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Leandro Vilar

sábado, 19 de setembro de 2009

O Século de Péricles

"As reformas políticas realizadas por Péricles ao longo de sua carreira política, transformaram Atenas numa cidade recém saída dos males causados pelo exército persa de Xerxes I, em uma potência política, econômica e cultural da Grécia".
Leandro Vilar 


Péricles foi um notório militar e político da Grécia Antiga, sendo principalmente lembrado por suas realizações na política, pois fora um árduo defensor da democracia em seu tempo. Proveniente de uma respeitada família da aristocracia ateniense, tendo tido uma educação liberal e de qualidade, cresceu numa Atenas devastada pela Guerras Médicas, mas com a ideia de um dia se tornar político e poder recuperar Atenas. Homem de palavras firmes, pensamento astuto, oratória envolvente e cativante, Péricles estava preocupado com sua cidade e seu povo, para ele a democracia que Atenas vivenciava em seu tempo ainda não era digna de ser chamada de democracia (devemos ter em mente que o conceito de democracia daquela época difere do de hoje), pois as alas conservadoras impunham uma forte restrição ao direito dos cidadãos. 

Péricles combateu os conservadores, os corruptos, os traidores, teve que combater ameaças de guerras das outras cidades-Estados, como também empreendeu suas próprias batalhas. Também dedicou-se a promover o desenvolvimento econômico, social e cultural de Atenas, a transformando numa potência em seu tempo. Seus feitos levaram Atenas e a Grécia a entrarem na Era Clássica de sua história, onde o "império ateniense" vivenciara seus tempos dourados, ao ponto de os historiadores falarem que o século V a.C, fora o Século de Péricles

Uma Atenas em ruínas


Péricles
Péricles nasceu por volta de 493 a.C (alguns historiadores apontam também as datas de 495 e 492), era filho do general Xantapo e de Agarista, a qual pertencia a tradicional e poderosa família dos Alcmêonidas. Agarista era parente de Clístenes (565-492 a.C) um dos "Pais da Democracia", legado este que Péricles viria a herdar e tentar revitalizar. No ano de 490 a.C, o rei persa Dario, o Grande enviou um exército para punir Atenas e Erétria, as quais apoiaram a revolta de cidades gregas na Jônia, pequena região na Ásia Menor, hoje na Turquia, mas na época estava sob o domínio do Império Persa. Erétria fora conquistada, mas os persas foram derrotados pelos atenienses e os platenses na Batalha de Maratona (490 a.C). A primeira Guerra Médica ou Guerra Greco-persa havia terminado. Na época Péricles era uma criança e nem imaginava que tal acontecimento traria sérios problemas para sua cidade e seu povo no futuro. Dario, o Grande em 486 a.C tentou iniciar uma nova guerra, mas acabou falecendo naquele ano, mesmo assim, o general ateniense Temístocles incentivou o povo ateniense a não "baixar a guarda", Temístocles acreditava que o herdeiro de Dario, neste caso Xerxes, um dia viria atacar  a Grécia novamente. 

Enquanto isso não acontecia, Péricles fora crescendo e fora educado nas melhores escolas da cidade e por alguns dos melhores professores e filósofos da época como Anaxágoras, Zenão de Eleia e Protágoras, recebendo uma educação exemplar em seu tempo; o mesmo aprendeu a ler e escrever, aprendeu história, geografia, um pouco de matemática, possivelmente retórica; aprendeu a apreciar as artes e a treinar o corpo, pois os gregos consideravam que um estudante deve-se ter um corpo são e uma mente sã. Ele assim como os outros meninos eram treinados para um dia poderem ingressar no exército, algo que Péricles veio a fazer, mas antes de chegarmos a este ponto, o que o general Temístocles e outros governantes de Atenas temiam, veio a acontecer.

No ano de 480 a.C, Xerxes, o rei da Pérsia invadiu a Grécia pelo norte, atravessando a Trácia e a Macedônia. Atenas e Esparta que eram rivais de longa data, se mobilizaram para criar alianças com as outras cidades-Estados para combater o poderoso inimigo, mesmo assim os gregos perderam as primeiras batalhas, os atenienses tiveram que abandonar sua cidade, pois o exército de Xerxes marchava em direção a esta. O Oráculo de Delfos (o mais famoso oráculo da Grécia) havia previsto que Atenas não iria se salvar da fúria do rei persa. Grande parte da população ateniense se refugiou na ilha vizinha de Salamina. Péricles e sua família foram um destes refugiados. 

Os atenienses que ainda ficaram para defender sua cidade foram massacrados. Atenas que era uma pequena cidade na época, fora invadida, a Acrópole fora incendiada, a cidade fora saqueada. Xerxes assistiu tudo aquilo com orgulho. A vingança que ele havia jurado ao seu pai, de que destruiria Atenas havia sido concretizada. Agora o próximo passo era conquistar Grécia. Todavia, a vitória persa sofreria um revês derradeiro e nunca imaginado pelos persas. Em setembro daquele ano, na Batalha de Salamina (480 a.C), a gigantesca frota persa fora encurralada próxima a ilha de Salamina, e quase metade dos navios persas foram destruídos e avariados na ocasião. A derrota fora tão surreal para Xerxes que ele decidiu abandonar a campanha e retornou para a Pérsia, porém seu exército ainda permanecera na Grécia, mas fora definitivamente derrotado no ano seguinte na Batalha de Platéia (479 a.C) e na Batalha de Mícale (479 a.C), batalha esta que o pai de Péricles atuou. As pequenas cidades gregas haviam derrotado o poderoso Império Persa. 

"Em 480 a.C, após a guerra, os atenienses retornaram para uma cidade totalmente destruída - o mercado, as escolas, os templos e os locais de reunião haviam sido arrasados. Mas a história e as tradições de Atenas estavam intactas na memória e no coração de seus cidadãos. E estes estavam determinados a restaurar rapidamente a grandeza da cidade, tanto no seu aspecto físico como no nível de suas instituições". (KING, 1988, p. 15).

Os anos pós-guerra e a Liga de Delos

Pouco se sabe sobre a infância e adolescência de Péricles, e até mesmo acerca da sua vida familiar e particular, o mesmo é mais conhecido por sua vida pública ou política. Mas antes de prosseguir com sua vida, devo mencionar um acontecimento importante ocorrido neste meio tempo. Em 477 a.C, representantes da cidade de Atenas, das cidades da Jônia e de várias ilhas do mar Egeu se reuniram na ilha de Delos, para forma uma confederação ou aliança como alguns chamam, a qual ficou conhecida como a Liga de Delos

A Liga de Delos tinha como meta reunir as cidade gregas para combater os persas e outros inimigos, o que incluía até mesmo outras cidades gregas; como também ajudar-se mutuamente em questões políticas, econômicas, sociais, etc., de fato a liga representou um dos primeiros "mercados comuns" da História, pois a moeda ateniense passou a ser a moeda padrão da liga. Além disso, anualmente todas as cidades membros depositavam uma quantia nos cofres em Delos, tesouro este utilizado para eventuais necessidades da liga, como equipar e armar exércitos, realizar reformas, construções, construir navios; pagar dívidas, comprar alimentos se fosse necessário, contratar mercenários, etc. 


Dracma de prata ateniense. A coruja é um animal associado a deusa Atena e personifica a sabedoria. Os dracmas atenienses se tornaram uma poderosa moeda no mundo grego. 
"A confederação começou imediatamente o seu trabalho. Os aliados dos persas foram varridos do norte do Egeu e os piratas que rapinava navios mercantes gregos goram expulso de seus refúgios nas ilhas. A medida que a liga ampliava o seu raio de operações, mais cidades nas ilhas e nas costas do Egeu eram convidadas a participar". (KING, 1988, p. 29).


