Pesquisar neste blog

Comunicado

Comunico a todos que tiverem interesse de compartilhar meus artigos, textos, ensaios, monografias, etc., por favor, coloquem as devidas referências e a fonte de origem do material usado. Caso contrário, você estará cometendo plágio ou uso não autorizado de produção científica, o que consiste em crime de acordo com a Lei 9.610/98.

Desde já deixo esse alerta, pois embora o meu blog seja de acesso livre e gratuito, o material aqui postado pode ser compartilhado, copiado, impresso, etc., mas desde que seja devidamente dentro da lei.

Atenciosamente
Leandro Vilar

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Os movimentos nazi-fascistas e a eclosão da II Grande Guerra


Os movimentos nazi-fascistas e a eclosão da II Grande Guerra


Lier Pires Ferreira1


1 – INTRODUÇÃO

O curto período situado entre as duas grandes guerras mundiais assinalou, no cenário global, o surgimento de novos pólos de poder. Em detrimento das antigas e tradicionais potências européias, especialmente França e Inglaterra, emergem novos protagonistas representados pelo Japão e, muito especialmente, pelos Estados Unidos, em virtude do alto grau de desenvolvimento de suas forças produtivas e pelo significativo poder relativo de suas forças militares. Este período marca, igualmente, o surgimento da primeira alternativa vitoriosa ao modo capitalista de organização social em nosso século. A Revolução bolchevique de l9l7 constituiu-se, por mais de sete décadas, como o principal marco de referência para aqueles que, em alguma medida, pautam seus caminhos na história das sociedades pelo sonho da construção de relações humanas mais justas e igualitárias.

Assim, até um passado ainda recente, o mundo viveu sob a égide de dois sistemas de configuração social não apenas conflitantes, mas, em muitas medidas, diametralmente opostos. De um lado, a estruturação societária capitaneada pelos Estados Unidos, conhecendo o fortalecimento de uma sociedade liberal (l) com seus valores de liberdade individual, política, religiosa e econômica. De outro, a construção socialista, de inspiração soviética, com sua tentativa de superar as relações de exploração, dependência e alienação que marcam as sociedades capitalistas.

Em meio a esses dois pólos, o entre - guerras assistiu também a instalação de uma profunda crise nas sociedades liberal-capitalistas, especialmente aquelas localizadas na velha Europa. Esta crise foi distintamente sentida pelos principais países do continente. Nos que emergiram vitoriosos do primeiro grande conflito mundial, como Inglaterra e França, a crise, apesar de sua intensidade, não chegou a alterar a estrutura política, que continuou a se guiar pelos princípios da democracia liberal. Em outros termos, isso significou que a crise foi assimilada por esses países, não tendo chegado a provocar transformações de grande lastro em sua estrutura sociopolítica e de apropriação econômica.

Em outro extremo temos aquelas nações que, por diferentes motivos, não só foram alijadas de quaisquer benefícios oriundos do conflito, mas que, para além das graves conseqüências globais da crise de 29, tiveram que arcar com os custos econômicos, políticos e morais da Guerra. No primeiro caso temos países como Portugal, Espanha, Hungria e Itália, no segundo, a Alemanha. Nestes países, a crise, se não acarretou profundas mudanças em sua estrutura sócio-econômica, provocou graves alterações em seu sistema político. Aqui, a superação desta grande convulsão dos anos vinte e trinta só se deu com a instalação de movimentos revolucionários (2) que, por meio de regimes fortes e totalitários, procuraram garantir uma determinada ordem capitalista. Os dois principais exemplos destes movimentos na Europa foram o fascismo e o nazismo, respectivamente na Itália de Benito Mussolini e na Alemanha hitlerista, onde mais do que recuperar as fissuras provocadas pela Guerra e pela crise econômica global, objetivavam superar as limitações estruturais destas sociedades de unificação recente e industrialização tardia e graves desequilíbrios na ordem sóciopolítico e produtiva interna.

