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Leandro Vilar

segunda-feira, 17 de junho de 2019

Chernobyl - A Catástrofe

Devido ao sucesso do seriado Chernobyl da HBO, trago este artigo que comenta os acontecimentos sobre o maior acidente radioativo que teve-se até então no mundo. As imagens aqui utilizadas foram escolhidas por mim para ilustrar o texto dos autores. 

Chernobyl - A Catástrofe


Me. Djmes Yoshikazu de Lima Suguimoto
Dra. Maria Augusta de Castilho

Introdução

A usina nuclear Vladimir Lênin está localizada a cerca de 20 km da cidade de Chernobyl, e cerca de 110 km de Kiev capital da Ucrânia e a 4 km da cidade de Pripryat. A instalação da usina foi iniciada em 1970 e em 1983 foi entregue o reator nº 4 onde aconteceu o acidente. Ainda existiam dois reatores em construção no momento da tragédia, mas os dois últimos complexos só tiveram suas obras paralisadas após três anos. Em dezembro de 2000 foram definitivamente desativados todos os reatores, mas ainda hoje existem pessoas que trabalham em Chernobyl, tais como: militares, funcionários da usina que atuam no controle da radiação e na administração.

1 Finalidades da usina nuclear

A construção desta usina teve como estratégia sua localização geográfica para beneficiar a União Soviética, e além de oferecer energia para cidades industriais e residenciais. A fabricação de bombas nucleares era o aspecto mais sombrio da usina, já que o contexto geopolítico neste período tornava indispensável à produção e a corrida armamentista entre duas potências: EUA e URSS. Na segunda guerra mundial os EUA detonaram duas bombas atômicas nas cidades japonesas de: Hiroshima e Nagasaki. Essa arma fez com que vários cientistas soviéticos voltassem seu trabalho para a força do átomo, esse esforço representava o orgulho tecnológico que uma sociedade socialista podia criar. Em 1942 a URSS deu início ao programa nuclear soviético, com seus engenheiros apelidados de especialistas vermelhos pelos engenheiros ocidentais. Esses cientistas soviéticos conheciam e dominavam o desenvolvimento e construção de bombas nucleares, mas a questão das usinas estava atrasada em comparação ao ocidente, já que a preocupação naquele momento era a produção do plutônio. A construção de uma bomba nuclear que os soviéticos desejavam tinha como principal combustível o plutônio, que pode ser produzido apenas artificialmente.

Localização de Chernobyl na Ucrânia. 
Era necessária a produção em grande escala para desenvolver reatores específicos para fabricação deste elemento químico. Esse processo gera energia térmica, antes de se pensar em usinas para produção de energia elétrica esse calor resultante da transformação de urânio em plutônio causava dor de cabeça aos pesquisadores. “A quantidade imensa de calor que produziam era tida como inconveniente pelos projetistas” (HAWKES et al., 1986, p. 36). Os locais de produção eram semelhantes às usinas nucleares, existindo barras de contenção para controlar nêutrons, água ou gás, chamados de refrigerante, para a refrigeração que se torna vapor, com os mesmos princípios de usinas termoelétricas que utilizam o vapor para girar turbinas e produzir energia elétrica, com algumas vantagens, e uma delas era em quantidade de combustível utilizado. “A energia contida em um quilo de urânio utilizado em um reator, quando liberada, equivale à fornecida pela quantidade de 3.000 toneladas de carvão em usina convencional” (HAWKES et al., 1986, p. 34). A produção de energia foi uma consequência das pesquisas para desenvolvimento de armas nucleares, e isso aconteceu em todos os países que fizeram instalação e tais usinas.

2 Visão ocidental

A forma com que este projeto era visto pelo ocidente refere-se a mentalidade discriminatória pelo regime adotado na URSS. Alguns pesquisadores como Michele Lee e Oliver MacDonald examinaram a engenharia empregada na usina de Chernobyl. Em entrevista concedida para revista New Left Review de maio/junho de 1986 esses pesquisadores não atacam a usina ou o projeto, mas explicam de forma racional vários pontos que naquele momento ainda era uma dúvida: da evolução do reator PWR para o modelo em questão, sendo bastante sofisticada exemplificando a eficiência individual de cada tubo que armazena o combustível, de como é fácil trabalhar com os bastões sendo retirados individualmente e os motivos, na visão deles, para construção da usina (MEDVEDEV, 1987).

Examinando em fontes publicadas no período, que para outros pesquisadores do assunto tudo não passou de mais um erro grotesco do sistema comunista. É certo que a utilização do reator RBMK “Reactor Bolshoy Moshchnosty Kanalny” (reator de canaletas de alta potência) devia-se a vários fatores, tanto econômico, político e militar, mas sem dúvida os especialistas vermelhos eram capazes de aplicar os conhecimentos matemáticos, técnicos e científicos na criação de usinas assim como os engenheiros ocidentais. Produzir plutônio era um orgulho para a engenharia da União Soviética, sendo totalmente projetada pelos especialistas vermelhos e sendo alimentado de urânio com menor índice de enriquecimento.

“Para reduzir os riscos com o urânio, a maioria dos reatores ocidentais esfriados com água usa urânio altamente enriquecido, a taxa de 3,5%. Para economizar, os russos planejaram a usina de Chernobyl com reatores onde o urânio está enriquecido a 1,8% e é guardado dentro de blocos de grafite. O grafite é colocado em torno do urânio para manter a eficiência da operação” (REVISTA VEJA, 1986, p. 39).

A facilidade na troca do combustível feita por um guindaste sobre trilho também foi fator importante para utilização deste modelo de reator, já que não era necessário o desligamento total do reator, a queima não acontecia de forma regular. O núcleo sofria maior deterioração se comparadas com as extremidades, então era necessário fazer várias trocas, tornando este ponto do sistema desfavorável. À medida que substituía as varetas era necessário fazer perfurações enfraquecendo a tampa do reator. O tamanho do reator e a ponte móvel impedia a construção de um vasilhame metálico de contenção que cobrisse toda a estrutura (GROSS, 1987).

A única proteção era uma tampa de cimento que pesava em torno de 700 toneladas. Ainda assim esse modelo foi implementado em outros locais da URSS, o que trazia a instabilidade do reator era ser operado em baixa potência e os engenheiros soviéticos não tinham conhecimento até o acidente.

3 O acidente

A usina tinha recebido ordens do comitê estatal para uso da energia atômica e para fazer manutenção de rotina no reator nº4 no dia 25 de abril de 1986. Aproveitando a ocasião seriam realizados testes sobre a capacidade de refrigeração na falta de energia. As usinas nucleares não apenas produzem energia, mas também consomem para acionar as bombas responsáveis pela circulação do refrigerante que vai para o núcleo e sistemas auxiliares. Se uma usina está acima de 20% de produção ela própria se mantém, quando está abaixo deste valor precisa de energia externa (ESTEVES, 2013).

Caso falte energia o sistema de segurança entra em ação ligando os geradores de emergência movidos a diesel. Não é explícito, mas é certo que o motivo maior do teste na refrigeração era o medo de um ataque como ocorreu na central nuclear no Iraque em 1981 pelos israelenses.

"O experimento que estava prestes a ser feito foi realizado no pior momento, pois vários pontos cruciais que levariam a instabilidade estavam prontos para entrar em choque, tais como: todos os sistemas de segurança foram desligados, a barra de combustível estava em seu ciclo final, neste momento a falta de resfriamento ficou mais perigosa já que o produto da fissão no final de ciclo gerou uma quantidade maior de calor e ficou altamente instável. “O período final do combustível é onde tem maior acúmulo de resíduo nuclear, resultado da fissão do urânio, com isso o risco de vazamento também aumentou” (DALAVIA, 2014, p. 2).

Inicialmente os testes estavam programados para começar à 1h da madrugada do dia 25 de 1983. Às 14h houve o que se pode considerar como um dos pontos cruciais no acidente, o desligamento do sistema de resfriamento de emergência o que evitava seu funcionamento durante os testes. No mesmo momento houve um aumento na demanda de energia adiando o teste para o próximo turno. Às 00h houve a troca dos 256 funcionários para grupo da noite que assumiria a usina, o sistema de emergência continuava desativado. A potência na madrugada do dia 25 estava em 3.200MWth e foi reduzida até 1.600MWth. Manteve-se esta situação até as 00h005min do dia 26, ocasião

em que foi reduzida para 720MWth e continuava diminuindo. Segundo o relatório para execução dos procedimentos a potência segura do reator para execução seria de 700MWth a 1.000MWth. Por ordem do engenheiro supervisor Anatoly Dyatlov Stepanovich responsável pelo procedimento o reator teria sua potência diminuída até 200MWth para dar início aos testes. O operador responsável pela potência não conseguiu operar o sistema com a destreza necessária para balancear a força do reator, caindo para 30MWth, nesse momento começou o processo de envenenamento por xenônio 135.

“Os produtos de fissão produzidos durante a operação de reator figuram o xenônio 135, um gás que apresenta uma alta taxa de absorção de nêutrons. Quando o reator está em operação total há nêutrons suficientes para que essa absorção não represente nenhum problema, mas quando ele funciona a baixa potência ou é completamente desativado, o acúmulo de xenônio 135 fica insignificante. Depois da desativação total, o iodo 135 presente no núcleo continua a sofrer decaimento, produzindo mais xenônio 135, que vai se acumulando. Em consequência disso, o reator, da mesma forma que um carro afogado, só pode ser ligado depois que se tiver passado tempo suficiente para que o xenônio 135 decaia” (HAWKES et al., 1986, p.79).

O reator não respondia de forma eficiente e o controlador não conseguia elevar a potência devido ao envenenamento, pois a atitude feita contrariava todas as normas de segurança. O reator possuía um total de 211 barras de controle, mas o máximo de barras que poderia ser removida seria de 181, porém foram deixadas pelo operador apenas 6. “Optou-se pela remoção das barras de controle, aumentando a potência do reator entrando num regime de funcionamento instável, com risco de sofrer elevações incontroláveis de potência” (ESTEVES, 2013).

Normalmente o reator funciona com quatro bombas de refrigeração, o que é suficiente para manter a pressão de água e vapor adequada dentro dos tubos, sendo extremamente importante devido à condição do tipo de reator. Neste dia as quatro bombas estavam em funcionamento e foram adicionadas mais duas; posteriormente foi ligada ao sistema mais duas bombas ficando com um total de oito.

“Estava criada, no entanto, uma situação irregular, com oito bombas funcionando e o reator em potência de apenas 200MW, e não de 500MW conforme estabelecida no programa. [...] Como decorrência, a residência hidráulica do sistema de circulação (núcleo com os canais de combustível e as próprias bombas) atingiu um ponto sensivelmente menor do que o valor previsto para o funcionamento normal e seguro do reator. Como havia menos vapor – e, portanto, menos pressão – nos sistemas de circulação, o volume de água em circulação aumentou enormemente, até atingir 56.000 a 58.000m³/h. Trata-se de regime proibido, pois implica risco de danificação das bombas e produz vibrações nos principais sistemas de resfriamento (com ocorrência de cavitação), criando ainda uma fonte adicional de calor” (GROSS, 1987, p. 32).

O fluxo de vapor no controlador caiu devido ao volume de água disparando os alarmes, ao invés da manobra ser interrompida e o reator desligado, o controlador desligou o alarme. A combinação de menos barra de controle com um fluxo maior de água e xenônio 135 no primeiro momento ajudou a manter o nível de nêutrons no núcleo, já que a água retém essa partícula. Quando o teste propriamente começou, foram fechadas as válvulas de entrada da turbina e a energia das bombas d’água foi desligada, diminuindo assim o fluxo de água no núcleo.

“Às 1:23:04h foram fechadas as válvulas que controlam o fluxo de vapor para o turbo gerador nº8, iniciando-se assim run – down propriamente dito. Desligou-se ao mesmo tempo o sistema de proteção que entra automaticamente em operação quando o gerador funciona em condições irregulares” (GROSS, 1987, p. 33).

