Embora as múmias egípcias sejam as mais famosas no mundo, no entanto, outros povos pelo mundo realizaram as práticas de mumificação. Neste texto veremos um pouco da história sobre as múmias feitas pelo povo sul-americano, os Incas, os quais com métodos próprios somados ao clima seco e frio dos Andes, permitiu legar múmias que duraram séculos.
Fotografia que fiz de uma múmia inca no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, em 2012. Essa múmia foi destruída no incêndio em 2018. |
Quando falamos em múmias normalmente é comum vir em mente o exemplo egípcios com suas múmias enfaixadas e guardadas em sarcófagos, no entanto, existem diferentes formas de se fazer múmias. Essencialmente uma múmia pode ser de pessoas ou animais, em que consiste na preservação dos restos mortais de partes do corpo ou do corpo inteiro. Nesse sentido, a múmia consiste num corpo que possui bastante anos, podendo ter décadas ou milênios, mas que não se deteriorou plenamente, tendo conservado seus tecidos, cabelos, pelos e ossos; em alguns casos, há múmias que também apresentam a conservação de trajes, acessórios e objetos.
Assim, temos duas formas para se fazer múmias, a primeira são as chamadas múmias naturais, ou seja, foram oriundas de processos naturais como frio, secura, calor, umidade, se originando a partir de pessoas que morreram em montanhas, desertos, pântanos, etc. Essas múmias naturais podem ter se formado acidentalmente a partir de pessoas que se feriram, adoeceram ou foram mortas nessas localidades, ou surgiram de forma intencional, em que o corpo foi deixado ali para ser preservado.
O segundo tipo trata-se da mumificação artificial, feita a partir de técnicas diversas, somadas ao uso de processos químicos e depois pode-se usar também condições ambientes como baixas temperaturas, baixa umidade e locais secos para ajudar a preservar os corpos. A mumificação artificial conta com diferentes tipos de métodos que envolvem remoção de órgãos, uso de sal, ervas, bandagens, resinas, secar o corpo ao sol, etc.
Entre algumas culturas como a dos Incas e Egípcios, a mumificação teve um papel importante, sendo mais difundida no caso egípcio. Porém, outros povos também adotaram em menor ou maior grau o uso de mumificação, mesmo que fosse restrita para governantes ou sacerdotes. No caso inca e egípcio observou-se o uso da mumificação de forma mais ampla, atingindo diferentes camadas sociais daqueles povos, apesar que para intentos diferentes, pois enquanto no Egito Antigo a religião ditava que o corpo deveria ser preservado para a futura ressureição, as múmias incas como veremos adiante, tinham outro propósito.
Os Incas
Antes falar sobre as múmias desse povo, decidi fazer um breve resumo apresentando quem foram eles. Os incas eram um povo rural que teria surgido na região de Cusco, no Peru, por volta do século XII, formando uma cidade-estado baseada numa monarquia teocrática, em que os monarcas não apenas possuíam funções religiosas, mas eram a conexão com os deuses e até encarados como sendo de origem divina.
O reino inca cresceu por duzentos anos até que a partir de 1438, o monarca Pachacuti (1408-1474) deu início a uma massiva campanha de expansão, sendo continuada por seus sucessores. As conquistas militares do longo governo de Pachacuti criaram o Império Inca (1438-1533), tendo sido o mais extenso império indígena na América do Sul e um dos maiores das Américas, englobando o Peru, Equador, sul da Colômbia, oeste da Bolívia, norte do Chile e noroeste da Argentina. Embora tenha chegado ao fim com a invasão e colonização espanhola.
Mapa mostrando a extensão máxima alcançada pelo Império Inca na primeira metade do século XVI. |
Os Incas desenvolveram um governo estratificado e com certo grau de burocracia, consistindo numa monarquia centralizadora e teocrática, mas possuindo cargos públicos e de governo. Embora não tenham desenvolvido a escrita, eles desenvolveram um sistema de cálculos e contagem únicos, baseado nos quipos. Permitindo o controle econômico do país e até mesmo censitário e cronológico.
Sua religião era politeísta, possuindo templos, festivais, casta sacerdotal organizada, além de fazer uso de sacrifícios de animais e humanos. A sociedade era estratificada entre a nobreza, o alto clero, a população livre no geral e na base estavam os escravos.
A língua oficial era o quíchua, embora como o império governava outros povos, falava-se também outros idiomas em determinadas localidades. Os incas também desenvolveram a arquitetura e a engenharia, construindo cidades de pedra, terraços, canais, pontes etc. Eles também possuíam conhecimentos agrônomos para o cultivo de diferentes plantas em altitudes elevadas.
As múmias incas
Entra a cultura dos incas as múmias não possuíam uma condição de estarem relacionadas a uma crença difundida de conservar os corpos para uma ressurreição futura, como se via no Egito Antigo, para os incas mumificar determinadas pessoas era algo que também possuía uma função religiosa, mas associada com o culto aos mortos e sacrifícios humanos
Rivera (2017, p. 13) comenta que o culto de nobres e imperadores incas, parece ter sido prática instituída pelo imperador Pachacute, responsável pela criação do império. Durante seu longo reinado, o monarca incentivou a criação de múmias de nobres e sacerdotes, as quais eram preservadas em templos para serem alvo de culto, em que honrar os mortos seria uma maneira de se pedir suas bênçãos e intervenção perante os deuses. A prática de cultuar os mortos é bastante antiga e existe em diferentes continentes, sendo encontradas entre várias religiosos e povos.
As múmias incas eram expostas em templos, covas, tumbas, mas também participavam de procissões, rituais festivais, marcando a presença desses governantes ou membros da realeza; lembrando que o imperador, chamado de Sapa Inca, era considerado de origem divina, logo, seus familiares diretos possuíam ligação com o sagrado naquela religião. Além disso, essas múmias serviam para marcar presença dos falecidos nos acontecimentos atuais, mostrando que embora já tivessem morrido, seus corpos santificados estavam ali, preservados, podendo ser vistos e tocados. Passando a possuir um simbolismo fúnebre para aquela religião. (RIVIERA, 2017, p. 14-15).
Duas múmias de Llulaillaco com suas oferendas. Elas foram descobertas em 1999, num vulcão no Chile. |
“Asimismo,
se recuperaron alrededor de 100 objetos depositados como ofrendas asociadas,
incluyendo estatuillas antropomorfas de oro, plata y valva de molusco con
miniaturas textiles y tocados de plumas; figurinas representando camélidos
andinos -llamas y vicuñas- vasijas y platos de cerámica; vasos y cucharas de
madera, bolsas tejidas conteniendo hojas de coca y alimentos”. (CERUTI, 2012, p. 93).
A múmia da Donzela de Llulaillaco, durante exames em 2007. A partir de alguns ângulos dá a impressão que a garota esteja viva e apenas dormindo. |
CERUTI, María Constanza. Los niños del Llullaillaco y otras momias andinas: salud, folclore, identidade. Scripta Ethnologica, vol. XXXIV, 2012, p. 89-104.
ISIDRO, A. Las momias: tipología, historia y patalogía. Rev. Esp. Antrop. Fis. n. 26, 2006, p. 37-62.
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