Mapa das cidades membros da Liga de Delos no ano de 431 a.C. Em laranja a cidade-Estado de Atenas, líder da liga. Em amarelo as cidades membros. 
A Liga de Delos fora o início do "império marítimo ateniense". Embora Péricles ainda fosse jovem na época que a mesma surgiu, anos mais tarde ele passaria atuar na liga, mas naquele momento o chefe da liga era o general ateniense Címon


Címon
"O líder militar da Liga de Delos era o general ateniense Címon. Aristocrata renomado por seu temperamento generoso, Címon era também um brilhante estrategista. Assumindo firmemente o controle das finanças e da organização militar da liga, ele conduziu os gregos numa longa campanha contra os exércitos persas na Ásia Menor. [...]. As vitórias de Címon, as doações que fez aos pobres e sua aplicação de recursos para melhorar os lugares públicos de Atenas tornaram-no muito popular. No entanto, suas ideias políticas eram conservadoras: apoiava uma democracia limitada e acreditava que os atenienses deveriam deixar as decisões a cargo de homens como ele mesmo, provenientes de famílias aristocráticas". (KING, 1988, p. 29). 

Seria devido a este pensamento conservador que Péricles quando já estivesse na política entraria em discordância com Címon, embora que em dados momentos os dois chegaram a trabalhar juntos, pois tinham algo em comum: o amor por sua cidade.

Ésquilo
Em 472 a.C, Péricles contava com seu 19 ou 21 anos, já havia entrado na vida adulta e se encontrava nesta época no exército desde os 18 anos. Fora neste ano que que Péricles, um apreciador das belas-artes patrocinou a peça Os Persas do famoso dramaturgo Ésquilo (525/524-456/455 a.C)A peça narra a história da invasão de Xerxes à Grécia, a mesma consisti numa tragédia que termina mal para os persas, mas bem para os gregos, como fora a verdadeira história. Neste caso, Péricles pagou o coro da peça. Na época, Os Persas foram um sucesso no teatro ateniense, e Péricles fora parabenizado por ter investido naquela peça e dado confiança a Ésquilo, isso o ajudaria anos mais tarde em sua carreira política. Posteriormente seu pai falecera, Péricles sendo o filho mais velho acabou herdando as propriedades da família e a obrigação de cuidar das propriedades e da família, ao mesmo tempo se preparava para entrar na política. Em 471 a.C, o governo votou o ostracismo de Temístocles, o general que liderou com sucesso a campanha ateniense contra os persas em 480 a.C, era visto pelas alas conservadoras como uma ameaça ao seu poder, pois Temístocles discordava de alguma das decisões dos mesmos. Mesmo assim fora exilado de Atenas, indo buscar ironicamente asilo na corte persa de Xerxes, onde faleceu algum tempo depois. Em 469 a.C, as campanhas militares de Címon para derrotar os persas na Macedônia, Trácia e na Jônia resultaram em vitória para os gregos, isso contribuiu para aumentar o prestígio de Címon e os conservadores em Atenas.

"Antes de concorres às eleições, entretanto, Péricles tinha de levar em conta sua aparência física. Os cidadãos de Atenas mostravam marcada preferência por indivíduos de físico perfeito e os autores de comédias costumavam fazer piadas malévolas com políticos muito feios e portadores de defeitos, como os narigudos e os muito gordos". (KING, 1988, p. 26).

Embora os relatos registrem que Péricles era um homem razoavelmente belo, havia um problema com sua imagem, ele tinha uma cabeça grande. Seu "cabeção" fora um problema que ele não pode resolver. Péricles recebera do comediante Cratino o apelido de "cabeça de santola", em alusão a espécie de caranguejos (Maja squinado) comumente chamada de santola. Tais caranguejos são animais grandes, e como os caranguejos não possuem pescoço, sua cabeça e ligada ao corpo, dando a ideia de que seja maior do que aparenta ser. Na tentativa de amenizar tal comparação, Péricles ordenou que as estátuas que o representavam, devessem trager um elmo, a fim de esconder sua cabeça alongada. 

As estátuas de Péricles são comumente representadas com ele usando um elmo, na ideia de esconder sua grande cabeça. O comediante Cratino dissera o seguinte sobre as estátuas do general: "Eis Péricles, o nosso Zeus com cabeça de santola, com o Odeon enfiado na cabeça como um capacete enterrado até as orelhas". 
A democracia antiga: aspectos gerais

Para compreendermos melhor os embates realizados por Péricles e vivenciado por ele durante sua carreira política, devemos compreender pelo menos de forma simples como se estruturava a democracia antiga. 

A palavra democracia significa demo = povo + kratia = governo/poder = "governo do povo" ou "o poder do povo". Todavia, o conceito de povo para os antigos atenienses era diferente do conceito atual que temos, o próprio entendimento da democracia difere de hoje. A democracia surgiu no século VI a.C com Clístenes e em certa parte com Sólon, embora Clístenes seja considerado seu "pai fundador". 

Mas antes de prosseguir falando acerca de Clístenes e Sólon devemos entender quem eram os cidadãos, pois apenas os cidadãos participavam do governo da democracia ateniense. Hoje cidadão é qualquer indivíduo nascido em um país ou no caso de ser estrangeiro, possua documentos de identidade do país em que vive, lhe concedendo reconhecimento como cidadão daquela nação. 

Porém, na Grécia antiga, os cidadãos eram apenas os homens, maiores de idade (20 ou 25 anos eram maioridades comuns entre algumas cidades), alfabetizados e oriundos das cidades que viviam. Estrangeiros (metecos), escravos, mulheres, crianças e mestiços não eram reconhecidos como cidadãos. Se uma pessoa nascesse em Atenas, mas se seu pai e mãe não fossem atenienses, ele não seria reconhecido como cidadão ateniense. Logo, a ideia de povo, resumia-se aos cidadãos, os demais eram a "população", e esta "população" não tinha direito de participar da política das cidades-Estados, fosse essa uma democracia, oligarquia, tirania ou monarquia.

A democracia nasceu em Atenas, mas antes de Atenas se tornar uma democracia, ela no passado fora uma monarquia, passando por intervalos que oscilavam entre uma oligarquia e uma tirania, neste caso o conceito de tirania possuía outro sentido. O tirano não era um governante cruel e opressivo, mas sim um homem eleito pelo povo para assumir o governo de sua cidade em casos extraordinários ou de grande necessidade, quando necessitava-se de um líder forte. O tirano embora possuísse grande autoridade, ele não era um rei, mas  um governador auxiliado por um conselho, embora, que alguns tiranos acabaram sendo "tirânicos". 


Sólon
Em 594 a.C, os camponeses se rebelaram em Atenas, pois as famílias aristocráticas haviam usurpado as terras de pequenos camponeses, os expulsando destas e ameaçando eles e suas famílias. Tal massa camponesa seguiu para a cidade e cobrou por uma solução. Nesta época, a economia ateniense era predominantemente rural, e muitas famílias viviam da agricultura e da pecuária. O Conselho dos Arcontes, na época a principal assembleia da cidade, nomeara um arconte para legislar esta causa, o homem escolhido fora Sólon. Sólon (638-558 a.C) fora um renomado legislador, jurista e poeta, embora seja mais lembrado como legislador. 

"Este tomou uma posição intermediária entre as exigências dos latifundiários e dos pequenos agricultores. Reconhecendo que Atenas precisava do apoio de todos os cidadãos para sustentar seus crescimento, reorganizou o sistema político ateniense tendo em vistar dar mais voz aos pequenos agricultores. Aboliu todos os débitos e hipotecas que os haviam transformado em servos dos grandes proprietários de terras e determinou a importação de cereais para prevenir a falta de alimentos. Aboliu também a prisão por dívidas e uniformizou os pesos e medidas, introduzindo a moeda". (KING, 1988, p. 18).

Sólon criou uma nova assembleia, a Eclésia (Ekklesia), uma assembleia popular, onde o povo (os cidadãos) teriam maior participação nas decisões políticas. O mesmo também criou a Boulé, um conselho que reunia quatrocentos cidadãos para votar e debater questões ligadas a cidade, e por fim criou o Tribunal de Helialia, formado por seis mil cidadãos os quais participariam de julgamentos de crimes. Sólon também revisou as leis draconianas, criadas por Drácon por volta de 621 a.C. O código draconiano era bastante severo, e no tempo de Sólon estava desatualizado e não era mais levado a sério, Sólon empreendeu algumas revisões e atualizações. 


Clístenes
Os Pisistrátidas assumiram o poder ateniense como tiranos, Sólon discordava da atuação desta família e partiu em exílio voluntário. O governo tirânico dos pisistrátidas por alguns anos fora prospero e justo, porém por volta do final do século VI a.C começou a se tornar opressivo, e neste momento entrava em cena Clístenes. Os historiadores não consideram Sólon o responsável pela democracia, pois o conceito de democracia inexistia em sua época, ele começara a surgir a partir do trabalho de Clístenes, daí ele ser considerado por alguns como o "Pai da Democracia". 