O reator deixa a estagnação e começa o aumento na reação criando vapor devido à falta de água para manter refrigerado. O espaço entre as bolhas não consegue absorver os nêutrons, permitindo sua passagem gerando o processo em cadeia e dessa forma torna-se, a formação de vapor é incontrolável. Os operadores ainda não tinham conhecimento do que estava acontecendo no núcleo, lembrando que todos os sistemas de segurança foram desativados, neste momento a última opção para evitar o desastre.

Buraco ocasionado pela explosão do reator 4 na Usina de Chernobyl. 
Quando foi percebido o que estava acontecendo, o chefe de turno ordena que fossem inseridas as barras, o operador aperta o botão AZ-5, responsável por inserir todas as barras de controle no núcleo. O calor no interior do reator era tão intenso que deformou as barras de combustível impedindo a passagem das barras de controle. Em uma medida desesperada as barras foram soltas dos motores que faziam a inserção. Todo o grafite que existia no núcleo fez com que a força armazenada nos combustíveis fosse amplificada, quando as barras de controle foram inseridas ao invés do reator reduzir, ele aumentou sua capacidade. “Com a inserção das barras, houve o deslocamento da água que refrigera os elementos combustíveis para dar lugar ao encamisamento e, no primeiro instante, houve uma subida brusca na potência ao invés do efeito desejado que era o de reduzir a potência” (ESTEVES, 2013).

Neste momento não existia nenhuma possibilidade de reversão da situação, o que estava por vir seria o fim do reator e o início do maior desastre nuclear para fins pacíficos do mundo. O nível de potência salta de 7% para 50% em apenas três segundos (HAWKES et al., 1986, p. 82).

O excesso de vapor fez com que todo o sistema começasse a vibrar, a força exercida no sistema era além do que o projeto podia suportar; a pressão acumulada fez com que um equipamento de 200 ton. caísse sobre o sistema de refrigeração agravando ainda mais o problema. Ouve-se um primeiro estrondo, era o vapor destruindo o reator, uma explosão hidráulica fazendo com que a tampa de contenção que pesava 700 t. fosse levantada, que na sua queda destruiu boa parte do prédio.

“Os reatores de Leningrado não contam com vaso de contenção, nem com sistema de vaporização por canais e sistema alternativo de desativação, tais como os adotados na Inglaterra. Contudo, o problema mais importante parece ser o de projetar e demonstrar um sistema de contenção do núcleo que possa resistir à pressão do vapor no caso de rompimento dos tubos pressurizados” (HAWKES et al., 1986, p. 85).

As matérias que existiam dentro do reator como o grafite e o zircalói, que em contato com a água e o calor extremo produziu hidrogênio e monóxido de carbono, ao entrar em contato com o oxigênio tornando-se explosivo. Após a explosão de vapor, o hidrogênio contido no reator inicia várias outras explosões. Tais explosões, incendiárias, inicialmente foram combatidas pela equipe de bombeiros (30 focos) e o grafite presente em grandes quantidades está superaquecido, tornando quase impossível o controle do incêndio pelos bombeiros que vão trabalhar no local. A explosão liberou toda a radioatividade contida no interior do reator, materiais como: plutônio, césio, estrôncio, urânio e grafite altamente contaminados foram ejetados para fora da usina. Fontes divergem sobre a quantidade de material lançado para a atmosfera, uns calculam a liberação cerca de 50 ton. De produtos nucleares, outros assinalam 3 milhões de terabecqueréis, e outros consideram 10 vezes mais do que a bomba de Hiroshima. O reator n° 4 de Chernobyl estava com seu futuro selado, liberando radioatividade sem nenhum controle pelos próximos oito meses até que a limpeza e construção do sarcófago fossem finalizadas, tornando-se um problema ainda maior para a URSS.

A cidade de Pripyat e os moradores

A cidade de Pripyat foi fundada em quatro de fevereiro de 1970, principalmente para os trabalhadores da usina. A infraestrutura contava com casas, apartamentos, escola, hospitais, bibliotecas, cinemas, salas de espetáculos, locais para esporte, lojas, ferrovia e rodovia. Todos os trabalhadores da usina esforçavam-se ao máximo para permanecer na cidade, o medo de ser transferido para outros lugares sem a mesma estrutura forçava com que as decisões do partido ou dos engenheiros chefes fossem executadas sem alterações, ou questionamentos, o que se pode explicar em partes por que os operários não desistiram do teste na usina.

Quando o acidente aconteceu sua população tinha cerca de 49.000 habitantes, segundo o documentário - O desastre de Chernobyl produzido pelo Discovery Chanel, que é reconhecido pela embaixada da Ucrânia no Brasil por meio de documento disponibilizado como fonte fidedigna. Tal documentário atesta que só após trinta horas do ocorrido as medidas de precaução foram tomadas para os habitantes, como a distribuição de pílulas de iodo e a evacuação em massa. O prazo para evacuação foi de duas horas, literalmente a população saiu com a roupa do corpo abandonado sua casa e vida naquela cidade. Segundo essa mesma fonte todas as pessoas foram evacuadas em apenas três horas e meia, sem nenhum tipo de pânico, ônibus levaram os primeiros refugiados atômicos da Europa. A evacuação aconteceu sem nenhum tipo de desespero, mas não foram sem recusa, uma vez que muitos moradores em alguns locais convocaram assembleias para evitar a saída das pessoas. Alguns idosos não acreditavam em um inimigo invisível, chegavam a esconder-se em porões e quando achados pelos militares ficaram aos prantos por ter que abandonar suas terras. A cidade de Chernobyl só foi evacuada no dia 27, essa cidade era maior que Pripyat, a estratégia para levar as pessoas a um local com melhores condições foram as mesmas executadas nas primeiras cidades e vilas.

Conjunto habitacional em Pripyat. Ao fundo a usina de Chernobyl. A cidade foi evacuada ainda em 1986, sem receber retorno de moradores desde então. 
As cidades, vilas e casas rurais dentro da zona de exclusão nunca mais iriam receber nenhum habitante, tornando-se cidades-fantasmas que ainda hoje abriga objetos dos seus antigos moradores. Segundo o Greenpeace Brasil (2011) cerca de sete milhões de pessoas estavam em zonas contaminadas no período do acidente, e foi estimado que trezentos e cinquenta mil pessoas deixaram seus lares nas zonas mais contaminadas.

5 Possíveis vítimas

Por mais perturbador e absurdo que possa parecer, as informações oficiais sobre mortes no primeiro momento foi de apenas duas pessoas, posteriormente esse número foi alterado. Ainda hoje algumas fontes divergem sobre a contagem dos mortos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) e fontes oficiais assinalam em um total de 59 mortes relacionadas diretamente ao acidente, outras fontes apontam 31 ou 33 pessoas.

As primeiras pessoas a morrerem no acidente foram alguns funcionários que trabalhavam no interior da usina, nem todos morreram imediatamente ou devido às altas doses de radiação, alguns ficaram presos, ou sofreram queimaduras em todo o corpo. As primeiras pessoas que não trabalhavam diretamente na usina foram os bombeiros que rapidamente atenderam o chamado. A explosão ejetou em todas as direções grafite em chamas altamente radioativos, que se tornou quase impossível à extinção das chamas com os métodos tradicionais. Todos os bombeiros receberam doses muito elevadas de radiação, o equipamento de proteção não era adequado para tal situação, a temperatura do local chegou a derreter a sola dos sapatos destes homens. Algumas horas depois foi solicitado o reforço, os que tentavam apagar o fogo começavam a mostrar os primeiros sintomas de contaminação, os primeiros bombeiros morreram imediatamente ou em alguns dias depois.

A limpeza do desastre ficou por conta dos liquidadores, um apelido dado às pessoas que trabalharam em qualquer função relacionada à limpeza e contenção da radiação. Esse termo está ligado a questão de “liquidar Chernobyl” ou “acabar com o problema”. Os liquidadores eram: engenheiros, reservistas, militares das forças armadas, bombeiros, civis, mineiros, trabalhadores de construção, médicos e policiais. Essas pessoas fizeram parte de uma operação gigantesca que envolvia a limpeza na zona de exclusão, caça aos animais contaminados, construção de um túnel embaixo do reator avariado para instalação do sistema de refrigeração, fiscalização dos limites, construção do sarcófago entre outras funções. Uma estimativa do contingente de pessoas foi de seiscentas mil, todas contaminadas de alguma forma sofrendo os efeitos até os dias de hoje. Essas pessoas ficaram fisicamente incapacitadas e seus auxílios constantemente são reduzidos, deixando sua situação ainda mais precária.

Outro grupo que esteve no centro do problema foi apelidado de biorobôs, jovens com a tarefa de limpar o telhado onde seria erguida a estrutura do sarcófago. Quando os engenheiros descobriram que o resto do telhado que resistiu a explosão estava cheio de grafite contaminado, decidiram jogar o lixo de volta para dentro do prédio, já que a estrutura cobriria tudo. Optou-se em utilizar robôs. Depois de algum tempo em funcionamento esse equipamento foi seriamente danificada devido ao alto grau de radioatividade que emanava do núcleo, a alternativa seria utilizar pessoas para fazer esse trabalho. Os homens selecionados para função tiveram que adaptar placas de chumbo ao seu corpo para minimizar os efeitos da contaminação, o trabalho tinha que ser rápido e só podiam permanecer no local por no máximo 40 segundos.

Funcionários limpando escombros no texto da usina do reator 4. Na época foram chamados de "biorobôs" devido as proteções feitas de chumbo que utilizavam. 
Esses homens sacrificaram suas vidas para evitar um desastre sem precedentes. Combateram o incêndio, diminuíram o nível de radioatividade, e limparam da melhor forma possível a zona de exclusão. Alguns homens não foram reconhecidos como liquidadores, foram excluídos dos méritos e da história, fizeram o trabalho que nem as máquinas suportavam. Foram os verdadeiros
heróis que evitaram algo ainda pior e estão sendo esquecidos.

6 Como o mundo soube da tragédia

A União Soviética escondeu o que estava acontecendo ao máximo. A Suécia foi o primeiro país que achou que havia algo errado, devido ao seu programa rígido de controle nas usinas, notaram que a poeira na roupa dos trabalhadores apresentava radioatividade muito acima do normal. Nesse momento todos os alarmes soaram e deixaram os suecos preocupados; medidas foram tomadas sem saber o que tinha acontecido, não estava no seu país mais sim no seu vizinho. Depois de uma extensa verificação percebeu-se que nada tinha acontecido nas suas usinas, voltaram suas dúvidas para os soviéticos. A Suécia tem em todo o território sensores que podem verificar qualquer variação na radioatividade, assim comunicaram à Casa Branca (EUA), que no primeiro momento não deu atenção ás informações afirmando que poderia ser gases que escaparam do subsolo devido aos testes. Os sensores sísmicos que foram instalados para verificar testes nucleares no subsolo não detectaram qualquer movimentação e os isótopos que estavam viajando junto com as nuvens apontavam que algo mais grave ocorrera.

Matérias dos jornais The Times e The Guardian de 29 de abril de 1986, noticiando o acidente nuclear em Chernobyl. 
Os soviéticos só assumiram que algo tinha acontecido dentro de suas fronteiras dois dias depois, enquanto isso, satélites espiões já vasculhavam para verificar o que tinha acontecido dentro da cortina de ferro. O mesmo documento cedido pela embaixada ucraniana reconhece que a nuvem com material tóxico fez seu passeio em praticamente toda a Europa, alcançando pontos do litoral leste dos EUA. Em outra fonte também é citado o tamanho da dimensão “[...] praticamente toda a Europa, parte da Ásia e, em menor escala, a América do Norte foram contaminadas pelos radionuclídeos liberados no acidente” (PASCHOA, 1987, p. 36).

Após alguns dias o líder Mikhail Gorbachev fez um pronunciamento revelando o que tinha acontecido. A ocasião inédita que marcou a história foi o pedido de auxílio que fez ao ocidente. Foi o próprio Gorbachev que convidou Hans Blix na época presidente da Agência Internacional de Energia Atômica (1981-1997), para inspecionar as consequências do desastre, sendo o primeiro ocidental designado para tal função. Para alguns o acidente em Chernobyl foi um golpe duro para URSS.

