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Leandro Vilar

quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

A bebida da vida: Uma história do leite

Naturalmente os mamíferos consomem leite nos primeiros meses ou anos de sua vida. As fêmeas de espécies mamíferas produzem em sua glândulas mamárias esse líquido branco nutritivo, carregado de gorduras, proteínas e outras substâncias necessárias para a nutrição de seus filhotes. Todavia, o ser humano é o único mamífero que após crescido continua a beber leite. E foi a espécie humana que ensinou outros mamíferos a tomarem leite também, especialmente os animais de estimação e bichos de zoológico. 

Assim, para poder sustentar o consumo de leite, a humanidade passou a domesticar animais leiteiros especialmente bovinos, caprinos e ovinos, apesar que leite de equinos, suínos e de outros mamíferos também foram consumidos. No entanto, para além do consumo como bebida, o leite tornou-se a fonte para o preparo de alimentos como pães, bolos e massas, mas sobretudo pelo seu uso na produção de laticínios, em destaque o queijo, a manteiga e o iogurte

O presente texto apresenta aspectos da história desse importante alimento, o qual entre algumas culturas, religiões e mitos creditou ao leite o simbolismo da nutrição, da boa saúde, da cura, da pureza, do sagrado, da vida e da imortalidade. Leite era ofertado como oferendas entre alguns povos, e essa sacralidade o tornava uma bebida da vida assim como a água e num líquido sagrado como o sangue. (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1986, p. 631-632). 

O leite materno

Para as espécies de mamíferos o leite é o primeiro alimento que os filhotes passam a ingerir logo após o parto. Durante a gestação, as glândulas mamárias são ativadas e passam a produzir leite, os quais ficam armazenados aguardando o nascimento dos filhotes, por tal condição as mamas e os seios no caso das mulheres, crescem, ficam pesadas e até doloridas. Após os filhotes nascerem, a geração de leite continua enquanto eles necessitarem serem amamentados, embora haja casos de fêmeas e mulheres que as vezes não produzem leite o suficiente ou por outros motivos de saúde, tem que interromper a amamentação. 

O leite consiste numa secreção líquida de coloração branca opaca (mas pode ter coloração amarelada também), nele estão contidos água, gordura, açúcar (lactose), carboidratos, proteínas (especialmente a caseína), vitaminas A, C, D, E, K, complexo B, cálcio, zinco, potássio, sódio, fósforo, ácido fólico etc. O valor nutricional do leite materno varia de espécie para espécie, e também é afetado pela dieta da fêmea e sua condição de saúde. No caso dos humanos, os médicos recomendam uma boa alimentação a gestante para que seu leite tenha níveis adequados de nutrientes; em alguns casos é necessário consumir vitaminas, suplementos alimentares e até tomar medicamentos durante a gestação. (MORGANO et. al, 2005). 

Estoque de doação de leite materno. A diferença da coloração representa as fases do leite materno humano. Confira a nota 1 no final do texto. 

O consumo de leite materno é essencial para o filhote por vários motivos: ao bebê-lo o filhote vai ganhar peso e se nutrir, ajudando no seu crescimento, desenvolvimento ósseo, celular e neurológico. Além disso o leite hidrata os filhotes já que em algumas espécies esses não bebem água, apenas leite; além disso, ele também fornece anticorpos que ajudam no desenvolvimento do sistema imunológico, por conta disso, mães que possuem certos tipos de doenças, não podem amamentar os filhos pelo risco de transmitir os patógenos. (MARQUESLOPEZBRAGA, 2004). 

Além disso, a amamentação ajuda no desenvolvimento da musculatura facial dos filhotes, como também conecta mãe e filho, mostrando-se um laço de afeto e cuidado. De qualquer forma, por tais características fica mais fácil de entender porque povos antigos creditavam ao leite fonte de força, saúde e prosperidade. 

A pecuária e o leite

A pecuária se desenvolveu na esteira da agricultura, pois ambos necessitaram que as comunidades humanas se sedentarizassem, embora que a pecuária cobrasse menos isso, já que ainda permaneceu a prática de criar gado livre, o que incluía a migração sazonal para novos pastos. Ainda assim, o processo de sedenterização foi importante, pois mesmo havendo essa migração de tempos em tempos, as pessoas viviam semanas ou meses numa mesma localidade, não sendo nômades como antes disso, em que havia a necessidade de mudar semanalmente de localidade atrás de caça. 

A pecuária surgiu na Ásia por volta de 13 mil anos atrás quando espécies ovinas e bovinas começaram a serem domesticadas, a fim de fornecer alimento e matéria-prima advinda de seu couro, chifres, cascos e ossos. Antes disso, alguns animais até eram capturados e mantidos vivos nas comunidades, aguardando o abate, mas não havia uma noção de criação dos mesmos, ligada ao seu cuidado, manutenção e reprodução. Nos milênios seguintes, ovelhas, porcos, cavalos, camelos, galinhas e patos foram sendo domesticados. Quando chegamos a 4 mil anos atrás, vários animais de fazenda já estavam domesticados. (MAZOYER, 2010). 

A domesticação do primeiro animal leiteiro foi de ovinos, ocorrida no Oriente Médio, por volta de 11 mil anos atrás, sendo seguida da domesticação de bovinos (10.500 anos), suínos (9.000 anos) e caprinos (7.000 anos). Sendo assim, por volta de 5 mil anos atrás, quando já existiam cidades na Mesopotâmia, em especial na região da Suméria, os sumérios já criavam vacas, ovelhas, porcos e cabras. E o leite desses animais eram consumido, além de ser usado para se fazer pães, bolos, massas e mingaus, assim como, produzir queijo e manteiga. Já o leite de camelos e cavalos foi consumido mais tardiamente, entre 6 mil a 4 mil anos atrás, quando esses animais foram domesticados. 

Friso em alto-relevo mostrando a coleta e armazenamento de leite, possívelmente para fazer queijo. Imagem datada de entre 2800-2600 a.C. Atualmente faz parte do acervo do Museu de Bagdá. 

Hannah Velten (2010, p. 15-16) comenta que foram encontrados objetos de cerâmica datados de 5 mil anos atrás, contendo vestígios de leite. A autora destaca que leite, manteiga e queijo já era produzidos por esse período em localidades da Europa itálica, grega e balcânica, norte da África, Oriente Médio, Ásia Central, Índia, China e Sudeste Asiático. Terras onde havia a criação de bovinos, ovinos, suínos e caprinos, mais tarde os cavalos e camelos foram introduzidos na Europa e África. 

"Posteriormente, entre 5.000 e 3.000 anos antes de nossa Era, isto é, entre 3.000 e 1.000 a.C., a população mundial dobrou, passando de 50 a 100 milhões de indivíduos aproximadamente, isso se explica, ainda, em certa medida, pela extensão dos cultivos de derrubada-queimada, mas ela se explica também pelo grande desenvolvimento das grandes sociedades agrárias do Indus, da Mesopotâmia e do Nilo. Certamente, os sistemas de cultivos de vazante e de cultivos irrigados que foram implantados, então, localmente, nesses vales privilegiados, tiveram uma extensão limitada, mas podiam suportar densidades de população impressionantes, de muitas centenas de habitantes por quilômetro quadrado". (MAZOYER, 2010), p. 91). 

Pintura egípcia mostrando atividades cotidianas, no entanto, nota-se um homem ordenhando uma vaca. Datação desconhecida. 

À medida que a pecuária se espalhava pela Ásia, Europa e África, o consumo de leite e laticínios foi aumentando, lembrando que nem todo mundo tinha o hábito de consumir leite por alguns problemas envolvendo sabor, conservação, contaminação do leite, optando-se em comer queijo e coalhada. Apesar disso, a produção de leite por volta do ano 200 a.C já era significativamente grande nesses três continentes e seguiria crescendo nos séculos seguintes. 

Os laticínios

O termo laticínio ou produto lácteo refere-se aos alimentos produzidos à base de leite, sendo esses o queijo, a manteiga, o iogurte e a coalhada. Mais tarde outros laticínios foram desenvolvidos como a ricota e o requeijão. Entretanto, para aqui trabalharemos com os quatro primeiros, por serem os laticínios mais antigos desenvolvidos, comentando um pouco a respeito dele e sua importância na história da alimentação. 

Exemplos de laticínios. Na fotografia podemos ver queijos, manteiga, coalhada seca, coalhada cremosa e iogurte de morango. 

Não se sabe em que época o queijo, a manteiga, a coalhada e o iogurte surgiram, tampouco se desconhece o povo que teria descoberto eles primeiro e como era sua produção naquela época. Entretanto, sabe-se que queijos e manteigas eram consumidos antes de 3000 a.C, possívelmente a coalhada e o iogurte talvez fossem já conhecidos nesse período também. Apesar dessas incertezas eles tiveram uma função importante na história da alimentação de vários povos. (DALBY, 2009, p. 36-38). 

O queijo consiste num laticínio sólido cuja coloração normal é branca ou amarela. Existem diferentes tipos de queijos que possuem sabor, textura e aroma distintos. Além de que o tipo de leite utilizado também altera tais características. No entanto, a produção mais simples de queijo advém do tratamento do leite coalhado que é separado de seu soro, recebendo alguns ingredientes (como sal e vinagre) para ajudar no processo de formação da massa, lhe dando consistência, sabor e aroma. A massa estando pronta ela é moldada ou colocada em recipientes, sendo deixada para maturar ou podendo ser levemente cozida. Hoje em dia se refrigera algumas receitas. (DALBY, 2009, p. 52-54). 

Gravura italiana do século XV, mostrando o preparo e consumo de queijo. 