"Entretanto, por volta de 510 a.C, o governo dos tiranos havia se tornado opressivo, o que os levou a perder o apoio popular com o qual haviam contado durante tanto tempo. Iniciou-se então um movimento para desalojar os pisistrátidas do poder. E o líder desse movimento era Clístenes, chefe de uma das principais famílias de Atenas: os Alcmeônidas. Com a ajuda de um exército enviado por Esparta - na época, a mais poderosa das cidades gregas e inimiga de todos ditadores -, Clístenes forçou o último dos tiranos a fugir para o exterior. 

Com a expulsão dos pisistrátidas, Clístenes dera início a suas reformas políticas. Ele dividiu Atenas em dez tribos (neste caso incluí-se a zona urbana e as rurais), e o Conselho dos Arcontes que antes só possuía nove membros, passaria a ter dez membros, sendo um eleito de cada uma destas tribos (correspondia à zonas do Estado), dessa forma, Clístenes evitava que apenas os cidadãos da cidade tivessem atuação na política e ao mesmo tempo, evitava que apenas os latifundiários também tivessem acesso a política, agora cada cidadão de uma destas tribos teria acesso as estruturas políticas e seus órgãos, independente de sua condição social e de sua renda, requisitos anteriormente cobrados para se atuar nos cargos públicos. O mesmo aumentou o número de membros da Boulé para quinhentos membros, os quais não seriam mais eleitos, mas, sim sorteados. Ele criou o cargo de estratego, o qual era um comandante militar, o qual ficaria responsável por cada uma das tribos, e entre suas atribuições estava o de organizar o exército para a guerra. 

Clístentes também criou o ostracismo, o exílio político. Neste caso para se evitar que novos tiranos assumem o poder de forma errada ou qualquer outro político ou cidadão tentasse agir contra o bem do Estado, tal indivíduo seria enviado para um exílio obrigatório. Clístenes considerava que era dever de cada cidadão agir para o bem da cidade de seus habitantes, se o mesmo agisse de forma corrupta e errônea, era considerado um traidor, pois agiu por interesses egoístas e mesquinhos, usando a política para concretizá-los, preferindo servi a si em primeiro lugar do que ao povo. Os cidadãos votavam o ostracismo, escrevendo em placas de cerâmica o nome dos sentenciados. 


Pedaços de cerâmica contendo o nome daqueles que foram votados para o ostracismo.
As elites atenienses não gostaram das medidas tomadas por Clístenes e decidiram agir. Os mesmos pediram auxílio a Esparta que enviou uma tropa para tomar o poder de Atenas e entregá-lo a seus aliados, porém os atenienses conseguiram derrotar os espartanos e a nova ordem prevalecera. A democracia se iniciava.

Um fato para encerrar esta parte e voltar a falar de Péricles, diz respeito a questão de que a democracia ateniense era direta, ou seja, os cidadãos participavam diretamente das decisões políticas, propondo, criticando, debatendo e votando, embora que em alguns casos, apenas alguns dos conselhos votassem em determinadas decisões, mesmo assim, o povo tinha acesso e participação na política, diferente de hoje, onde todas as nações que vivem sob um governo democrático, são democracias indiretas

Embora, as mulheres possam votar, diferente da Antiguidade; a democracia de hoje, é representativa, ou seja, o povo elege os políticos que são seu representantes nas assembleias, câmaras, senado, parlamento, congresso, etc., o povo não participa mais diretamente das decisões políticas, não debatem, votam, criticam propõem leis, reformas, recursos, orçamentos, verbas, etc., isso é delegado aos representantes políticos. Os plebiscitos, uma invenção romana, onde permitia que na época os plebeus votassem certas questões políticas, hoje raramente é utilizada. 

Péricles entra para a política

Não se sabe ao certo com quanto anos Péricles entrou na vida política, provavelmente ele devia ter mais de 25 anos na época. No início ele atuou como assistente do político Efialtes, líder da ala esquerdista democrática, conhecida pelo seu pensamento progressista. Nesta época, Címon e os conservadores haviam vetado leis que aumentavam a participação dos cidadãos na política, como também concentraram a autoridade do Estado entre seus partidários. Em 463 a.C, os progressistas acusaram Címon de ter recebido um suborno do rei da Macedônia durante as campanhas realizadas por Atenas no país, para mudar o resultado do conflito. Péricles fora escolhido para realizar a acusação publicamente, como era feita na ágora, a qual consistia numa praça onde se debatia questões políticas, filosóficas, realizavam cerimônias, discursos, celebrações, festejos, etc. A ágora era uma parte importante das antigas cidades gregas, e toda cidade possuía sua ágora. Todavia, os juízes negaram a acusação proferida por Péricles, e Címon fora inocentado. 


Alguns dos prédios em volta da ágora, eram prédios que sediavam os conselhos da cidade  de Atenas, além de haverem templos e monumentos. 
Ainda naquele ano, um terremoto atingiu o sul da Grécia, destruindo parte da cidade de Esparta, Címon e os conservadores decidiram dá apoio aos espartanos, pois os hilotas (termo para se referir aos escravos dos espartanos) haviam rebelado contra seus senhores. Esparta era uma diarquia, embora na realidade fosse uma oligarquia. A mesma possuía dois reis, mas os reis não possuíam total autoridade e poder sobre o Estado, eram os Éforos e o Conselho dos Anciãos que controlavam as questões estatais, principalmente os Éforos, os quais formavam um "conselho superior". 

Todavia, os democratas progressistas não eram a favor do apoio militar a Esparta, pois desde que acabaram as Guerras Médicas, os espartanos retomaram sua rivalidade contra os atenienses, embora Péricles fosse amigo do rei espartano Arquidamo II, os democratas temiam que Esparta invadisse Atenas, pois em termos militares os espartanos eram os maiores guerreiros da Grécia. Mesmo assim os conservadores conseguiram aprovar o apoio a Esparta, então Címon partiu liderando uma pequena força militar para ajudar os espartanos a retomar a ordem em suas terras.

"A ausência dos líderes conservadores deu a Efialtes e Péricles uma boa oportunidade para intensificar sua campanha por reformas democráticas. Uma proposta tramitou com sucesso na assembleia: destituir os conservadores do Conselho do Areópago da maioria de suas funções. Essa vitória demonstrou e abriu caminho para novos avanços na legislação ateniense". (KING, 1988, p. 31). 

O Areópago consistia num conselho formado pelos arcontes, geralmente homens provenientes da aristocracia ateniense, logo, cidadãos de origem mais baixa não tinham acesso a tal conselho. O Areópago ao longo da história de Atenas adquiriu e perdeu poderes, no entanto, eles costumavam atuar como juízes, julgando crimes de homicídio, como também debatiam questões ligadas a guerra, e outros assuntos ligados a administração da cidade. Neste caso, o Areópago era formado principalmente pela ala conservadora do governo, logo, a ideia de Efialtes era mudar isso, e permitir o acesso de cidadãos de camadas mais baixas ao cargo de arconte. 

Em 461 a.C, Címon retornou para a cidade, mas tentou promover as mudanças conquistadas por Efialtes e seus partidários, no entanto, o povo havia aprovado as reformas de Efialtes, e consideraram a decisão de Címon como um crime contra a democracia, Címon fora sentenciado ao ostracismo (exílio político forçado, dado a aqueles que ameaçavam a ordem da cidade). O ostracismo era votado pelos cidadãos, e o nome de Címon conquistou a maioria, logo o mesmo deixou a contra gosto a cidade, porém, ainda no mesmo ano, os conservadores contra-atacaram e assassinaram Efialtes. 

Com o ostracismo de Címon e a morte de Elfiates, Péricles ascendia como o mais  proeminente político da época, embora ainda não houvesse conquistado seu respeito e reconhecimento. Por este tempo também, ele acabou se casando, embora não se saiba o nome de sua esposa, ele tivera dois filhos, Xantipo e Páralo. Anos depois Péricles pediria divórcio, pois o mesmo não fora um bom marido e pai de família. Sua preocupação com a política e o Estado, lhe tomavam grande parte de seu tempo, o próprio era descrito como um homem reservado, metódico e atencioso com o trabalho. Péricles não gostava de participar de festas dadas por políticos, ou aparecer publicamente, a não ser que fosse necessário. 