2 - AS ORIGENS DO FASCISMO:

Em seu trabalho sobre o fascismo, H. R. Travor-Roper remonta as origens deste fenômeno de poder típico do entre - guerras aos primórdios da reação conservadora (3) do século XIX, quando, em oposição à burguesia triunfante: "the old élite of Europe, the aristocracy, the landlords, the established churches, and their theorists, nursed their wounds and meditated revenge on the upstart bourgeoisie which seemed everywhere to have triumphed over them." (cf. H. R. Travor-Roper, in: The Phenomenon of Facism, pp. 22).

Não obstante estas raízes remotas, como movimento positivo - ou dinâmico como denomina Roper - e como regime político, o fascismo origina-se na Itália, na década de vinte como resposta estratégica à crise e a alternativa socialista. A história do fascismo está intimamente ligada às condições vividas pela Itália após o conflito de l9l4. Estruturalmente deficiente, preterida pelos vencedores na mesa de negociações do tratado de Versalhes, desprovida da ajuda financeira prestada pelos Aliados ao longo da guerra, assolada por graves problemas de inflação, desemprego, abastecimento, déficit habitacional e sacudida por greves, rebeliões civis e ocupação de fábricas, a Itália apresentava-se, nitidamente, como uma bomba prestes a explodir.

A vida política italiana era a expressão de sua vida social. Desmoralizada e fragilizada a monarquia já não mais era capaz de organizar minimamente a política local. No parlamento, onde se representavam todas as correntes políticas de então, nenhuma tinha condições de assumir as rédeas do poder público que era gerido por coalizões débeis e inadimplentes. A esquerda, desconfigurada por dissensões internas, foi incapaz de criar um projeto alternativo para a crise político-social. Neste quadro de incertezas, coube a uma pequena facção de extrema direita o golpe bonapartista (4). O Partido Fascista que não tinha quase nenhuma expressão no pleito de l9l9, saiu fortalecido nas eleições de l92l, quando passou a ser conhecido e temido por seus atos de violência, quase sempre impunes. Assim constituído foi o instrumento catalisador da união de classes - médias, populares e dirigentes - que concorreu para a superação das catástrofes mais imediatas que se apresentavam no cenário de então. Em muito contribuiu para esta coalizão política o programa básico do Partido, profundamente genérico e ambíguo, que defendia de forma demagógica a propriedade, a ordem, a monarquia e exaltava o sentimento nacional ferido, além de bater - se violentamente contra a ameaça comunista.

Outro instrumento de seu sucesso foi a criação de organizações paramilitares altamente armadas e disciplinadas - as milícias dos “camisas negras” - cujos membros obedeciam cegamente às ordens do Duce. A organização destas milícias - os fasci di combattimento - foi financiada pelos grandes grupos industriais e financeiros, tornando-se a grande tropa de vanguarda fascista, perseguindo e combatendo seus opositores, principalmente socialistas, comunistas e operários em greve.

Assim, impondo-se pelo medo e pela violência, perseguindo opositores, ganhavam a cumplicidade, quando não o apoio direto, de autoridades constituídas, órgãos de comunicação, intelectuais, artistas, personalidades diversas além, é claro, de amplos setores das camadas médias e populares. O Partido Fascista crescia e paulatinamente tornava-se a fonte de poder por excelência da sociedade italiana.

Em síntese, portanto, podemos afirmar que o fascismo foi um regime político eminentemente totalitário, pois pretendeu e, em certa medida, conseguiu "controlar todos os aspectos da vida humana submetendo-os ao Estado (...) que, compreendido como encarnação jurídica da nação, era supremo. (cf. ARENDT, Hannah. in: Totalitarismo, o Paradoxismo do Poder.) Suas características básicas seriam o da total integralização entre Estado (partido) e sociedade, através da exaltação da raça, da nação enquanto sistema de valores e da força enquanto instrumento de ação política e social.

3 - A EMERGÊNCIA DO NACIONAL SOCIALISMO:

Sem dúvida alguma a Alemanha foi o país que mais intensamente sofreu os horrores da guerra mundial de l9l4/l8. Considerada culpada pelos países vencedores, foi despojada de vasta parcela de seu território, justamente o mais rico, além de ter sido obrigada a se responsabilizar por pesadas indenizações de guerra.