7 Contaminados por radiação e esquecimento

A contabilização das mortes que já aconteceram e ainda vão acontecer para a OMS, chegou à casa de quatro mil vítimas. O curioso nos dados que são apresentados por este órgão internacional ligado as Nações Unidas é a forma branda que a pesquisa leva em conta a aceitabilidade das pessoas permanecerem em locais contaminados. Ela julga que cerca de cinco milhões de pessoas ainda residem em locais onde se deve tomar medidas defensivas para diminuir o nível de contaminação, e assume que essas pessoas estão recebendo algum tipo de radiação lentamente. O documento dá a entender que é aceitável o nível de radiação destes locais, por mais que as pessoas estão sendo envenenadas aos poucos.

Para Dupuy (2007), o modelo usado pelos pesquisadores e autoridades para definir o número de pessoas afetadas ou as mortes é um cálculo que analisa o nível de radiação recebida proporcionalmente (modelo linear limiar), ou seja, não existe nenhum tipo de carga que se possa receber sem que afete os seres em geral, o que vai contra o relatório acima citado. O mesmo documento estima que até quatro mil crianças receberam doses suficientes para desenvolver câncer de tireóide no dia do acidente. Identificou-se também (de acordo com o mesmo documento) que as pessoas de baixa renda econômica resistiram em sair, mas como o nível de radiação estava acima dos padrões, tais pessoas sofreram grande radiação.

Como observado no relatório de Chernobyl Fórum de Saúde, o impacto sobre a saúde mental de Chernobyl é o maior problema de saúde pública desencadeada pelo acidente até hoje. Sofrimento psíquico decorrente do acidente e suas consequências têm tido um impacto profundo sobre o comportamento individual e da comunidade populações em áreas afetadas exibem atitudes fortemente negativas na auto-avaliações de saúde e de bem-estar e um forte sentimento de falta de controle sobre suas próprias vidas. Associado a estas percepções é um sentimento exagerado os perigos para a saúde da população exposta a radiação. Os afetados apresentam uma crença generalizada de que as pessoas expostas são de alguma forma condenadas a uma expectativa de vida mais curta. Esse fatalismo também está ligado a uma perda de iniciativa para resolver os problemas de sustentar uma renda e dependência de ajuda do Estado (FORUM DE CHERNOBY, 2005, p. 36 - tradução nossa).

Crianças apresentando deformações físicas, oriundas devido a contaminação pela radiação emitida no acidente em Chernobyl. 
Segundo a jornalista, política e escritora Alla Yaroshinskaya pesquisadora sobre o tema, que em sua carreira publicou vários trabalhos e livros sobre Chernobyl e indicada ao prêmio Nobel da paz em 2005, teve acesso aos documentos secretos enquanto ela fazia parte do Supremo Soviético em 1990 quando a URSS estava se desfazendo. Segundo esta autora os documentos comprovam que a alta cúpula do partido modificou deliberadamente os níveis aceitáveis de radiação que uma pessoa pode receber, diminuindo as taxas de pessoas contaminadas. Essa foi uma das decisões macabras que o governo soviético decidiu fazer, os motivos certamente seriam a sua permanência no poder, manter o controle sobre as pessoas e a imprensa e diminuir os gastos com o acidente. Segundo Yaroshinskaya além dos materiais radioativos, o reator liberou outro produto que afetou apenas os líderes da URSS à mentira ou como ela cita “a mentira de 82” fazendo um jogo de palavras com o césio 137.

Um documento que comprova que a sociedade afetada e os órgãos de pesquisa não chegaram ao um consenso sobre as mortes e vítimas, foi produzido pelo parlamento Europeu em onze de abril de 2011 com este registro: B5-0325/2001 que trata sobre a segurança nuclear quinze anos depois do acidente. Este documento relata a divergência de opiniões da seguinte forma:

“Considerando que, até à data, as consequências do acidente reconhecidas oficialmente se limitam a 33 mortos e a 1800 crianças e adolescentes vítimas de cancro da tiróide; que o relatório 2000 do UNSCEAR sobre esta matéria apenas reforça esta atitude, apesar de este balanço oficial ser veemente e continuamente contestado pelas vítimas e pelos especialistas e os cientistas ligados a este domínio; que organismos oficiais como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Serviço das Nações Unidas para a Coordenação dos Assuntos Humanitários têm uma posição muito diferente” (PARLAMENTO EUROPEU, 2011, p. 2).

É evidente que o trabalho de memória e esquecimento de micro e macro-história está fortemente ligado a este assunto, já que quando o assunto torna-se alvo das atenções, os temas lembrados são apenas o acidente, cidade fantasma, comunismo, erros e etc. Sempre esquecendo-se das pessoas que morreram ou tiveram suas vidas afetadas. O processo de esquecimento também refere-se aos problemas econômicos. Em 1986 a segunda crise do petróleo e a demanda de energia barata fez com que a URSS suprimisse o reconhecimento de quatro mil mortes, pois era necessário que a opinião pública não interferisse em questões nucleares do país. A questão das pensões também entra no cálculo para não reconhecer essas pessoas como vítimas. O relatório do fórum de Chernobyl reconhece que a radiação pode modificar ou matar.

“Interação da radiação ionizante (alfa, beta, gama e outros tipos de radiação) com matéria viva pode danificar as células humanas, causando a morte de alguns e modificando outras. A exposição à radiação ionizante é medida em termos de energia absorvida por unidade de massa, isto é, a dose absorvida. A unidade de dose absorvida é o gray (Gy)” (FORUM DE CHERNOBY, 2005, p. 36).

O mesmo relatório aponta que a radiação mais forte foi recebida pelos trabalhadores da usina e pelos bombeiros, já a população não sofreu com uma dose de corpo inteiro, não mais do que o mesmo nível da radiação de fundo. O impacto socioeconômico reconhecido foi enorme nas regiões europeias mais afetadas, o nível de pessoas principalmente crianças que desenvolveram câncer, de tireoide foi de quatro mil em 2002 (FORUM DE CHERNOBY, 2005).

Outro estudo realizado por 60 pesquisadores a pedido da organização não governamental Greenpeace (2006) aponta que o número de mortes provocadas pelo acidente pode alcançar a marca próxima de cem mil vítimas nos três países mais afetados. O mesmo documento acredita que só na Rússia o número de mortes já alcançou cerca de sessenta mil, e na Belarus e Ucrânia o número é de cento e quarenta mil vítimas, contestado pelo relatório da UNO como na seguinte passagem:

“Apesar das dificuldades para dimensionar o real número de vítimas, os resultados do relatório do Greenpeace comprovam que as estatísticas oficiais da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), divulgadas em setembro último e que falam em 4 mil vítimas, subestimam de forma grosseira o número de mortes provocadas pelo acidente, numa atitude desrespeitosa para com as vítimas” (GREENPEACE, 2006a).

Quando analisado esse documento na íntegra, identificam-se pontos controvertidos quanto ao número de mortes.

“Apesar da seriedade e extensão geográfica documentada da contaminação causada pelo acidente, a totalidade de impactos em ecossistemas, saúde humana, desempenho econômico e estruturas sociais continua desconhecida. Em todos os casos, impactos assim tendem a ser extensos e duradouros” (GREENPEACE, 2006b, p. 3).

Na pesquisa se leva em conta tudo que afeta a vida das pessoas, e é detalhada os tipos de doenças que as pessoas podem desenvolver, tais com: problemas respiratórios, digestivos, hormonais e diversos tipos de câncer. Além disso, em nenhum outro estudo analisado foi discriminado quais grupos de pessoas ficaram mais suscetíveis a essas doenças.
  1. Trabalhadores de limpeza ou ‘liquidatários’, incluindo civis e militares designados a continuar com suas atividades de limpeza e construir a camada protetora para o reator;
  2. Evacuados de territórios perigosamente contaminados num raio de 30km ao redor da usina;
  3. Residentes dos territórios menos (mas ainda perigosos) contaminados; e
  4. Crianças nascidas em famílias de qualquer um dos 3 grupos acima. (GREENPEACE, 2006b, p. 3).

Não se pode analisar o pós-tragédia sem levar em conta todas as estruturas em que essas pessoas vivem atualmente. Não é possível isolar o homem e analisar só sua saúde, sua alimentação, pois cada fator influencia o outro. Essa pesquisa evidencia como os governos escondem juntos com órgãos a real dimensão da tragédia. Essas políticas só causam mais mortes, e menos acesso à verdade e são ligadas ao esquecimento.

Segundo a revista online Exame (26/04/2011) as perdas no acidente já somam 180 bilhões de dólares alcançando 10% do orçamento anual da Ucrânia, sem contar com as indenizações e auxílios pagos ainda hoje. Recentemente jornais do mundo todo noticiaram que houve desabamento do teto do sarcófago, sendo necessária a construção de uma nova estrutura que cobrirá toda a unidade 4. Seu custo foi estimado em 1,8 bilhões de dólares, sem essa nova contenção o material que está armazenado no interior do prédio pode voltar a expelir radiação para a atmosfera (ver mapa a seguir).

Escala continental da nuvem radioativa emitida pelo vazamento do reator 4 da Usina de Chernobyl.
8 O ocidente a um ponto de torna-se uma Chernobyl

A ideologia que possuímos não pode influenciar como olhamos especificamente este acidente, é necessário manter-se o mais neutro possível para não usar os julgamentos de que o outro não é capaz de fazer algo que possamos. Insistentemente os trabalhos produzidos no ocidente visam desqualificar a usina, os engenheiros e os modelos sociais, administrativo e econômico adotados pela URSS. Assim, como os soviéticos o ocidente superestimou todas as questões nucleares, várias questões técnicas foram tratadas com improviso, ou acabaram utilizado peças alternativas paras situações que não foram planejadas, como no caso da usina de Windscale no Reino Unido:

“É evidente que a maior parte da história de Windscale vem sendo entremeada de acidentes e ‘desastres que não ocorreram por um triz’. Em outubro dede 1976, detectou-se (por acaso) um vazamento de estrôncio e césio radioativos de um deposito de lixo atômico durante uma obra na usina. Só então percebeu que o vazamento já vinha ocorrendo há uns quatro anos. Enquanto se investigava esse problema, encontrou-se outro grande vazamento em uma estrutura próxima, provavelmente ainda mais antigo que o primeiro, talvez com sete anos de existência” (HAWKES et al., 1986, p. 44.)

Em outra passagem, este mesmo o autor aponta a seguinte estatística:

“Ao todo, já ocorreram mais de 300 acidentes das mais diversas proporções em Windscale, gerando críticas de parte da indústria nuclear e de outras fontes. Só que nenhum desses acidentes se equipara à série de ocorrências que teve início em 8 de outubro de 1957, quando um físico responsável pelo reator nº1 de produção de plutônio cometeu um erro fatal: ligou uma chave antes da hora durante um procedimento de rotina. Como ele não tinha à mão um manual para consulta, e os instrumentos básicos não estivessem marcando o que deveriam, de maneira que ele pudesse obter dados precisos, iniciou-se um incêndio que envolve instantaneamente o reator e permaneceu incontrolável durante 42 horas” (HAWKES et al., 1986, p. 44).

A irresponsabilidade das autoridades inglesas chegou a tal ponto que testes com bombas nucleares foram feitas na Austrália. Um destes testes produziu uma enorme nuvem de material radioativo que foi levado pelo vento até uma aldeia aborígene local. Toda a aldeia dos foi contaminada e os moradores começaram a sentir os efeitos da exposição, como se não bastasse pilotos foram enviados para verificar o nível de radiação dessas nuvens sem nenhum tipo de proteção. Para demonstrar como as usinas do ocidente não eram tão boas assim, uma comissão do governo norte americano fez uma pesquisa constatando que em 1982 já tinha acontecido cerca de 169 acidentes que poderia ter como causa a fusão do núcleo de reator no território dos EUA. Como última exemplificação e a mais aterrorizante mostra as incoerências no ocidente:

[...] Em um certo reator nuclear, era empregada uma bola de basquete, do tamanho regulamentar, envolta em fita de borracha, para bujonar um tubo. Inevitavelmente, a pressão da água fê-la disparar como uma bala de revolver, causando o vazamento de 53 mil litros de água radioativa. Em outro, um tanque de dejetos com capacidade para 11mil litros estava ligada a um bebedouro. [...] Relata que certos sistemas de segurança foram inutilizados em decorrência de algumas válvulas e chaves terem sido deixadas em posição errada, às vezes durante semanas seguidas (HAWKES et al., 1986, p. 52- 53).