O queijo foi o principal laticínio consumido por milhares de anos por conta de sua conservação ser prolongada devido ao seu processo de fabrico. Dependendo da forma como isso é feita, um queijo pode durar dias ou semanas, diferente da manteiga, da coalhada e do iogurte, que sem refrigeração estragaram em horas. Assim, os povos antigos deram grande atenção ao fabrico de queijo, alguns se especializaram na produção de queijos de cabra e de ovelha, mais apreciados do que o queijo de vaca, o qual é o mais comumente consumido hoje em dia. 

Já a manteiga consiste numa emulsão feita do leite, ou creme de leite ou de nata, o qual é batido até talhar, o que significa que ele adquiri uma constituição pastosa a qual deixa como resíduo o soro de leite. Esse soro deve ser removido e pode ser usado em outras receitas. Em seguida pega-se a "gordura" e retira-se todo o vestígio do soro, para depois adicionar-se sal (o que ajuda na conservação e na melhoria do sabor). Concluída essas etapas a manteiga é colocada para descansar, podendo ser servida algumas horas depois. Hoje em dia coloca-se ela na geladeira, mas antes da invenção dessa, a manteiga era deixada em local arejado. A manteiga pode ter uma coloração branca, amarelada ou amarela, isso varia de acordo com a matéria-prima usada (leite, creme ou nata) e o tipo de leite (vaca, cabra, ovelha etc). A escolha da matéria-prima não apenas altera a coloração, mas também a consistência e sabor da manteiga. (KHOSROVA, 2016, p. 14-18). 

Diferente do queijo, a manteiga apresenta uma versatilidade maior de usos, sendo utilizada na fritura de alimentos, no preparo de massas, pães, bolos e biscoitos. É usada também no preparo de molhos e doces, além de servir para conceder sabor no preparo de carnes e legumes. A manteiga também é consumida ao se passar numa fatia de pão, sendo uma das formas mais habituais de consumi-la. No Brasil e em outros países temos o famoso pão na chapa, que basicamente é uma fatia de pão com manteiga que é assado. 

Figura de uma mulher batendo leite para preparar manteiga. 1499.

A coalhada (palavra que vem do espanhol cuajada) é outro laticínio antigo e bastante consumido em alguns países antigos como a Grécia, a Turquia, a Síria, o Líbano, a Arábia Saudita. A coalhada é o resultado do leite coalhado, que consiste na fermentação natural ou induzida dele. Dependendo da forma como isso é feito, o leite leva horas para ser coalhado, adquirindo uma consistência pastosa branca, a qual é matéria-prima também para o preparo de alguns queijos e iogurtes. Além disso, existe a receita de coalhada seca, cuja aparência lembra de alguns queijos. No entanto, terminada a fermentação a coalhada está pronta para ser consumida pura ou receber a adição de açúcar, mel, suco de frutas, granola etc. Antigamente era comum o uso de mel para adoçar a coalhada, pois seu gosto naturalmente é azedo

Na Europa, além dos gregos, os espanhóis são grandes apreciadores de coalhada, prática que remonta o medievo. Por sua vez, com a colonização das Américas, os espanhóis levaram o costume de se consumir coalhada. Atualmente países hispânicos como El Salvador, Honduras, Costa Rica e Nicarágua, são grandes apreciadores de coalhada. Os portugueses também consomem coalhada, mas em menor quantidade, porém, eles legaram isso aos brasileiros, que são grandes consumidores desse laticínio. A coalhada também é usada no preparo de doces

Potes de coalhada e de mel. A mistura de ambos é bastante popular e existe a séculos. 

O iogurte (palavra que vem do turco yogurt) consiste num laticínio que pode ser sólido tendo textura pastosa ou cremosa, ou pode ser consumido de forma líquida. Isso varia de acordo com a maneira de produção. O iogurte teria surgido em algum lugar da região dos Balcãs na Europa ou na Anatólia na Turquia. Seu preparo é parecido com o da coalhada, havendo necessidade de deixar o leite fermentar (de forma natural ou induzida). Normalmente se utiliza bactérias dos lactobacilos no preparo de iogurte, o que demanda uma temperatura mais elevada para a fermentação ocorrer. Essa é uma das diferenças em relação ao preparo da coalhada, pois enquanto a anterior adquire um sabor azedo, o iogurte tem um sabor levemente doce, embora haja formas de prepará-lo que o deixam salgado. (WEILL, 2017, p. 28-34). 

O iogurte desde a Antiguidade também era consumido naturalmente ou na companhia de mel ou frutas como morangos, maçãs, ameixas, amoras etc. Os gregos e turcos se destacaram no consumo de iogurte, por conta disso, o "iogurte grego" é famoso hoje em dia. Além disso, os turcos também têm o hábito de comer iogurte salgado com outros tipos de alimentos, além de usá-lo no preparo de molhos, sopas e sobremesas. O iogurte de morango, chocolate, banana, maçã, ameixa etc., que encontramos hoje facilmente nos mercados, são oriundos da industrialização. 
Um copo de iogurte turco. 

O leite e laticínios nos mitos

O mito era uma forma de explicar acontecimentos diversos e uma maneira de compreender o mundo, a vida, a morte e a natureza. Na mitologia grega temos alguns mitos referentes ao leite. Quando Zeus ainda bebê foi escondido por sua mãe Reia na ilha de Creta, para não ser devorado por seu pai Cronos, o pequeno deus foi amamentado com leite de uma cabra chamada Amalteia (outra versão do mito diz que Amalteia era uma ninfa que tinha uma cabra da qual tirava leite para amamentar Zeus). Já adulto, após a morte da cabra que o nutriu na infância, Zeus usou seu couro para forrar seu escudo Égide e transformou seus chifres na cornucópia, um símbolo de fertilidade. (BRANDÃO, 1986, p. 332). 

Outro mito grego informa que após Héracles ter nascido, Zeus tentou cuidar do menino no Olimpo, colocando Hera para amamentar a criança. Porém, a deusa estava dormindo e ao sentir a criança mamando, acordou abruptamente e o retirou, espirrando leite no céu. Outra variante do mito diz que Hera aceitou amamentar Héracles, mas o bebê chupava com tanta força que machucou seu seio e ela o afastou, fazendo o líquido branco jorrar. Apesar da versão, em ambos os casos o leite da deusa que jorrou no céu, formou a Via Láctea ("o caminho do leite"). (BRANDÃO, 1986, p. 321).

O nascimento da Via Láctea. Peter Paul Rubens, 1636. 

Ainda na mitologia grega temos dois mitos que não se referem ao leite, mas ao queijo. Na Odisseia, poema épico atribuído a Homero, existem alguns versos que falam sobre o leite e queijo, importante fonte de alimento na cultura grega. Ao chegar a ilha dos ciclopes, Odisseu e sua tripulação entram numa caverna onde encontram cabras e ovelhas, além de queijos e leite coalhado. Era a caverna do ciclope Polifemo. Na ilha da feiticeira Circe, os gregos são recebidos por ela e suas servas, as quais oferecem queijo e vinho misturado com mel. Quando Odisseu desce ao Hades para consultar o vidente Tirésias, ele faz oferendas ao mesmo, dentre os produtos ofertado estava leite, vinho e água. (HOMERO, 1997). 

Na mitologia nórdica o gigante primordial Ymir, se alimentava do leite da vaca Audhumla, isso nos princípios dos tempos, antes do mundo ser criado. Enquanto Ymir tomava leite para se alimentar, o mito diz que a vaca lambia o sal do gelo. Até que certo dia de tanto lamber uma massa de gelo, dessa descongelou Buri, o primeiro deus. Buri veio a se casar com uma das filhas de Ymir, iniciando a linhagem dos deuses. (LANGER, 2015, p. 62-63). 

O gigante Ymir tomando leite de Audhumla, enquanto ela descongela o gelo que aprisionava o deus Buri. Nicolai Abildgaard, 1790. 

Na mitologia hindu existe uma narrativa que diz que por desatenção o deus Indra acabou insultando o sábio Durvasa, destruindo sua satanaka (um tipo de coroa de flores). Durvasa indignado, achando que o deus havia agido de propósito, o amaldiçoa, rogando que Lakhsimi (deusa da fertilidade e prosperidade) deixasse de abençoar Indra e os Devas (seres sobrenaturais que não seriam deuses). Esses acabaram perdendo seus poderes e a imortalidade, com isso, os inimigos dos Devas, os Asuras aproveitam isso e invadem o reino de Indra, expulsando-o junto aos seus súditos e tomando posse dele. (KLOSTERMAIER, 1998, p. 49-50). 

Tempo se passa e Indra e os Devas vão procurar a ajuda de Vishnu, o qual aconselha que eles deveriam agitar o Oceano de Leite (Kshira Sagara). Para isso, eles precisariam usar a montanha Mandara como mexedor, e o rei naga Vasuki como "corda" para mover a montanha. Porém, era necessário outra equipe para ajudar. Assim, Indra recorreu aos seus contatos para pedir a ajuda dos Asuras, que aceitaram, pois cobiçavam a Amrita (líquido que proporcionava a imortalidade), a qual estava escondida no fundo daquele oceano leitoso. Dessa forma, Devas e Asuras trabalharam para agitar (ou bater) o Oceano de Leite, ocorrendo outros acontecimentos nesse tempo, que não vem ao caso narrar aqui por conta do mito ser mais longo. De qualquer forma, após concluir a tarefa, a deusa Lakshimi saiu do Oceano de Leite, concedendo a Amrita aos Devas e Indra, os quais recuperaram a imortalidade e seus poderes e expulsaram os Asuras de seu reino. (CUSH; ROBINSON; YORK, 2008). 

Ilustração mostrando os Devas, Asuras e outras divindades participando da batida do Oceano de Leite. 

