domingo, 10 de março de 2024

O dinheiro em diferentes épocas

Ao longo da História diferentes formas de dinheiro foram desenvolvidas, algumas bastante antigas ainda perduram hoje em dia, mesmo tendo surgido há milhares de anos. Dessa forma, o presente texto apresenta algumas dessas formas pelas quais o dinheiro se manifesta. 

Conceito de dinheiro

O dinheiro refere-se a meios que representam valores reais através de suportes físicos (materiais) ou virtuais (imateriais). Esses meios podem ser moedas, cédulas, cartão de crédito, cheque, conta bancária, nota promissória, bilhete premiado, vales etc. O dinheiro também pode estar manifestado através de mercadorias, produtos, animais, plantas, imóveis etc. O dinheiro também é referido como ativo financeiro, que consiste em qualquer coisa que represente um valor econômico positivo aceito para se efetuar atividades econômicas diversas. 

Dessa forma, o dinheiro consiste em meios pelos quais é possível adquirir produtos, mercadorias, imóveis, móveis etc; além de adquirir serviços diversos. O dinheiro é usado para se pagar salários, impostos, tributos, taxas, licenças, autorizações etc. 

O dinheiro também representa a capacidade de poder aquisitivo de uma pessoa na sociedade, o que expressa os parâmetros de riqueza e pobreza. Atualmente em muitas sociedades esses parâmetros estão divididos em classes sociais, indo desde os miseráveis que passam fome regularmente, não possuem habitações adequadas, estão desempregados e padecem de outros problemas; até as classes altíssimas, formadas por bilionários. 

Atualmente no século XXI o dinheiro movimenta o mundo. Viver sem dinheiro é quase impossível, embora existam comunidades que não fazem uso de dinheiro, vivendo da produção de subsistência e do escambo. Mas esses casos são exceções. Para viver e sobreviver é preciso ter algum dinheiro, pois as sociedades atuais, sejam elas capitalistas, socialistas, rurais ou industriais, necessitam de alguma forma de dinheiro. 

O escambo

A prática do escambo antecede a criação do dinheiro propriamente falando. Ela surgiu ainda na Pré-história, tratando-se da realização do comércio ou de alguma forma de compra ou venda baseada na troca de mercadorias. Inclusive o pagamento de tributos e impostos também era feito com base nessa prática. No entanto, engana-se aquele que acredita que o escambo foi abolido quando as moedas surgiram. Ainda hoje alguns povos nas Américas, África e Oceania fazem uso do escambo em suas negociações.

Por conta do escambo ser a troca de mercadorias, basicamente há uma diversidade de produtos e objetos que eram usados para escambo: animais, plantas, minérios, tecidos, joias, ferramentas, armas, matéria-prima etc. No caso do pagamento de tributos, era bastante comum esses serem pagos com uma parcela da produção agrícola e pecuária. Incluía-se também tal pagamento com minérios, madeira e outras matérias-primas. (MARCHANT, 1990). 

Essa condição foi mantida mesmo depois da criação das moedas. Fato esse que no Brasil colonial os senhores de engenho pagavam seus tributos à Coroa e a Igreja, em açúcar; mais tarde no século XVIII, o ouro descoberto em Minas Gerais era confiscado pela Coroa, mas os donos de minas privadas também pagava o imposto em ouro. (MARCHANT, 1990). 

O escambo ainda existe informalmente, sobretudo na forma de troca de favores entre amigos, familiares e conhecidos. Além disso, existem feiras, sebos, mercados de pulgas e sites especializados em escambo, onde as pessoas oferecem suas mercadorias em troca de outras. Mesmo passados milhares de anos, a prática do escambo não sumiu completamente, apenas se restringiu a alguns aspectos bem específicos. 

A moeda

A primeira forma de dinheiro falando propriamente surgiu com as moedas. Elas foram o primeiro invento que concedeu uma materialidade a noção de dinheiro. Antes disso o comércio, os impostos, os pagamentos, eram feitos com escambo. 

Algumas das moedas mais antigas encontradas datam da China por volta de 1100 a.C, sendo lingotes de bronze, embora alguns historiadores questionam se esse objeto poderia ser tratado como uma moeda. Após isso, só temos notícia de moedas datadas do século VII a.C, na Lídia (atualmente parte do território turco). Essas primeiras moedas eram feitas de prata, sendo pequenas, cabendo na palma da mão, sendo mais ou menos redondas e já possuíam imagens em ambos os lados. Assim, pode-se considerar esses como sendo os primeiros exemplares de moedas como conhecemos. (DAVIES, 2002). 

Moeda de prata do rei Aliate I da Lídia, datada de entre 635 a.C e 585 a.C. 

As primeiras moedas eram feitas de prata, mais tarde surgiram moedas de ouro. Mas em geral ao longo da história até a Idade Moderna era comum que as moedas fossem cunhadas com uma porcentagem de um desses dois metais nobres, pois o valor monetário era material, ou seja, o valor da moeda estava na quantidade de prata ou ouro que ela possuía. Entretanto, além de ouro e prata, moedas de cobre, estanho, bronze e de outras combinações de metais também foram produzidas. (DAVIES, 2002). 