É evidente que todos os países desrespeitaram as normas independentes para que finalidade tivesse. As usinas inglesas, norte americanas, francesas ou soviéticas não eram e não são lugares seguros como é vendida a imagem de uma energia limpa e segura.

Fotografia da Usina de Chernobyl em 2018, apresentando a nova estrutura de contenção da radiação, chamada desde 1987 de sarcófago. 
Considerações finais

Fica claro que a maioria dos países desrespeitava as normas de segurança. A crendice na hipótese de que nada dará errado torna-se ainda mais perigosa ao tratar de algo que pode exterminar vidas em questão de minutos, isso acontecia não só na URSS. Infelizmente qualquer uma das usinas estava pronta para torna-se uma Chernobyl. Acusar o projeto ou a capacidade dos engenheiros soviéticos é uma clara demonstração na tentativa de desqualificar os pontos positivos que esses homens criaram. Infelizmente o acidente aconteceu, criando munição para os ataques ocidentais. O que se pode fazer agora é reconhecer que não se deve trabalhar com “amadorismo”, pois nesta área o respeito a todas as normas devem ser cumpridas ao pé da letra para que não ocorram novos acidentes nucleares.

O reconhecimento de todas as vítimas, ajudá-las e fazer o possível para que todas possam viver com melhores condições de vida deve ser um compromisso das autoridades dos países envolvidos, pois muitas gerações ainda sentem esse passado que deixa marca e números de mortes não calculadas.

A história como se sabe nunca se repete, pode apenas ter fatos semelhantes. Hoje se vive a sobra de uma nova catástrofe localizada no Japão mais precisamente na usina de Fukushima, por isso deve-se utilizar o que já foi ensinado da forma mais dolorosa para evitar que vidas inocentes paguem por irresponsabilidades de outros.

Referências

DALAVIA, Vitor. O desastre nuclear de Chernobyl (26/041/986). Disponível em: <http://xa.yimg.com/kq/groups/17807105/167 0189686/name/O+ACIDENTE+NUCLEAR+DE+CHERNOBYL.doc>. Acesso em: 10 mar. 2014.
DISCOVERY CHANNEL. O Desastre de Chernobyl. (Vídeo) diretor Thomas Johnsonr. 2006.
DUPUY, Jean Pierre. A catástrofe de Chernobyl vinte anos depois. Revista Estudos Avançados, v. 21, n. 59, p. 243-252, 2007. 
ESTEVES, Victor. Chernobyl - o fato. Texto disponível em: http://www.del.ufrj.br/~victor.esteves/Segur anca2013/trabalhosobreChernobyl.pdf Acesso em: 4 dez. 2013.
FÓRUM DE CHERNOBYL. O legado de Chernobyl: Saúde, Meio Ambiente e Impactos Sócio-Econômicos. Recomendações aos governos de Belarus, da Federação Russa e da Ucrânia – Viena 2003-2005. Disponível em: <http://www.iaea.org/Publications/Booklets/C hernobyl/chernobyl.pdf>. Acesso em: 5 maio 2014.
GREENPEACE. Chernobyl death toll grossly underestimated. Disponível em: <http://www.greenpeace.org/international/en/news/features/chernobyl-deaths-180406/>. Acesso em: 13 nov. 2013.
GREENPEACE. Novo estudo do Greenpeace revela que número de mortes por câncer de Chernobyl pode chegar a 93 mil. 17, abril, 2006a. Disponível em: <http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/novo-estudo-do-greenpeace-reve> Acesso em: 24 nov. 2013.
GREENPEACE. The Chernobyl catastrophe consequences on human health. Amsterdam, the Netherlands , 2006b. Disponível em: <http://www.greenpeace.to/publications/chernobyl_health_report.pdf>. Acesso em: 5 mar. 2014.
GREENPEACE. Vítimas de Chernobyl. 18, março, 2011. Disponível em:<http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Blog/vtimas-de-chernobyl/blog/33819>. Acesso em: 26 nov. 2013.
GRID ARENDAL. The continental scale of the Chernobyl accident, 2007. Disponível em: <http://www.grida.no/graphicslib/detail/thecontinental-scale-of-the-chernobylaccident_12e3>. Acesso em: 10 mar. 2014.
GROSS, B., Chernobyl 1 ano depois. Revista Ciência Hoje, v. 6, n. 32, p. 28-37, 1987.
HAWKES. Nigle et al. Chernobyl: o fim do sonho nuclear. São Paulo: José Olympio, 1986.
MEDVEDEV, Zhores. Inovação & Conservadorismo – nova liderança soviéticaTradução de Lígia Kosin. Revista Novos Estudos, n. 17, maio, 1987. 
PARLAMENTO EUROPEU. Proposta de resolução do Parlamento Europeu sobre a segurança nuclear 15 anos depois do acidente de Chernobil. 11 abril, 2011. Disponível em: <http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.
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PASCHOA, Anselmo S. Lições de Tchernobyl - os alimentos importados. Revista Ciência Hoje, Rio de janeiro, v. 6, n. 32, p.36-37, jun., 1987.
REVISTA EXAME. Perdas pelo acidente de Chernobyl somam US$ 180 bilhões. 26/04/2011. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/meio-ambiente-eenergia/ noticias/perdas-pelo-acidente-dechernobyl-somam-us-180-bilhoes>. Acessado em: 15 de nov. 2013.
REVISTA VEJA. Chernobyl - a explosão vermelha - o reator de uma usina nuclear soviética pega fogo, explode e joga na atmosfera nuvem radioativa que espalha o medo por toda a Europa, n. 922, 7 de maio de 1986.

Fonte: SUGUIMOTO, Djmes Yoshikazu de Lima; CASTILHO, Maria Augusta de. Chernobyl: A Catástrofe. Revista da Universidade do Vale do Rio Verde, Três Corações, v. 12, n. 2, ago./dez. 2014, p. 316-322. 



domingo, 2 de junho de 2019

Santo António de Sant’Ana Galvão, OFM (1739-1822): primeiro Santo natural do Brasil

Santo António de Sant’Ana Galvão, OFM (1739-1822): 
primeiro Santo natural do Brasil 


António de Sousa Araújo


OBS: As imagens aqui contidas foram escolhidas por mim, para ilustrar o trabalho do autor. 

Por ocasião da V Conferência Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe e durante a sua Viagem Apostólica ao Brasil, sua Santidade o Papa Bento XVI presidiu, na presença de centenas de Bispos e mais de um milhão de fiéis, no dia 11 de Maio de 2007, sexta-feira, no aeroporto “Campo de Marte”, na cidade de São Paulo, à Santa Missa e à Canonização do primeiro Santo brasileiro. Trata-se do padre franciscano Frei António de Sant’Ana Galvão (1739-1822), cuja biografia tentaremos condensar para os nossos interessados da hagiografia, da piedade e da cultura franciscanas.

Semelhante tarefa ser-nos-ia absolutamente impossível sem o acesso à Biografia documentada ou Biografa Crítica de Fr. Desidério José Kalverkamp1, publicada pelo Mosteiro das Concepcionistas da Luz, nas Edições Loyola – S. Paulo, 1993, em vol. de 384 pp. Foi na qualidade de vice-postulador da causa que Frei Desidério, a partir de 1983, pôde pesquisar documentação e redigir o texto deste volume, para apresentar em Roma, em 1993, como a “Posição sobre a Vida, virtudes e fama de santidade” entregue na Congregatio de Causis Sanctorum Prot. n.º 1765, cuja edição foi autorizada em São Paulo, no Brasil.

Nos sítios da Internet ligados ao Brasil existe abundante informação a seu respeito sob o nome de Frei Galvão, Frei António de Sant’Ana Galvão ou mesmo Frei António Santana Galvão. Com o nome de Frei Galvão designam-se monumentos, edifícios, retratos, objectos, localidades, e até uma Serra. Tudo isso, como veremos, a demonstrar a qualidade e peso da devoção, popularidade e carinho, que, graças ao seu patrocínio e exemplo de vida, conquistou entre o povo paulistano e brasileiro.

As Biografias

A primeira biografia sobre ele escrita logo após a sua morte, pelo seu confrade e sucessor, Frei Lucas José da Purificação, constava de um só caderno manuscrito, que, tendo corrido de mão em mão, acabou desaparecido, tudo levando a crer que terá sido queimado.

1 – A bibliografia escrita e impressa ganhou impacto em 1922, na comemoração do primeiro centenário da sua morte, sobretudo a partir do Recolhimento ou Mosteiro da Luz – São Paulo – onde ele exerceu a sua acção pastoral e passou quase toda a sua vida. Num álbum de 86 pp. in 8º grande, com 14 trabalhos históricos, o terceiro franciscano Manuel E. Altenfelder assina o estudo mais sólido de todos sobre Frei António de Sant’Ana Galvão.

2 – Seis anos após, publicou o Convento da Luz a Vida de Frei António de Sant’Ana Galvão, Religioso Franciscano natural de Guaratinguetá (1739-1822), S. Paulo, 1928, 48 pp. ilustradas, um trabalho altamente devedor a Altenfelder.

3 – Manuel E. Altenfelder Silva, O.T.F., em Brasileiros Heroes da Fé, S. Paulo, 1928, 424 pp., traça os perfis de 35 brasileiros: sacerdotes, religiosos e leigos, ocupando Frei Galvão as pp. 241-290, cujo texto sólido tem em vista a edificação do povo.

4 – Sor Myrian, Vida do venerável Servo de Deus Frei António de Sant’Ana Galvão, Religioso Franciscano natural de Guaratinguetá (1739-1822), S. Paulo, 1936, 254 pp. Nesta 2ª edição aumentada, e sob pseudónimo, assina-se a Abadessa do Mosteiro da Luz, Madre Oliva Maria de Jesus. Não é rigorosamente uma biografia histórica. Tem interesse pela reprodução de alguns documentos franciscanos do Arquivo do Mosteiro.

5 – Lúcio Cristiano, Frei António de Sant’Ana Galvão. O Apóstolo de São Paulo entre os séculos XVIII e XIX, S. Paulo, 1954, 14 pp. Sem preocupações históricas, propõe um bom perfil biográfico com quatro citações bibliográficas.

6 – Maristela, Frei Galvão, Bandeirante de Cristo, S. Paulo, edição do Mosteiro da Luz, 1978, 227 pp. Parece constituir a primeira biografia com atenção histórica, dominando todos os contributos históricos anteriores. Não se destinando a historiadores, não tem preocupações críticas, mas tenta uma relação dos passos necessários à beatificação e canonização.

7 – Pe. António de Oliveira Godinho, Frei António de Sant’Ana Galvão. Escritos Espirituais (1766-1803), S. Paulo, 1980, 93 pp. É a primeira edição de uma parte dos escritos, iniciativa do Museu de Arte Sacra de S. Paulo.

8 – Carmelo Surian, Vida de Frei Galvão, S. Paulo, 1997, 209 pp. É a biografia mais recente, sem nada de novo, a não ser a reconstrução mais minuciosa da vida do servo de Deus.

Frei António Galvão – a sua família e naturalidade

Frei António de Sant’Ana Galvão nasceu e foi baptizado na freguesia e vila de Guaratinguetá, do Bispado do Rio de Janeiro, em 1739. Mas com a criação da diocese de S. Paulo logo em 1745, poder-se-á dizer que Frei Galvão é um verdadeiro paulistano: viveu e morreu nesta diocese. Ignora-se o mês e dia do seu nascimento, por falta ou desaparecimento da certidão do registo paroquial.

Retrato de Frei Galvão, autoria desconhecida, c. 1850. Não se sabe se ele tinha essa aparência exatamente. 
No nome Sant’Ana, de professo franciscano na Província capucha da Imaculada Conceição com que se tornaria conhecido, sepultou parte do nome de família. Na verdade, ele denominava-se António Galvão de França, e era descendente de um português. O seu pai era de Portugal, chamava-se igualmente António Galvão de França, nascera em 1706 em Faro, no Algarve, e havia emigrado para o Brasil, para a região de Guaratinguetá, onde se casou, em 1733, com Isabel Leite de Barros, em capela de familiares dela, chamada “capela dos Correias”2. Em vez do nome de França paterno, passou a usar o nome de Sant’Ana, (hoje até se diria espontaneamente Santana), em homenagem à santa padroeira da família3.