Na mitologia sumeriana, Dumuzi era o deus dos pastores e da pecuária, a ele era creditado a responsabilidade de ter ensinado os sumérios como praticar a pecuária, assim como, passar a consumirem leite e saberem produzir queijo e manteiga. Por tais características o deus também estava associado com a fertilidade, o mundo rural e a prosperidade. Existem menções a orações que pediam a Dumuzi para abençoar os rebanhos, as colheitas e até que o gado desse mais filhotes e produzisse mais leite. Existe um mito que aborda o sumiço da deusa Inanna, de quem Dumuzi era um dos amantes, o que lhe deixou preocupado, a ponto de que a produção de leite tinha cessado. Os animais pararam de fornecer leite, pois o deus não estava mais abençoando-os. (LEICK, 2003, p. 34-36). 

Na mitologia romana os irmãos gêmeos Rômulo e Remo foram abandonados por seu tio Numitor, que prendeu sua sobrinha Reia Sílvia após essa dar à luz as crianças. Porém, as crianças foram acolhidas por uma loba que os amamentou por algum tempo até que os irmãos foram encontrados por um pastor de cabras chamado Fáustulo que adotou as crianças e os levou para sua esposa Aca Larência. Vários anos depois já adultos, os gêmeos viriam a brigar pelas terras onde moravam, Rômulo acabou matando Remo e depois fundou a cidade de Roma

Estátua de bronze do século XI mostrando Rômulo e Remo mamando na loba que os acolheu. 

As propriedades do leite

Hoje sabemos que a ingestão moderada de leite faz bem a saúde, exceto para aqueles que tem problemas estomacais e intolerância à lactose. Porém, no passado, ao longo da História, o leite foi receitado como remédio e supostamente teria outras propriedades diversas. 

O erudito romano Plínio, o Velho (23-79) relatou que a rainha Cleópatra e a imperatriz Popeia (esposa de Nero), ambas tomavam banho de leite de jumenta, pois dizia-se que era muito bom para hidratar a pele e rejuvenescê-la. Não se sabe exatamente se as duas monarcas tomavam banho de leite, mas hoje sabe-se que alguns tipos de leite realmente são usados em tratamentos de beleza, sendo assim, é provável que no passado longínquo algumas mulheres realmente fizessem uso de banhos de leite para hidratar a pele por motivos estéticos. (VELTEN, 2010, p. 51).

Essa questão envolvendo o leite e uso estético não se limitava apenas o banho em leite de jumenta, pois relatos gregos e latinos falam de outras receitas caseiras envolvendo o uso de leite para tratar a pele. Inclusive essa prática foi vista em outras épocas da História, como no período elisabetano na Inglaterra, onde loções e cremes à base de leite de jumenta eram vendidas como artigos beleza. (VELTEN, 2010, p. 52). 

Entretanto, o leite não teria apenas um uso estético, em História Natural, no livro 28, capítulo 33, Plínio, o Velho escreveu sobre as propriedades alimentícias e medicinais do leite, mencionando os melhores tipos de leite para determinadas situações e as variedades de leites que normalmente as pessoas de sua época consumiam. A respeito, ele escreveu:

“O leite mais nutritivo, em todos os casos, é o leite de mulher, e depois o leite de cabra, ao qual se deve, provavelmente, a fabulosa história de que Júpiter foi amamentado por uma cabra. O mais doce, depois do leite de mulher, é o leite de camelo; mas o mais eficaz, em termos medicinais, é o leite de burra. É nos animais de maior tamanho e nos indivíduos de maior volume que o leite é secretado com maior facilidade. O leite de cabra combina melhor com o estômago, aquele animal que come mais do que pasta. O leite de vaca é considerado mais medicinal, enquanto o leite de ovelha é mais doce e nutritivo, mas não tão bem adaptado ao estômago, sendo mais oleaginoso que qualquer outro”. (PLÍNIO, liv. 28, cap. 33, tradução minha). 

Em seguida Plínio relata algumas aplicações medicinais que supostamente o leite teria. Embora hoje se saiba que não passava de crendices e exageros associados a um "poder curador" que os leites teriam. 

“O leite de vaca é o mais relaxante e todos os tipos de leite têm menos probabilidade de inflar quando fervidos. O leite é usado para todos os tipos de ulcerações internas, em particular as dos rins, bexiga, intestinos, garganta e pulmões; e externamente, é empregado para sensações de coceira na pele e para erupções purulentas, sendo tomado em jejum para esse fim. Já dissemos, ao falar das plantas, como na Arcádia, o leite de vaca é administrado para tísica, constipação e caquexia. São citados exemplos, também, de pessoas que foram curadas de gota nas mãos e nos pés, bebendo leite de burra". (PLÍNIO, liv. 28, cap. 33). 

Plínio também descreve algumas receitas envolvendo leite fervido misturado com soro de leite e até mel, a qual supostamente seria usada para tratar epilepsia, melancolia (depressão), paralisia, lepra, elefantíase e doenças articulares. Além dessas doenças, ele segue prescrevendo o uso de leite para tratar de outras doenças diversas, fato esse que no título do capítulo ele menciona 54 utilidades para o leite. (PLÍNIO, liv. 28, cap. 33). 

Os supostos usos medicinais do leite ainda perduraram por mais tempo. No Renascimento italiano entre os séculos XIV e XVI, médicos, filósofos e eruditos adotaram várias práticas medicinais gregas e romanas, tidas como corretas e mais avançadas do que a medicina medieval foi. Assim, a recomendação de consumo de leite para tratar diferentes problemas de saúde, algo já indicado por Plínio, mas também por médicos renomados como Hipócrates e Galeno, foram seguidas e receitadas por médicos italianos desse período. Entretanto, nem todos os médicos concordavam que o leite deveria ser consumido por qualquer um, havia aqueles que apoiavam que a bebida deveria ser ingerida por crianças, idosos e pessoas doentes, mas pessoas adultas e saudáveis não deveriam beber leite pois esse prejudicaria o seu humor (isso era reflexo da teoria dos quatro humores, oriunda na Grécia Antiga). (VELTEN, 2010, p. 61). 

Na Inglaterra do século XVII temos relatos de leite sendo receitado por médicos ou curandeiros para tratar de problemas de saúde como epilepsia, tuberculose, bronquite etc. Assim, encontra-se em receituários de origem popular, recomendações para ingerir leite de vaca, cabra e de burra, o qual era tido ainda como um "santo remédio". Jornais russos e alemães do século XIX, denunciavam curandeiros charlatões que receitavam o consumo de leite de cabra ou leite de outras origens para tratar problemas de saúde diversos. Observa-se que mesmo passados séculos desde o relato de Plínio, o Velho na Roma Antiga, os supostos usos medicinais do leite ainda se mantiveram na medicina popular de alguns povos europeus. (VELTEN, 2010, p. 48-50). 

O leite na Antiguidade

Povos mesopotâmicos como os sumérios, acádios, babilônios e assírios consumiam leite, embora não se saiba o qual abrangente era isso, no entanto, eles produziam manteiga e queijo. No caso do leite, esse era tido como uma bebida com um valor sagrado ao lado da cerveja, em que ambos eram usados como oferendas aos deuses. Dessa forma, entre esses povos havia o hábito de "alimentar" diariamente os deuses, então os sacerdotes preparavam refeições para as divindades, as quais eram colocadas em mesas ou altares nos templos. (CIVITELLO, 2008, p. 11).  Uma variedade de alimentos e bebidas eram servidos. Alimentar os deuses era uma forma de adorá-los, servi-los, assim como, não afrontá-los, pois se isso ocorresse, eles poderiam punir a comunidade. 

Os egípcios produziam leite e laticínios há mais de quatro mil anos, sendo um dos primeiros povos africanos a domesticar gados. Para os egípcios o leite tinha um valor sagrado e religioso. A deusa Ísis, uma das mais importantes divindades do panteão egípcio, era associada com a maternidade, o cuidado do lar, a proteção das mulheres grávidas, o ofício de parteira, a proteção do faraó etc. Estátuas mostrando Ísis amamentando seu filho Hórus foram populares em algumas épocas do Egito Antigo. 

Estátua de Ísis amamentando Hórus. Século VII a.C. 

"Como símbolo de salvação, o leite ocupou um lugar importante na cultura popular de festas religiosas. Jarras de leite cercavam o túmulo de Osíris, marido de Ísis, na ilha de Philae. Os sacerdotes reuniam-se ali para cantar e rezar, solenemente encher uma tigela de libação, uma para cada dia do ano, com leite. Para o egípcio comum, visitar este local constituía uma peregrinação sagrada que poderia iluminar uma vida inteira". (VALENZE, 2011, p. 15, tradução minha). 

Na Índia com a sacralização das vacas, tudo que viesse delas (exceto a ingestão de sua carne) passou a ser visto como algo sagrado. Dessa forma, os indianos há milhares de anos já consumiam leite, manteiga, queijo e coalhada de forma mais regular. Tais alimentos são usados também como oferendas até hoje, marcando uma longeva tradição religiosa quanto aos usos dados ao leite e os laticínios. (VELTEN, 2010, p. 116). 

Shiva, um dos mais populares e conhecidos deuses hindus, relacionado a vários atributos, possui como montaria o touro Nandi, considerada o "senhor dos animais". Além de montaria, Nandi já ajudou o deus em outras ocasiões. E em alguns templos dedicados a Shiva é possível encontrar estátuas de Nandi, agindo como seu guardião. O touro é considerado como o "pai de todos os bovinos". E devido a sua importância, esse foi um dos fatores para se sacralizar as vacas. Mas outra divindade associada com as vacas é Krishna, outro nobre deus conhecido por suas virtudes e sabedoria, o qual costuma ser retratado tocando música para esses animais. (VELTEN, 2010, p. 39-40). 