A imposição dessas condições serviu para desestabilizar ainda mais a estrutura governamental, sacudida fortemente por grupos extremistas de direita e de esquerda – basta lembrarmo-nos da revolta espartaquista, liderada por Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht - que, apesar de vencidas, provocaram grande desgaste na já combalida composição governamental.

No campo econômico a situação não era mais tranqüila. Ao longo dos anos vinte o marco alemão sofreu um dos mais acintosos processos de desvalorização monetária da história, em um processo inflacionário que, se por um lado provocava uma aguda pauperização em amplas parcelas da população, por outro garantia a uma ínfima minoria níveis alarmantes de concentração de renda. A miséria e a crise social conduziram mais uma vez as classes populares à revolta.

Além de Berlim, a efervescência operária era forte nas regiões de Saxe e de Turingia; quanto à direita, encontrava-se fortalecida especialmente na Baviera. Entretanto, malogro as várias tentativas de insurgência, o frágil equilíbrio foi mantido até a grande crise de l929. O estancamento total e abrupto de recursos externos e a grande quebra no comércio internacional são brutalmente sentidos pela Alemanha. Aqui, a crise concretizou-se em um sem número de falências, na quebra da safra agrícola e, consequentemente no agravamento da crise social e política que já a mais de uma década sacudia o país. Na virada dos anos trinta, os conflitos políticos e sociais na Alemanha assumiam um caráter particularmente dramático em uma Europa já transfigurada pela Guerra e pela crise global. À exemplo da Itália, o acirramento dos confrontos políticos tinha como um de seus vetores mais expressivos a debilidade das forças que compunham o poder do Estado. Aqui, como antes na península itálica, o Partido Nacional Socialista é a força política que consegue catalisar as aspirações coletivas e articular um número significativo de forças sociopolíticas em torno de um projeto comum para o país. Assim como o Partido Fascista Italiano, os nacionais socialistas se assumiram como defensores da ordem contra o perigo vermelho, receberam apoio das camadas médias e populares do país, utilizaram-se fartamente de milícias paramilitares, penetraram direta ou indiretamente em todos os setores da vida nacional, contaram com verbas da alta burguesia e recrutaram seus "agentes" nas camadas mais pauperizadas da população.

Também como seus congêneres peninsulares, fundamentaram suas bases ideológicas sobre o nacionalismo obtuso, o idealismo extremado, a agressividade desmedida e o anti-semitismo. Não obstante, ao contrário do fascismo italiano, que foi sendo constituído à medida que se organizava enquanto força política e social, o nazismo alemão estruturou-se enquanto ideologia já antes da ascensão do Partido ao poder. O ideário nazista está contido no Mein Kampf de Adolf Hitler que, apesar de não destacar-se como trabalho teórico de porte, apresenta um ensaio nítido das idéias básicas do movimento. O nazismo, a rigor, apresentou-se como o exemplo mais acabado do regime fascista, o que vale dizer que os traços que arrolamos para caracterizar o fascismo italiano e seu aparecimento podem, guardadas as devidas proporções, ser aplicadas ao caso alemão conforme tentamos demonstrar, inclusive no que concerne à construção de um estado totalitário que, em muitas medidas, foi bastante mais eficiente e penetrante que seu par.

4 - A GENERALIZAÇÃO DOS REGIMES DITATORIAIS:

As trajetórias de sucesso trilhadas especialmente por estes dois regimes reforçaram os movimentos de ordem nacionalista e conservadora que assolavam todo o território Europeu. Não obstante, como já assinalara Trevor-Roper, apesar das reais semelhanças entre estes modelos e os produzidos na Itália e na Alemanha, faltavam a países como Portugal, Espanha, Áustria, Bulgária entre outros, algumas características comuns só apresentadas por Itália e Alemanha, e que parece fundamental para a distinção entre ditaduras conservadoras e o movimento nazi-fascista, ou, como denominou Roper, entre o fascismo dinâmico e sua vertente clerical-conservadora.