As primeiras medidas que ele tomara como um dos dez membros do Conselho dos Generais, fora organizar o exército para expandir os domínios de Atenas sobre a Ática, Beócia, em direção a Fócida e ao istmo de Corinto. Péricles queria evitar entrar em guerra contra Esparta e a Liga do Peloponeso, liga similar a Liga de Delos, porém, neste caso Esparta era quem a controlava. A ideia de Péricles era construir muralhas próximo ao istmo de Corinto, o único caminho por terra que ligava o Peloponeso ao restante da Grécia. Nesta época, Corinto e Mégara estavam em guerra, logo Atenas teve sucesso em construir uma muralha para defender a Ática e um porto na região, mas quando os atenienses estavam para construir outro porto, porém Corinto e sua aliada a ilha de Egina decidiram intervir contra a expansão ateniense, e a guerra que Péricles queria evitar veio acontecer. As batalhas foram pequenas, mas levou a Péricles e os demais governantes a investirem nas defesas da cidade, temendo um cerco ou um ataque direto a esta.


Vista do Peloponeso no sul da Grécia e o istmo de Corinto que liga a península peloponense ao restante da península grega. 
Nessa mesma época, Péricles ordenou o envio de navios e soldados para o Egito, onde uma rebelião eclodira contra o governo do rei persa Artaxerxes, filho de Xerxes. A ideia de Atenas era ajudar os egípcios a retomarem sua independência e torná-lo seus aliados, porém a tentativa fracassou após alguns meses. Mas uma dura notícia chegou a Atenas, os primeiros anos da carreira política de Péricles foram turbulentos, os conflitos contra Corinto e Egina, levaram Esparta a entrar nesta batalha para apoiar suas aliadas, e ao mesmo tempo as forças atenienses no Egito estavam sendo derrotadas. Embora o exército ateniense fosse maior do que o espartano, os atenienses estavam cientes de que os espartanos eram bem mais treinados.

A batalha ocorreu próxima a cidade de Tânagra, os atenienses sabendo que mesmo em maior número poderiam sofrer uma derrota, Atenas recebeu alguns cavaleiros vindos da Tessália, regão no norte da Grécia, e alguns hoplitas da cidade de Argos, a qual decidiu entrar para a Liga de Delos. Porém, um fato curioso aconteceu: o general Címon que se encontrava em exílio retornou para a cidade solicitando poder liderar as tropas nesta luta contra os espartanos; Péricles desconfiou da atitude do general, pois sabia que o mesmo era simpatizante dos espartanos, então negou seu pedido.

"A Batalha de Tânagra foi sangrenta, com ambos os lados sofrendo pesadas baixa. Os espartanos levaram vantagem quando os tessálios passaram para o seu lado; mesmo assim, não puderam desfrutar até o fim de seu triunfo, pois foram obrigados a recuar em direção ao Peloponeso pelo istmo de Corinto. A guerra contra Esparta ajudou a unificar os atenienses; conservadores e democratas, homens comuns e aristocratas rejubilaram-se por ter lutado contra os mais temidos guerreiros da Grécia até a última cartada". (KING, 1988, p. 38).

Com a população alegre pela vitória sobre Esparta, Péricles decidiu chamar Címon de volta de seu exílio e o incumbiu de levar aos espartanos uma proposta de trégua. A decisão de Péricles fora sagaz; ele sabia que o velho general ainda possuía prestígio entre seu povo, e agir desta forma, era um jeito de mostrar que não guardava ressentimentos e ao mesmo tempo, Péricles alegava que os rivais poderiam deixar de serem rivais. Címon conquistou a trégua com Esparta, porém, alguns generais atenienses como Mirônides aproveitando o momento de triunfo dos atenienses liderou uma campanha militar na Beócia derrotando a cidade de Tebas na Batalha de Enofita, conquistando a Beócia, a Fócida e a Lócrida. Embora dera resultado, Péricles e outros governantes consideraram a decisão de Mirônides ousada, pois acabavam de sair de uma guerra para entrar em outra. 

Governando um "império marítimo"

Era o ano de 454 a.C, Péricles contava com seus 39 anos ou 41 anos, e já era um homem respeitado por suas ações. Péricles era o general mais influente da cidade, ao ponto de que chegava a governar a mesma como se fosse seu governador. Um dos problemas que ele enfrentou, fora conviver com os grupos sociais que existiam na cidade-Estado. Os cidadãos eram divididos entre conservadores e democratas, por sua vez os conservadores defendiam os interesses latifundiários dos aristocratas, porém, um grande número de estrangeiros, chamados de metecos se instalara na cidade nos últimos anos, e muitos destes eram mercadores, e recorriam ao Estado pedindo investimento no comércio. 

Embora os metecos não fossem cidadãos, cuidavam de parte da economia do Estado e lutavam no exército, como forneciam investimentos para empreendimentos públicos. Para completar havia os escravos os quais correspondiam mais da metade da população ateniense, os escravos executavam os mais distintos serviços e tarefas, e eram a base do sustento das cidades gregas. Se os escravos entrassem em revolta, isso geraria sérios problemas para a cidade. 

"Temístocles tentara controlar a política ateniense banindo seus adversários, mas Péricles recorre a uma tática diferente: procurou unir os vários grupos sociais da cidade sob um programa destinado a expandir o poder e aumentar a segurança militar de Atenas. Nos últimos anos, o tesouro ateniense havia crescido enormemente, e essa prosperidade possibilitou a Péricles conseguir a aprovação de leis que instituíam a remuneração dos cidadãos a serviço dos júris, dos soldados, dos marinheiros e de determinados funcionários do governo. Os democratas decretaram ainda outras medidas que aumentaram a popularidade do grupo entre as massas atenienses, como, por exemplo, estender a todos os cidadãos a possibilidade de ascender ao honroso e importante cargo de arconte". (KING, 1988, p. 43). 

No mesmo ano, Péricles decidiu retomar a ideia de fundar portos e bases pela Beócia e a Fócida, dessa vez partiu para liderar pessoalmente os exércitos atenienses, pois anteriormente, apenas votara a favor de outros. Pequenas cidades foram conquistadas, se tornando aliadas de Atenas ou sua tributárias. As Batalhas de Sicião e Arcanânia foram os principais embates realizados sobre o comando de Péricles ainda no ano de 454 a.C, todavia a campanha fora suspensa devido a notícias ruins que chegaram à Atenas; as cidades de Mileto e Eritréia, se desvincularam da Liga de Delos, e tiranos assumiram o poder, tais tiranos era partidários a favor do Império Pérsia, pois ambas as cidades ficavam na Jônia, território disputado entre gregos e persas. Péricles e os outros governantes consideram isso uma traição, então Péricles coordenou uma expedição até estas cidades, para derrubar os tiranos e restabelecer a ordem. Estabeleceram uma democracia em Eritréia e uma oligarquia em Mileto. 

"Como mostra o acordo assinado com os aristocratas de Mileto, Péricles estava mais interessado em trabalhar para assegurar relações estáveis com os governos das cidades aliadas do que forçar a adoção de regimes democráticos. No entanto, a intromissão persa na Liga de Delos alarmara os atenienses: a estabilidade daquela confederação fora ameaçada e o tesouro guardado na pequena ilha ficara sujeito a uma pilhagem". (KING, 1988, p. 44).

Para manter o tesouro da liga em segurança, Péricles ordenou que o mesmo fosse transferido para a Atenas, para os cofres localizados na Acrópole. Sendo Atenas a cidade mais poderosa, o tesouro da liga estaria em melhores condições de segurança. Além disso, a deusa Atena fora promovida como padroeira da liga, e parte dos tributos que as cidades aliadas pagavam era considerado como oferenda par a deusa, uma jogada engenhosa dos atenienses para receberem uma quantia por fora, pois Atena era a padroeira da cidade. 