O pai foi sargento-mor em Taubaté e dedicava-se também ao comércio em vários ramos de negócio, sendo homem de influência social na sua terra, conhecido pela sua caridade e generosidade, o que condizia perfeitamente com a sua qualidade de membro das Ordens Terceiras de S. Francisco e de Nossa Senhora do Carmo4. Enviuvou em 1755, com 49 anos, nessa condição ou estado vindo a falecer em 1770, abintestado, e tendo ainda em sua casa um filho, três filhas e uma fortuna das mais sólidas do tempo5.

A mãe, Isabel Leite de Barros, filha do capitão Gaspar Correia Leite e Maria Leite Pedroso, estava ligada aos troncos vicentinos/paulistas provindos de povoadores quinhentistas. Teve onze filhos e faleceu com apenas 38 anos, em 1755, tendo deixado vivos 3 rapazes e 5 meninas. Tal como o marido, gozava também do dom de atender os pobres e de juntamente com ele levar à pia baptismal grande número de crianças pobres e abandonadas6. Constituíam uma clássica família cristã do Brasil do século XVIII, devota de Santa Ana, como se vê até pelo nome das filhas. Mas continuemos a identificá-la.
  • José, o primogénito (1734-1782), casado com sua prima Maria Xavier de Barros, teve oito flhos. Foi sargento-mor e faleceu em Guaratinguetá. Dele provém a grande família Galvão de França que de Paraíba irradiou para cidades paulistas como Itu, Piracicaba, Campinas…
  • Maria (1735-1796), casada com o seu primo, capitão Francisco Ferraz de Araújo. Teve seis filhos e ficou sepultada em Guaratinguetá.
  • Isabel Leite de Barros ou Leite Galvão (1736-1771), casada com Manuel Nogueira da Silva, teve três filhos. Jaz também em Guaratinguetá.
  • António (1739-1822). Trata-se do nosso S. Frei Galvão, sepultado e venerado em S. Paulo.
  • Ana (1741), que faleceu criança.
  •  Ana Joaquina (1744-1841), casada com o alferes Félix Gomes de Siqueira, teve oito filhos e faleceu com 97 anos em Embaú.
  • João (1745), que teve Santa Ana por madrinha7, faleceu menino8.
  •  Ana Jacinta (1746-1823/1825), casada com o capitão-mor José Gomes de Siqueira e Mota, com filhos todos falecidos na infância9.
  •  Manuel (1747), casado em 1792 com Ana Joaquina de Andrade e falecido sem filhos, no Rio de Janeiro.
  • Francisca (1748), que faleceu criança.
  •  Francisca Xavier (1753-1805), casada com o alferes Francisco Nabo Freire. Teve dezessete filhos, vários deles falecidos na infância10.

Algumas notas da sua vida e formação em família

Guaratinguetá remonta enquanto povoação a 1630 e ter-se-á desenvolvido em redor de uma capela “erguida em palha e parede de mão”, dedicada a Santo António11. Eclesiasticamente dependia do Bispado do Rio de Janeiro até que em 1745 ficou integrada em São Paulo. O seu apogeu económico, político e social foi atingido com o ciclo do café e graças ao seu forte desenvolvimento urbano, foi elevada a comarca em 1852. Com a decadência do café em finais do século XIX, virou-se para a economia agropecuária, tornando-se a capital leiteira do Vale do Paraíba12.

Localização de Guaratinguetá, local de nascimento do santo. 
Em Outubro de 1748, António Galvão de França surge juntamente com a sua irmã Maria de 13 anos como padrinho de baptismo de uma menina, Maria Raposo, na sua paróquia de S.to António de Guaratinguetá. Quando contava 13 anos, ou seja, em 1752, teve de sair para muito longe de casa. Para efeito de estudos foi enviado para o Colégio/Seminário de Belém, mantido pelos Padres da Companhia de Jesus na vila de Cachoeira, a 130 quilómetros da cidade do Salvador da Baía.Tratava-se dum estabelecimento fundado pelo Padre Alexandre de Gusmão (1629-1724), um lisboeta emigrado em 1644, que ingressou na Companhia em 1646, nela se tendo ordenado e sido Provincial. Em 1670 residia na Baía. Aí fundou o seminário, (de que fora Reitor e vice-reitor entre 1690-1715) em regime de internato13. Regia-se por uma disciplina simples e austera, para formação de jovens. Teve a particularidade de suprir praticamente a carência dos seminários menores, porquanto dele saíram muitos eclesiásticos diocesanos e regulares.

Quando António Galvão de França ali chegou, já ali se encontrava, havia cerca de cinco anos, o seu irmão mais velho, o José, com quem permaneceu apenas uns dez meses, uma vez que ele viajou para as cidades da Baía e do Rio de Janeiro, onde permaneceu seis meses, antes de regressar a Guaratinguetá e de prosseguir cinco anos de estudo em São Paulo. O José chegou a pensar receber ordens menores. Mas desistindo delas, aparecerá em 1758 na Cúria metropolitana de São Paulo a solicitar dispensa para se casar com a sua prima Maria Xavier de Barros. Neste colégio jesuíta recebeu António Galvão uma sólida educação intelectual e religiosa, tendo-se mesmo revelado bom latinista e havendo começado a sentir o desejo de se consagrar na vida religiosa no seio da Companhia de Jesus. Deve ter sido grande a sua dor, quando em 1755, aos dezesseis anos, perde a sua mãe de apenas 38 anos de idade, bem assim como quando o seu pai, atento às borrascas pombalinas que ameaçavam a Companhia, obstou a que o filho demandasse o ingresso nessa Instituição votada à extinção14.

Nos Franciscanos: formação e apostolado

Na impossibilidade de conseguir do pai o acordo para ingressar na Companhia de Jesus, António Galvão voltou-se para os Frades Menores ou Franciscanos ditos Descalços ou Capuchos da Província da Imaculada Conceição, cujo apostolado era bem conhecido na sua região. Em Taubaté, não longe de Guaratinguetá, possuíam o Convento de Santa Clara, para eles construído pelo povo e autoridades locais entre 1674 e 1677(15). Terá sido a partir desta Casa que o candidato a franciscano se iniciou no conhecimento do ideal de vida franciscana e no contacto com o Provincial Frei Francisco da Purificação, para que o aceitasse na Província, com sede na cidade do Rio de Janeiro. Foi este quem o enviou para o Convento de S. Boaventura de Macacu, inaugurado em 1670, na Capitania do Rio de Janeiro, e destinado a Casa de Noviciado já desde 1672(16), por onde passariam 229 noviços, notáveis muitos deles17.

Ruínas do Convento de São Boaventura de Macacu, Rio de Janeiro. Frei Galvão estudou alguns anos como noviço aqui. 
Foi com 21 anos que António Galvão de França se despediu do pai e dos irmãos, para tomar o hábito franciscano a 15 de Abril de 1760, sendo guardião dessa casa o P. Frei José das Neves18. Foi nesse dia que, de acordo com praxes franciscanas, renunciou ao seu nome de França para incluir o de Sant’Ana (= Santana) em lembrança da devoção que sua mãe lhe consagrava como protectora da sua família, cujo nome deu a três das suas filhas.

Terminou o ano de noviciado, professando a 16 de Abril de 1761(19) e fez juramento de defender o privilégio da Imaculada Conceição20. Logo de seguida terá vivido no Convento de Santo António do Rio de Janeiro, estudando em vista das ordenações, ou trabalhando, até que em 1762, e como consta do Livro das Matrículas dos Ordenandos, foi escalando, entre Março e Julho, etapas da ordenação sacerdotal, recebendo esta a 11 de Julho de 1762, das mãos de D. Frei António do Desterro, OSB, bispo do Rio de Janeiro21 . Depois de ordenado sacerdote foi para o convento de S. Francisco de São Paulo, onde a 24 de Julho de 1762 “foi admitido ao estudo de Filosofia. Significa isto que, em atenção ao seu excelente currículo de estudos obtido entre os jesuítas no Seminário de Belém, na Baía, houveram por bem ordená-lo antes de terminado aquele curso.

Terá, pois, feito a Filosofia e a Teologia nas aulas dos religiosos da cidade de São Paulo, acompanhando também os padres que já ali se exercitavam no apostolado entre o povo22. A duração normal do Curso era de três anos de Filosofia e de outros tantos de Teologia escolástica e Moral para se habilitarem para pregadores e para confessores de seculares23. Além destes estudos e do trabalho apostólico, Frei António Galvão procedeu ao aprofundamento da sua espiritualidade franciscano-mariana, declarando-se filho e perpétuo escravo” de Maria Santíssima, em Novembro de 1766, isto é, quando contava 27 anos de idade24.

Em Capítulo Provincial de 1768, Frei António de Sant’Ana Galvão, depois de concluídos em São Paulo todos os estudos regulamentares, foi nomeado, a 23 de Julho, pregador e confessor de seculares, além de porteiro do mesmo convento paulistano. Ser porteiro era então um cargo-chave da vida dum convento, confiado exclusivamente a sacerdotes prudentes e de sólida formação e conduta religiosa25, pelo apreço que se pretendia manter entre o convento e o povo. Foi confirmado neste ofício em 1770 e em 1773. No exercício destes ministérios sacerdotais acompanhou os seus confrades por diversas localidades, caminhando sempre a pé. Sorocaba, Porto Feliz, Itu, Parnaíba, Indaiatuba, Moji das Cruzes, Paraintinga, Pindamonhangaba, Guaratinguetá e outras localidades o ouviram por ocasião de prédicas solicitadas ou aquando das suas excursões de angariação de fundos para a construção do Convento da Luz, em São Paulo26. Aos 31 anos era já considerado erudito da sociedade paulistana como o comprovam as suas 16 composições poéticas em latim, em louvor de Sant’Ana, na Sessão literária solene de Agosto de 1770, na primeira Academia de Letras, também dita “Academia dos Felizes”27, instalada no antigo Colégio da Companhia de Jesus28.

Orientador de Recolhidas e Assistente de Terceiros Franciscanos

Por 1769/1770 terá sido nomeado confessor do Recolhimento de Santa Teresa, existente em São Paulo desde 1685(29), aparecendo em 1775 como visitador do convento de Itu30, e em 1776 também como Comissário da Ordem Terceira de S. Francisco na cidade de São Paulo, confirmado nesse cargo até 1792, época em que também orientava o Recolhimento da Luz, que aspirava ascender a convento ou mosteiro31.

A fundação do primitivo Recolhimento da Luz está ligada ao Morgado de Mateus, D. Luís António de Sousa Botelho e Mourão, e remonta a 1774(32); surge junto a uma capela de Nossa Senhora transferida em 1603 das margens do Ipiranga para o campo da Luz, a qual em 1765 se encontrava ao abandono33. A Irmã Helena Maria do Espírito Santo, ligada ao Recolhimento de Santa Teresa, estava também por detrás do novo Recolhimento da Luz. Queria ela que esta casa fosse carmelita. Mas o então bispo de São Paulo desde 1774, o franciscano D. Frei Manuel da Ressurreição, quis sujeitá-lo à Regra dos doze capítulos da Puríssima Virgem Maria da Conceição, aprovada pelo Papa Júlio II, em 1511, para a fundadora portuguesa Santa Beatriz da Silva34.

Em 8 de Setembro de 1774 nasceu a nova comunidade concepcionista vindo juntar-se a outras três iguais existentes na Baía, Rio de Janeiro e Minas Gerais, malgrado a oposição do todo-poderoso Marquês de Pombal35. Graças à sua orientação do Recolhimento de Santa Teresa, Frei Galvão acabaria por se ver intimamente ligado ao nascimento e crescimento da nova comunidade da cidade de São Paulo. Mas ao mesmo tempo que comungou das suas alegrias, também partilhou das suas tristezas, tais como a morte da Madre fundadora em 23 de Fevereiro de 1775, a substituição, em 14 de Junho, do Governador Morgado de Mateus por Martim Lopes Lobo de Saldanha, cujos oito anos de governo representam uma “época sinistra na história de São Paulo”, cheia de arbitrariedades, entre elas a de obrigar o Bispo a encerrar o Recolhimento, apesar da autorização do Senado da cidade36.