Apenas Itália e Alemanha tinham tido participação ativa no jogo concorrencial das grandes potências imperialistas no período imediatamente anterior à Primeira Guerra. Apenas estes dois países apresentavam características tão próximas no que concerne ao seu processo de unificação. Mais uma vez, e principalmente, apenas estes dois países possuíam um nível tão intenso de industrialização, de desequilíbrios regionais, com um operariado numeroso e ativo, com amplas parcelas de sua população habitando espaços urbanos e com a identidade nacional tão abalada.

Estes aspectos, eminentemente distintivos, são os diferenciais básicos para compreendermos os vetores que levaram à construção de um autêntico movimento nazi-fascista na Itália e na Alemanha, o que não foi possível em outros Estados dentro e fora da Europa, onde o baixo desenvolvimento das forças produtivas, a acentuada ruralização da economia, o peso de setores tradicionais como a Igreja e os grandes proprietários rurais, e a ausência de uma população urbana com expressão política, definiu, por exclusão, a diferenciação basilar entre tais movimentos e o fascismo positivo. Se o fascismo enquanto movimento ampliado possui características comuns e mesmo origens remotas, enquanto fenômeno de poder possui uma indefectível circunscrição geopolítica e espaço-temporal, que lhe confere características bem peculiares e identidade inequívoca.

5 - A ROTA DE COLISÃO:

Indubitavelmente, a Segunda Guerra Mundial possui suas raízes mais vigorosas no grande conflito de l9l4/l8. Só através da percepção de como as diferentes sociedades montaram a solução dos problemas oriundos deste primeiro evento, ou das causas que levaram a ele, e do impacto da depressão de l929, podemos entender como se fechou o círculo em setembro de l939.

Peguemos, a título de exemplo, o decurso alemão, pelo peso de seu significado histórico. A Alemanha reage à crise dos anos trinta com a implantação de um regime fascista. Sob a égide de Hitler, as principais forças constitutivas do Estado alemão procuram avidamente nichos de oportunidade por onde possam promover sua recuperação econômico-produtiva e, consequentemente sua estabilidade política e social. Estas demandas, típicas do plano da política interna, acarretaram grandes alterações no campo limítrofe da política exterior. Com as principais economias mundiais ocupadas em reestruturar sua ordem interna, a Alemanha procura, na apropriação de áreas próximas, os mercados fornecedores de matérias primas e de consumo que o país necessitava para tornar a crescer. É a política de busca de um espaço vital, ou seja, a integração de áreas nas quais vivesse alemães, como condição de crescimento para o país, impondo para isso uma política de pleno emprego baseada, sobretudo, na indústria de guerra e no seu rearmamento. Esta postura, expansionista e belicista, correspondeu plenamente aos múltiplos anseios das classes médias e populares bem como às burguesias germânicas, então comprometidas com o ideário nazista, embora preocupasse enormemente as grandes potências européias tanto a leste quanto a oeste. O descumprimento das cláusulas anti-rearmamento presentes em especial no Tratado de Versalhes, foi mais um fator de desajuste no cada vez mais precário equilíbrio de forças continental.

Este equilíbrio, após l930, estava assentado sobre três blocos aproximados não por tratados formais, mas por afinidades político-ideológicas: Inglaterra e França - com o apoio tímido dos Estados Unidos no que se referia ao plano estritamente europeu; Alemanha e Itália; e, complementarmente, o bloco soviético, isolado pelas potências ocidentais, mas com grande penetração no leste do continente e na eurásia. Por fim, no oriente, mas sem presença efetiva no plano intra-europeu, temos o Japão, que desde l93l iniciara sua expansão militar, conquistando a Manchúria e retirando-se da Liga das Nações.

