavos

Países como Dinamarca, Noruega, Suécia e Islândia até hoje conservam a prática de adotar patronímicos como sendo sobrenomes oficiais. Tal costume remonta ao período medieval pelo menos. No caso, o patronímico é representado pelo uso dos sufixos son, søn e sen. Que significa "filho de". Sendo assim, por exemplo, o escritor e poeta Snorri Sturluson (1178-1241), possível autor da Edda em Prosa (séc. XIII), famoso livro sobre mitos nórdicos, seu sobrenome Sturluson significa "filho de Sturlu"Um homem chamado Hans Bjornsen, significa que era filho de Bjorn. 

As mulheres também recebem o nome do pai como sobrenome. Por exemplo, o navegador e colonizador viking, Eric, o Vermelho, tinha como um dos filhos, o navegador Leif Ericson. Por sua vez, sua filha era chamada de Freydis Ericdóttir. Pois o nome Ericdóttir significa "filha de Eric". Neste caso, para mulheres usa-se os sufixos dotter, dóttir ou datter.

No caso da Dinamarca, Suécia e Noruega até se encontram sobrenomes sem ser patronímicos, porém, na Islândia o costume ainda é mais comum. Muita gente lá não possui um sobrenome de família, mas é nomeado pelo nome do pai. Como Magnus Magnusson ou Hans Hanson. 

Curiosamente sobrenomes como Watson, Peterson, Grayson, Masterson, Johanson, etc. que são encontrados na Inglaterra, Estados Unidos e até na Escandinávia, sendo estes legados desse antigo costume patronímico. A diferença é que se tratam de sobrenomes de família, e não patronímicos comuns. Fato esse que a atriz e cantora Scarlet Johansson tem como sobrenome Johanson e não Johandóttir. Pois seu Johansson é um sobrenome, já que o pai dela chama-se Karsten Olaf Johansson

Tradição árabe

Entre os árabes o uso de patronímicos é bem comum, fazendo-se uso das expressões ibn, ibne ou bin para homens e bint para as mulheres. Dessa forma temos como exemplo o profeta Mohammed ibn Abdalá, que refere-se a Mohammed filho de Abdalá. Por sua vez, tomando o profeta como referência novamente, cito o exemplo de Fátima bint Mohammed, que era uma de suas filhas. 

Com a expansão árabe entre os séculos VIII ao XII, o costume de usar tais palavras para compor os nomes completos e sobrenomes foi levado a outros povos asiáticos e africanos que foram conquistados pelos árabes ou adotaram sua língua e costumes. 

Países eslavos e bálticos

Os patronímicos eslavos seguem um conceito similar ao caso escandinavo. Lá tanto filhos quanto filhas, costumam receber o nome do pai como sobrenome ou nome do meio. Para o caso masculino usam-se os sufixos ovicth, evitch e itch. Já para o caso feminino usa-se ievna, ovna e itchna

Tomemos como exemplo o famoso escritor Lev Tolstói (1828-1910), também conhecido como Leon ou Liev. Ele teve ao todo treze filhos. Apesar do sobrenome de sua família ser Tolstói, todos seus filhos e filhas receberam seu patronímico. Logo alguns de seus filhos chamavam-se Sergei Lvovich, Nikolai Lvovich, já algumas das suas filhas chamavam-se Maria Lvovna e Tatyna Lvovna

A famosa grã-duquesa Anastásia (1901-1918), chamava-se Anastásia Nikolaevna Romanov, pois seu pai era o czar Nicolau II. Já o famoso cosmonauta Iuri Gagarin (1934-1968), tinha como nome completo Iuri Alekseievitch Gagarin, poi seu pai chamava-se Aleksei. 

Na Rússia ainda é costume o patronímico seja o nome do meio, além de ser pronunciado apenas por familiares ou amigos próximos. Assim, ao invés de alguém ser chamado de Ivan, seria chamado de Ivanovitch, por se tratar de uma forma mais pessoal de tratamento


Tabela com os sufixos patronímicos dos países eslavos e bálticos.  

Normandia

Durante a época do Condado da Normandia e do Ducado da Normandia, na Idade Média, os normandos usavam a palavra fitz, fiz ou filz como sufixo para identificar o patronímico. Logo, uma pessoa era referida como Pierre FitzAlan (Pierre filho de Alan), ou Jaime Fizgilbert (Jaime filho de Gilbert). Com a conquista da Inglaterra por Guilherme, o Conquistador, rei normando, o costume foi levado aos ingleses, daí haver famílias inglesas adotando a prática normanda de nomear seus filhos com o nome do pai, usando-se os prefixos fitz e as suas variações. Na Idade Moderna a forma de emprego desses prefixos patronímicos foi abandonada, porém, alguns nomes surgido nessa época originaram famílias como os Fitzgerald

Estados Unidos

Embora os Estados Unidos tenha herdado patronímicos de origem escandinava, inglesa, irlandesa, alemã, francesa, italiana etc. Esses se difundiram como sobrenomes de família, não como patronímicos comumente usados. Inclusive os americanos fazem pouco uso de patronímicos, e quando fazem, geralmente usam a palavra Júnior ou a sigla Jr, para se referir aos filhos, como em John D. Rockfeller Jr. Quando eles querem nomear o neto, bisneto ou trineto, usa-se os numerais romanos. Como exemplo temos o senador John D. Rockfeller IV. 

França

O caso francês é curioso, pois muitos nomes hoje que usamos normalmente são originários de patronímicos, os quais foram concebidos para serem não sobrenomes necessariamente, mas prenomes mesmo. Por exemplo, na França da Baixa Idade Média (sécs. V-X), começaram a surgir os patronímicos, adicionando-se sufixos como ard, in, que originou nomes como Bernard (filho de Bern), Richard (filho de Rich), Gerard (filho de Ger), Martin (filho de Mart), ou prefixos como de, des, du e lu visto em nomes como Desmond, Despat e Desmarais. 

Roma Antiga

Entre os romanos havia o costume de nomear os filhos e filhas a partir do nome do patriarca da família ou com base no sobrenome da família. Por exemplo, o famoso Caio Júlio César, seu prenome era Caio, já Júlio e César eram seus sobrenomes, sendo que Júlio era seu patronímico, pois ele pertencia a família Júlia. Uma das suas tias chamava-se Júlia César. Aqui sublinho o fato que os romanos não empregavam prefixos ou sufixos, palavras ou numerais para designar os descendentes com o mesmo nome. Neste caso, Caio Júlio César tinha o mesmo nome que seu bisavô. 

Outro exemplo, temos o caso do imperador Caio Otávio, que pertencia a família Otávia, e sua irmã chamava-se Otávia. Já o general Marco Antônio pertencia a família Antônia. O imperador Cláudio pertencia a família Cláudia. Seus filhos e filhas chamavam-se Cláudio e Cláudia. 





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