Perante o inesperado da ordem de encerramento, o Padre António Galvão executou com serenidade a última celebração com notável atraso, para espanto das recolhidas e dos mais circunstantes, os quais, só no final, ficariam ligeiramente a par do alcance do acontecido. Ocorreu isso no dia de S. Pedro, a 29 de Junho de 1775. Tendo-se revestido, ordenou que se encaminhassem para o comungatório: “deu a comunhão e consumiu o Sacramento do Sacrário, mandou apagar a lâmpada e no fim disse ao povo que não adorassem mais o Sacramento que já não existia no Sacrário”37.

Na portaria souberam as recolhidas que o Senhor Bispo as mandava avisar os pais para que as viessem buscar para suas casas, porque dentro de um mês se fechariam as portas. Ninguém, nem Frei Galvão, lhes explicara as razões de tudo isto. Resolveram manter-se confiantes e encerradas em casa, pois quase todas eram naturais da cidade ou da área de São Paulo, aguardando o desenrolar dos acontecimentos. Depois de um mês e dias trouxe o correio pedestre do Rio de Janeiro a resposta do Vice-Rei – Marquês do Lavradio – ao Relatório do Capitão general Martim Lopes, o qual seria advertido e forçado a revogar a ordem e reabrir o Recolhimento, o que fez, persistindo contudo sempre na sua hostilidade em todo o tempo do seu governo (1775-1782)38.

Em face deste contratempo, Frei Galvão repensou ampliar as habitações das recolhidas, substituindo a estrutura de tipo conventual pela de um mero recolhimento e casa de retiro de senhoras piedosas ou devotas, sem votos. Embora pudessem praticar vida religiosa na máxima perfeição, não eram, nem podiam ser tidas como religiosas ou freiras, portanto, fora do alcance das leis anti-monásticas de Portugal. E foi assim que algumas das antigas recolhidas voltaram das suas famílias, muitas das quais contribuiriam para a ampliação do novo Recolhimento. As obras da nova casa efectuaram-se entre 1775 e 1788, tendo-se prolongado ainda numa segunda fase até 1802, com a construção da sua bela igreja39. A hostilidade manifestada pelo Governador tornou mais despertas as recolhidas e solidárias com elas as suas famílias, a ponto de fazer surgir um grande número de pretendentes ou candidatas a devotas e proporcionar a oportunidade de se construir um edifício sólido com paredes de mais de metro de espessura, oito de altura e algumas de trinta de comprimento.

Frei Galvão foi o arquitecto de todo o Recolhimento da Luz, uma obra que precisou de 14 anos de trabalho pesado e moroso, todo ele conseguido à custa de donativos e de braços. Outros tantos seriam necessários para o levantamento da igreja40, inaugurada em Agosto de 1802, embora sem as torres41. Este conjunto conhecido como Convento de Nossa Senhora da Luz constitui ainda hoje um importante espécime da arquitectura religiosa de São Paulo. É uma obra de arte, admirada pela sua resistência e pelo seu belo estilo barroco42; pôde mesmo ser declarada, em 1998, pela UNESCO, “Património cultural da Humanidade”43, tornando-se assim mais do que digna de figurar num Atlas da Arte Portuguesa no Mundo44.

Pintura do Convento da Luz, Henrique Manzo, 1860. O convento e mosteiro foram ampliados sobre direção e projeção de Frei Galvão. 
Além de arquitecto, Frei António Galvão teve de exercer todos os ofícios para a formação das suas “religiosas” ou reformadas: Regente, Mestre, Director. Tinha de lhes ministrar os rudimentos da vida cristã, ensinar a rezar, a ler o latim, a entoar e cantar o gregoriano e a praticar as cerimónias segundo os rituais da vida franciscana. Deixou-lhes nos Estatutos, que lhes redigiu, orientações muito precisas sobre o modo de se comportar no coro, na cela, na casa, na portaria, nas relações entre si, com os doentes, os seculares, superiores e confessores45.

Frei Galvão foi sempre, desde o seio da sua família, desde o Colégio/Seminário jesuíta da Baía, e as casas da sua Ordem Franciscana por onde passou, um zelador de tudo o que é recto, verdadeiro, bom e justo. Patenteou-o, por exemplo, no exercício de cargos de Comissário da Ordem Terceira de S. Francisco (1776-1780)46, fazendo inovações em nome da justiça, como a de investir os capitais em imóveis que renderiam em benefício dos sufrágios atempados aos irmãos falecidos, ou da satisfação de serviços prestados com novos imóveis47.

A sua voz de protesto ou tomada de posição, em 1780, perante a atitude cruel do Governador da Capitania de São Paulo, ao infligir a pena capital, em vez da prisão perpétua, ao pobre soldado Caetaninho, valeu-lhe a ordem fulminante de desterro para o Rio de Janeiro. Ele deu imediato cumprimento à ordem, cuja notícia logo correu toda a sua cidade de São Paulo.

Em pouco tempo, homens com escravos armados formaram bando ameaçador e cercaram a casa do Governador, Capitão-General Martim Lopes Lobo Saldanha, o qual não teve outro remédio senão revogar a sentença de desterro, permitindo a recondução de Frei Galvão ao convento de S. Francisco48. Por causa disso a revolta dos paulistas foi de tal ordem que determinou a demissão do General do seu posto49, numa demissão triste a manchar a história da cidade50.

Os Superiores Franciscanos reconhecem as suas qualidades

Graças à sua virtude, competência e prestígio, os seus superiores franciscanos tinham nele o seu olhar, desejando promovê-lo no seio da própria Ordem. Para tanto começaram por nomeá-lo Presidente e Mestre de Noviços, em Outubro de 1781, no Convento de S. Boaventura de Macacu, da Capitania do Rio de Janeiro.

O Bispo Franciscano de São Paulo, D. Frei Manuel da Ressurreição, não o deixou ir tomar posse. “Os habitantes de S. Paulo – escreveu ele – experimentariam amargura na ausência desse padre”, que “tem tido um procedimento exemplaríssimo pela qual razão o aclamavam santo”51. Frei Galvão era mais útil em São Paulo do que em Macacu, onde em 1884, por decréscimo de noviços, encerrou o Noviciado, tendo assim podido seguir pregando, angariando esmolas e levando a termo a construção do Recolhimento52.

Como se depreende da decisão do Capítulo de Setembro de 1796, o que os seus Superiores franciscanos pretendiam era poder conceder-lhe privilégio de uma Presidência e de uma Guardiania para atingir ou desempenhar cargos mais altos na sua Ordem53. Foi uma espécie de título honorífico a prepará-lo para, na Congregação intermédia de Março de 1798, o nomearem Guardião do Convento de S. Francisco da cidade de São Paulo. Não obstante esta nomeação, Frei Galvão permaneceu Capelão das Recolhidas da Luz, cujos serviços eram considerados insubstituíveis, tanto no Recolhimento como na cidade e em toda a diocese, conforme consta de cartas da Câmara e do próprio Bispo D. Mateus de Abreu Pereira.

Segundo este, o Recolhimento da Luz era considerado “como âncora que sustenta São Paulo e todo o Bispado”54. O problema da acumulação de cargos ou ofícios não estaria então em uso, mas Frei Galvão aceitou-os e exerceu-os dignamente e a contento de todos. Tanto o de guardião de S. Francisco como o de capelão e construtor da igreja do Recolhimento de Nossa Senhora da Luz. Em 1799 terminou a guardiania. Mas em 1801, foi reeleito nas mesmas circunstâncias do mandato anterior55.

O Recolhimento da Luz, atualmente Mosteiro e Convento da Imaculada Conceição da Luz, localizado na cidade de São Paulo. Abriga os restos mortais do santo e o Museu de Arte Sacra. 
Em Outubro de 1804, além da direcção do Recolhimento, foi incumbido da visita canónica do convento de S. Luís de Itu e de ser o Visitador Geral e Presidente do Capítulo, cargo a que renunciou, por doença, ou naturais motivos de cansaço. Recorde-se que a fundação do novo Recolhimento ocupou-o desde 1774 até 1788, isto é, 14 anos. Mas faltava ainda a igreja… E tal como aconteceu com a habitação, Frei Galvão, adoptou com a igreja o critério da solidez da obra. Arrecadar fundos e supervisionar o andamento duma construção em que muitas vezes ajudou com as próprias mãos, implicou todo um conjunto de canseiras com trabalhos e viagens que se prolongaram por outros tantos 14 anos, ou seja, entre 1788 e 1802.

E diga-se que se Frei Galvão teve a imensa alegria de ter sido ele o primeiro a cantar missa e a pregar o primeiro sermão proferido dentro da nova igreja em 15 de Agosto de 1802(56), já não conseguiu concluir o seu sonho. A igreja estava inaugurada. Mas faltavam as torres. O plano da fachada concebido pelo “arquitecto” Frei Galvão traçou-o ele na parede da cela ou cubículo onde morreu, no Recolhimento da Luz. Comportava duas torres. Aquilo que ele já não pôde fazer, muito menos o conseguiriam os seus sucessores. Estes tiveram de se contentar com o levantamento de apenas uma torre57.

A sua ligação a um novo Recolhimento

Também noutras circunstâncias ressaltou patente o reconhecimento e o aproveitamento da virtude, criatividade, empatia e capacidades de organização e liderança de Frei Galvão. As netas do Capitão-mor de Sorocaba, Salvador de Oliveira Leme, Manuela e Rita, filhas de Francisco Xavier de Oliveira, requereram a construção de um recolhimento, principiando pelo projecto de um educandário para seis meninas que manteriam com os seus próprios recursos. Foi esta modalidade um habilidoso subterfúgio utilizado até 1828, data em que pediram ao Imperador D. Pedro I autorização para suspensão do educandário, permanecendo às recolhidas a liberdade de iniciarem “uma vida contemplativa sem nenhuma perturbação”. D. Manuela, faleceria em 1833 e a sua irmã Rita, em 1842(58).

Para a fundação do Recolhimento da cidade de Sorocaba, pediu o Bispo de São Paulo, D. Mateus de Abreu Pereira, a preciosa colaboração não só de Frei Galvão, mas também de duas ou três recolhidas de Nossa Senhora da Conceição da Luz. Os termos do despacho do Vigário Geral de São Paulo, datado de 12 de Agosto de 1811, portanto quando ele contava já cerca de 72 anos, revelavam o respeito e veneração que a Autoridade Diocesana lhe devia: “podendo e querendo as acompanhe [as duas ou três recolhidas de Nossa Senhora da Luz], dê os fundamentos e direcções ao novo recolhimento”. Escusado seria dizer que aceitou e que o êxito da sua missão de direcção deste novo “Recolhimento” foi tão bem-sucedido que onze meses foram o bastante para que ele e as suas colaboradoras do Recolhimento da Luz, Irmãs Domiciana e Rita, pudessem ter regressado em 1812, ao referido Recolhimento de São Paulo59.

Os últimos dez anos da vida de Frei Galvão

Depois desta sua ligação a Sorocaba, Frei Galvão viveu mais dez anos. Caminhava diariamente a pé, entre o convento de S. Francisco e o Recolhimento da Luz, enquanto pôde. De seguida, obteve licença do Guardião e do Bispo para permanecer em dependências da obra, ainda alguns anos60. Habitava “num quartinho contíguo ao convento da Luz, muito ruim e todo esburacado, de chão de terra, situado no local onde hoje está o locutório novo”61, até ao momento em que se mudou para um quartinho (cubículo) atrás do sacrário, “no fundo da igreja”62.