Nesta conjuntura, Hitler e Mussolini agiam com certa desenvoltura, em muito devido à política de apaziguamento empreendida especialmente pela Inglaterra, que percebendo, como acreditamos, os movimentos expansionistas do Fuhrer, consentia que este se realizasse desde que fosse em direção ao leste da Europa, onde além de encontrarem-se grandes grupos de origem germânica, erguia-se o império soviético, inimigo comum aos regimes nazi-fascistas e capitalista-liberais. Estas assertivas parecem bem corroboradas pelos trabalhos de Paul Kennedy e J. Levesque, respectivamente. Em "Ascensão e Queda das Grandes Potências", Paul Kennedy nos aponta que o grande erro estratégico das potências da Europa ocidental, foi o de não perceber que, já em l938, Hitler dispunha-se a estruturar uma nova ordem territorial na Europa, "que não poderia ser satisfeita apenas por ajustes de pequena escala" (Ascensão e Queda... pp. 325). Ao abster-se de intervir nas incursões nazistas aos países vizinhos, em especial os de forte herança germânica, o Ocidente subdimensionou o germe expansionista do regime alemão, seu caráter belicista, ao mesmo tempo em que concedeu a Hitler as condições de ampliação de seu parque industrial e bélico militar, ao pôr a sua mercê todos os recursos disponíveis nos países sob intervenção alemã, aumentando exponencialmente o poderio do Eixo.

Nem mesmo a tomada da Áustria na primavera do mesmo ano modificou a linha da política externa do ocidente em relação à Alemanha, citando Kennedy mais uma vez, "eram necessários dois para haver uma guerra de grandes potências, e em l938 não havia nenhum adversário disposto a enfrentar Hitler" (Ascensão e Queda..., pp. 326).

Se o regime nazista não encontrava adversários na frente ocidental, muito menos o incomodava o front oriental. Desprovido de alcance no extremo oriente, os interesses do Fuhrer não se rivalizavam com os do império japonês, ao contrário, em certa medida até os aproximava, enquanto que possuíam desafetos comuns. Por outro lado, a República Soviética buscava zelar mais pela consolidação do seu regime do que em debater-se com quem quer que fosse ao plano internacional. Ao longo dos anos vinte e trinta, a característica básica da política externa soviética foi criar as condições de sustentação de seu original modelo de desenvolvimento. J. Levesque coaduna-se com esta proposição ao destacar os esforços de Stálin em estabelecer uma frente tripartite contra eventuais intervenções germânicas com Inglaterra e França, no período imediatamente anterior a constituição do Pacto Ribbentrop-Molotov com o regime nacional socialista que, além de reforçar os acordos comerciais já existentes entre os dois países, firmava um compromisso mútuo de não agressão. Se para Stálin o pacto garantia as condições necessárias para a continuidade da política de construção do socialismo em um só país, para Hitler era a garantia do fornecimento quase ilimitado de matérias-primas estratégicas – como petróleo - e de que, em caso de guerra, teria de concentrar suas tropas apenas na face ocidental do país.

Todos estes movimentos foram entendidos pelas potências ocidentais. Agora, a questão básica é formulada por William Carr: Did Hitler intend to go to war in the autumn of l938? (...) No one can know what went on in Hitler's mind. All one can say is that the evidence we possess sugested very strongly that the threat to Czechoslovakia was a very real one. It is scarcely credible that elaborate military preparations for a blitzkrieg would have been made - with Hitler's participation - had armed intervention not been seriously comtemplated. (W. Carr,"National Socialism: Foreing Policy and Wehrmacht", pp. l3l/l32).

Efetivamente, como destaca Carr, a única alternativa viável para o analista é perceber no decurso das ações, o seu provável significado. Para tal, em muito nos auxilia o estudo empreendido por Aníbal Romero em "Tiempos de Conflicto". Neste trabalho, o autor desenvolve uma discussão a respeito do modelo realista de racionalidade e sobre a decisão de se ir ou não à guerra. Para Romero, tal fenômeno é a decorrência circunstancial (5) de um sem número de variáveis que concorrem para que esta potência estrutural dos Estados se transforme em ato. Além de variáveis como a estrutura simbólica e cultural dos beligerantes, seus interesses específicos, bem como a dos principais grupos que o compõe, sua posição geopolítica, etc., entra necessariamente em cena um cálculo supostamente rigoroso acerca dos custos e benefícios e dos riscos de um confronto armado, em uma decisão que, conquanto possua inúmeras condicionantes, é geralmente tomada por um grupo restrito de elementos.