O deus Shiva montado no touro Nandi. Ambos são importantes símbolos para a sacralização das vacas no Hinduísmo. 

“O leite não era apenas o alimento dos deuses, mas também dos sábios, videntes e santos. De acordo com o Ayurveda indiano, o corpo é dominado por um dos três elementos – sattva (equilíbrio), rajas (atividade) e tamas (inércia) – que dão caráter específico e impulsos para cada pessoa (muito parecido com o conceito europeu medieval dos quatro humores). Esses mesmos elementos também são atribuídos a diferentes alimentos para explicar seu efeito sobre o não-físico aspectos da fisiologia – a mente, o coração, os sentidos e espírito. De todos os leites, exceto o leite humano, o leite de vaca é considerado o alimento sáttvico mais puro, o que significa que é edificante, mas estabilizante, agindo como uma ajuda para a serenidade e a espiritualidade. Mas tem que ser bebido quatro horas após a ordenha, caso contrário torna-se rajástico: levando à estimulação e agravamento. Sábios, santos e os videntes sobreviviam facilmente apenas com alimentos sáttvicos (que eram fornecidos pelos devotos locais), como leite fresco ou kheer (arroz cozido em leite), pois esta dieta levou ao desenvolvimento de uma consciência superior. O leite não induziria desejos mundanos nem distrairia suas mentes de sua busca por verdades metafísicas superiores”. (VELTEN, 2010, p. 42-43). 

Todavia, além da questão religiosa, outro motivo que levou o aumento no consumo de leite e produtos lácteos se deve também a uma questão alimentícia. A Índia atualmente é o país mais populoso do mundo, e no passado já contava com milhões de moradores, os quais por várias épocas foram ensinados a adotarem uma dieta vegetariana devido a fatores religiosos, mas também a escassez de animais. Dessa forma, o consumo de leite e laticínios se tornou importante para suprir a necessidade diária por proteínas. Assim, desde a década de 1970 a Índia se tornou um dos maiores produtores de leite no mundo, sendo um dos grandes exportadores também. A maior parte de sua produção é de leite bovino, depois caprino e de búfala. (VALENZE, 2011, p. 270-271). 

Alto-relevo indiano mostrando um homem ordenhando uma vaca. Arte feita por volta do século VII d.C. 

Na Bíblia a terra de Canaã que viria originar Israel e a Palestina, é referida em alguns momentos como um lugar onde haveria muito leite e mel (Êxodo 33:3). De fato, isso não existe, trata-se de uma metáfora usada nos livros bíblicos para falar da prosperidade daquela região, pois muito leite significava vastos rebanhos e pastos, por sua vez, a existência de abelhas dependia de haver florestas e muitas flores. Logo, numa região desértica como é o Oriente Médio, uma localidade onde supostamente "leite e mel" eram fáceis de serem encontrados, significava ser um lugar bastante próspero. Essa ideia surgida com os hebreus foi transmitida aos cristãos e muçulmanos. (CIVITELLO, 2008, p. 17). 

Os gregos e romanos eram grandes consumidores de laticínios, mas curiosamente eles não tinham o hábito de tomar leite. Os rebanhos de cabras e ovelhas eram maiores na Grécia do que o de vacas, principalmente por conta do território montanhoso e pastos escassos. Assim, desde cedo os gregos passaram a apreciar o queijo e manteiga feito do leite de caprinos e ovinos. Os gregos também mais tarde absorveram de povos vizinhos o gosto pelo iogurte e a coalhada. O consumo de queijo era feito em todas as refeições, onde ele poderia ser comido ao lado de pães, azeitonas, massas, carnes, sopas e saladas. Embora o feta seja um dos queijos gregos mais famosos, no entanto, eles desenvolveram diferentes tipos de queijos, a maioria feitos de leite de cabra ou ovelha. 

Alguns tipos de queijos gregos. Para eles o queijo era mais valioso como alimento do que o leite. 

Embora houvesse uma grande produção de laticínios, especialmente de queijos, os quais eram um dos alimentos básicos da culinária grega, os gregos não tinham o costume de tomar leite, um dos motivos era que sua ingestão era associada aos "povos bárbaros". (VELTEN, 2010, p. 29). 

Assim, para os gregos, povos como os trácios e citas, os quais bebiam leite, isso era um costume incivilizado, pois o leite não era visto como uma bebida civilizada como o vinho. Até o consumo de cerveja que eles faziam, também era encarado como algo inferior. O historiador Heródoto de Halicarnasso escreveu acerca dos costumes do citas, relatando que eles bebiam leite de éguas e jumentas. A respeito ele relatou: 

"Os Citas têm por hábito furar os olhos dos seus escravos, para utilizá-los na ordenha de animais, cujo leite consomem diariamente. Para a extração do leite adotam uns canudos de osso semelhantes a flautas, que introduzem nas partes naturais das jumentas, e os escravos neles sopram, enquanto outros tiram o leite. Dizem eles que empregam esse processo para que o sopro intumesça as veias das jumentas e faça baixar as mamas. Extraído o leite, despejam-no em recipientes de madeira, que os escravos sacodem e agitam. É a nata que eles mais apreciam, considerando-a saborosíssima e nutriente. É para essa tarefa que eles vazam os olhos dos que submetem à escravidão. Os Citas não cultivam a terra e são nômades". (HERÓDOTO, 2009, p. 306). 

É preciso salientar que alguns dos relatos de Heródoto eram exagerados e até difamatórios, mas isso fazia parte da mentalidade da época, em que os gregos antigos atribuíam uma visão negativa e inferior aos povos vizinhos, sempre procurando destacar supostos costumes que definiam eles como sendo bárbaros. Apesar de tais exageros, realmente se sabe que os citas também bebiam leite de equinos. 

Os romanos também compartilhavam dessa ideia, relatando que povos celtas, germânicos e bretões bebiam leite, inclusive as vezes sem ferver. Alguns autores romanos alegavam que o leite deveria ser consumido apenas na infância, depois das pessoas crescerem e desmamarem, o leite deveria ser usado na produção de queijo e manteiga, ou em alguma receita, pois supostamente sua ingestão causava dores de barriga ou mal-estar. De fato, isso poderia acontecer por conta da intolerância à lactose ou se o leite estivesse contaminado. (VELTEN, 2010, p. 29-30). 

O leite no medievo

O Cristianismo não sacralizou o leite como o pão e o vinho, pelo menos não num sentido bíblico, porém, os hebreus eram consumidores de leite e laticínios. Vale ressalvar que quando o Cristianismo espalhava-se pela Europa na Antiguidade e Medievo, ele foi sendo pregado a vários povos pastores, os quais já tinham o hábito de consumir leite e laticínios. Logo, isso acabou sendo mantido e mais tarde até difundido, quando as igrejas e mosteiros começaram a ganhar terras e feudos, eles passaram a investir na agricultura e pecuária, e a produção de leite, queijo e manteiga se tornou algo comum. 

Na Irlanda medieval lendas sobre vacas mágicas surgiram em algumas épocas e se popularizaram. Alguns relatos falam de misteriosas vacas que apareciam de não se sabe da onde, cujo leite era mágico, podendo curar algumas doenças inclusive. Essas vacas apareciam em alguns casos em tempos de penúria, sendo milagres para os que passavam fome. Há relatos sobre vacas chamadas Fuwch Frech, Dun Cow, Glas Ghaibneach. No entanto, um dos relatos mais populares sobre vacas mágicas irlandesas é associado com Santa Brígida da Irlanda (c. 451-525), cuja lenda diz que a santa quando bebê, não conseguia tomar leite de vaca, então uma misteriosa vaca surgiu nas terras onde ela vivia, permitindo que a futura santa fosse alimentada. Por conta desse milagre, Santa Brígida passou a ser associada com os animais leiteiros, o consumo de leite e a pecuária. Os cristãos irlandeses no medievo prestavam orações pedindo a santa que ajudassem em tempos de escassez de alimentos ou quando o gado estava com problema para gerar leite. (VELTEN, 2010, p. 44).

Ícone medieval de c. 1300 mostrando Santa Brígida da Irlanda e uma vaca. A santa era associada com o leite em seu país.

O leite também era visto como fonte de inspiração divina. Uma antiga lenda cristã diz que São Bernardo de Claraval (1090-1153) certa vez estava orando para a Virgem Maria, pedindo pôr sabedoria, enquanto ele cantava o hino Ave maris stella, uma estátua da santa se materializou em carne e osso e espirrou leite de um dos seios, caindo na boca do santo, lhe concedendo sabedoria e eloquência. Essa lenda justificaria a condição de Bernardo ter sido um teólogo prolífero, tendo escrito várias cartas e estudos teológicos. (VALENZE, 2011, p. 43). 

A lenda que São Bernardo teria recebido "divino leite" de Maria se espalhou pela França e Espanha, condição essa que alguns padres em seus sermões exaltavam simbolicamente o leite materno da Virgem Maria como fonte de sabedoria e bonanças. Dessa forma o leite materno se tornou metáfora religiosa para falar sobre crescimento, nutrição, amor, inspiração etc. O próprio seio também ganhou uma conotação divinizada, representando o acolhimento, o carinho, a maternidade, o amor materno. Por isso expressões como o "seio da igreja", "acolhido no seio da santa igreja", passaram a serem usadas. (VALENZE, 2011, p. 46-47).

São Bernardo de Claraval recebendo o leite divino da Virgem Maria. Pintura de Alonso Cano, século XVII. 