Foi este local ou quarto improvisado que lhe serviu de enfermaria e onde em momentos de insónia e tréguas de sofrimento conseguiu “desenhar na parede” a “cúpula da torre da igreja” que deixaria inconclusa. Neste pequeno espaço de apenas dois metros e cinco centímetros de largura tinha a sua modesta cama. Aceitava todas as privações, dizendo: “seja tudo, por amor de Deus”63. Pelas dez horas da manhã do dia 23 de Dezembro de 1822 aqui faleceu, socorrido de todos os sacramentos, assistido pelo seu Guardião, Frei João do Espírito Santo, P. Mestre Frei Inácio de Santa Justina, Frei António da Assunção e pelos clérigos confessores da Casa, padres Joaquim Francisco de Abreu e Francisco de Assis Ribeiro, seguindo-se, à tarde, o ofício de corpo presente e missa cantada solene64.

Túmulo de São Antônio de Sant'ana Galvão, no Mosteiro da Imaculada Conceição da Luz, São Paulo capital. 
Por concessão do Bispo D. Mateus e a requerimento das Irmãs e moradores da Luz, o seu corpo foi deposto no presbitério da igreja, em sepultura aberta sob a lâmpada do Santíssimo, em frente do altar, cuja lápide registaria o epitáfio: Hic jacet Fr. Antonius a Sant’Ana Galvão huius almae domus inclytus fundator et director qui animam suam in manibus suis semper tenens placide obdormivit in Domino die 23 decembris anno 1822, a significar: Aqui jaz Frei António de SantAna Galvão, ínclito fundador e reitor desta casa, que tendo sua alma sempre em mãos, placidamente adormeceu no Senhor, no dia 23 de Dezembro do ano de 1822”. A primitiva lápide foi substituída por outra de mármore, com os mesmos dizeres, em 1906(65).

Em Fevereiro de 1991, no âmbito do processo de beatificação, perante as Autoridades, membros do Tribunal Eclesiástico e Médicos do Instituto Médico-Legal de São Paulo e alguns especiais convidados, procedeu-se à exumação dos restos mortais de Frei Galvão. Deles, a parte mais conservada foi recolhida numa urna colocada no mosteiro; os fragmentos menores continuariam a permanecer na sepultura66.

Frei Galvão: o seu nome e a sua memória

Como já se referiu, a primeira biografia de Frei Galvão foi escrita por Frei Lucas José da Purificação, seu confrade e sucessor na Capelania do Recolhimento da Luz, com a colaboração das religiosas testemunhas da vida dele durante 48 anos. Como não foi publicada e dela não terão sido feitas cópias, correu de mão em mão, até que alguém (quem sabe se por já delido e surrento com tanto uso!) não mais devolveu o caderno manuscrito. Segundo depoimento recolhido, alguém terá dito, quando perguntado: “Ah… foi para o fogo, como o foram todos os objectos religiosos”…67.

Não obstante esse pequeno incidente, jamais se apagou da memória dos admiradores e devotos, nem o seu nome, nem as suas virtudes, nem alguns factos quase milagrosos68, como o dom de penetrar segredos69, o dom de vencer distâncias (bilocação), ou o de ser advogado para o bom sucesso das parturientes70, o seu prestígio ou força moral sobre o Governo e o povo de São Paulo71, ou nos Paços episcopais e nas Cúrias72, o seu poder apaziguador73, a sua assistência aos aflitos e perseguidos que buscam consolação e justiça74. O respeito pelo seu nome, pelas suas receitas e conselhos, pelas suas lembranças e objectos resultavam desse poder sobrenatural que ressumara da sua virtuosa vida e se prolongava para além da sua preciosa morte.

Os “Galvão de promessa”

Em veneração do Frei Galvão “numerosos indivíduos trocavam os apelidos paternos pelo de Galvão”, “em virtude de promessa feita por seus pais ou avós”. São os “Galvão de promessa”, conhecidos em todo o Estado de São Paulo e existem também noutros Estados particularmente no de Minas Gerais75.

O seu Nome

O nome “Frei Galvão” foi dado a monumentos, edifícios, ruas em várias localidades, a uma Serra; a edifícios, como maternidade, museu, Seminário, Escola Estadual, rancho, residência episcopal; a coisas, como placas, áreas, poço, cela, quadros ou pinturas a óleo, escultura, busto, medalhão etc.76

Pílulas de Frei Galvão

São nada mais nada menos que pequenos papelinhos enrolados com uma oração em latim, dizendo: “Depois do parto, ó Virgem, permaneceste intacta: Mãe de Deus intercede por nós”, que ele escreveu e com sucesso deu a um jovem como remédio para os seus cálculos renais, para que os engolisse com água. O mesmo faria a uma parturiente com dificuldades de parto. Este uso divulgou-se muito, sendo procurado por homens, mulheres e jovens em dificuldades de toda a espécie. As Irmãs do convento de Nossa Senhora da Luz podem dá-las às pessoas que as procuram, na portaria77.

A tradição das pílulas do frei se mantém até hoje, quase duzentos anos depois de sua morte. 
Frei Galvão faz a propaganda de si mesmo. Sua intercessão junto de Deus obtém graças e com elas o amor e a veneração dos devotos. Não é só a capital ou o Estado de São Paulo que o venera. O convento da Luz recebe diariamente cartas de todos os cantos do Brasil, do Amazonas ao Rio Grande do Sul, a comunicar graças ou a pedir estampas e orações. Até na Argentina, México e Portugal o seu nome é conhecido e invocado78.

Causas de beatificação: a santidade notável, base de todas elas

Exactamente porque raramente se fala das dimensões ou vertentes banais ou das circunstâncias das causas dos santos, comecemos por dizer que cada caso é um caso, mas a organização dum processo comporta sempre um trabalho ou serviço moroso, exigente e não isento de dificuldades. Tudo tem de ser provado, coerente e transparente. Apoiado em Fontes e testemunhas fidedignas, que permitam a construção dum retrato e a reconstituição duma biografia.

No caso de Frei Galvão, saliente-se, antes de mais, que a biografia crítica ou biografia documentada resultou dum conjunto infindável de pesquisas. Tudo em ordem à elaboração do processo para a sua Causa de beatificação. Na realidade, o itinerário da beatificação de Frei Galvão, desde que se iniciou até ao termo da canonização, requereu sete longas décadas e quase quatro processos, todos eles condicionados por contingências inevitáveis, tais como carências de disponibilidade, saúde, meios materiais, competência dos postuladores, acrescentadas a outros tantos imprevistos e vicissitudes.

As notas que colhemos a propósito das sinuosidades ou vicissitudes ocorridas com Santo António Santana, Santo António Galvão ou São Frei Galvão são deveras ilustradoras. Registremo-las. A inexperiência em instruir processos deste tipo, bem assim como a falta de recursos humanos e económicos terão estado na origem do insucesso dos dois primeiros. Além disso, saliente-se que a causa não contou oficialmente com o respaldo nem da Ordem Franciscana nem da Arquidiocese de São Paulo, mas tão somente com as ofertas dos devotos do Servo de Deus e as economias do seu Convento ou Mosteiro da Imaculada Conceição da Luz79. Os requerimentos feitos à Autoridade Eclesiástica, em ordem à introdução da Causa foram sempre, em todos os processos, custeados pela Abadessa do Mosteiro.

O primeiro data de 1938-1939 e teve como postulador Frei Adalberto Ortmann, OFM, que se empenhou na busca de documentos e pesquisas então exigidas pelo Direito, para o que contou com a ajuda do confrade historiador Frei Basílio Röver80. Mas o entusiasmo inicial terá esmorecido com o somar dos anos… Em Maio de 1947, à pergunta que lhe foi dirigida acerca do material recolhido, o P. Ortmann, entretanto desligado da Ordem Franciscana, respondeu que tudo havia entregado à Abadessa do Mosteiro da Luz, por ter sido ela quem custeara toda a despesa havida81. Em Julho de 1948, o postulador entretanto nomeado pelo Cardeal Carlos Mota obteve indicação das insuficiências do processo anterior. Em face disso, em 28 de Abril de 1949, constituiu o Cardeal um tribunal eclesiástico expressamente para a Causa de Frei Galvão, nomeando como Vice-Postulador Frei Dagoberto Romag, OFM, cujo Processiculus Diligentiarum, entregue em Roma em 1949(82) também não sortiu efeito, permanecendo-se assim, em 1954, noutra fase de recesso.

Perante a ineficácia dos processos anteriores, foi reaberto o terceiro processo pelo Cardeal D. Agnelo Rossi, o qual começou com a constituição dum novo tribunal, em 23 de Dezembro de 1969(83). Infelizmente, a nomeação de D. Agnelo Rossi para Prefeito da Congregação da Evangelização dos Povos, em 1970, conduziu à paralização total do tribunal e da postulação, desde então nada mais se produzindo84.

O quarto processo (1980-1991) deve-se à vontade do Cardeal franciscano D. Paulo Evaristo Arns, o qual sendo Arcebispo de São Paulo retomou a Causa muito empenhadamente. Perto de 30 anos volvidos verificar-se-ia, com espanto e consternação, que o Processiculus que devia, havia muito, transitar na Causa dos Santos não aparecia lá; andava extraviado e esquecido. Permaneceria lacrado e intocável, até ao momento em que o Cónego Pascoal Amato, da Diocese de São Paulo, depois de muita canseira e expectativa, o localizaria na Cúria Generalícia dos Frades Menores, donde o retirou e trouxe para o Brasil, para ser incluído em fotocópia na Relação dos diferentes Processos85.

Para tanto, em Novembro de 1980, o Arcebispo de São Paulo constituiu postulador geral Frei António Cairoli, que aceitou em Janeiro do ano seguinte86. O vice-postulador, Frei Alberto Beckhauser, OFM, foi homologado em 5 de Fevereiro de 1981 pelo Cardeal Arns, mas por impossibilidade teve de ser substituído, em 1983, por Frei Desidério J. Kalverkamp, OFM(87), o qual fez novas pesquisas de documentos. Por motivos de saúde, também este teve de desistir, em Abril de 1990, e ser substituído, em Novembro seguinte, pelo P. Arnaldo Vicente Belli, ex-OFM Cap., encardinado na Diocese de São Paulo88. Felizmente, porém, a pesquisa de documentos tinha sido efectuada e a elaboração da Biografia Crítica de Frei Desidério tinha finalmente conduzido a causa a bom termo. De posse de 17 cartas postulatórias da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e Bispos do Regional Sul e de todos os Cardeais do Brasil, o Cardeal de São Paulo pôde em Outubro de 1990(89), dirigir ao Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos, Cardeal Ângelo Felici o pedido de “nihil obstat”, cuja resposta, ocorreu a 21 de Dezembro desse ano. Tudo isso permitiu proceder-se à preparação do decreto de validade, a partir de 1991(90).

Por outro lado, foi instaurado em 1991, em São Paulo, o Tribunal Eclesiástico para o Processo sobre a continuidade da fama de santidade, o qual nomearia uma Comissão histórica para compulsar Arquivos Eclesiásticos e Civis para verificação de documentos. Em Fevereiro de 1991 procedeu-se à exumação dos restos mortais do Servo de Deus com a presença do Cardeal de São Paulo, do Tribunal Eclesiástico, de pessoas “ad hoc” convidadas e com o trabalho científico do Instituto Médico-legal de São Paulo91.

Em Novembro de 1993 ocorreu a sessão dos consultores históricos, em Junho de 1996 efectuou-se o congresso dos consultores teólogos e em Dezembro o dos Cardeais e Bispos. Após tudo isso, a 25 de Março de 1997, o Sumo Pontífice, João Paulo II, aprovou e dispôs que se elaborasse o Decreto de cuja declaração solene “consta que o servo de Deus António de Sant’Ana (no século António Galvão de França), sacerdote professo na Ordem dos Frades Menores Alcantarinos (ou Descalços) Fundador do Mosteiro de Nossa Senhora da Luz, praticou as virtudes teologais da Fé, Esperança e Caridade para com Deus e para com o próximo, como também as virtudes cardeais da Prudência, Justiça, Temperança e Fortaleza e as outras anexas, em grau heróico para efeito da canonização”. Data a publicação e transcrição deste Decreto nas Actas, do dia 8 de Abril de 1997(92).