Atena era uma das principais deusas cultuadas entre os gregos antigos, mas na cidade de Atenas, seu culto era o mais grandioso. Atena era filha de Zeus e de Métis, sendo a deusa da guerra, da sabedoria e protetora dos heróis. 
Atenas agora consolidava seu poderio sobre a Liga de Delos, o dracma de prata ateniense se tornara moeda recorrente entre as cidades da liga, ao mesmo tempo, em todos os grandes festejos realizados na cidade, as autoridades e famílias importantes das outras cidades aliadas eram convidadas a participar em Atenas. Todavia, isso não era o bastante, Péricles, tinha em mente um projeto que ele já vinha preparando algum tempo: reconstruir a Acrópole destruída pelos exércitos de Xerxes. Mas antes de proceder com tais planos, em 451 a.C, Péricles enviou Címon novamente a Esparta a fim de propor um tratado de paz, o tratado fora aceito, e durante cinco anos ambas as cidades estariam em paz. Depois disso, Címon fora encarregado de combate os persas na ilha de Chipre, mas acabou adoecendo por lá e veio a falecer. 

Péricles nunca se entendera bem com Címon, mas soube usar seus serviços em prol de Atenas. Cansado de continuar a combater os persas, fosse na Jônia, Chipre ou no Egito, em 499 a;C, Péricles enviou Cálias o qual era cunhado de Címon, para a corte persa em Persepólis, onde naquele ano, Cálias assinou um acordo de paz com o rei Artaxerxes. Péricles ainda naqueçla época enviou embaixadores para várias cidades gregas, a fim de convidá-los pra um congresso pan-helênico, porém Esparta se recusou a ir, e também vetou a participação de suas aliadas. No congresso, Péricles solicitou contribuições financeiras para reconstruir a Acrópole de Atenas, mas as cidades se negaram a contribuir. Péricles alegara que Atenas fora a cidade que mais sofrera com o ataque persa em 480 a.C. 

Ainda no ano de 449 a.C, os espartanos quebraram o tratado de paz, e tomaram a cidade de Delfos conhecida por pelo famoso oráculo do deus Apolo. Os espartanos começaram a manipular as previsões, de forma que as mesmas incentivassem um ataque a Atenas, fazendo outras cidades acreditarem naquelas previsões, pelos dois anos seguintes Péricles evitou de entrar em conflito direto com os espartanos, preferindo negociações ao invés de lutas. Porém a situação piorou quando em 446 a.C, uma rebelião na Beócia estourou e o general Tolmides imprudentemente partiu para apaziguar a região, porém sua tropa acabou sendo derrotada perto da cidade de Queronéia, o próprio general faleceu na ocasião, e parte do exército fora feito refém, pois alguns dos soldados provinham de importantes famílias atenienses. Para resgatar os reféns, "filhos ilustres" de Atenas, Péricles tivera que ceder as terras que os atenienses haviam conquistado doze anos antes na Beócia. 

Ainda no ano de 446 a.C, a ilha de Eubéia entrou em rebelião, o que levou Péricles a enviar um exército para punir os rebeldes, e ao mesmo tempo Esparta, Corinto e Mégara ameaçaram de declarar guerra aos atenienses, no entanto, a poderosa oratória e astúcia de Péricles evitou um novo conflito e uma nova trégua fora assinada no final daquele ano, o Tratado da Paz dos Trinta Anos. Atenas havia perdido a oportunidade de expandir seus domínios sobre a Grécia, tal posição coube a Esparta, porém, Atenas ainda se mantivera forte e próspera sobre o mar Egeu. Tendo conseguido amenizar os problemas com os persas, espartanos e outras cidades gregas, Péricles, decidiu dar maior atenção a cidade em si, a política interna e não mais a guerras. 

A reconstrução da Acrópole e o incentivo à cultura

Com a paz feita por toda a Hélade, nome pelo qual os gregos chamavam a Grécia antigamente (hoje o nome oficial é Hellas), Péricles havia decidido pegar parte do tesouro ateniense e alguns dos investimentos dados pelas cidades aliadas e inciar a reconstrução da Acrópole. O mesmo convocou os melhores escultores, artesãos, ferreiros, pintores, arquitetos, pedreiros, etc., de toda a Grécia para esta imensa obra. Ao mesmo tempo, isso levou outros artistas a se mudarem para Atenas, local de grandes debates, onde se debatia política, economia, guerra, religião, filosofia, artes, cultura, o cotidiano, a justiça, etc. Atenas se tornara o centro cultural da Grécia do século V a.C.

"Essa época de grandes realizações artísticas é também conhecida como Século de Péricles. Embora ele nunca tenha esculpido uma obra de arte como o bronze de Míron, Atena e Mársia; jamais haja escrito uma peça teatral, como Édipo em Colona, de Sófocles, e tampouco projetado uma construção que se erguesse tão altivamente quanto o Propileu, de Mnésicles, Péricles merece uma parcela substancial do crédito pelo florescimento cultural de sua cidade. Homem de pensamento e ação, aconselhava-se e inspirava-se com os pensadores e artistas de Atenas e, por isso, criou um ambiente propício ao trabalho deles. É a Péricles que se deve agradecer pelos monumentos erguidos na Acrópole, a colina sagrada. Eles são testemunhos da glória da Atenas clássica que sobreviveram aos séculos, enquanto outros importantes trabalhos desse período se perderam". (KING, 1988, p. 51). 

Nessa época o teatro vivenciava seu auge, os dramaturgos trágicos, Ésquilo, Sófocles e Eurípedes, considerados os "Pais da Tragédia" lotavam o teatro com suas fabulosas peças, das quais muitas se perderam ao longo do tempo. Na comédia, o nome mais expressivo era Aristófanes

"Ésquilo reinterpretou os mitos gregos para sancionar a nova ordem social. Em peças como Os Sete contra Tebas, A Orestíada (a única trilogia conservada) e Prometeu Acorrentado, ele tratou dos destinos coletivos, porém, valorizando sempre a condição individual. O segundo autor trágico foi Sófocles, que produziu obras como Édipo Rei, Antígona e Electra. Seus temas também foram os mitos gregos, dos quais se utilizou para tratar da luta entre a vontade humana e o todo-poderoso destino do indivíduo, estabelecido pelos deuses. Eurípedes, o último do trio, também escreveu sobre deuses e heróis, mas em sua obra o amor humano tende a suplantar os temais religiosos e patrióticos. Medéia, As Troianas e As Bacantes, por exemplo, estão cheias de crimes de vingança, sacrifícios nobres e atos de paixão que refletem o caráter mais realista de suas peças". (KING, 1988, 57-58).


Anaxágoras de Clazômenas
Além destes dramaturgos, houveram poetas, pintores, ceramistas, escultores, dançarinas, músicos, entre o meio artístico. Mas, além dos artistas, Atenas contou com a presença de filósofos como Anaxágoras, Zenão de Eleia, Protágoras, Arquelau de Atenas, Leucipo de Abdera, Diógenes de Apolônia, etc. Alguns destes filósofos dito pré-socráticos chegaram a viver em Atenas, ou em algum momento da vida a visitaram ou viviam em cidades que pertenciam a Liga de Delos, pois Péricles não apenas promoveu o incentivo a cultura e as artes em Atenas, mas também em outras cidades da liga. O próprio Sócrates nesta época ainda era apenas um jovem nos seus vinte e poucos anos, e só viria a ter renome no final do século, e no século seguinte Platão e Aristóteles se tornariam os grandes nomes da filosofia grega de seu tempo. O famoso historiador Tucídides (ca. 470/460 - ca. 400 a.C) vivia nesta época na cidade e o próprio Heródoto de Halicarnasso (ca. 484 a.C - ca. 425/420 a.C), o "Pai da História" havia vivido algum tempo em Atenas, possivelmente entre os anos de 446 e 444 a.C. Heródoto até mesmo chegou a entrar em contato com a família de Péricles, como também leu publicamente trechos de seu livro As Histórias, o qual tinha como um dos temas, as Guerras Médicas. Políticos, oradores, generais e outros estudiosos passaram pela cidade entre os anos de 450 a.C a 430 a.C.

No caso das obras na Acrópole, o renomado escultor Fídias (490?-430 a.C) fora contratado por Péricles para esculpir as principais estátuas e frisos dos templos das Acrópole o que incluía duas estátuas da deusa Atena, a estátua de Atena Promakos (Atena Guerreira), localizada na entrada da Acrópole (hoje a estátua não existe mais) e a estátua de Atena Partenos (Atena Virgem), a grande estátua de ouro e marfim, que ficava dentro do Partenon. 