O que a bibliografia consultada nos aponta de uma maneira mais geral, é que a despeito das reais intenções de Hitler quer em l938 ou mesmo ao longo dos anos trinta, uma guerra, embora de caráter absolutamente diferenciado do que efetivamente ocorreu, parecia estar nos planos do alto comando alemão. Um confronto que possibilitasse a Alemanha reorganizar sua economia, sua ordem política interna, seu moral nacional e que, ao mesmo tempo, coadunasse-se com os novos ideais que norteavam a sociedade alemã. Os limites reais a este conjunto inicial de intenções foi, sem dúvida, o real interesse das potências ocidentais. No quadro europeu do final dos anos trinta, o único palco viável para a solução destes conflitos era a guerra.

6 – CONCLUSÃO:

O fato conhecido como Segunda Guerra Mundial, transcorrido entre l939 e l945, parece não ter sido nada mais do que uma continuação extemporânea do conflito anterior. Isso pareceu compreendido por seus contemporâneos e por suas lideranças. Wiston Churchill, primeiro-ministro da Inglaterra, por exemplo, em um discurso proferido no Parlamento em pleno desenrolar do conflito, mais exatamente aos vinte e um dias do mês de agosto de l94l, afirmou que "esta guerra, de fato, é uma continuação da anterior". Se isto, como cremos, for efetivamente verdade, o mundo ocidental, entre l9l8 e l939, nada mais fez do que preparar-se para um novo conflito. Importa-nos, pois, aqui, perceber como o nazi-fascismo ítalo-germânico contribuiu para esta preparação, ou melhor, qual seu peso real na eclosão do conflito.

O fascismo positivo foi à forma pela qual as principais potências industriais e bélico-militar européias, desfavorecidas no pós-primeira guerra, encontraram para reorganizar suas sociedades profundamente atingidas pelas decorrências mais diretas do conflito de l9l4/l8 e, posteriormente, pela grande quebra das bolsas de l929.

O fascismo dinâmico, assim como seus congêneres clericais – conservadores espalhados por toda a Europa, buscava suas bases últimas nos movimentos anti-liberais conservadores do século XIX, mas diferenciava-se deles pelas condições muito específicas das sociedades nas quais foram desenvolvidos. Tanto Itália quanto especialmente a Alemanha apresentavam um grau de complexificação societária muito mais elevado do que países como Hungria e Espanha. O grau de desenvolvimento de suas forças produtivas e de suas relações de produção, bem como o nível de urbanização de sua população, eram bastante elevados. Estes fatores são os mais relacionados pelos autores que subsidiaram a confecção deste texto, no sentido de compreendermos o porquê a vaga conservadorista que atingiu a Europa como um todo adquiriu contornos tão radicais e elaborados no eixo ítalo-germânico.

A escalada belicista empreendida principalmente pelas potências do eixo, e necessariamente seguida pelas demais nações no plano global, bem como seu caráter nacional-expansionista extremado, aparecem como frutos hiper-dimensionados do tradicionalismo conservador europeu fomentado por diversos autores quase um século antes dos fenômenos aqui tratados. Além deste caráter tradicional e nacionalista, as políticas de expansão e a corrida belicista fomentadas especialmente pela Alemanha contribuíram fundamentalmente para desestabilizar o extremamente frágil equilíbrio de forças europeu e, em alguma medida, global.

Tendo a guerra - uso legítimo da violência de Estado - como uma alternativa válida para a solução de conflitos quer no plano interno quer no âmbito da política exterior, tanto Itália quanto Alemanha tiveram obscurecidas suas capacidades de cálculo realista pelo furor ideológico e pela limitada informação sobre as reais capacidades e vulnerabilidades dos inimigos potenciais. E ainda, tendo uma avaliação equívoca de quais são os inimigos privilegiados e em que momento as frentes de batalha devem ou não ser ampliadas, percebemos o caminho, hoje nítido, que as principais potências mundiais percorreram nos anos imediatamente anteriores ao segundo grande conflito mundial.