O simbolismo de Maria amamentando o pequeno Jesus começou a se expandir na Baixa Idade Média (XI-XV) por países como França, Itália e Espanha. No caso italiano tivemos a fundação ou renomeação de igrejas que foram dedicadas a Maria e sua tarefa materna da amamentação, algo visto no Monastero di Santa Maria di Gala, na Sicília; Chiesa Madonna da Latte, em Novara; Chiesa Nostra Signora di Latte Dolce, em Sassari. 

Os povos muçulmanos foram incentivados ao consumo do leite. No seu livro sagrado, o Corão, há passagens como Al Náhl 66 e Al Munin 21, que recomendam o leite como uma bebida importante da dieta de um muçulmano. Entretanto, um dos exemplos de maior destaque sobre a presença do leite na religião islâmica encontra-se na surata Mohammed 47, em que se ler:

"Eis aqui uma descrição do Paraíso, que foi prometido aos tementes: Lá há rios de água impoluível; rios de leite de sabor inalterável; rios de vinho deleitante para os que o bebem; e rios de mel purificado; ali terão toda a classe de frutos, com a indulgência do seu Senhor. Poderá isto equipar-se ao castigo daqueles que permanecerão eternamente no fogo, a quem será dada a beber água fervente, a qual lhes dilacerará as entranhas?". (CORÃO, Mohammad 47:15, grifos meu). 

Nesta breve descrição sobre o Paraíso para a fé islâmica, observa-se que ele é retratado como um local possuindo abundância de alimentos, tendo plantações e pomares, além de rios de leite, mel e vinho. Cada uma dessas bebidas possuem características simbólicas no Islão, estando associadas com fertilidade, prosperidade, saúde, pureza etc. Além disso, os árabes levaram consigo para a África o hábito de tomar leite de camelos, ensinando-os para alguns povos que foram convertidos a sua religião. Eles também difundiram a criação de ovinos e bovinos em algumas áreas do território africano. 

Ainda hoje o leite de camela é consumido normalmente em países muçulmanos. 

Os nórdicos da Era Viking (VIII-XI), popularmente chamados hoje de vikings, também consumiam leite, creme de leite, queijo e manteiga, hábito compartilhado com os povos germânicos. O leite além de bebido, era usado também para se fazer mingaus, massas, sopas, molhos e usado até para se amaciar algumas carnes, prática ainda hoje utilizada. Como grande parte da população escandinava era rural naquele tempo, então o acesso ao leite era mais fácil, fato esse que nas fazendas era comum bebê-lo fervido ou coalhado durante o desjejum (dagverd). (CAMPOS, 2021, p. 128, 145). 

Mas o leite consumido pelos vikings era principalmente de cabra ou de ovelha, já que rebanhos bovinos eram mais raros e pertenciam a gente mais abastada. Condição essa que na Islândia, ainda hoje se produz um queijo cremoso chamado skyr, que é feito de leite de ovelha ou de cabra, embora que hoje a palavra skyr também designa um tipo de iogurte. E no norte da Escandinávia, os povos sámis bebiam leite de rena, pois eles domesticaram esses animais, embora fossem pecuaristas seminômades. (NATOKER, 2009, p. 29). 

No período medieval o skyr era consumido na forma de queijo, mas hoje ele normalmente é vendido como iogurte, requeijão e até sorvete. 

No século XIII os europeus tomam conhecimento de uma bebida alcóolica apreciada por tártaros, mongóis, cazaques, turcos e outros povos das estepes asiáticas, chama-se kumis (airag em mongol), o qual se trata de leite de égua fermentado e azedo. Viajantes como Giovanni da Pian del Carpine (c. 1182-1252), William of Rubrick (1220-1293) e Marco Polo (1254-1324) viajaram pela Ásia, tendo contato com povos das estepes, em especial os mongóis que dominavam grande parte do continente naquele tempo. Os três relataram como o kumis era a bebida preferida desses povos, apesar de seu gosto azedo e forte, no entanto, aqueles homens apreciavam-se em se embriagar com isso. 

Carpine e Rubrick relataram que os abastados bebiam kumis ao som de música e até faziam barulho enquanto bebiam, como forma de exaltar sua alegria em apreciar aquela bebida. Eles também escreveram que era costume os mongóis beberem usando tigelas, enchendo-as diretamente de caldeirões ou grande recipientes. (VALENZE, 2011, p. 38). Já Marco Polo relatou que provou kumis em sua viagem para à China, comparando-o ao vinho branco. Além disso, ele comentou que os chineses não tinham hábito de tomar essa bebida, mas como eles foram conquistados pelos mongóis, Kublai Khan introduziu na corte tal costume. Polo chegou a dizer que o imperador possuiria dez mil éguas que lhe forneciam leite para abastecer a corte. (CIVITELLO, 2008, p. 81). 

O kumis é uma bebida alcoólica feita de leite fermentado de égua, sendo bastante popular na Mongólia ainda hoje. 

Além dos mongóis, indianos, turcos, árabes, persas e outros povos muçulmanos e das estepes, o consumo de leite e laticínios não foi comum entre chineses, coreanos, japoneses e outros povos do Sudeste Asiático, todavia, alguns povos himalaios mantiveram esse hábito, como os tibetanos, nepaleses e butaneses, os quais ainda hoje consomem leite de iaque (Bos gruniens) bovino de grandes altitudes. (CASCUDO, 2016, p. 21-22). 

Os tibetanos desde a Idade Média passaram a desenvolver o apreço pelo consumo de manteiga, queijo e leite. Especialmente os dois primeiros, os quais estavam bastante presentes em sua culinária, já que o leite era mais usado para a produção de mingaus e massas. No caso da manteiga essa tem um papel de destaque na cultura tibetana, sendo usada no famoso chá de manteiga (bho jha), o qual se tornou a bebida nacional do Tibete, apesar de ser consumido em países vizinhos. Trata-se de uma bebida calórica e salgada, feita de manteiga de iaque, a qual também recebe adição de sal. O chá de manteiga é consumido diariamente pelos tibetanos e até usado em cerimônias religiosas como oferenda. (KHOSROVA, 2016, p. 284-285).  

O chá de manteiga é bastante popular no Tibete. 

O chá de manteiga também é usado no preparo no tsampa, um alimento tibetano feito com farinha de cevada, a qual misturada ao chá forma um mingau salgado e calórico, bom para enfrentar o frio. Pois é preciso lembrar que em clima frio o corpo gasta mais calorias para se manter aquecido, por conta disso a necessidade de ingerir mais calorias diárias. 
(KHOSROVA, 2016, p. 39).  

Além do uso alimentar da manteiga e do queijo, os tibetanos possuem uma tradição antiga de usar manteiga para fazer arte. Durante o inverno alguns templos budistas reúnem habilidosos monges escultores e pintores, os quais usam a manteiga para fazer estátuas e alto-relevo, depois as pintam. A tradição existe já a mais de quinhentos anos pelo menos. 

O consumo de leite, queijo e manteiga cresceu em algumas localidades europeias, especialmente as rurais, as quais predominavam na Idade Média, por conta disso, assegurar a conservação desses produtos alimentícios eram essencial para a alimentação diária daquelas fazendas e comunidades rurais, por conta disso, quando algo dava errado, significava que forças maléficas ou travessas estavam agindo. Entre os séculos XIV e XV surgiu em alguns países europeus lendas sobre seres fantásticos, assim como, foi desenvolvendo-se o conceito de bruxaria. 

Na Suécia falava-se que os tomtes agiam com travessura, azedando o leite, estragando o queijo e a manteiga. Na Inglaterra tínhamos os brownies ou goblins como responsáveis por não fazer o queijo coalhar, a manteiga estragar rapidamente, os animais não darem leite. Eles também poderiam salgar sopas e estragar a cerveja e outros alimentos. Na Irlanda, Escócia, Alemanha, Islândia, entre outros países nortenhos, lendas sobre duendes e criaturas similares se difundiram entre o final do medievo e o começo da modernidade. Esses seres travessos tinham que receber suas "oferendas" ou "agrados" como tigelas com leite ou mingau, bolos, biscoitos, entre outros alimentos, do contrário, eles agiriam de forma traquina. (VELTEN, 2010, p. 46).

No entanto, em alguns lugares esses seres fantásticos foram substituídos pela figura das bruxas, mulheres que diziam praticar "magia negra" e terem feito um pacto diabólico. Essas mulheres agiriam de forma malvada, prejudicando indivíduos ou comunidades inteiras. Assim, lendas sobre bruxas roubando manteiga para fazer bruxaria, envenenando o gado, azedando o leite etc., além de termos relatos de bruxas sendo auxiliadas por demônios ou monstros a prepararem queijo, manteiga, coalhada e outros alimentos, passaram a se difundir no século XV e se desenvolveram nos séculos seguintes. 

Um demônio ajuda uma mulher (ou bruxa) a bater manteiga, enquanto uma lebre vermelha vomita leite num balde, sendo assistida por uma lebre branca. Pintura de Albertus Pictor, na Igreja de Ösmo, na Suécia. Século XV. 

A Virgem Amamentando

No Renascimento (XIV-XVI), um dos temas populares dos pintores italianos e franceses foi a Virgem Amamentando (ou Maria Lactans, ou Madonna do Latte). Vale ressaltar que a amamentação de Maria havia sido sacralizada ainda na Idade Média, como a lenda envolvendo São Bernardo Claraval no século XI. Dessa forma, nos séculos XIV e XV, temos pinturas mostrando Maria amamentando, temática essa que foi reaproveitada pelos artistas da renascença, proliferando vários quadros sobre o tema (VERNON, 2000, p. 694). 

Madonna Litta, Leonardo da Vinci, 1490-1491. 