Réplica da estátua de Atena Partenos, esculpida por Fídias no século V a.C. A estátua tinha quinze metros de altura e fora esculpida em ouro e marfim. 
"As construções da Acrópole começaram nos primeiros meses do ano de 440 a.C, e quase todos os atenienses foram designados para alguma tarefa no grande projeto de Péricles. Milhares de homens foram empregados em tempo integral nos trabalhos de erigir e decorar os novos templos. Cortadores de pedra, carroceiros, fazedores de cordas, marinheiros e construtores que preparavam e transportavam mármore, bronze, marfim e troncos de ciprestes para a Acrópole. Arquitetos, pedreiros, pintores, tecelões, trabalhadores em cobre, carpinteiros e escultores transformavam os materiais brutos em obras-primas. E esses artífices, que constantemente refinavam suas técnicas, criaram trabalhos de tal beleza que os artistas dos séculos posteriores viriam a considerá-los como padrão de perfeição estética, copiando-os incessantemente". (KING, 1988, p. 52).

Embora Péricles tivesse poder para iniciar o projeto na Acrópole, ele realizou uma votação para que os cidadãos escolhessem se queriam ou não; logo, a maioria dos votos fora para sim, pois a Acrópole era um símbolo de Atenas, e merecia ser resgatado e melhorado, de forma a esboçar o esplendor e a prosperidade que Atenas vivia naquela época, naqueles anos dourados. Péricles ordenou que todos os gastos com a obra fossem exibidos publicamente, para manter o povo ciente de onde e quanto as obras estavam consumindo dos recursos. Além disso, durante os anos de obras, ele costumava ir quase todos os dias nos locais de obra, nos estúdios e oficinas verificar com estava o andamento das obras. Sua atenção, determinismo, auto-estima cativava os trabalhadores; Péricles era um homem curioso e amante das artes e gostava de conversar acerca do assunto.


Fídias exibindo o friso do Partenon - uma representação artística do escultor grego Fídias, em obra (1868) do pintor neerlandês Lawrence Alma-Tadema (1836-1912).
"Sua energia sem limites contagiava os trabalhadores que estavam envolvidos mais numa missão sagrada do que num imenso programa de obras públicas". (KING, 1988, p. 53).

O templo principal, O Partenon fora obra dos arquitetos Ictino e Calícrates e começou a ser erguido em 447 a.C, vindo a ser concluído em 438 a.C, no entanto a decoração ficou totalmente pronta entre 433 a.C e 432 a.C. O templo possuí 69,50 m de comprimento por 30,90 m de largura. A cela, local onde central do templo onde ficava a grande estátua de Atena Partenos possuí 28,9 x 19,2 metros. O templo possui mais de 15 metros de altura, sendo que as colunas em estilo dórico possuem um pouco mais de 10 metros de altura e quase dois metros de largura. Ictino e Calícrates projetaram as colunas de tal forma que seu grau de inclinação oculta-se variações de perspectiva, ou seja, de longe vemos linhas retas, mas na realidade as colunas e as paredes possuem um leve grau de inclinação


Réplica do Partenon em Nashville, Estados Unidos. Com esta réplica dá para se ter noção de como era o templo em seu auge, diferente das ruínas que vemos hoje. 
Além do Parteno, a Acrópole possuí outros dois templos dedicados a Atena e outros pequenos templos dedicados a Zeus, Apolo, Ártemis e Poseidon. Havia um dos estúdios de Fídias; os propileus (conjunto de colunas), as salas do tesouro, muros, pórticos, portões, estátuas, friso e painéis, etc. Posteriormente ao lado da Acrópole se construíram teatros, o Teatro de Dionísio e perto dali o Teatro de Herodes Ático


Desenho retratando a Acrópole na época de Péricles. Algumas construções e monumentos foram adicionados nos séculos seguintes. 
Além dos trabalhos artísticos na Acrópole, a pintura ateniense ficou bem famosa neste tempo, os vasos, taças e ânforas, com pinturas em preto e dourado, ou em preto e vermelho adornavam luxuosos vasos e ânforas, a ponto de outras cidades encomendarem tais peças por sua beleza. O perfil de beleza masculina e feminina e o nu artístico se acentuaram neste tempo com as estátuas em mármore e em bronze. 

"A Idade de Ouro de Atenas foi resultado do trabalho de uma comunidade que tentava glorificar sua cidade, ao mesmo tempo que indagava sobre o lugar do homem no Universo. A verdadeira extensão de suas contribuições para o conhecimento humano apenas pode ser avaliada, mas os atenienses deram àqueles que seguiram seus passos muito para refletir, para admirar e para imitar". (KING, 1988, p. 59).

Intrigas políticas


Tucídides
A popularidade de Péricles atiçou a inveja da ala conservadora, a qual não era a favor de algumas medidas que o mesmo vinha tomando nestes anos de seu governo, pois Péricles havia diminuído consideravelmente a influência da aristocracia (eupátridas) no governo. Logo, alguns políticos conservadores começaram a expor acusações contra Péricles, alegando que os tributos pagos pelas cidades da liga deveriam ser utilizados para a defesa e para a guerra e não em obras públicas e culturais. Além disso, o acusaram de superfaturamento, desvio de verba, mal uso do dinheiro público, fraude orçamentária, etc. As acusações fora dirigidas pelo orador e guerreiro Tucídides o qual é mais lembrado por ter sido historiador. Tucídides provinha de uma família aristocrática assim como Péricles, mas era da ala conservadora. 

"Péricles então forçado a defender seu programa de despesas diante da Assembleia. E, em uma série de debates brilhantes, comparados pelos comentaristas da época a um duelo entre dois guerreiros campeões, Péricles e Tucídides se enfrentaram numa batalha verbal, cujo prêmio seria o apoio da opinião pública". (KING, 1988, p. 60).

Sua poderosa oratória, astúcia, retórica e linguajar direto e claro, somado ao apoio político e popular, garantiram a Péricles mostrar-se inocente perante a tais acusações. Tucídides perdeu a batalha e em 443 a.C fora sentenciado ao ostracismo por suas calúnias. Vale ressaltar que nesta época o Partenon ainda estava em construção e parte dos edifícios da Acrópole ainda não estavam concluídos. Tucídides posteriormente se dirigiu para Esparta, onde o rei Arquidamo teria lhe perguntado quem era o melhor orador, ele ou Péricles. Segundo o historiador romano Plutarco, Tucídides teriam respondido o seguinte: "Toda vez que eu lhe dou um golpe, ele revida argumentado que jamais caiu. Ele até consegue fazer com que os espectadores acreditem nisso". 

A amante

Aspásia de Mileto 
Segundo as leis atenienses um homem e uma mulher que se divorciassem eram proibidos de se casar novamente pelo resto da vida, tal fato aconteceu com Péricles, o qual tendo divorciado de sua esposa não pôde casar com sua nova paixão, Aspásia de Mileto (ca. 470-400 a.C). Não se sabe muito da vida de Aspásia, mas sabe-se que no início foi uma prostituta em sua cidade natal e talvez em outros lugares, antes de ganhar as graças de Péricles e se mudar para Atenas. Sócrates conta que Aspásia era uma mulher inteligente e astuta, a mesma começou a estudar filosofia se tornando uma sofista (os sofistas eram em alguns casos itinerantes e atuavam como preceptores, professores e advogados). Acredita-se que Aspásia tenha dado aulas de filosofia, retórica e oratória, pois Sócrates diz que assistira a uma destas aulas ou teria sido um discurso. Aspásia também era bem conhecida no meio político, pois costumava aparecer ao lado do "marido", e gostava de conversar sobre filosofia, artes e questões políticas, embora soube-se que as mulheres não tinham direito de participar da política. Ela teve um filho com Péricles, chamado também de Péricles

"O líder ateniense dava grande valor aos conselhos de Aspásia em relação aos negócios de Estado e na preparação de seus discursos". (KING, 1988, p. 69).

"Alguns cidadãos ficaram estarrecidos com o fato de uma mulher - ainda por cima prostituta e meteca - conseguir atingir uma posição de tanta influência nos negócios da cidade. Levada a julgamento sob a acusação de impiedade (não demonstrar adequada reverência aos deuses), Aspásia não foi condenada, segundo se diz, somente porque Péricles defendeu-a pessoalmente diante do júri". (KING, 1988, p. 69).