Além dos lídios, outros povos da Ásia, Europa e África começaram a produzir suas moedas nos séculos seguintes como os persas, egípcios, micênicos, gregos, romanos, indianos, chineses. As técnicas de cunhagem já estavam bem avançadas no século V a.C, período em que havia moedas com riqueza de detalhes, apresentando imagens bem elaboradas. 

O uso de moedas foi o principal suporte do dinheiro por milênios, fato esse que ainda hoje moedas são utilizadas na maior parte do mundo, embora elas não sejam mais feitas de ouro ou prata, mas geralmente de cobre, latão, estanho, e seu valor monetário é representado por números cunhados no lado chamado de coroa. 

A nota promissória e o papel-moeda

As promissórias surgiram na China por volta do século VII d.C, durante a Dinastia Tang (618-907), as quais não diferiam das notas promissórias atuais. Basicamente trata-se de um título de câmbio onde uma pessoa se comprometia em pagar um valor em determinado prazo. No entanto, a partir desse título impresso séculos depois surgiu na Dinastia Song (960-1279) o jiaozi, considerado o primeiro papel-moeda. (DAVIES, 2002). 

O jiaozi era baseado nas notas promissórias, mas a diferença é que ele já apresentava valores fixos. Esse dinheiro de papel era normalmente usado por mercadores e o governo, para se pagar valores altos, pois o restante das atividades econômicas se fazia com o uso das moedas. 

Uma nota jianzi, datada do século XII. 

Quando Marco Polo viveu na China no século XIII, ele relatou em seu livro ter visto o uso de papel-moeda, algo inexistente em outras partes do mundo, inclusive quando os italianos leram a respeito, acharam que Polo estivesse mentindo, pois a concepção daquele tempo era que o dinheiro deveria mostrar seu valor no próprio suporte como moedas de prata e ouro, diferente de uma nota feita de papel de arroz. 

Por volta do século XIV, algumas cidades italianas e belgas começaram a fazer uso de notas promissórias, especialmente entre acordos comerciais de valor mais elevado. Os bancos europeus começariam a surgir no século XV, permitindo a ampliação do uso de notas promissórias. Entretanto, o uso de cédulas de dinheiro ainda tardaria a ocorrer na Europa. Os ingleses, suecos e holandeses fizeram testes com notas de dinheiro no século XVII, mas foi o Banco da Inglaterra a partir de 1695 que se tornou o primeiro banco europeu e ocidental a emitir regularmente cédulas. Inicialmente no valor de 20 libras. Algumas das cédulas chegavam até o valor de 1000 libras. (DAVIES, 2002). 

No século XVIII o uso de papel-moeda ainda era escasso na maior parte do mundo, poucos países faziam uso dele. Inclusive os Estados Unidos foi um dos primeiros novos países do mundo a adotar o uso também do dinheiro de papel, chamado de dólar. 

Uma nota de 55 dólares datada de 1779.

A partir de 1792 foi criada a Casa da Moeda dos Estados Unidos, que legalizou o uso do dólar como única moeda oficial do país, passando a ser cunhado em moedas e impresso em cédulas. Todavia, foi somente no século XIX com melhorias na industrialização que os países começaram a adotar o uso regular do papel-moeda. 

O cheque

O uso de cheque surgiu na Europa medieval por volta do século XIV, com a expansão comercial do final do medievo. Nessa época já se fazia uso de notas promissórias, mas elas não eram garantias que o cliente iria pagar, assim, uma alternativa surgida foi o cheque, um título de crédito a ser descontado de uma conta corrente. Apesar de não existir banco naquela época, existiam depósitos de moedas ou casas do tesouro. Ali os ricos guardavam sua riqueza, e funcionários trabalhavam administrando o dinheiro e descontando os cheques emitidos. (DAVIES, 2002). 

Mais tarde no século XVII, com a expansão dos bancos pela Europa, o uso de cheques foi melhorado e ampliado graças ao a criação de uma rede bancária em vários países, além de casas de câmbio também. Isso passou a facilitar o uso de cheques, que eram utilizados normalmente para o pagamento de somas elevadas, pois valores mais baixos usavam-se moedas. (DAVIES, 2002). 

Um cheque de 1793 emitido pela empresa Barclays and Co, no valor de 39 pounds, 4 shillings e 2 pences para Messrs Barclay and Tritton. 

Com a difusão dos sistema bancário no século XIX a nível mundial, o uso de cheques se difundiu também, alcançando seu auge no século XX. Embora que atualmente o uso de cheques decaiu bastante em vários países devido as alternativas de pagamento mais rápido e fáceis como cartões de crédito, débito em conta e pagamentos virtuais. 

O cartão de crédito e débito

Os primeiros cartões de crédito começaram a serem emitidos nos Estados Unidos em 1934, por companhias aéreas, graças a uma iniciativa da American Airlines e da Air Transport Association. Os clientes que costumavam fazer voos regulares recebiam cartões que continham seus nomes e outros dados, os quais eram usados para se comprar as passagens aéreas e até concediam descontos também. Na década seguinte outras companhias aéreas adotaram os chamados air travel card (cartão de viagem aérea), os quais se tornaram os precursores do cartão de crédito. (MANDELL, 1990). 