Assim, importantes pintores como Sandro Botticelli, Leonardo da Vinci, Andrea del Verrochio, Lorenzo di Credi, Jean Fouquet, Jan van Eyck, entre outros, realizaram pinturas de Maria amamentando Jesus, o qual se tornou um símbolo de maternidade, amor, nutrição, crescimento, os quais foram sacralizados no ato de amamentar. Em parte essa importância também se deveu a Mariologia, ramo teológico que estuda a devoção, importância e mistérios da Virgem Maria. 

A vaca holandesa

Quando pedimos para alguém desenhar uma vaca, provavelmente a pessoa desenhará uma vaca branca com manchas pretas, isso se deve ao fato de que das raças bovinas leiteiras, a raça Holstein-Frísia, popularmente chamada no Brasil de "raça holandesa", seja a mais eficiente no mundo na produção de leite. 

Uma vaca Holstein-Frísia. A raça é atualmente conhecida por sua grande capacidade de produção de leite. 

A criação da Holstein-Frisia remontaria a Antiguidade, passando por séculos de seleção artificial para criar animais que produzissem cada vez mais leite. Todavia, os holandeses somente começaram a despontar com grande produtores de leite a partir da Idade Moderna, especialmente os séculos XVI e XVII, período conhecido como a "Era de Ouro dos Países Baixos". Nesse período a república neerlandesa se tornou uma potência militar e econômica mundial, possuindo empresas que tinham negócios nas Américas, África e Ásia, fundando colônias, explorando a produção de açúcar e café; os bancos holandeses cresceram consideravelmente, o país também atraiu muitos investidores, sua produção agrícola e pecuária aumentou consideravelmente. Dessa forma, os holandeses ficaram conhecidos por serem produtores de bom leite, queijo e manteiga. 

"Queijos holandeses, manteiga, e o leite tornou-se o ponto focal de discussões acaloradas sobre agricultura melhoria. Na indústria leiteira, conhecimento da natureza, perspicácia comercial, e o trabalho árduo veio acompanhado de uma energia quase combustível. Aqui estava um campo de provas digno para o que os historiadores hoje chamam de “milagre holandês”, o surgimento das Províncias Unidas como uma potência comercial líder impulsionado por uma população próspera e bem alimentada". (VALENZE, 2011, p. 84, tradução minha).

Dessa forma, os queijos holandeses começaram no século XVII a ganhar fama pela Europa, sendo exportados para a Alemanha, Dinamarca, França, Bélgica, Inglaterra, Escócia, Irlanda e outros países. Os queijos não chegaram a se difundir tanto entre Portugal e Espanha devido a Guerra dos Oitenta Anos (1568-1648), em que o império espanhol considerava a república neerlandesa como vassalos traidores por terem declarado sua independência e depois invadido o Brasil. 
A partir do século XVII os queijos holandeses começaram a ficarem internacionalmente famosos. 

O leite se espalha pelo mundo

No período moderno a produção de leite seguia crescendo em alguns países e regiões. Porém, o consumo de leite e laticínios foi levado às Américas, a Oceania e outras localidades da África. No caso do continente africano, a presença de leite e produtos lácteos é bastante antiga existindo há milhares de anos, destacando-se os egípcios no quesito. Além disso, tais alimentos eram consumidos principalmente por povos africanos próximos do Mediterrâneo, pois facilitava o contato com povos europeus e asiáticos, permitindo a compra de animais e até a importação de queijos. A situação somente mudou com a expansão islâmica nos séculos VIII ao XII, quando os árabes levaram criações de cabras e camelos para outras localizações saarianas e o leste africano, que consequentemente levou tais povos a passarem a consumir leite de cabra e de camela. (VELTEN, 2010, p. 28). 

Todavia, a expansão islâmica não adentrou determinadas localidades do continente, mas essas foram visitadas pelos europeus, especialmente os portugueses de início, mais tarde os franceses, ingleses, alemãs e belgas. No caso de Portugal, eles foram responsáveis por estabelecerem colônias no Cabo Verde e em São Tomé e Príncipe, ilhas desabitadas que receberam engenhos, fazendas e criação de cabras. Por sua vez, os portugueses também colonizaram a Guiné e Angola, e mantiveram contato no Congo. Eles levaram caprinos, suínos, equinos e bovinos para tais terras. 

A colonização espanhola, portuguesa, francesa e inglesa foi responsável por levar a pecuária bovina, caprina, ovina, suína e equina para as Américas. Além de criar-se esses animais por lá, os quais acabaram se adaptando bem a diferentes climas e territórios, o consumo de suas carnes se tornou hábito, assim como, beber seu leite (exceto das porcas e éguas), e produzir-se queijo, manteiga e coalhada. (VELTEN, 2010, p. 33). 

Os vários povos indígenas americanos desconheciam o hábito de consumir leite após deixarem de serem crianças, tampouco não conheciam os laticínios, então para eles foi uma surpresa. No entanto, havia uma exceção. Os incas os quais criavam lhamas (Lama glama), dos quais bebiam seu leite. É possível que outros povos que habitavam o que hoje são Colômbia, Equador, Peru e Bolívia pudessem tomar leite de lhama, mas isso carece de mais evidências, até porque os relatos de cronistas espanhóis apontam que entre as populações andinas do Império Inca, o consumo de leite de lhama era pouco usual, não era um hábito, condição essa que eles não tinham costume de fazer manteiga e queijo, vindo adquiri-lo com os espanhóis. (ROSENBERG, 2006, p. 383). 

Os incas consumiam leite de lhama, embora não fosse algo habitual. 

Por outro lado, não foi de imediato que os povos indígenas se acostumaram com esses novos alimentos, especialmente os laticínios bastante estranhos para eles, os quais eram encarados tendo sabor forte e ruim, e as vezes até causavam mal-estar, devido aos seus estômagos não estarem habituados a eles ou terem intolerância à lactose. 

Apesar disso, o desenvolvimento da colonização, o consumo de leite e laticínios foi se tornando cada vez normal. A pecuária teve seu papel também no processo colonizador de vários países americanos, destacando-se o Brasil e os Estados Unidos, em que na busca de pastos, a pecuária foi adentrando o interior do continente. No caso brasileiro, a partir da segunda metade do século XVII houve uma massiva expansão sertaneja motivada pela pecuária bovina, embora também procura-se por ouro, prata e joias, além de ir caçar indígenas para escravizá-los. Dessa forma, territórios como Maranhão, Ceará, interior da Bahia, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, tiveram sua colonização impulsionada pela pecuária bovina, que gerava carne, couro, leite, queijo e manteiga. (PRADO Jr, 2005).

Nos Estados Unidos, México e Canadá algo de similar ocorreu. Os rebanhos foram sendo empurrados atrás de pastos, invadindo-se territórios indígenas. Além de procurar terras para a pecuária e a agricultura, também procuravam-se metais preciosos. No caso estadunidense isso despontou no século XVIII, levando os Estados Unidos a entrar em conflito com o México pelas terras no oeste, o que veio a originar o Velho Oeste. (UDALL, 2004). 

Foto de uma criação de gado na Flórida. A busca por pastagens e a expansão da pecuária para sustentar o consumo de carne, leite e laticínios no século XIX, impulsionou a colonização do interior da América do Norte, ajudando a criar o atual território dos Estados Unidos. 

Assim, países como Brasil, Argentina, Uruguai, México Estados Unidos se especializaram na pecuária, criando grandes rebanhos, como desenvolveram laticínios, especialmente o queijo e a manteiga, havendo uma variedade desses. 

Luís da Câmara Cascudo (2014) relatou como o leite se encaixou tão bem na culinária brasileira. Ele menciona seu uso para se fazer pães, bolos, massas, mingau, curau (ou canjica), mungunzá, doce de leite, cuscuz com leite, cuscuz branco, leite com café, arroz de leite (ou arroz doce), uma variedade de doces e outros pratos. Cascudo lembra como o leite se tornou com o tempo alimento diário na mesa do brasileiro, ao lado do queijo e da manteiga. As vezes da coalhada e menos habitualmente do iogurte, sendo esse mais consumido hoje em dia por conta da industrialização. 

Arroz de leite ou arroz doce, é um típico prato brasileiro. 

O estado de Minas Gerais que começou a ser ocupado massivamente no final do século XVII devido a descoberta de minas de ouro, mas ele tornou-se no XVIII e XIX o maior produtor de leite e laticínios do Brasil. Sendo hoje notável o queijo minas, a ricota, o doce de leite e o requeijão. A preponderância de Minas Gerais como produtora de leite e carne bovina foi tamanha, que na primeira metade do século XX, os candidatos à presidência eram mineiros ou paulistas, devido a São Paulo deter a maior produção de café, o grande produto exportador do período. Por conta disso, aquele período que foi de 1898 a 1930 era chamado de "política do café com leite"

Entretanto, não foi apenas as Américas em que os povos nativos passaram a consumir leite, queijo e manteiga, em outras localidades do mundo isso também ocorreu. Um exemplo é o caso do Japão. Embora os japoneses já criassem porcos, cabras e cavalos há séculos, eles não tinham o hábito de tomar leite desses animais, tampouco produziam queijo e manteiga. De fato, foram os portugueses, holandeses e ingleses nos séculos XVI e XVII, quando passaram a ter negócios no país, que introduziram o costume de consumir tais alimentos, mas tal costume não se espalhou de imediato. 

Os japoneses que ingeriam leite e laticínios eram poucos, se limitando aos que viviam nas cidades portuárias frequentemente visitadas pelos europeus. Além da escassez de acesso a tais alimentos, havia a estranheza pelo sabor, especialmente da coalhada por ser azeda. Além desses alimentos, os europeus também introduziram no Japão o consumo de pão, açúcar, farinha de trigo, cerveja, vinho e outros produtos. Para os ricos, isso eram iguarias que valiam o investimento, para o restante da população eram produtos caros que eles jamais conseguiriam provar, e em alguns casos eram até vistos como exóticos. 

