O texto a seguir, fora retirado de uma parte que compõem o prefácio da sexta edição do livro História de Portugal: Das Origens até 1940, do historiador João Ameal; publicado em 1968, na cidade do Porto, pela editora Livraria Tavares Martins.
Prefácio 1:
Que é a História? Uma ciência? Uma arte? Uma ética? Para uns, a função exclusiva do historiador consiste em pesquisar arquivos, analisar documentos, apurar, com paciência e método, a certeza de uma data, a identidade de uma figura, a veracidade de uma testemunha, a minúcia de um acontecimento, formular mesmo certas leis, derivadas da análise efectuada: é a História-ciência. Para outros, consiste em traçar belos quadros num estilo sugestivo e eloquente, com descrições coloridas de cenários e atmosferas, largos movimentos de turbas, lances culminantes de tragédias, de apoteoses e de batalhas: é a História-arte. Para outros, consiste em apresentar uma galeria de modelos na qual possa distinguir o bem e o mal, o exemplo a seguir e o erro a evitar e portanto donde resulte uma série de normas úteis para a orientação dos contemporâneos: é a História-ética. Dentro destes três conceitos há numerosas variantes; todas se integram, mais ou menos, num deles, ou representam uma combinação em que algum deles prepondera.
Quanto a nós, a História não é apenas ciência, arte ou ética; é, ao mesmo tempo, as três coisas - e ainda qualquer coisa mais.
Evidentemente, será indispensável que os estudos históricos possuam firme e honesto carácter cientifico: o primeiro objectivo a visar é saber o que se passou, quando se passou e como se passou. Os grandes trabalhos eruditos subordinados a tal objectivo são os mais sólidos alicerces - indispensáveis, mesmo - sobre os quais tem de ser construída qualquer obra séria de História. Ninguém, por outro lado, deixa de apreciar os grandes painéis descritivos e evocadores, em que se apreenda, como num luminoso espectáculo de ressurreição, a beleza, o drama, a grandiosidade ou o horror de determinadas épocas ou determinados factos. E de que serviria a História se não fosse como essas galerias de retratos que se vêem nas salas nobres das grandes casas - e das quais resultam sempre estímulos, avisos e lições?
Tudo isto a História é, sem dúvida. Parece-nos que é ainda qualquer coisa mais. Desde que se queira formar uma ideia do que sucedeu outrora - imperfeita que seja, precária e relativa que seja, e só essa nos é permitida - temos que colocar-nos diante da vida em pleno curso. A História é vida - tal o axioma inicial a propor. E não apenas vida dos outros - de outros tempos, de outros seres - mas a nossa vida, antes de nós. Longe está de abraçar o próprio destino quem julgue que a sua história terrena começa no nascimento e acaba na morte. A nossa história é toda a História. A história dos homens é a História do Homem - e a história de cada homem. Em cada homem, está, por isso, a História inteira - que colaborou na sua formação e veio até ele com o impulso que nele se resolve e condensa. Escrever a História é buscar-nos, compreender-nos, definir-nos, sentir-nos solidários de um imenso movimento que nos inclui e nos leva. Nada mais vivo, sem dúvida, visto ser aquilo que em nós é anterior a nós e que nos sobreviverá.
Uma ciência? Uma arte? Uma ética? Tudo isso, e mais que tudo isso. Se nos pedissem que arriscássemos uma definição, sugeríamos esta: a História constitui, para o verdadeiro historiador, - um exame de consciência.
Prefácio 1:
Que é a História? Uma ciência? Uma arte? Uma ética? Para uns, a função exclusiva do historiador consiste em pesquisar arquivos, analisar documentos, apurar, com paciência e método, a certeza de uma data, a identidade de uma figura, a veracidade de uma testemunha, a minúcia de um acontecimento, formular mesmo certas leis, derivadas da análise efectuada: é a História-ciência. Para outros, consiste em traçar belos quadros num estilo sugestivo e eloquente, com descrições coloridas de cenários e atmosferas, largos movimentos de turbas, lances culminantes de tragédias, de apoteoses e de batalhas: é a História-arte. Para outros, consiste em apresentar uma galeria de modelos na qual possa distinguir o bem e o mal, o exemplo a seguir e o erro a evitar e portanto donde resulte uma série de normas úteis para a orientação dos contemporâneos: é a História-ética. Dentro destes três conceitos há numerosas variantes; todas se integram, mais ou menos, num deles, ou representam uma combinação em que algum deles prepondera.
Quanto a nós, a História não é apenas ciência, arte ou ética; é, ao mesmo tempo, as três coisas - e ainda qualquer coisa mais.
Evidentemente, será indispensável que os estudos históricos possuam firme e honesto carácter cientifico: o primeiro objectivo a visar é saber o que se passou, quando se passou e como se passou. Os grandes trabalhos eruditos subordinados a tal objectivo são os mais sólidos alicerces - indispensáveis, mesmo - sobre os quais tem de ser construída qualquer obra séria de História. Ninguém, por outro lado, deixa de apreciar os grandes painéis descritivos e evocadores, em que se apreenda, como num luminoso espectáculo de ressurreição, a beleza, o drama, a grandiosidade ou o horror de determinadas épocas ou determinados factos. E de que serviria a História se não fosse como essas galerias de retratos que se vêem nas salas nobres das grandes casas - e das quais resultam sempre estímulos, avisos e lições?
Tudo isto a História é, sem dúvida. Parece-nos que é ainda qualquer coisa mais. Desde que se queira formar uma ideia do que sucedeu outrora - imperfeita que seja, precária e relativa que seja, e só essa nos é permitida - temos que colocar-nos diante da vida em pleno curso. A História é vida - tal o axioma inicial a propor. E não apenas vida dos outros - de outros tempos, de outros seres - mas a nossa vida, antes de nós. Longe está de abraçar o próprio destino quem julgue que a sua história terrena começa no nascimento e acaba na morte. A nossa história é toda a História. A história dos homens é a História do Homem - e a história de cada homem. Em cada homem, está, por isso, a História inteira - que colaborou na sua formação e veio até ele com o impulso que nele se resolve e condensa. Escrever a História é buscar-nos, compreender-nos, definir-nos, sentir-nos solidários de um imenso movimento que nos inclui e nos leva. Nada mais vivo, sem dúvida, visto ser aquilo que em nós é anterior a nós e que nos sobreviverá.
Uma ciência? Uma arte? Uma ética? Tudo isso, e mais que tudo isso. Se nos pedissem que arriscássemos uma definição, sugeríamos esta: a História constitui, para o verdadeiro historiador, - um exame de consciência.
Um comentário:
Grande LEandro
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