No dia 20 de Junho seguinte, voltou a reunir-se o mesmo congresso dos teólogos consultores e a 17 de Fevereiro de 1998 efectuou-se a reunião ordinária dos Cardeais e Bispos. Em ambas as sessões foi afirmativa a resposta à questão do milagre verificado na menina Daniela Cristina da Silva, de 4 anos, de São Paulo, que em Maio de 1990 foi hospitalizada; perante a ineficácia da medicina, os pais, vizinhos e irmãs do Mosteiro da Luz invocaram o Venerável António de Sant’Ana. Tendo logo recuperado a saúde voltou para casa, a 21 de Junho, totalmente curada duma “hepatite fulminante de vírus A com encefalopatia, insuficiência renal aguda. A promulgação do Decreto sobre o milagre, por João Paulo II, ocorreu a 6 de Abril de 1998(93).

Na Carta Apostólica Dominus mihi astitit et confortavit me, de 25 de Outubro de 1998, o Papa designou para o rito de Beatificação o dia 25 de Outubro de 1999(94), fixando para o mesmo dia 25 de Outubro a data anual da sua comemoração litúrgica95. O segundo milagre é posterior. Ocorreu nas pessoas de D. Sandra Grossi de Almeida, de São Paulo e seu filho, Enzio de Almeida Gallafassi. Depois de abortos espontâneos em 1993 e 1994 por malformação uterina, não obstante as correcções cirúrgicas, D. Sandra nunca conseguira qualquer gravidez. Em Maio de 1999, engravidou.

A ecografia de Junho, mostrando deformações, levou o obstreta a tomar precauções para enfrentar a gravidez tida como perigosíssima por diversos motivos. Contudo a gravidez prosseguiu até à 30ª semana, quando os médicos fizeram uma cesariana; a 11 de Dezembro a parturiente poderia falecer… O bebé nasceu são e normal, saindo do hospital a 19 de Dezembro. Tudo isso obteve esta mãe, por intercessão do Beato António Galvão, a quem recorreu e se confiou em Junho de 1999.

Aceite, em 26 de Novembro de 2004, o facto, a Junta médica, em 18 de Janeiro de 2006 declarou não ser de momento possível explicar cientificamente o sucedido, pelo que os teólogos nos dias 4 e 13 de Abril de 2006 e os Cardeais e Bispos, no dia 12 de Dezembro de 2006, responderam afirmativamente acerca do milagre. Bento XVI, inteirado do assunto, fez constar o ocorrido, face à “malformação uterina congénita de classe 3-4 (…) não corrigida cirurgicamente em paciente com história clínica de poliabortividade espontânea, com sucesso de gestação materno-fetal favorável”. O decreto de reconhecimento do segundo milagre foi publicado a 16 de Dezembro de 2006(96).

Na manhã do dia 23 de Fevereiro de 2007, o Papa anunciou a canonização de Frei Galvão na sua visita a São Paulo, no dia 11 de Maio de 2007. No dia 11 de Maio, sexta-feira, procedeu à canonização, tendo na homilia dado louvores a Deus pela graça da canonização de Frei António e agradecido ao actual Arcebispo de S. Paulo, D. Odilo Scherer as palavras de carinho em nome do seu povo e ao seu antecessor Cardeal Cláudio Hummes o empenhamento pela Causa deste Santo. No ponto 5. da sua Homilia, o Papa parece condensar toda a riqueza da profundidade de vida e espiritualidade de Frei Galvão: “Vinde a mim, todos vós que andais fadigados e oprimidos, que eu vos aliviarei” (Mt 11,28). … Como não ver aqui este sentimento paterno e, ao mesmo materno, de Deus por todos os seus filhos? Maria, a Mãe de Deus e Mãe nossa, se encontra particularmente ligada a nós neste momento. Frei Galvão assumiu com voz profética a verdade da Imaculada Conceição. Ela, a Tota Pulchra, a Virgem Puríssima, que concebeu em seu seio o redentor dos homens e foi preservada de toda a mancha do pecado original, quer ser o selo definitivo do nosso encontro com Deus, nosso Salvador. Não há fruto da graça na história de salvação que não tenha como instrumento necessário a mediação de Nossa Senhora”.

Fotografia de 11 de maio de 2007, do Campo de Marte, em São Paulo, aonde o papa Bento XVI celebrou a missa de canonização de Santo Antônio de Sant'ana Galvão. 
Conclusão

A canonização do primeiro santo brasileiro, o franciscano Santo António Galvão ou Santo António Santana Galvão, em 11 de Maio de 2007 coroou não só uma vida de virtudes e um período de mais de um século de graças por sua intercessão obtidas, mas também uma imensidade de trabalhos conjugados ao longo de quase 70 anos, em cuja Causa ou sucessivos processos se viram envolvidas centenas de pessoas e várias instituições.

No caso do nosso Santo, recapitulemos, sumariamente etapas dos processos: O primeiro contou com o trabalho de Frei Adalberto Ortmann, que além de pesquisa documental, registou testemunhos “ex auditu” e testemunhos “ex auditu auditus” entre 1938-1947. Foi ele quem elaborou a Inquisitio S. D. Fr. Antonii de S. Anna Galvão, OFM. No segundo, trabalhou Fr. Dagoberto Romag, em 1949, organizando o Processiculus Deligentiarum dos Escritos do servo de Deus, com três Sessões do Tribunal Eclesiástico de S. Paulo; foi um documento inexplicavelmente bloqueado/desaparecido ou esquecido. Do terceiro processo nada mais consta, a não ser a nomeação dos membros do Tribunal em 1969. O quarto processo beneficiou do empenhamento pessoal dos últimos Arcebispos de São Paulo, desde D. Odilo Scherer, passando pelos seus antecessores o Cardeal Cláudio Hummes e muito particularmente o Cardeal-Arcebispo de S. Paulo, o franciscano D. Evaristo Arns.

De realçar ainda a dedicação e capacidades de pesquisador e redactor de Frei Desidério Kalverkamp, nomeado vice-postulador em 1983, autor da Biografia Crítica. Em 1991 o Tribunal Eclesiástico nomeou uma Comissão histórica para compulsar arquivos eclesiásticos (diocesanos, paroquiais, de mosteiros) e civis (cartórios civis, municipais, institucionais) para verificação de possíveis documentos e concluir o processo. Decisivas foram as conclusões do estudo de dois dos últimos milagres: o primeiro, que possibilitou a beatificação de Frei Galvão em 25 de Outubro de 1998, pelo Papa João Paulo II, em S. Pedro de Roma; o segundo, que deu lugar à sua canonização, em 11 de Maio de 2007, pelo Papa Bento XVI, no Campo de Marte, no Aeroporto da cidade de São Paulo, no Brasil.

Justo seria que a cidade e a Diocese de Faro soubessem recordar as raízes deste primeiro santo brasileiro, cujo pai, o português António Galvão de França, nela nascido, conseguiu constituir e alimentar no Brasil uma família viveiro de virtude e santidade, permitindo e apoiando a resposta à santidade de um dos seus filhos, a saber o Franciscano que certamente nos atenderá sob qualquer destes apelativos: Santo António Santana, Santo António Galvão, Santo António de Sant’Ana Galvão, ou tão somente S. Frei Galvão.

NOTAS: 
1 Alemão de Ahlen, onde nascera em Março de 1910.
2 Congregatio de Causis Sanctorum, Biografia Crítica, II, Roma, 1993, p. 43. Citaremos sempre Biografia Crítica.
3 Biografia Crítica, p. 52.
4 Biografia Crítica, p. 44.
5 Biografia Crítica, p. 45.
6 Biografia Crítica, pp. 45-47.
7 Biografia Crítica, p. 65.
8 Biografia Crítica, p. 46.
9 Biografia Crítica, p. 47.
10 Cf. Biografia Crítica, p. 47.
11 Biografia Crítica, p. 47.
12 Biografia Crítica, p. 48.
13 Biografia Crítica, p. 49.
14 Biografia Crítica, p. 50.
15 Biografia Crítica, p. 51; cf. A Província Franciscana da Imaculada Conceição 1822-1922, Petrópolis, 1922, pp. 96-97.
16 Biografia Crítica, p. 52.
17 Biografia Crítica, p. 69.
18 Biografia Crítica, p. 52.
19 Biografia Crítica, p. 73.
20 Biografia Crítica, p. 74.
21 Biografia Crítica, p. 74.
22 Biografia Crítica, p. 75.
23 Biografia Crítica, p. 75.
24 Biografia Crítica, p. 75.
25 Biografia Crítica, p. 85.
26 Biografia Crítica, p. 86.
27 Biografia Crítica, pp. 86-87.
28 Biografia Crítica, p. 32.
29 Biografia Crítica, p. 88.
30 Biografia Crítica, p. 89.
31 Biografia Crítica, pp. 91 e 103.
32 Biografia Crítica, p. 107.
33 Biografia Crítica, p. 109.
34 Biografia Crítica, p. 110.
35 Biografia Crítica, p. 107 e 110.
36 Biografia Crítica, pp. 138-139.
37 Biografia Crítica, p. 139.
38 Biografia Crítica, p. 140.
39 Biografia Crítica, pp. 141-142.
40 Biografia Crítica, p. 152.
41 Biografia Crítica, p. 113.
42 Biografia Crítica, p. 155.
43 Biografia Crítica, p. 152.
44 Pedro Dias, Atlas da Arte Portuguesa no Mundo, Santander Totta, 150 anos, Lisboa, 2007, p. 43. Apenas faltará a menção do seu
arquitecto franciscano, Frei António de Santana Galvão, canonizado primeiro santo do Brasil, em Maio de 2007.
45 Biografia Crítica, p. 154.
46 Biografia Crítica, p. 187.
47 Biografia Crítica, pp. 188-189.
48 Biografia Crítica, p. 190.
49 Biografia Crítica, p. 189.
50 Biografia Crítica, p. 191.
51 Biografia Crítica, p. 197.
52 Biografia Crítica, p. 198.
53 Biografia Crítica, p. 199.
54 Biografia Crítica, p. 198.
55 Biografia Crítica, p. 200.
56 Biografia Crítica, p. 212.
57 Biografia Crítica, p. 113.
58 Biografia Crítica, p. 214.
59 Biografia Crítica, p. 214.
60 Biografia Crítica, p. 221.
61 Biografia Crítica, p. 222.
62 Biografia Crítica, p. 223.
63 Biografia Crítica, p. 223.
64 Biografia Crítica, p. 123.
65 Biografia Crítica, p. 224.
66 Biografia Crítica, p. 225.
67 Biografia Crítica, pp. 311-312.
68 Biografia Crítica, p. 313.
69 Biografia Crítica, p. 314.
70 Biografia Crítica, p. 315.
71 Biografia Crítica, pp. 318 e 321
72 Biografia Crítica, p. 319
73 Biografia Crítica, p. 325
74 Biografia Crítica, p. 331
75 Biografia Crítica, p. 312
76 Biografia Crítica, pp. 341-343.
77 Biografia Crítica, p. 340.
78 Biografia Crítica, p. 333.
79 Biografia Crítica, p. 270.
80 Biografia Crítica, p. 262.
81 Biografia Crítica, p. 263.
82 Biografia Crítica, p. 264.
83 Biografia Crítica, p. 265.
84 Biografia Crítica, p. 266.
85 Biografia Crítica, p. 265.
86 Biografia Crítica, pp. 266-267.
87 Biografia Crítica, p. 268.
88 Biografia Crítica, pp. 269 e 302.
89 Biografia Crítica, p. 269.
90 Biografia Crítica, p. 270.
91 Biografia Crítica, p. 16.
92 Acta Apostolicae Sedis, XC (1998), pp. 51-53; cf. Acta Ordinis Fratrum Minorum, CXVII (1998), pp. 33-34.
93 Acta Apostolicae Sedis, XCI (1999), p.119-121; cf. Acta Ordinis Fratrum Minorum, CXVIII (1999), p. 50.
94 Acta Apostolicae Sedis, XCI (1999), p. 856.

95 Acta Apostolicae Sedis, XCI (1999), p. 857.

Fonte: ARAÚJO, António de Sousa. Santo António de Sant’Ana Galvão, OFM (1739-1822): primeiro Santo natural do Brasil. Revista Lusitania Sacra, v. 23, jun/jul 2011, p. 243-262.