No século XIX houve no Japão tentativas de estabelecer uma indústria leiteira e queijeira, mas somente a partir do século XX é que os japoneses começaram a se interessar em beber leite, comer queijo, manteiga, iogurte e coalhada. 

O consumo regular de leite no Japão somente foi estabelecido no século XX, apesar que os japoneses tiveram contato com ele ainda no século XVI. 

"Embora o consumo de leite tenha permanecido estável ou diminuído no Ocidente durante os últimos 40 anos, o oposto é verdadeiro na Ásia, onde culturas tradicionalmente não-consumidoras de leite adotaram o líquido branco. O consumo da China aumentou massivamente 15 vezes, de 1964 a 2004, enquanto a Tailândia aumentou pela metade, com a Índia, o Japão e as Filipinas a registarem uma triplicação ou quadruplicação do consumo". (VELTEN, 2010, p. 116). 

No caso da Oceania, o consumo de leite e laticínios somente começou de forma modesta no final do século XVIII. Os ingleses passaram a colonizar a Austrália a partir de 1788, inicialmente tratando a vasta ilha como uma colônia penal, depois iniciou-se a pecuária bovina extensiva, a qual ajudou na colonização daquele país. Em período aproximado a Nove Zelândia também começou a ser colonizada, recebendo gado bovino, caprino e ovino. Mais tarde no século XIX e XX, outros arquipélagos da Oceania foram sendo colonizados pelos ingleses, franceses e americanos. 

Fotografia de gado da raça droughtmaster, de origem australiana. A Oceania foi o último continente a adotar o consumo de leite e laticínios regularmente. Atualmente a Austrália é um dos maiores produtores de gado bovino no mundo. 

Leite, chocolate e café

O chocolate era consumido por alguns povos indígenas da América Central como os maias e astecas, sendo no século XVI que os espanhóis tiveram contato com ele. Todavia, entre os indígenas o chocolate era bebido na forma de cerveja, podendo ser acompanhado de pimenta ou outras especiarias. Quando comido como uma pasta, ele tinha um gosto amargo, já que naturalmente o cacau é amargo. No entanto, quando os espanhóis levaram o chocolate para a Europa, os europeus trataram de incrementar isso, alterando o sabor para deixá-lo mais palatável ao gosto local, assim, no século XVII, na Espanha, França, Bélgica, Holanda, Inglaterra e Itália, os mestres-chocolateiros passaram a misturar o chocolate com leite e açúcar, originando o chocolate ao leite com seu sabor mais suave e doce. (LEMPS, 1998, p, 615). 

O chocolate ao leite foi uma invenção europeia para tornar o chocolate mais doce e macio, o que o deixou mais apreciável e tornou um doce popular nos séculos seguintes. 

Mas não foi apenas a combinação entre chocolate e leite que acabou dando certo, o café também se mostrou uma mistura acertada ao unir-se com o leite. O café foi difundido pelos árabes ainda na Idade Média, mas somente passou a interessar os europeus na Idade Moderna. Os árabes tomavam café puro, as vezes com açúcar ou alguma especiaria como a canela. Entretanto, no século XVIII quando os franceses começaram a apreciar o café, consideravam seu gosto forte, mesmo que misturado com açúcar, então eles começaram a misturá-lo com leite também. Há quem diga que foram os austríacos que desenvolveram o hábito de tomar café com leite, de qualquer forma, essa prática acabou se espalhando e até hoje se mantém, em que encontramos pessoas que somente bebem café se for adoçado e misturado com leite. (CIVITELLO, 2008, p. 169). 

O café com leite teria sido uma invenção francesa surgida no século XVIII. 

A industrialização do leite

Apesar do ser humano criar animais leiteiros há milhares de anos, no entanto, o consumo regular e amplo de leite é algo recente na História. Por séculos a maioria das pessoas que bebiam leite regularmente eram aqueles que viviam nas fazendas ou criavam vacas, cabras e ovelhas, podendo beber leite com maior frequência. Isso se devia ao fato de que não havendo uma forma eficaz de conservar o leite, isso inibia seu comércio a maiores distâncias. Somente em alguns países frios nos meses de inverno, a baixa temperatura ajudava a estender a conservação do leite, porém, na ausência de neve e gelo, o consumo de leite tinha que ser feito em poucas horas antes que ele coalhasse ou azedasse. Por conta disso, excetuando-se a população rural, a população urbana não tinha o hábito de beber leite regularmente, optando em consumir o queijo e a manteiga. 

Além disso havia outro aspecto a ser sublinhado, nem todo mundo gosta do sabor do leite, por conta disso, mesmo as pessoas que viviam da pecuária, optavam em ingerir queijo, coalhada e iogurte, ao invés de tomar leite. Outro fator que inibia o consumo regular de leite diz respeito a intolerância a lactose, desconhecida no passado, mas que afetava as pessoas causando náuseas, dores de barriga e vômitos; além disso, devido a falta de melhores técnicas de conservação e purificação do leite, ele poderia ser facilmente contaminado, então as pessoas para evitar adoecerem, não o bebiam. Vale ressalvar que animais doentes acabavam produzindo leite contaminado. 

No entanto, esse era usado na produção de pães, bolos, biscoitos, massas, mingaus etc. O consumo regular de leite começou a se desenvolver no final século XVIII com o surgimento da indústria leiteira, a qual seguiu crescendo e se aperfeiçoando nos séculos XIX e XX. Foi nesse período de mais de cem anos que surgiu mudanças na criação do gado leiteiro (especialmente o bovino), além do desenvolvimento de técnicas e tecnologias para potencializar a obtenção de leite, seu tratamento, conservação e transporte. 

No século XIX o inventor francês Nicolas Appert (1749-1841) realiza estudos e experimentos para desenvolver formas de melhorar a conservação de alguns alimentos, o que incluía conservá-los em garrafas e latas. Appert teria descoberto o leite condensado, apesar que esse fato seja contestado por parte dos historiadores, os quais creditam ao inventor americano Gail Borden (1801-1874), tal invento, tendo sido realizado em 1851 em caráter experimental. Condição essa que Borden com alguns sócios, investiram em mais experimentos para aperfeiçoar a fabricação de leite condensado, mas o intento que perdurou até 1858, fracassou comercialmente, embora Borden conseguiu desenvolver uma condensadora que agilizava o processo. (FRANTZ, 1948). 

Propaganda de 1898 do leite condensado da empresa de Borden. 

O leite condensado passa por um processo de remoção de 60% de sua água, mas em seguida recebe adição de açúcar, por isso ele é pastoso e doce. Com a difusão das latas, Borden adotou esse recipiente para guardar o leite condensado, pois ajudava no prolongamento da sua conservação que poderia durar até 12 meses em condições normais. O leite condensado apesar de ter fracassado como produto na década de 1850, mas ele finalmente deu certo a partir de 1864, quando Borden fundou a New York Condensed Milk Company. O produto foi na época incluído na ração dos soldados em campo, servindo de sobremesa. O que ajudou a popularizar o leite condensado nos Estados Unidos. Mais tarde o produto já era feito em outros países da Europa e exportado também, sendo bastante usado na produção de doces ainda hoje. (FRANTZ, 1948). 

"A taxa de expansão do leite condensado indústria fornece algumas dicas sobre o crescimento da produção leiteira neste momento. Entre 1890 e 1900, a quantidade de leite condensado produzido no Os Estados Unidos cresceram quase cinco vezes, de 38 milhões para quase 187 milhões de libras; com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, o número tinha atingiu mais de 875 milhões de libras. Demanda da Europa durante a guerra manteve a produção subindo, de modo que, em 1919, os Estados Unidos produziam mais de 2 bilhões de libras de leite condensado". (VALENZE, 2011, p. 187-188). 

Por sua vez, Gail Borden também desenvolveu um processo para produzir leite em pó em 1855, comercializando em seguida, apesar que existam contestações se ele teria sido o primeiro a inventar tal tipo de leite. Outros autores apontam inventores russos e franceses que teriam desenvolvido o leite em pó anteriormente. Ainda na década de 1850, os ingleses e suíços se interessaram pelo invento e passaram a investir nesse. O leite em pó inicialmente era considerado um produto voltado para as crianças, além de ser usado também para a fabricação de alguns doces. (VALENZE, 2011, p. 187). Na Suíça o químico e empresário Henri Nestlé (1814-1890) influenciado pelo leite em pó lançou em 1867 a farinha láctea. Um suplemento alimentar para crianças, ainda hoje vendido. (VELTEN, 2010, p. 74). 

O leite em pó passou a ser comercializado na década de 1850, tornando-se no começo do século XX um produto vendido em muitos países. 

O leite em pó se tornou uma alternativa para o consumo de leite, mesmo que algumas pessoas relutassem em usá-lo, alegando que ele era adulterado (apesar que tais problemas realmente ocorria), ainda assim, seu consumo foi crescendo consideravelmente. Em 1919, um ano após o término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), os Estados Unidos tinha exportado 44 milhões de quilos de leite em pó, a maior produção do mundo. Um valor colossal mesmo para os padrões da época. (VALENZE, 2011, p. 188). 