O Olímpico

Já um homem de meia idade, com três filhos e uma grande reputação política e apoio popular, Péricles começou a ser chamado por seus admiradores de o "Olímpico", uma forma de enaltecê-lo pelos feitos que havia feito. De certa foram, "Olímpico" era uma homenagem feita a Zeus, Péricles estava sendo comparado a um deus. 

"Péricles conseguiu levar para o governo de Atenas um grau de democracia desconhecido em qualquer outra parte do mundo. Todo cidadão poderia servir à cidade - fosse como general, membro do júri ou soldado - e ser pago por seu trabalho. Mesmo os aristocratas aceitavam o princípio defendido por ele de que todos os atenienses estavam autorizados - e até obrigados - a participar dos assuntos da cidade". (KING, 1988, p. 63). 

Nos anos seguintes ao ostracismo de Tucídides a oposição da ala conservadora diminuiu, no entanto os democratas radicais consideravam que algumas das decisões tomadas por Péricles eram de caráter aristocrático, e o mesmo tivera que passar a cuidar deste problema com os radicais.

Em 445 a.C, Péricles ordenou a reforma no sistema de coleta de impostos tanto no Estado como na liga. Sófocles, famoso dramaturgo, ocupava um cargo público neste tempo, coordenou a revisão do sistema de coleta de impostos. Além disso, Péricles incentivou a fundação de novas colônias e o seu povoamento, de forma que tais colônias expandiriam os domínios atenienses e aproximariam ainda mais Atenas de seus aliados, pois algumas das colônias foram estabelecidas em territórios aliados. O envio de colonos também fora uma jogada esperta de Péricles, pois alguns destes foram designados para ficarem "de olho" em políticos e governantes de pouca confiança.

"Apesar dos esforços de Péricles para manter a paz dentro dos domínios de Atenas, periodicamente surgiam disputas entre seus aliados. Em 440 a.C, um conflito entre o porto de Mileto, na Ásia Menor, e a ilha de Samos assumiu proporções de uma rebelião total, quando os poderosos habitantes da ilha se recusaram a permitir que Atenas resolvesse a questão por meio de arbitragem". (KING, 1988, p. 66).

Péricles coordenou as missões contra Samos para controlar a revolta e destituir os corruptos do poder. Fora necessário o envio de uma força militar para confrontar os rebeldes em Samos, até poder colocar fim a oligarquia da ilha e instaurar uma democracia. Houve batalha em alguns soldados morreram. Quando Péricles retornou para Atenas, ele realizou um belíssimo discurso fúnebre exaltando a memória daqueles que morreram nos conflitos em Samos, e ao mesmo tempo incentivando o patriotismo  a democracia e a união entre as cidades da Liga de Delos. Mas, Samos não fora a única a se rebelar naquela época, a cidade de Bizâncio que viria a ser séculos depois a poderosa Constantinopla, e hoje Istambul, se rebelou em 439 a.C, contra seus aliados da liga, Péricles ordenou uma expedição punitiva e seguiu para Bizâncio, pois a cidade era um ponto estratégico, ligava o Mar de Mármara ao Mar Negro

Péricles não precisou usar a força para conter os bizantinos, as palavras falaram mais alto. No ano de 437 a.C, Péricles empreendeu viagens pelo Mar Negro, indo fundar algumas colônias e propor acordos de paz e comerciais com os Estados locais. 
No ano de 437 a.C, Péricles coordenou uma viagem pelo Mar Negro a fim de fundar novas colônias para Atenas e realizar acordos com os Estados locais. 
Em 435 a.C um novo problema surgiu para Péricles. Até então as relações entre Esparta e Atenas, entre a Liga do Peloponeso e a Liga de Delos estavam em paz. Os espartanos até concordaram se unir aos atenienses e fundaram a cidade de Túrio na ilha da Sicília, hoje território italiano. Nesta época, grande parte da Sicília e partes do sul da Itália eram colonizadas pelos gregos, e isso de vez em quando gerava confrontos entre as cidades-Estados que as colonizavam. Neste caso, Corinto começou a se desentender com Corcira, pela posse da colônia de Epidamno, um importante porto comercial no Mar Adriático (nome dado a porção de água que separa a Itália da Grécia). Corcira possuía a terceira maior frota da Grécia e estava determinada a defender seus territórios, logo, uma batalha naval se iniciou entre as duas cidades, e Corinto fora pedir ajuda a Atenas, a qual possuía a maior frota da Grécia. 

O problema era que Corinto era aliada de Esparta, e Péricles não estava interessado em se intrometer nesta "guerrinha" entre Corinto e Corcira, por outro lado, era uma decisão ambígua: ajudar o aliado do meu rival, ou ficar neutro, e se mostrar anti-solidário? Péricles decidiu apoiar Corcira e depois de algumas batalhas eles saíram vitoriosos, mas os coríntios juraram se vingar desta ofensa. Nos anos seguintes, Péricles enviou tropas para lutar na Trácia e Macedônia, a fim de proteger os domínios da liga na região, ao mesmo tempo puniu a cidade de Potidéia e embargou financeiramente a cidade de Mégara, a qual apoiara Corinto e a incentivara na guerra contra Corcira. 

O embargo a Mégara e o apoio contra Corinto, levaram seus líderes a recorrerem a Esparta. No ano de 431 a.C, embaixadores de Corinto, Mégara, Atenas e de outras cidades estavam reunidos em Esparta para debater os problemas surgidos nos últimos quatro anos. O Conselho de Esparta chegou a conclusão que Atenas havia rompido a Paz dos Trinta Anos que durara apenas 13 anos e alguns meses, tendo ousado apoiar Corcira contra Corinto, tendo embargado Mégara e causado outros problemas a outras cidades gregas. A guerra fora declarada.

Guerra e Peste


"O que eu temo não é a estraégia do inimigo, mas os nossos erros". 
Péricles

A Guerra do Peloponeso (431-404 a.C) marcou o fim da paz entre algumas cidades gregas e o período clássico da cultura grega, pois nos anos seguintes as cidades quase se destruiriam nesta guerra. Péricles sabia que seria difícil convencer os espartanos desistirem da guerra, então ordenou que os exércitos atenienses se preparassem para o inevitável conflito.  

"Na sua obra História da Guerra do Peloponeso, Tucídides registrou muitos dos fatores que geraram as hostilidades entre as duas principais cidades gregas, mas afirmou que a principal causa da Guerra do Peloponeso foi o temor dos espartanos diante da expansão do grande Império Ateniense. Ele acreditava que esta guerra irromperia mais cedo ou mais tarde". (KING, 1988, p. 76).

Para os historiadores de hoje, a guerra talvez poderia ter sido evitada, se Péricles e os demais atenienses não tivessem tomado decisões precipitadas e erradas com Corinto e Mégara. Esparta antes de deflagrar a guerra tentou propor um novo acordo de paz, enviando seus embaixadores com algumas exigências:

"Na primeira ocasião, os generais espartanos exigiam que Atenas 'afastasse a maldição da deusa', uma provocação a Péricles, descendente da família dos Alcmeônidas, acusados de haver cometido sacrilégio contra a deusa Atena dois séculos antes. Na verdade, Esparta esperava que os atenienses s dividissem em relação ao seu líder; principalmente aqueles que questionavam a devoção religiosa de Péricles. A provocação, no entanto, teve efeito contrário: os atenienses cerraram fileiras em torno do grande general e contra atacaram com suas próprias exigências". (KING, 1988, p. 77). 

A segunda embaixada espartana cobrou que Atenas pusesse fim ao embargo comercial de Mégara, a ideia fora debatida na Eclésia, mas Péricles fora contra tal proposta. Ele dizia que os espartanos queriam humilhar os atenienses e se negavam a uma arbitragem, como ditava o tratado assinado entre os dois Estados. A Eclésia acabou ouvindo Péricles e rejeitaram a segunda proposta, talvez este tenha sido o maior erro que ele cometera. 

Quando a terceira embaixada chegou a Atenas, o exército espartano já havia deixado sua cidade, os espartanos acreditavam que os atenienses se recusariam também e assim ocorreu. Os atenienses se recusaram a aceitar a terceira exigência, onde os espartanos alegavam que os atenienses agiam como tiranos, e estavam "escravizando os cidadãos das outras cidades". Logo, a guerra se iniciou, Péricles evitou entrar em conflito direito e optou por uma estratégia de ataques pequenos e múltiplos, de forma a cansar os espartanos e esgotar seus recursos. 

No verão de 430 a.C uma nova ameaça caiu sobre Atenas, a peste. A Peste de Atenas como ficou conhecida surgiu na Etiópia e fora trazida pelos mercadores, marinheiros e viajantes nos navios que vieram do Egito, indo abastecer o porto de Pireu com alimentos. Inicialmente a doença se espalhou pela população portuária e não demorou para cegar a cidade. De 430 a.C a 427 a.C milhares de pessoas morreram. Tucídides chegou a descrever alguns dos números de mortos e os sintomas da doença dentre os quais causavam fortes febres, sensação de queimação, pústulas, tosse contínua e até mesmo delírios. Por longo tempo debateu-se se tal peste teria sido a peste negra, varíola, tifo ou outra doença. Hoje acredita-se que a peste de Atenas tenha sido um surto de febre tifoide  causada pelo consumo de água e alimentos contaminados pela bactéria Samonella typhi


Pintura renascentista retratando a Peste de Atenas (430-427 a.C).
Nessa época Péricles estava fora da cidade, liderando ataques navais no Peloponeso, mas quando retornou ficou estarrecido com o que viu. A grande quantidade de cadáveres que se espalhavam pelas ruas era uma visão macabra e repulsiva. Moscas, ratos e cães atacavam os cadáveres que eram postos em carroças para serem cremados. 

"Os templos e demais edifícios públicos da cidade enchiam-se de cadávares e os mortos eram cremados ou enterrados de maneira caótica, sem as cerimônias fúnebres habituais. A ordem pública entrou em colapso". (KING, 1988, p. 79).

O fim de um líder

Péricles tentou procurar soluções para a peste, mas nada pudera fazer. Os médicos não conheciam formas de tratá-la e curá-la. Péicles tentou levantar o ânimo do povo, alguns até o ouviam, mas o medo era grande demais, e suas palavras já não surtiam efeito como antes. Além disso, ele fora acusado de ter sido negligente com o povo, estando interessado mais na guerra que travava, então a Eclésia votou a destituição de Péricles do Conselho dos Generais, e o mesmo fora multado por não ter mantido registros exatos dos gastos do tesouro público durante os meses de 430 a.C.

Em 429 a.C, vários amigos e parentes de Péricles morreram, vítimas da peste. Seus dois filhos Xantipo e Páralo sucumbiram a praga. Com seus 61 ou 63 anos, era um homem abalado e sem esperança. Ainda naquele ano, ele fora convocado de volta ao Conselho dos Generais, pois os conselheiros que assumiram eram incompetentes, e o grande líder que um dia fora, era necessário neste cenário caótico. Péricles tento mudar a lei de cidadania que não permitia que filhos de atenienses com estrangeiros fossem reconhecidos como cidadãos atenienses, ele fizera isso para tentar ajudar o único filho que lhe restara, o jovem Péricles. Mas as assembleias se recusaram a aceitar a medida.

No outono de 429 a.C, Péricles contraiu a peste e lentamente fora definhando até morrer. Atenas não voltaria por muito tempo a ter nenhum outro político na categoria de Péricles ou que tivesse sua popularidade. Embora tenha cometido alguns erros, tenha sido imprudente, orgulhoso e teimoso, Péricles fora um grande líder, defendeu como poucos a democracia em seu tempo, a importância da cultura, das artes, da educação, da política, da boa conduta, da cidadania, das alianças e amizades. Segundo Plutarco: "Ele considerava que o seu maior mérito era o fato de que, apesar do imenso poder de que dispôs, jamais cedeu a sentimentos de inveja ou de ódio e nunca tratou ninguém como um inimigo tão irreconciliável que este não pudesse jamais tornar-se um amigo". (KING, 1988, p. 83).

Péricles discursando na ágora. Ao fundo a Acrópole, um dos maiores legados de seu governo. 
Quando a Guerra do Peloponeso acabou em 404 a.C, grande parte da Grécia estava arruinada economicamente, politicamente e socialmente. Os gregos enfraquecidos foram conquistados pelas tropas e armas de guerra do rei da Macedônia, Filipe II (382-336 a.C) sem muitas dificuldades. Quando Filipe II morreu em 336 a.C, a Grécia praticamente estava sob o domínio macedônio; algumas cidades tentaram se rebelar, mas o filho de Filipe, Alexandre, o Grande (356-323 a.C) subjugou os gregos de vez ao seu controle. Atenas, Esparta, Corinto, Delfos, Tebas, Mégara, Delos, Samos, Eubéia, Egina, Salamina e tantas outras poderosas cidades-Estados que foram um dia, agora faziam parte do nascente império de Alexandre, o Grande. Os gregos se orgulhavam de terem derrotado o poderoso Império Persa em 480 a.C, mas foram subjugados pelo pequeno exército macedônico de Filipe II, embora seu exército cresceria nos anos seguinte, se tornando um dos mais poderosos do mundo sob o comando de seu filho. Atenas não voltaria a vivenciar seu esplendor, poder e prosperidade, por muito tempo. 


Embora tenha sido chamado de o "Olímpico", sendo comparado aos deuses, Péricles fora um homem comum, com seus sonhos, frustrações, ambições, medos, esperanças, glórias e derrotas. Mas, o Século de Péricles mesmo tendo acontecido há mais de 2.400 anos, ainda ecoa nos dias hoje. Sua arquitetura, poesia, dramaturgia, pintura, escultura, história, filosofia, democracia, ainda são estudados, são símbolos de um tempo onde homens questionaram a si mesmo e o mundo, onde viram que um governo deve ser justo e de todos e para todos. 

NOTA: Fídias fora acusado pelos opositores de Péricles de ter desviado carregamentos de ouro da construção do Partenon. Péricles defendeu pessoalmente o amigo no tribunal, e Fídias fora inocentado. Posteriormente, Fídias viajou para sua cidade natal, Olímpia, onde fora chamado para trabalhar nas obras de arte do Templo de Zeus. Fídias esculpiu a estátua de Zeus Olympeios (Zeus Olímpico), considerada uma das Sete Maravilhas do mundo antigo. 
NOTA 2: Anáxagoras fora acusado de impiedade, mas fora inocentado, no entanto preferiu deixar Atenas. Anáxagoras fora professor de Péricles e seu conselheiro. Segundo Platão, o mesmo teria ensinado também Sócrates. 
NOTA 3: Um dos colonos que seguiram para a cidade de Túrio, fundada por Atenas e Esparta, fora o historiador Hérodoto. 
NOTA 4: Hoje grande parte da Acrópole está em ruínas, o Partenon e outros templos passam por restauração, restauração essa lenta e prejudicada pela crise econômica que a Grécia vivencia atualmente. 

Referências Bibliográficas:
KING, Perry Scott. Péricles. São Paulo, Nova Cultural, 1988. (Coleção Os Grandes Líderes - vol. 74).
FINLEY, M. I. Grécia Primitiva: Idade do Bronze e Idade Arcaica, São Paulo, Martins Fontes, 1990.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 6, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 19, São Paulo, Nova Cultural, 1998.
Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 23, São Paulo, Nova Cultural, 1998.

Links relacionados:
Xerxes: O Rei dos Reis
Heródoto de Halicarnasso: O Pai da História
A Era de Alexandre
Olímpia e os Jogos Olímpicos

4 comentários:

Eduardo disse...

Pelo jeito assistiu as aulas de Seriorja bem direitinho hein!!
kkkkkkkkkkkk

;P

iTetelma disse...

parabens pelo blog

Unknown disse...

PELO AMOR DE DEUS QUAL NOME DESSE LIVRO, OU DOCUMENTO (KING 1988) EU QUERO MUITO LER COMPLETO

Leandro Vilar disse...

Unknown, a referência está na bibliografia do texto. KING, Perry Scott. Péricles. São Paulo, Nova Cultural, 1988. (Coleção Os Grandes Líderes - vol. 74).

Eu peguei esse livro numa biblioteca pública, tem inclusive outros da mesma coleção.