Na década de 1950 os empresários Frank McNamara e Ralph Schneider, donos da rede de restaurantes Dinners Club, tiveram a ideia de implementar cartões de crédito para serem usados em seus restaurantes e clubes. A ideia se mostrou bastante promissora que em 1958 o banco American Express passou a emitir cartões de crédito para seus clientes, os quais eram aceitos em vários estabelecimentos americanos. Neste mesmo ano o Bank of America também criou um cartão de crédito e a famosa bandeira Visa. (MANDELL, 1990). 

Cartão de crédito da primeira-dama Eleonor Roosevelt, do Diners Club, com validade até maio de 1962. 


Na década de 1960 surgiu a bandeira MasterCard, assim como, o sistema de cartões foi sendo difundido para outros países, com a expansão das tecnologias da informação e mais tarde dos computadores. Isso foi importante para conectar os bancos, agências bancárias, casas de câmbio, lojas e outros estabelecimentos ampliando a rede de disponibilidade de uso de cartões de crédito, o que foi essencial para a difusão dos cartões de débito. Assim, nos anos 1970, muitos bancos já emitiam os dois tipos de cartões, o chamado "dinheiro de plástico", hoje tão popular.  

Criptomoedas ou moeda virtual

Em 2008 o programador Satoshi Nakamoto, um pseudônimo usado pelo criador (ou criadores) da primeira criptomoeda funcional, lançada em 2009 oficialmente com o nome de bitcoin. A ideia acabou com o tempo se tornando uma sensação nos anos seguintes, mas ainda hoje divide opiniões de economistas pelo mundo, havendo quem defenda as criptomoedas como uma alternativa ao dinheiro físico e aos sistemas finaneceiros tradicionais, e há quem aponte que as criptomoedas sejam usadas para lavagem de dinheiro e outros crimes, além de não ser uma forma financeira sustentável. (ULRICH, 2014). 

Enquanto as moedas e cédulas possuem um controle de cunhagem e impressão, fato esse que produzir tais suportes sem autorização é ilegal, por sua vez, as contas bancárias são registradas e verificáveis, o caso do bitcoin e outras criptomoedas é mais problemático, pois elas não estão vinculadas a bancos ou governos, apesar de possuírem registro criptografado (por isso o termo criptomoeda, ou seja, moeda codificada), no entanto, existem meios para burlar as formas de transação e até dificultar o rastreamento desses tipos de moedas virtuais. (ULRICH, 2014). 

Apesar dessa problemática, o uso de criptomoedas cresceu bastante nos últimos quinze anos por ter facilitado transações financeiras via online. Hoje já existem mais de vinte criptomoedas como a Bitcoin, a Ethereum, a Tether, a USD-Coin, a Binance, etc. Cada uma dessas moedas virtuais faz uso de suas próprias redes financeiras e blockchain (bases de dados nas quais operam as transações e produção desse dinheiro). 

Logo de várias criptomoedas, ao centro a Bitcoin, a primeira moeda virtual criada. 

O uso de criptomoedas demanda a criação de contas (ou carteiras virtuais) que recebam esse dinheiro, o qual depois será convertido para outras moedas reais através do câmbio. Além disso, dinheiro comum pode ser convertido em criptomoeda também. Cada criptomoeda possui sua própria conta online, embora possa se fazer câmbio entre elas também. 

E existe a prática da "mineração" em que usam-se programas os quais executam uma série de cálculos e outras atividades num blockchain, e à medida que essas atividades e cálculos são resolvidos, gera-se receita. Assim, algumas pessoas usam seus computadores ou servidores para deixarem efetuando essas atividades para gerar dinheiro para elas. Mas não é um processo fácil, demanda geralmente muitos computadores e alto gasto de energia, por conta disso, há quem faça descentralização, usando computadores de diferentes localidades. (ULRICH, 2014). 

Mas outra forma de gerar criptomoedas é através de vendas online, especialmente potencializadas pelos NFT (Non-fungible Token), que consistem em produtos virtuais únicos, não podendo ser substituídos, mas podem ser vendidos. Atualmente já existem sites especializados para criar NFT, lojas de comercialização de tais produtos, até jogos que permitem criar NFTs e se fazer o comércio dos mesmos. 

O uso de criptomoedas ainda não foi totalmente regulamentado, há países onde elas são proibidas, outros já permitem seu uso, mais restrito. Todavia, o crescimento dessas moedas virtuais levou alguns países a criar também seu dinheiro virtual, sendo este vinculado a seus bancos centrais, o que concederia maior segurança, confiabilidade e fiscalização das transações online. 

Referências bibliográficas

DAVIES, Glyn. A History of Money: From Ancient Times to the Present Day. Cardiff, University of Wales Press, 2002. 

MANDELL, Lewis. The credit card industry: a history. [s. l], Twayne Publishers, 1990. 

MARCHANT, Alexander. Do escambo à escravidão: as relações econômicas de portugueses e índios na colonização do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1980. 

ULRICH, Fernando. Bitcoin: a moeda na Era Digital. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2014. 

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