Outra invenção importante para o leite que margou o um dos grandes trunfos para prolongar a conservação do leite sem o uso da refrigeração, adveio do processo de pasteurização. Desenvolvido pelo químico francês Louis Pasteur (1822-1895) em 1862, a pasteurização consiste numa técnica para se reduzir a quantidade e microrganismos nocivos num alimento. O processo é simples: aquece-se o alimento acima dos 60 C por alguns minutos (ou segundos) e em seguida o refrigera à baixa temperatura rapidamente, isso causa um choque térmico que mata vários microrganismos. Dependendo do tipo de alimento, a temperatura de calor e de frio varia, assim como, o tempo em cada um. (VALENZE, 2011, p. 211-212; VELTEN, 2010, p. 85-87). No entanto, essa técnica simples foi revolucionária, pois permitiu prolongar a conservação do leite, mas de outros alimentos também como comidas enlatadas, ovos e bebidas como cerveja, vinho, água, sucos etc. 
Tabela mostrando o processo de pasteurização do leite. 

Embora a pasteurização tenha sido desenvolvida em 1862 e aplicada em seguida ao leite, no entanto, ela demorou décadas para se tornar um processo reconhecidamente necessário. Muitos países somente adotaram a pasteurização como obrigatória no século XX. Dessa forma, o leite pasteurizado é hoje em dia o mais consumido no mundo,. No entanto, existem algumas variedades quanto a isso. Com base na pasteurização foram criadas algumas categorias para identificar o leite que passa por tal processo. (VELTEN, 2010, p. 128). 
  • Leite Tipo A: a ordenha é 100% mecanizada e ocorre de um mesmo rebanho, não havendo contato humano. Sua taxa de bactéria é mínima. 
  • Leite Tipo B: a ordenha pode ser mecanizada ou manual, podendo usar mais de um rebanho. A taxa de bactéria é mediana. O leite é refrigerado antes de ser pasteurizado. 
  • Leite Tipo C: a ordenha pode ser mecanizada ou manual, porém, o leite não é refrigerado, sendo enviado diretamente para a pasteurização. Possui uma taxa de bactérias similar ao do Tipo B. 
A presença de bactérias no leite é normal, faz parte do produto. Neste ponto vale ressalvar que as pessoas que não tem costume de tomar leite retirado direto do animal (chamado de leite cru), não devem consumi-lo de imediato, devido a alta taxa de bactérias presentes, sendo recomendado sua fervura. Caso o consumo ocorra é provável que a pessoa tenha dores estomacais ou sinta enjoo. 

No entanto, além do processo de pasteurização, outro foi desenvolvido mais tarde baseado no mesmo, é o processo UHT (ultra high temperature). Esse processo pega o leite pasteurizado, adiciona alguns produtos químicos para ele não ter seus componentes perdidos durante o alto aquecimento, então coloca ele em pré-aquecimento para deixá-lo morno, depois o coloca para ser fervido a temperaturas de 130 C a 150 C por alguns segundos; em seguida o leite é transportado para contêineres herméticos, onde será resfriado rapidamente. Ali ele fica algum tempo descansando antes de ser envazado em caixas. Por conta desse processo o leite consegue ter uma conservação que perdura por meses, desde que mantenha-se a caixa fechada e em local fresco e arejado. Devido a isso ele é conhecido também como leite longa vida. (VELTEN, 2010, p. 128). 

A profissão de leiteiro

O ofício de leiteiro é antigo e se perde no tempo, não sabendo-se onde começou ou em que época isso ocorreu, pois leiteiros eram pessoas que iam de casa em casa, vender leite, mas também vendiam queijo e manteiga. Os leiteiros agiam na comunidade onde viviam, fosse um povoado, vilarejo ou vila. Caso a fazenda fosse próxima de uma cidade, ele poderia ir até ela. Todavia, o ofício de leiteiro se profissionalizou realmente a partir da segunda metade do século XIX com o avanço tecnológico dos meios de transporte, das garrafas de vidro, latas de leite, refrigeradores e o processo de pasteurização, o qual prolongava a durabilidade do leite. (VELTEN, 2010, p. 65-67). 

Com o progresso da indústria dos alimentos, a produção de leite e laticínios cresceu de forma avassaladora, permitindo que tais alimentos passassem a serem consumidos na dieta diária de pessoas de vários países europeus, no Canadá, Estados Unidos e alguns países latino-americanos. Na África e na Ásia com o atraso da industrialização, isso somente chegou no século XX. De qualquer forma, foram os europeus e estadunidenses que potencializaram a profissão de leiteiro, a qual surgiu em algumas cidades ou cresceu em outras que havia. Dessa forma, tais homens (pois acabou se tornando uma profissão masculinizada), logo cedo se dirigiam as fábricas ou depósitos para pegar as carroças de leite e partirem pelos bairros, vendendo o produto de porta em porta. Isso se repetia quase diariamente, pois dependendo da localidade a quantidade de entregas variava. 

Um leiteiro belga e sua esposa. A carroça de leite era puxada por cães. Fotografia tirada por volta de 1880. 

De início os leiteiros usavam latas feitas de alumínio, estanho ou latão. Dependendo do tamanho, poderiam transportar mais de 10 litros de leite. Essas latas eram carregadas nas carroças e as pessoas levavam panelas, garrafas, jarras e bacias para encher com o leiteiro. Mais tarde no começo do século XX com a difusão da indústria de garrafas de vidro, em alguns países tais latões foram sendo substituídos pelas garrafas de leite. No entanto, ainda hoje existem países em que tais antigas latas são utilizadas pelos leiteiros, algo que se ver na imagem a seguir. (VELTEN, 2010, p. 66). 

Um leiteiro nepalês transportando latas de leite. 

O comércio de leite cresceu no final do XIX e perdurou em alta até a década de 1960, pois em alguns países pelo mundo, as pessoas ainda mantiveram o hábito de comprar leite, queijo e manteiga com os leiteiros, embora que com o tempo tais produtos já fossem comercializados normalmente nos mercados e feiras. Mas em alguns lugares a profissão de leiteiro era respeitada e até vista como uma tradição, por isso perdurou por décadas. 

Carroças de leite em Helsinki, na Finlândia, na década de 1920. 

A entrega do leite por muito tempo era feita em carroças puxadas por cavalos, jumentos ou cães, mesmo que o automóvel tenha surgido ainda no XIX, ele não foi adotado de imediato. Fato esse que os carros de leite ainda demoraram para começarem a serem empregados, passando a serem uma realidade mais regular a partir da década de 1930, mesmo assim, somente em algumas cidades, pois havia casos em que na mesma cidade poderíamos ter leiteiros usando carroças e outros usavam carros, isso dependia da empresa para qual trabalhassem. (VELTEN, 2010, p. 9). 

Além de vender leite, queijo e manteiga, alguns leiteiros também passaram a vender pães, bolos, iogurte, coalhada, sorvete e outros produtos, mas no geral, o leite era o principal produto vendido. Inclusive já se disse que a profissão de leiteiro iria sumir totalmente, mas ela não sumiu. Em países como Inglaterra, Estados Unidos, Índia, Nepal, França, Itália, Irlanda, Suíça, em algumas cidades ainda existem tais profissionais, em que homens e mulheres usam carros para fazerem as entregas. Em geral são pessoas que trabalham para cooperativas ou pequenas empresas que procuram manter essa tradição do ofício do leiteiro ainda viva. 

A Inglaterra é um dos poucos países atuais onde a profissão de leiteiro continua a existir. 

Tipos de leite

Com o advento da industrialização tipologias para o leite foram criadas. Elas não se referem necessariamente a origem do leite, mas suas características quanto a presença de mais gordura, nata, vitamanis, nutrientes, lactose etc. 
  • Leite integral: leite que conserva sua gordura original, não tendo ela diminuída. 
  • Leite semidesnatado: parte da nata que representa a concentração de gordura, é removida. 
  • Leite desnatado: tem a maior parte da nata removida, sendo o menos calórico. Por conta disso, seu sabor e odor são diferentes do leite integral.
  • Leite fortificado: recebe a adição de vitaminas e nutrientes. É geralmente consumido por crianças e idosos com carência de nutrientes. Normalmente é vendido em forma de leite em pó, sendo bem mais caro. 
  • Leite sem lactose: devido ao problema de intolerância à lactose, esse leite passa por um processo que remove a lactose. 
  • Leite achocolatado: tipo de leite misturado com chocolate em pó. Normalmente passa por processo industrial, sendo vendido já dessa maneira. 
NOTA: O leite materno na espécie humana é dividido em três fases: colostro, sendo amarelo e produzido nos primeiros dias após o nascimento do bebê; o leite de transição, produzido entre o sexto e décimo quinto do nascimento da criança, sendo de coloração levemente amarelada, mais denso e rico em gorduras e carboidratos. Finalmente temos o leite maduro com sua coloração branca e vários nutrientes, o qual é produzido até o final do período da amamentação que é recomendado até os 2 ou 3 anos de idade. 

NOTA 2: Embora a função dos seios seja para a amamentação, no entanto, eles se tornaram partes sensuais e sexuais do corpo humano. No caso, a espécie humana é a única dentre os mamíferos a sentir atração sexual pelas mamas. 

NOTA 3: Os antigos egípcios, indianos e alguns povos africanos e asiáticos usavam manteiga para se fazer maquiagem. Por conta de ser viscosa, a maquiagem à base de manteiga concedia brilho para o rosto. 

NOTA 4: Para o povo Massai na África o leite é bebida sagrada, inclusive eles possuem um ritual no qual bebem leite misturado com sangue de vaca. 

NOTA 5: No Japão da segunda metade do século XVII com a expulsão dos europeus (exceto dos holandeses), o consumo de leite e laticínios foi proibido em grande parte do país, pois alegava-se ser um costume estrangeiro, não sendo algo da cultura nipônica. 

NOTA 6: A Yakult é uma empresa japonesa criada em 1938, e ela popularizou o consumo de leite fermentado, hoje difundido em vários países e considerado bebida de criança, embora que no Japão, Coreia do Sul e China, os adultos costumam tomar esse tipo de leite. 

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