Ao possibilitar a reorganização nacional ítalo-germânica em bases industriais, nacionalistas, expansionistas, belicistas e racistas, onde o Estado configurava-se tão fortemente, quer pelo medo quer pela real identidade de interesses, com as parcelas mais dinâmicas da população, o fascismo dinâmico parece ter contribuído, decisivamente, para a eclosão da ll Guerra Mundial.

Por isso, em caráter diligencial final, é preocupante notar o ressurgimento dos nacionalismos na Europa, especialmente na Áustria, motivados não por uma crise política e econômica real, mas pela mera sensação da crise. As lições do passado devem projetar-se positivamente para o futuro. Neste sentido, mais do que uma pequena resenha sobre as evidentes relações existentes entre o Nazi-Fascismo e a deflagração da II Grande Guerra, este artigo é um aviso.

NOTAS:
1 Doutor em Direito Internacional – UERJ. Mestre em Relações Internacionais - PUC/Rio. Bacharel em Direito – UFF. Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais – UFF. Coordenador Acadêmico e Professor de Sociologia do Colégio Pedro II. Advogado. E-mail: lier.rio@ig.com.br.

(l) Liberal neste sentido refere-se a um modo de organização social democrática, fundamentada sobre um legítimo estado de direito, tendo o indivíduo livre como sujeito normativo das instituições, e não o liberalismo clássico que possui como condição inalienável a plena autonomia para os agentes econômicos.

(2) A historiografia ocidental, bem como a ciência política, trabalha fundamentalmente com dois conceitos de revolução. A primeira oriunda da tradição francesa preconiza para o conceito uma completa transformação nas bases (estruturas) políticas, jurídicas e sociais do país. A segunda, de origem inglesa, considera apenas transformações ao nível da superestrutura das sociedades. É neste sentido que o termo está sendo empregado aqui.

(3) A noção de conservadora aqui se refere aos movimentos anticapitalistas promovidos pelos setores tradicionais da Europa do século XIX, que em muito contribuíram para a construção do fascismo positivo do século vinte. Estas forças são bem caracterizadas por Arno Mayer em "A Força da Tradição", um trabalho não diretamente citado, mas que esteve presente enquanto referência analítica ao longo de todo este texto.

(4) A noção de bonapartismo é desenvolvida por Karl Marx em "O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte".

(5) A palavra encontra-se aí em oposição à idéia de estrutural e necessária.

(6) Segundo Arno Mayer no trabalho supramencionado, a guerra era um meio tradicional para a solução dos conflitos entre as tradicionais classes dominantes da Europa da velha ordem. Esta prática social é mantida pelos Estados liberais sendo caracterizada pelo autor como um dos aspectos da velha ordem que condicionam a nova sociedade. No resgate do conservadorismo europeu realizado pelos movimentos nazi-fascistas esta dimensão da realidade social é supervalorizada.


BIBLIOGRAFIAS:
KENNEDY, Paul. Ascensão e Queda das Grandes Potências, Editora Campus, Rio de Janeiro, l989.
TREVOR-ROPER, H. R., The Phenomenon of Fascismo, in: "Fascism in Europe", Ed. by S.J. Woolf.
LEVESQUE, Jacques. L' URSS et sa Politique Internationale de l9l7 à Nos Jours, cópia Xerox sem referência bibliográfica.
CARR, W. National-Socialism; Foreing Policy and Wehrmacht, in: "Facism" org. Laqueur, W., Harmondsnorth, Penquin Books, l982.
ROMERO, Aníbal. Tiempos de Conflito, cópia xerox sem referência bibliográfica.
ARENDT, Hannah. Totalitarismo, o Paradoxismo do Poder, Rio de Janeiro, Ed. Documentário, l979.
MAYER, Arno. "A Força da Tradição", São Paulo, Companhia das Letras, l990.

Nenhum comentário: