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Leandro Vilar

sábado, 29 de março de 2025

A origem dos robôs

Cada vez mais a robótica tem se tornado uma ciência de destaque no século XXI. Embora os robôs atuais não sejam tão eficientes e inteligentes como vemos nas obras de ficção, no entanto, eles já progrediram bastante nos últimos 70 anos. Mesmo que para algumas pessoas esse progresso ainda seja demasiado lento. De qualquer forma, o presente texto buscou centrar-se em dois aspectos principais: de onde veio a palavra robô, quando ela passou a ser aplicada para se referir a um tipo de máquina, para em seguida vermos como surgiram os primeiros robôs, salientando que existem diferentes tipos de robôs. 

A palavra robô 

Essa palavra é de origem checa advindo de robota, termo utilizado para se referir ao servos, já que a República Checa e outros países vizinhos somente aboliram a servidão feudal no século XIX ou começo do XX. Dessa forma, originalmente o termo não designava um tipo de máquina, mas a condição social de pessoas sujeitas ao sistema feudal que ainda imperava em parte da Europa. A situação mudou quando o escritor e dramaturgo checo Karel Capek (1890-1938) escreveu a peça R.U.R (1920), cuja sigla significa Rossumovi Univerzálni Roboti (Robôs Universais de Rossum). 

Inicialmente Karel pretendia usar o termo labori (trabalhador em latim) para designar as máquinas que ele concebeu nessa peça de ficção científica, mas seu irmão Josef Capek (1887-1945), após ler o texto, percebeu que as máquinas atuavam como serviçais, então ele sugeriu usar uma palavra parecida com robota. Além de valorizar a língua nacional também, em detrimento de utilizar termos latinos. Assim, Karel criou o termo roboti para designar uma máquina humanoide. 

Capa da primeira edição.

Na peça R.U.R a empresa de Rossum desenvolveu uma tecnologia bastante avançada para seu tempo, criando um exército de robôs sintéticos, similares aos seres humanos (na prática eles seriam androides segundo a classificação atual), os quais foram chamados de robôs. Essas máquinas foram construídas para realizarem os mais diversos trabalhos e atividades a fim de libertar os humanos de trabalhos degradantes, arriscados, insalubres e enfadonhos. No entanto, em dado momento da narrativa os robôs que possuíam inteligência artificial avançada (embora esse conceito ainda estivesse sendo desenvolvido na época), decidem se rebelar e iniciam uma guerra para destruir a humanidade. Embora a ideia de Karel Capek de apresentar os robôs como um engenho da criação humana, ele já em 1920 os retratava como uma ameaça em potencial, adentrando as produções de ficção científica onde robôs se tornam inimigos dos humanos. 

Os autômatos

Há casos na História em que o conceito antecede sua nomenclatura, os robôs passaram por isso. Enquanto a palavra robô foi criada em 1920, no entanto, a ideia de robô é anterior, remontando ao conceito de autômato, o qual existe desde a Grécia Antiga, pelo menos. Os autômatos consistiam em máquinas feitas geralmente de madeira, mas as vezes de metal, que poderiam executar cálculos ou algum tipo de movimento mecânico como mover rodas, pás, cordas etc. Embora houvessem autômatos parecidos com pessoas ou animais, as quais executavam movimentos simples, geralmente mover a cabeça, braços, pernas e patas. Os autômatos eram movidos por energia a vapor, hidráulica, engrenagens ou sistema de polias. 

Embora os gregos tenham feito alguns autômatos, eles eram mais voltados para a curiosidade ou estudos científicos. Depois disso o seu fascínio se perdeu e eles foram esquecidos por séculos. Os árabes, persas e chineses resgataram o interesse por autômatos, exibindo-os em palácios e festejos. Construindo-os mais elaborados, com direito de alguns tocarem música ou imitarem o som de animais

No entanto, novamente eles foram esquecidos, somente retornando na Idade Moderna, onde filósofos, alquimistas, inventores e cientistas começaram a criar autômatos normalmente na forma de bonecos (não apenas como estátuas como era anteriormente comum no passado), os quais geralmente tocavam instrumentos ou escreviam alguma palavra ou frase. Os autômatos modernos se valeram bastante do desenvolvimento do sistema de engrenagens. Isso permitiu a criação de objetos, estátuas e até teatros de bonecos automáticos. 

Uma autômato do Pinóquio. 

Todavia, o autômato não possui um sistema operacional, mas um sistema mecânico que o faz executar funções bem simples. Apesar que na Idade Moderna tivemos autômatos construídos como um sistema de engrenagens vistos em alguns relógios. Inclusive alguns grandes relógios europeus possuíam autômatos. De qualquer forma, essas máquinas antecedem a ideia de robô, por serem instrumentos mecânicos que executavam algumas atividades. 

Autômatos num relógio do Colégio Maius, em Cracóvia. 

Neste ponto, os autômatos começaram a ganhar destaque na literatura de ficção científica e fantasia do século XIX, deixando de serem máquinas simples, para se tornarem algo mais sofisticado e até com consciência, similar aos robôs da ficção que hoje conhecemos. Assim, obras como The Sandman (1816) de E. T. A. Hoffmann, The Steam Man of the Prairies (1865) de Edward S. Ellis, Electric Man (1885) de Luis Senarens, A Eva Futura (1886) de Auguste Villiers de L'Isle-Adam, são exemplos de autômatos que se tornaram algo mais próximo de robôs como concebemos hoje em dia. Inclusive no livro A Eva Futura, temos o caso de uma bio-androide. 

O surgimento dos robôs

Se a ideia de máquinas com forma de pessoas ou animais, que executavam movimentos ou ações automaticamente é algo antigo e o conceito de robô surgiu em 1920, quando foi que os robôs surgiram propriamente? Devido a influência da ficção científica, na década de 1920 tivemos filmes, livros e desenhos mostrando robôs humanoides ou androides, inclusive algumas dessas máquinas chegaram a serem fabricadas como Eric (1928) e George (1932), os quais foram exibidos em feiras mundiais e eventos industriais e tecnológicos, mas na prática não eram robôs de verdade, apenas estátuas ou bonecos, alguns eram até mesmo autômatos. 

O robô George em 1932. Na prática ele não funcionava. 

Mais tarde a Westinghouse Electric Company lançou o Elektro em 1939, apesar de parecer um robô, tratava-se de um autômato, o qual reproduzia frases gravadas, além de mover a cabeça e os braços. No entanto, Elektro foi uma grande sensação na época, participando de turnês pelos Estados Unidos. Porém, a origem de robôs que conseguiam se locomover veio dez anos depois quando William Grey Walter, engenheiro da Burden Neurological Institute de Bristol, criou os robôs Elmer e Elsie entre 1948 e 1949, os quais faziam uso de baterias e conseguiam se mover a uma curtíssima distância. 

Entretanto, o primeiro robô eficaz foi o Unimate (1961), criado por George Devol para ser empregado na construção de veículos nas fábricas da General Motors. Embora não fosse um robô humanoide, tampouco não andava e nem falava, ainda assim, consistia num robô por executar ordens pré-programadas, funcionando a energia elétrica. 

O Unimate, o primeiro robô funcional da História. 

Assim, na segunda metade do século XX desenvolveu-se cada vez mais diferentes tipos de robôs usados em fábricas, além de robôs veiculares, utilizados para testes militares e espaciais. Enquanto isso no cinema, literatura, desenhos animados e videogames, robôs humanoides e robôs militares se tornavam cada vez mais comuns, porém, na prática isso ainda não seja uma realidade. 

No século XXI robôs de brinquedo passaram a serem comercializados, especialmente na forma de cachorros e bonecos, além de robôs aspiradores. Por sua vez, robôs humanoides ainda seguem em fase de experimentos, embora tenhamos empresas em países como Estados Unidos, China e Japão que vêm investindo nesse tipo de tecnologia, mas ainda não é viável para a comercialização. 

Robôs da Tesla em 2024. 

NOTA: Alguns dos primeiros filmes sobre robôs ou que mostram robôs foram: The Mechanical Man (1921), The Metal Giants (1926), Metropolis (1927), Automata (1929).

NOTA 2: Atualmente existem vários tipos de robôs sendo classificados de acordo com suas funções, usos e características. Assim, temos robôs industriais, militares, espaciais, domésticos, de brinquedo, nanorrobôs, robôs digitais etc. 

Referências bibliográficas: 

CRAIG, J. J. Introduction to Robotics. New Jersey, Pearson Prentice Hall, 2005. 

GUTKIND, L. Almost Human: Making Robots Think. New York, W. W. Norton & Company, Inc, 2006.

sábado, 22 de março de 2025

Os ginásios na Grécia antiga

Hoje a palavra ginásio evoca a ideia de uma quadra onde as pessoas realizam atividades físicas (embora no Brasil até certa época a palavra designava o ensino fundamental II). A concepção dos ginásios consistiu numa invenção da cultura grega clássica, no entanto, tais locais não eram voltados apenas para a educação física e os esportes, mas também era lugares de estudo, onde os frequentadores tinham aulas de filosofia, retórica, oratória, política, cidadania, direito, artes etc. Os gregos antigos em sua idealização de treinar corpo e mente, conceberam o ginásio como o local para isso. 

A palavra ginásio vem do grego gymnasion, que significa "treinar nu". Os gregos antigos tinham o costume de praticar atividades físicas desnudos, como forma de valorizar a beleza do corpo humano, poder se untarem com azeite ou óleos perfumados, além de desenvolverem resistência ao calor e o frio. Assim, os primeiros ginásios foram concebidos como locais voltados para as aulas de educação física e treinamento militar, dirigidos apenas aos homens, os quais ainda na infância começavam a frequentar esses lugares. 

Jovens treinando num ginásio. 

A cultura grega clássica (V-IV a.C) tinha um grande apreço pelo desenvolvimento das capacidades físicas e mentais, inclusive foram eles quem desenvolveram a noção de nu artístico e valorização de um corpo atlético. Além disso, a juventude masculina praticava atividades físicas como forma de treinamento militar para servir nas constantes guerras que assolavam o mundo grego. Pensando nisso, as cidades-estados tratavam de construir ginásios para essa finalidade, tornando-os uma instituição social pública, dirigida para formar inicialmente os militares, depois ampliando o uso dos ginásios para a prática do esporte e da educação escolar. 

Dessa forma, os primeiros ginásios eram apenas tendas e estruturas simples num campo, onde os homens se exercitavam, além de também treinar combate e táticas militares. À medida que se desenvolveu a educação clássica, os ginásios ganharam vestíbulos, banheiros, salas, escritórios, auditórios, refeitórios, bibliotecas etc., passando a consistir num centro educacional. Assim, os frequentadores não iam apenas para praticar atividades físicas, mas também estudar filosofia, política, retórica, artes, participar de palestras e debates, socializar. 

Em si, os ginásios eram espaços públicos e privados destinados ao mundo masculino, já que poucas mulheres tinham acesso aos mesmos, geralmente quando iam era como escravas para trabalhar ali em diferentes profissões, ou acompanhando os maridos. Embora houve alguns ginásios menores destinados apenas ao público feminino, já que homens e mulheres não se exercitavam ou estudavam juntos. 

Ruínas de um ginásio em Sardis, na Turquia. 

Vale frisar que os ginásios quando se tornaram maiores e melhor estruturados, alguns deixaram de atender o público geral, passando a serem destinados as elites e os cidadãos, lembrando que na Grécia Antiga o conceito de cidadania era restritivo. Dessa forma, três ginásios se destacaram no período clássico: a Academia de Platão, o Liceu de Aristóteles e o Cinosargo

O famoso filósofo Platão (428-348 a.C) foi fundada quando o filósofo tinha por volta de seus 44 anos, se tornando um dos ginásios mais famosos da História, além de influenciar até hoje a sociedade, já que a palavra academia tanto evoca local de atividade física, quanto local de atividade intelectual. No caso, a instituição fundada por Platão era a reunião de ambas as características. Assim, a academia platônica surgiu com uma instituição informal organizada por Platão e seus amigos e discípulos no subúrbio de Atenas, onde eles iam debater filosofia e política. Anos depois na década de 380, o local foi estabelecido como um ginásio, dedicado a Atena, Apolo e as Musas. Platão na época que comandava sua instituição permitia palestras restritas e abertas. 

O ginásio da Academia de Platão idealizado na pintura Escola de Atenas,
Rafael Sanzio, 1509. 

Já o Liceu, foi fundado por Aristóteles (384-322 a.C) na década de 330 a.C, inspirado na academia platônica, mas incluindo outras áreas do saber, como astronomia, matemática, lógica, física, biologia etc. Enquanto Platão foi um filósofo centrado em temas sobre epistemologia, política, sociedade, emoções, relações, Aristóteles já englobou outras áreas como a lógica, a ética e os estudos da natureza. Assim, o ginásio aristotélico tinha aulas para alunos inscritos, mas também palestras abertas ao público. 

No entanto, a Academia e o Liceu nem sempre permitiam a presença de não cidadãos as suas dependências, com isso, surgiu o Cinosargo, um ginásio público destinado a atender os homens não cidadãos, os quais tinham acesso a educação física e intelectual. 

Esses três ginásios também realizavam competições esportivas fechadas ou entre outros ginásios e cidades, além de haver eventos políticos, filosóficos e festivais religiosos, já que havia locais de culto ou pequenos templos nos ginásios, pois existiam deuses associados diretamente a educação como Atena, Apolo, as Musas e até o herói Héracles, tido como um patrono dos atletas e guerreiros. 

Os romanos interessados no modelo educacional grego adotaram o sistema de ginásios, mas com algumas modificações, incluindo as casas de banho chamadas de termas, que permitiam práticas de natação, mas também para o relaxamento, já que os romanos das grandes cidades gostavam de tomar banho quente para relaxar. 

NOTA: A cidadania na Grécia Antiga não incluía mulheres, escravos, adolescentes e estrangeiros. Somente homens maiores de idade, nativos das cidades-estados em que nasceram. Assim, ser cidadão significava estar apto a participar da política, exercer cargos públicos e poder votar. Por outro lado, não cidadãos poderiam exercer outras funções na sociedade. 

NOTA 2: A palavra ginásio também passou a ser associada com ginástica, já que entre as atividades físicas praticadas nos ginásios gregos estaria um tipo de ginástica inclusa. 

NOTA 3: Em alguns países como Brasil, Portugal, Espanha, França e Itália a palavra liceu pode ser usada para designar uma escola de ensino médio ou uma faculdade. 

Referências bibliográficas: 

LEVI, Peter. A civilização grega. Madrid, Folio, 2008. 

LYNCH, J. Gymnasium. In: ZEYL, D (ed.). Encyclopedia of Classical Philosophy. London, Greenwood Press, 1997. 

Link relacionado: 

Olímpia e os Jogos Olímpicos

quinta-feira, 13 de março de 2025

A Revolução Gloriosa (1688-1689)

Foi a segunda revolução inglesa ocorrida no século XVII, no entanto, se comparada a Revolução Puritana (1642-1649), a chamada Revolução Gloriosa, foi bem mais curta, simples e menos violenta, já que diferente da anterior que incorreu numa guerra civil que ceifou milhares de vidas, a segunda revolução não contou com a mesma violência da anterior. No entanto, a Revolução Gloriosa teve algo em comum com sua antecessora, ambas marcaram crises no governo monárquico e a troca de soberanos. 

Antecedentes

No ano de 1660 o rei Carlos II (1630-1685) foi coroado soberano da Inglaterra, Escócia e Irlanda, assumindo o trono de direito, que lhe foi vetado desde 1649, quando seu pai Carlos I foi executado durante a Revolução Puritana (1642-1649), a qual terminou próximo ao final da Guerra Civil Inglesa (1642-1651), acarretando na suspensão da monarquia e instituição de uma república parlamentarista (1649-1660), que acabou sofrendo uma série de problemas, especialmente por conta da ditadura imposta por Oliver Cromwell entre 1653 e 1658, então Lorde Protetor do país. (JONES, 1988). 

Após a morte de Oliver, seu filho Richard se tornou o segundo Lorde Protetor, mas a falta de experiência e apoio político, o levaram a pedir demissão do cargo em maio de 1660. O Parlamento testemunhando dez anos e uma república problemática e frágil, deliberou pelo retorno da monarquia, assim, o príncipe Carlos que estava exilado, foi convocado a assumir o trono naquele ano. 

Carlos II diferente do seu pai, não abusou tanto do poder e governou ao lado do Parlamento quase de forma pacífica, embora tenha enfrentado crises na década de 1670, levando-o a suspender o parlamento entre 1680-1685, conseguindo ter um longo reinado de 25 anos. Todavia, ele não deixou nenhum herdeiro legítimo, pois não gerou filhos com a rainha Catarina de Bragança, apesar de ter tido vários filhos bastardos, isso gerou uma crise de sucessão, porém, o Parlamento que foi restituído em 1685 deliberou em passar o governo para o irmão de Carlos, Jaime II (1633-1701). (JONES, 1988). 

Retrato do rei Jaime II da Inglaterra. 

Na época o novo rei tinha seus 52 anos, sendo casado a segunda vez, com Maria de Módena (1658-1718), uma princesa francesa, com a qual teve quatro filhos, mas por esses serem crianças, as herdeiras de Jaime II eram Maria e Ana, filhas do primeiro casamento com a rainha Ana Hyde (1637-1671), a qual teve oito filhos com rei, mas seis morreram durante a infância. (MILLER, 2000). 

Por ter vivido muitos anos na França, Jaime II converteu-se ao catolicismo e sua nova esposa também era católica, no entanto, a Inglaterra desde o século XVI vivia uma crise de intolerância religiosa. A religião oficial do país era o Cristianismo Anglicano, inclusive a imposição do credo anglicano ao reino unido como proposto pelo rei Carlos I, foi motivo para a Guerra dos Bispos (1639-1641), que culminou na Guerra Civil Inglesa (1642-1651). De qualquer forma, para a nobreza, o parlamento e o povo, um monarca católico era malvisto, considerado uma quebra de tradição, uma falta de respeito. E nem todos estavam aptos a tolerar tal condição. (MILLER, 2000). 

A Rebelião de Monmouth (1685)

Ainda no primeiro ano do reinado de Jaime II, o Duque de Monmouth, Jaime Scott (1649-1685), era um dos nobres que não concordavam que o rei e a rainha fossem católicos. No entanto, a decisão de fazer uma rebelião não era apenas por um motivo religioso, mas também havia um fator político e de ambição. Jaime Scott era filho bastardo do rei Carlos II, sendo sobrinho de Jaime II. Pela condição de ser bastardo, ele não tinha direito ao trono (apesar de ser um alto nobre). Assim, agindo de forma ambiciosa e traiçoeira, o Duque de Monmouth decidiu dar um golpe de estado contra seu tio. (JONES, 1988). 

Monmouth aliando-se a outros nobres contrários ao novo rei, como o Conde de Argyll, começou a arquitetar um plano de ataque: iniciar focos de revolta na Escócia e sul da Inglaterra, áreas turbulentas do reino, depois reunir um exército e sitiar Londres, forçando a renúncia do rei. 

Jaime Scott, Duque de Monmouth. 

Os conflitos tiveram início em maio, reunindo tropas leais ao duque, formadas por nobres, vassalos e plebeus que não aceitavam o governo de um rei católico. O plano inicial era tomar Bristol, para depois seguir para Londres, mas a falta de contingente militar adequado (havia poucos soldados profissionais e muitos camponeses sem experiência de guerra), prejudicou a estratégia, acarretando em várias derrotas ao longo de junho, culminando na fatídica Batalha de Sedgemoor em 6 de julho, onde os exércitos do rei obtiveram vitória esmagadora. (JONES, 1988). 

O Duque de Monmouth, entre outros nobres e aliados, foram capturados e declarados como traidores da nação. Monmouth foi decapitado em 15 de julho, os demais aliados foram sendo executados nas semanas seguintes. Os julgamentos se encerraram em fins de agosto. Dessa forma, Jaime II havia passado pelo seu primeiro teste de governo: uma traição familiar empreitada pelo seu sobrinho bastardo. 

A contestação de Guilherme de Orange (1688)

No começo de seu reinado, Jaime II como não tinha filhos homens, decidiu declarar sua filha mais velha, Maria (1662-1694), como herdeira. A princesa era casada com o príncipe holandês Guilherme de Orange (1650-1702) desde 1677, havendo a expectativa de que o casal futuramente seriam os novos monarcas, e ambos eram protestantes. (MILLER, 2000). 

Passada a Rebelião de Monmouth em 1685, Jaime II governou os anos seguintes sem grandes ameaças, já que ele decretou a criação de um exército fixo, mesmo em tempos de paz, um decreto determinado por seu irmão. Porém, as decisões mais problemáticas do rei vieram quando ele declarou liberdade de credo no país. A Inglaterra desde o século passado procurou banir católicos, judeus e até crentes de outras igrejas protestantes, tornando o Anglicanismo a única religião permitida no país. (MILLER, 2000). 

Retrato do rei Guilherme III da Inglaterra. 

O Lorde Protetor, Oliver Cromwell durante sua ditadura (1653-1658), permitiu o retorno dos judeus ao país (embora por motivos financeiros). No caso de Jaime II, em 1687, ele aprovou a Declaração de Indulgência para permitir que católicos, judeus, batistas, congregacionistas, calvinistas, presbiterianos, quakers, entre outras igrejas cristãs protestantes, pudessem ser estabelecidas no reino, além de que estrangeiros dessa fé eram bem-vindos. Isso foi considerado uma grande polêmica. E a situação se complicou quando o rei no ano seguinte convocou novas eleições parlamentares no intuito de conquistar a maior parte dos assentos com políticos favoráveis a ele. Muitos dos candidatos eram de outras religiões, os quais se tornaram simpatizantes do monarca. (JONES, 1988). 

Em 10 de junho de 1688 nasceu Jaime Francisco (1688-1766), o primeiro filho varão de Jaime II e Maria de Módena, o que o tornava o próximo na linha de sucessão. Isso causou novo rebuliço na corte. Até então a herdeira era Maria e seu marido Guilherme de Orange, mas com o nascimento de um príncipe, automaticamente ele passava na frente da irmã, mesmo ele sendo um bebê ainda. No entanto, a situação piorou quando o rei decidiu batizar a criança no catolicismo, o que atiçou a revolta dos conservadores religiosos. (MILLER, 2000). 

O príncipe Guilherme de Orange era um anglicano conservador e não concordava com a política de seu sogro, então decidiu agir. Em outubro ele abriu uma petição no Parlamento, contestando a decisão de seu sogro de batizar o jovem príncipe no catolicismo, além de retirar da princesa Maria a prioridade na linha de sucessão. Guilherme alegava que até o príncipe Jaime Francisco alcançar a maioridade, isso demoraria muitos anos, logo, sua irmã deveria ser preterida a suceder o trono inglês. É evidente que Guilherme ambicionava se tornar rei. 

Jaime II não gostou nada da petulância e ambição do seu genro e mandou rebater sua Declaração de Motivos, ainda em outubro. Guilherme que até então estava passando uma temporada na Holanda, decidiu em novembro voltar a Inglaterra para confrontar o sogro. 

O rei tendo percebido a ambição do genro, tratou ainda em novembro de convocar o Parlamento para deliberar a nomeação do pequeno Jaime Francisco como herdeiro legítimo do trono, assim, barrando qualquer contestação de Guilherme. No entanto, o príncipe holandês não estava determinado a desistir de sua ambição, se fosse necessário, haveria guerra para isso. Assim, eclodiu a Revolução Gloriosa(JONES, 1988). 

Guilherme de Orange usando seus contatos e influência, conseguiu reunir uma pequena tropa e com ela invadiu a Inglaterra em novembro de 1688. Ali ele ganhou adesão de outros nobres e plebeus, os quais viam no príncipe um monarca mais honrado e comprometido com a nação. O rei ainda enviou o exército para confrontar a traição de seu genro, vindo a ocorrer a Batalha de Reading em 9 de dezembro, nos arredores de Berkshire. Entretanto, o exército invasor era superior e derrotou as tropas reais. (JONES, 1988). 

Jaime II tomando conhecimento da derrota e de que mais reforços inimigos estavam a caminho, ele embarcou com a esposa e os filhos e fugiram para a FrançaO Parlamento considerou um grande ato de covardia de Jaime II, por outro lado, parte dos parlamentares também não apoiavam a traição de Guilherme contra o rei. Assim, ele foi convocado para se explicar. 

Os novos soberanos 

Guilherme passou o mês de janeiro de 1689 dando suas explicações de porque arquitetou um golpe de estado para derrubar seu sogro. Os parlamentares em maioria concordaram com os motivos, assim, ele e a esposa foram coroados novos monarcas da Inglaterra, Escócia e Irlanda em fevereiro, tornando-se Guilherme III e Maria II. (MILLER, 2000). 

A partir da França, Jaime II manteve contato com seus apoiadores e tentou manobras e articulações políticas para invalidar a coroação do genro e da filha, alegando conspiração, traição, crime de lesa-majestade, golpe de estado etc. O embate se alastrou pelos meses de 1689, já que parte do parlamento (mesmo sendo a minoria), discordava da entronização de Guilherme III e Maria II, já que a transição foi ilegal. 

Por sua vez, Guilherme procurou garantir seu governo, articulando seus apoiadores na nobreza e no parlamento, porém, ele também teve dificuldades, pois os parlamentares apresentaram um projeto de reforma das leis chamada Declaração dos Direitos, o qual restringia os poderes do monarca. Guilherme deliberou sobre a proposta e concordou com ela em dezembro de 1689, mesmo que não concordasse contudo aquilo, já que ela aumentava a autoridade parlamentar e lhe concedia proteção frente ao abuso de poder dos reis. Mas ele sabia que se fosse favorável ao Parlamento, isso asseguraria seu apoio e permanência no trono. (MILLER, 2000). 

Página da Declaração dos Direitos de 1689. 

Jaime II retornou nesse meio tempo a Inglaterra e tentou reunir tropas para sitiar Londres e confrontar o genro traidor, mas não conseguiu formar um exército apto a tal projeto, então desistiu do intuito e aceitou a derrota, deixando o país novamente. Jaime II devido a proteção do rei Luís XIV, viveu o resto da vida em território francês, embora gozasse do conforto da realeza, ele era visto como um rei sem reino. Por sua vez, Guilherme III manteve-se como rei até o fim da sua vida em 1701, tendo conquistado o trono durante a Revolução Gloriosa, na prática um golpe de estado promovido por uma traição familiar. (MILLER, 2000). 

Referências bibliográficas

JONES, J. R. The Revolution of 1688 in England. [s. l], Weidenfeld and Nicolson, 1988. 

MILLER, John. James II. New Haven, Yale University Press, 2000. 

Links relacionados: 

A Revolução Puritana (1642-1649)

O Protetorado: A ditadura de Cromwell (1653-1658)

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

O Protetorado: a ditadura de Cromwell (1653-1658)

Oliver Cromwell foi um nobre inglês que ingressou na política ao ser eleito ao Parlamento em duas ocasiões, no entanto, ele se destacou na História por sua participação na Guerra Civil Inglesa (1642-1649), o que o fez surgir como herói de guerra, depois sendo eleito Lorde Protetor, presidindo um projeto republicano do Reino Unido, que acabou se tornando uma ditadura. 

Introdução

Oliver Cromwell (1599-1658) era filho de Richard Cromwell e Elizabeth Steward. Por linhagem paterna, Oliver descendia da baixa nobreza, apesar que seu pai fosse senhor de terras, herdou dívidas da família, legando-as aos filhos. Muitos anos depois, já adulto, Oliver teve que vender parte de suas propriedades para quitar as dívidas da família, no entanto, em 1620, casou-se com Elizabeth, com quem teve nove filhos. Ela era filha do rico comerciante James Bourchier, o qual abriu as portas para Oliver ao mundo dos negócios. (HILL, 1988). 

Retrato de Oliver Cromwell como Lorde Protetor. 

Graças aos contatos de seu sogro, Oliver conseguiu fazer bons negócios, recuperando parte de sua fortuna e ganhando prestígio na região. Em 1628, ano em que o Parlamento foi reestabelecido pelo rei Carlos I, Cromwell se candidatou ao Parlamento por Huntindgton, sua cidade natal. A candidatura acabou dando certo e Oliver foi eleito, na época com seus 29 anos, ele defendia ideias republicanas. No entanto, sua carreira como político foi breve, pois o rei fechou o Parlamento novamente no ano seguinte. Carlos I era conhecido por ser um monarca absolutista, sendo autoritário. (HILL, 1988). 

Com a suspensão do Parlamento em 1629, Cromwell retornou a se dedicar aos negócios, mas manteve-se presente nos debates políticos da época. Dez anos depois, durante a Guerra dos Bispos (1639-1640), conflito entre escoceses e ingleses, pois Carlos I pressionou a Escócia a adotar o credo anglicano ao invés do credo calvinista que operava naquela parte do reino, uma guerra eclodiu. Precisando de ajuda e recursos, o rei reabriu o Parlamento em 1640. Os parlamentares eleitos anteriormente, incluindo Cromwell, foram convocados. 

O rei em apuros foi pressionado por contrapropostas dos parlamentares para concordar com uma série de concessões, uma delas era que o Parlamento não poderia ser mais dissolvido pelas ordens dele, recuperaria sua autonomia e plenas funções, algo que deu certo. Porém, a contragosto, Carlos I concordou com isso, mas discordou de outras exigências, incluindo sua abdicação diante da crise gerada por ele. O rei abandonou Londres em 1642, indo para Nottingham se reunir com seus servos leais, isso foi considerado um ato de traição pelos parlamentares. Cromwell se uniu aos políticos mais radicais, que declararam guerra ao rei. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

A Guerra Civil (1642-1651)

O país se viu dividido entre duas frentes inimigas: os realistas que formavam os exércitos fiéis ao rei Carlos I e os parlamentaristas que representavam as tropas leais ao Parlamento. Nos meses de 1642 ambos os lados trataram de reunir suas forças, iniciando alguns pequenos conflitos. Para surpresa do Parlamento o rei possuía mais apoio do que era esperado, fato esse que no ano de 1643 as batalhas travadas foram acirradas e algumas delas resultaram na vitória dos realistas. Por sua vez, o Parlamento assegurava o controle de Londres e arredores, enquanto Carlos I estabeleceu-se em Oxford(YOUNG; ROFF, 1973). 

O 3o Conde de Essex, Robert Devereux, tomou a dianteira no comando das forças parlamentares, conseguindo entre 1642 e 1643 reunir 10 mil soldados. Cromwell uniu-se ao conde para comandar também as tropas em algumas batalhas. O ano de 1643 foi favorável para os realistas, especialmente após o Príncipe Rupert do Reno (1619-1682) chegar à Inglaterra para apoiar o rei. Graças aos cavaleiros alemães que ele trouxe, a balança de guerra pendeu favorável aos realistas, que obtiveram importantes vitórias naquele ano. Cromwell notando que uma cavalaria leve e ligeira estava fazendo bastante diferença no campo de batalha, decidiu montar uma para o exército parlamentar. 

Ainda em meados de 1643, Oliver Cromwell criou um regimento de cavalaria chamado Ironside, do qual se tornou seu principal comandante, obtendo êxito no segundo semestre daquele ano e aumentando seus números em 1644, resultando nas importantes vitórias da Batalha de Marston Moor (2 de julho) e na Segunda Batalha de Newbury (27 de outubro). Os Ironside não apenas foram cruciais para que o exército parlamentar sobrepujasse o exército realista, mas também garantiram fama a Cromwell como liderança militar e herói de guerra. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

Batalha de Marston Moor(1644). Pintura de J. Baker, 1886. 

No ano de 1645, os nobres parlamentares Thomas Fairfax e Edward Whalley, os quais comandaram tropas na guerra civil, baseados no desempenho e organização das tropas do Ironside propuseram uma reforma militar conhecida como Novo Exército Modelo (New Model Army), que consistia na reconfiguração dos regimentos, batalhões e demais divisões do Exército, além de hierarquias de comando, quantidade de tropas, táticas militares etc. Cromwell foi um dos quais contribuiu para essa reforma militar, a qual resultou em êxito com novas vitórias na Batalha de Naseby (14 de junho) e na Batalha de Langport (10 de julho). (HAYTHORNWAITE, 1994). 

A primeira parte da guerra civil entrou numa trégua em 1646, quando o rei Carlos I foi capturado e preso na Escócia, onde havia fugido para se esconder e reunir reforços. Ele seria levado a julgamento por seus crimes, porém, isso demorou meses para acontecer. O monarca ficou preso em Londres, aguardando o tribunal que o julgaria, mas ele conseguiu escapar com a ajuda de apoiadores e fugiu para a ilha Wight no sul do país, onde permaneceu protegido pelo restante do ano de 1646 e 1647. Enquanto isso, ele expediu várias cartas para seus aliados, incluindo negociar com o Parlamento Escocês, o qual acabou fechando acordo e enviou um exército chamado Engagers (ou Engagement) para invadir a Inglaterra em 1648(YOUNG; ROFF, 1973). 

No entanto, o novo exército inglês controlado pelo Parlamento, era forte, unido e eficaz, conseguindo barrar as tentativas escocesas de resgatar o rei e levá-lo vitorioso a Londres, onde ele pretendia sitiar a capital e forçar a dissolução do Parlamento. Entretanto, Cromwell e os outros parlamentares obtiveram vitórias ao longo de 1648, minando qualquer chance do rei Carlos I conseguir reassumir o trono, resultando novamente em sua captura. Dessa vez, o esquema de vigilância sobre o rei foi melhorado e ele não conseguiu escapar. O monarca foi condenado a pena de morte por seus crimes num tribunal formado por 100 juízes, sendo executado diante do Palácio Whitehall em 30 de janeiro de 1649(YOUNG; ROFF, 1973). 

Apesar da morte do rei tirânico, o país não ficou em paz. Revoltas ainda ocorriam na Escócia e na Irlanda, levando o Parlamento a ter que enviar tropas para lá. Cromwell pessoalmente viajou com alguns regimentos dos Ironside para a Irlanda, ainda em 1649, e depois entre 1650-1651 para Escócia. Em ambos os casos ele foi criticado pelo excesso de violência aplicado fora das batalhas, autorizando saques e massacres. (YOUNG; ROFF, 1973). 

Mas enquanto a guerra civil ainda não chegava ao fim, o Parlamento convocou sessões para deliberar pelo controle do país, vetando a eleição de um novo rei e criando a Comunidade da Inglaterra (Commonwealth of England), um projeto de estabelecer uma república parlamentarista, primeiramente sobre Inglaterra e Gales, mais tarde estendido para a Escócia e a Irlanda.

Brasão de armas da Comunidade da Inglaterra. 

Assim, entre 1649 e 1653, período em que a guerra civil ainda perdurava na sua terceira fase, a singela "república" inglesa ainda não havia conseguido se firmar como um poder reconhecido pelo Commonwealth. Esse período ficou conhecido como Parlamento Manco (Rump Parliament), nome dado aos desentendimentos gerados nos primeiros anos da jovem "república" inglesa, em que os parlamentares ainda se desentenderam quanto as mudanças políticas a serem implementadas, destacando-se crises políticas envolvendo uma reforma tributária e a liberdade de credo

Em 1651 participando do controverso Parlamento Manco, Cromwell presidiu a votação para aprovar o Ato de Navegação, uma medida para fortalecer a economia do país. A lei determinava que todas as mercadorias exportadas da Inglaterra somente poderiam serem feitas com navios ingleses, não por mercadores de outros países. Além disso, o ato também estipulava que se desse preferência a navios ingleses na importação. O parlamento aprovou a proposta aplicando-o ainda naquele ano, mas isso irritou bastante os holandeses, pois na época eles tinham a maior frota da Europa, sendo responsáveis por alugar navios, além de agirem como intermediários no transporte marítimo. A Inglaterra devido a proximidade com a Holanda, era um dos principais clientes do país. Com o Ato de Navegação, isso comprometeu a economia holandesa, levando a ocorrer a Primeira Guerra Anglo-Holandesa (1652-1654). Diante de tais problemas, Cromwell, um parlamentar respeitado devido aos seus serviços prestados durante a guerra civil, decidiu se concentrar na política. (WOOLRYCH, 1982). 

O Lorde Protetor (1653)

Descontente com a crise do governo do Parlamento Manco, Cromwell voltou a assumir suas funções parlamentares ainda em 1651, e no ano de 1653, valendo-se de sua autoridade e influência conquistados ao longo dos anos de guerra civil, o que o levou a ser visto como um herói de guerra por alguns, ou um comandante sanguinário por outros, de qualquer forma, Cromwell soube se valer de articulações políticas para firmar seu caminho até o poder. (HILL, 1998). 

Neste caso, com o apoio de seus aliados, foi estabelecido o Parlamento Barebone, uma referência a Praise-God Barebone, um dos parlamentares de Londres, apoiador de Cromwell. O novo parlamento contou com a eleição de novos membros no intuito de se criar uma nova gestão, dessa vez mais eficiente do que a do Parlamento Manco. Entretanto, sem chegar a um consenso quanto a isso, parte dos novos eleitos eram favoráveis a Cromwell, então decidiram sugerir seu nome para liderar o governo. (HILL, 1998). 

Assim, criou-se o cargo de Lorde Protetor, uma espécie de primeiro-ministro ou presidente, mas no caso, com autoridade acima do comum. Cromwell deliberou sobre essa oferta e fez o juramento de aceitar essa honra e missão (ele considerava tal condição como um ato divino, destinado a ele por Deus) em dezembro de 1653. Assim, ele oficialmente se tornou o Lorde Protetor da Comunidade da Inglaterra, Escócia e Irlanda, reunindo em si autoridade civil e militar, embora ele ainda devesse governar dependente ao Parlamento. Cromwell jurava em servir o país pelo bem da nação e do povo, dedicando a protegê-lo de ameaças externas e internas. 

O Protetorado: a ditadura de Cromwell (1653-1658)

No ano de 1654, Oliver Cromwell colocou seu gabinete para trabalhar numa reforma política geral para a república, algo que levou meses para ficar pronto, começando as propostas a serem votadas apenas em setembro daquele ano. A ideia era realizar algumas mudanças na diplomacia, acordos comerciais, tributação, liberdade de credo, entre outros assuntos, mas de forma moderada. No entanto, algumas das suas propostas encontraram críticas negativas, especialmente as voltadas ao seu projeto militar no exterior, na guerra contra os holandeses, além de instaurar um governo militar no país. (WOOLRYCH, 1982). 

Cromwell insatisfeito com a oposição surgida no Parlamento, em janeiro de 1655, suspendeu o mesmo, já que o cargo de Lorde Protetor permitia ele fazer isso. Tal decisão foi um sinal claro de que o autoritarismo dele estava se instalando definitivamente. Após a suspensão do Parlamento, proibindo de votar as reformas políticas e outros assuntos, Cromwell passou a governar sozinho por alguns meses. Ele dividiu o país em quinze regiões militares governadas cada uma por um major-general, os quais tinham autoridade para usar a força para manter a ordem, a paz, a justiça e o controle, e se reportavam diretamente ao Lorde Protetor. (WOOLRYCH, 1982). 


Brasão de Armas do Protetorado. 

O projeto de Cromwell foi malvisto por parte dos políticos e da população, considerado um ato de autoritarismo. Hoje tal decisão é até mesmo vista como uma prática de uma ditadura militar. Todavia, a estrutura de regiões administrativas civis-militares acabou fracassando por falta de organização, sendo suspensa em 1656, principalmente devido as críticas dos políticos e de parte da população, os quais denunciavam os abusos de poder cometidos pelos major-generais e seus homens. (HILL, 1998). 

Enquanto Cromwell saía derrotado quanto a tentativa de reorganizar a divisão administrativa do país, ele tentou uma jogada política interessante no quesito econômico. Vendo que os judeus foram responsáveis em parte por impulsionar a economia da Holanda, Cromwell decretou que os judeus poderiam retornar a Inglaterra, já que haviam sido expulsos muito tempo antes. Além de incentivar a migração judia e permitir a liberdade de credo, isso foi feito pensando no quesito econômico, já que seu interesse era atrair os ricos comerciantes judeus, não os judeus pobres. Apesar do projeto ser voltado para impulsionar a economia, a população mais conservadora e intolerante, não aceitou de bom grado o retorno dos judeus ao país, vistos como um povo ardiloso e praticantes de uma fé herege. (WOOLRYCH, 1982). 

Quanto a Escócia e a Irlanda, ambos foram escanteados no governo de Cromwell, o qual não deu atenção a tais regiões, as quais ainda nutriam raiva pelo que ele mandou fazer durante o final da guerra civil. Além disso, o Lorde Protetor também gastou dinheiro com campanhas no exterior, apesar de vencida a Primeira Guerra Anglo-Holandesa (1652-1654), os acordos comerciais externos seguiam enfraquecidos, além de que a Inglaterra ainda estava desenvolvendo suas colônias na América do Norte e disputando algumas ilhas no Caribe e Antilhas

No ano de 1657 alguns parlamentares propuseram que Cromwell se tornasse rei, numa tentativa de melhorar sua reputação diante do povo, já que desde sua origem a Inglaterra sempre foi uma monarquia. A então república parlamentarista (na prática, uma ditadura civil-militar) não era bem vista pelo povo, a nobreza e os políticos. Entretanto, Cromwell recusou ser entronado como rei, no entanto, aceitou honrarias similares, ao passar por uma cerimônia que reafirmava seu cargo como Lorde Protetor. (WOOLRYCH, 1982). 

Dessa forma, dava-se início a um novo momento de seu governo autoritário e visivelmente em crise desde 1656, no entanto, Cromwell acabou adoecendo de forma inesperada em fins de agosto de 1658, vindo a falecer em 3 de setembro daquele ano. A causa de sua morte é inconclusiva. Alguns sugerem que ele adoeceu e assim morreu, outros cogitaram que ele possa ter sido envenenado, já que devido ao seu governo ditatorial, Cromwell conquistou muitos inimigos. 

Crise sucessória e a volta da monarquia (1658-1660)

A morte de Oliver Cromwell aos 59 anos tomou o país de surpresa, já que até então ela não aparentava estar doente a bastante tempo. Assim, uma crise sucessória se instaurou: o cargo de Lorde Protetor seria encerrado? Um novo protetor seria escolhido? Ou o Parlamento reassumiria sua função como visto entre 1649 e 1653? A resposta foi que os aliados da família Cromwell decidiram manter ela no poder. 

Richard Cromwell (1626-1712) era o terceiro filho de Oliver, não tendo desenvolvido uma carreira militar e política de destaque. Ele como seus irmãos, viveram à sombra do prestígio e fortuna adquiridos por seu pai. Em 1657, Richard foi nomeado reitor da Universidade de Oxford e no ano seguinte ganhou um assento no Conselho de Estado. Por ser na época o filho mais velho de Oliver, cogitou-se que ele seria seu sucessor político. (HILL, 1988). 

Richard Cromwell, o segundo Lorde Protetor do Protetorado. 

Assim, após o sepultamento de Oliver em setembro de 1658, o Parlamento do Protetorado deliberou passar o cargo de Lorde Protetor para Richard, mas isso foi questionado pelo comando militar e os políticos. Lembrando que o protetor era um chefe civil-militar. Assim, o Exército não viu de bom grado a indicação de Richard, pois ele não era militar, tampouco lutou na guerra como seu pai fez. Já os políticos também apontaram a falta de experiência de Richard na política. Apesar disso, uma assembleia foi convocada em novembro e no mês seguinte, Richard Cromwell foi eleito novo Lorde Protetor. 

Em janeiro de 1659 ele presidiu a primeira sessão do Parlamento do Protetorado, no entanto, Richard enfrentou uma série de oposições, intrigas e problemas envolvendo desavenças entre os parlamentares civis e militares. A falta de carisma, autoridade e experiência em lhe dar com o jogo político, levou Richard a pedir demissão em maio de 1659(HILL, 1988). 

Com a saída de Richard Cromwell do poder, o Parlamento assumiu suas funções do Executivo, governando pelo restante de 1659, sendo deliberado encerrar o projeto republicano em 1660, quando o príncipe Carlos foi convocado do seu exílio na França, chegando em maio daquele ano a Londres, onde foi coroado rei Carlos II. Dessa forma, o sonho republicano na Inglaterra durou dez anos, se mostrando um fiasco, já que parte desse período, especialmente durante o governo de Oliver Cromwell, vigorou uma ditadura civil-militar. 

Referências bibliográficas

HAYTHORNWAITE, Philip. The English Civil War 1642-1651. An Ilustrated Military History. London, Brockhampton, 1994. 

HILL, Christopher. O eleito de Deus: Oliver Cromwell e a Revolução Inglesa. Tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura. São Paulo, Companhia das Letras, 1988. 

WOOLRYCH, Austin. Commonwealth to Protectorate. Oxford, Clarendon Press, 1982. 

YOUNG, Peter; ROFF, Michael. The English Civil War. London: Osprey, 1973. 

Links relacionados:

A Revolução Puritana (1642-1649)

A Revolução Gloriosa (1688-1689)

sábado, 15 de fevereiro de 2025

A Revolução Puritana (1642-1649)

Na Inglaterra do século XVII ocorreram duas revoluções importantes, as quais ficaram conhecidas como "revoluções inglesas", "revoluções liberais" e até "revoluções burguesas". Entretanto, os termos liberal e burguês são questionáveis por parte dos historiadores, pois o Liberalismo criado pelo filósofo John Locke (1632-1704), ainda estava sendo desenvolvido e inexistia na época da Revolução Puritana, por sua vez, os envolvidos nas duas revoluções não eram apenas burgueses, mas também nobres indignados com o governo dos reis, além de haver membros das classes baixas que lutaram nos conflitos. De qualquer forma, o presente texto abordou a primeira das revoluções inglesas, chamada de Puritana, marcada pela eclosão de uma sangrenta guerra civil que perdurou por seis anos. 

Motivos

Os séculos XVII e XVIII marcaram na Europa o auge da política do Antigo Regime, definida por monarquias centralizadoras e absolutistas, em que os monarcas possuíam uma grande e excessiva autoridade, sendo até considerados "eleitos por Deus" para estarem ali. Tais soberanos em muitos casos ignoravam os seus conselheiros, câmaras, senados e parlamentos, podendo inclusive passar por cima das leis pelo seu bel-prazer, gerando o descontentamento de vários setores da sociedade, assim como, fomentando problemas graves para seus reinos. Com a Inglaterra isso não foi diferente. 

Durante o reinado de Carlos I (r. 1625-1649), o monarca tomou algumas medidas bastante impopulares, a primeira mais significativa foi entrar em conflito com o Parlamento, pois esse tinha autonomia para julgar leis e tomar decisões, diminuindo a plena autoridade do soberano. Após quatro anos de embates, Carlos I numa decisão surpreendente, ordenou o fechamento do Parlamento em 1629, o que levou uma série de indignações por seus membros, mas como ele contava com apoio das forças armadas e de parte da nobreza que era favorável a isso, a situação não se complicou tanto. (YOUNG; ROFF, 1973). 

O rei Carlos I em pintura de Anton van Dyck, c. 1635. 

Em segundo lugar teve todo o jogo de interesses do rei quanto a questão religiosa da época. Os séculos XVI e XVII foram marcados pelas guerras religiosas entre católicos e protestantes, conflito ocorrido em alguns países europeus gerando verdadeiros massacres. No caso inglês, Carlos I era anglicano (protestante), mas casou-se com Henriqueta Maria em 1625, uma rainha católica, tal decisão foi desaprovada pela nobreza e aristocracia anglicana. (YOUNG; ROFF, 1973). 

A Inglaterra era uma nação protestante desde 1534 quando o rei Henrique VIII rompeu com a Igreja Católica e fundou a Igreja Anglicana, tornando-a a referência para o cristianismo oficial no seu reino. Sendo assim, já fazia quase um século que essa mudança havia ocorrido, o catolicismo tornou-se estigmatizado na Inglaterra, apesar de ser tolerado, porém, o anglicanismo já era visto como uma tradição relativamente antiga, logo, um rei optar em casar-se como uma católica foi considerado afrontoso. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

A terceira medida controversa foi quanto a estratégia referente a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648). O conflito havia começado na época do governo de seu pai, o rei Jaime I, o qual ainda investiu nessa guerra, mas depois que Carlos I subiu ao trono, foi perdendo interesse nessa guerra, já que os ingleses entraram nela para apoiar seus aliados. Dessa forma, os alemães e outros aliados dos ingleses passaram a ver de forma negativa a falta de interesse e compromisso do novo soberano, além de que os generais que comandavam as frentes de trabalha se queixavam da falta de envio de recursos e reforços para o front. (YOUNG; ROFF, 1973). 

A quarta decisão problemática do rei foi se intrometer na disputa política dos bispos. Desde a Antiguidade era comum haver politicagem entre os bispos, já que além de serem autoridades eclesiásticas, eles também detinham poder político. No caso do reinado de Carlos I, havia uma disputa entre os bispos de três países: os bispos anglicanos da Inglaterra, os bispos calvinistas da Escócia e os bispos católicos da Irlanda. O conflito entre os bispados já vinha ocorrendo desde o reinado de Jaime I, mas foi agravando-se em seguida. (YOUNG; ROFF, 1973). 

Durante o governo de Jaime I, o rei removeu bispos calvinistas da Escócia, colocando no lugar deles bispos católicos, o que foi desaprovado por parte da população, mais tarde a situação foi equilibrada. Vários anos depois, Carlos I tomou a decisão de unificar as igrejas da Escócia e da Inglaterra, já que ambos os países compreendiam o Reino Unido. A ideia era tornar o Anglicanismo na igreja oficial da Escócia, a qual se via dividida entre calvinistas e católicos, os bispos de ambas as igrejas não gostaram disso e se revoltaram contra o projeto do rei, havendo protestos e revoltas na Escócia. 

Carlos I indignado com a insubordinação dos bispos e seus apoiadores, enviou um exército de 20 mil soldados em 1639 para a Escócia, dando início a Guerra dos Bispos (1639-1641), a primeira parte foi marcada por algumas pequenas batalhas pelo território escocês, o qual o Parlamento Escocês reuniu soldados para combater o rei. No ano de 1640, Carlos I reabriu o Parlamento Inglês em 13 de abril para votar a respeito da proposta oferecida pelos escoceses a fim de chegar a um acordo de paz. No entanto, os parlamentares aproveitaram a situação para fazerem críticas ao monarca e cobrarem mudanças políticas, jurídicas, tributárias e eclesiásticas. Carlos I que havia restabelecido o Parlamento para que esse apenas apoiasse suas próximas medidas, se indignou com as cobranças e o fechou em 5 de maio, tal acontecimento ficou conhecido como episódio do "Parlamento Curto", pois esse ficou em funcionamento por menos de um mês. 

Revoltado, o rei decidiu fazer de seu jeito, elegendo novos comandantes e enviando-os com reforços para retomar a guerra contra os escoceses insurgentes. A guerra estendeu-se pelos meses seguintes de 1640, acarretando em várias perdas para os exércitos ingleses e altos gastos aos cofres públicos. Carlos I diante de sucessivos erros decidiu convocar novamente o parlamento para pedir ajuda. Ele tinha a expectativa que pudesse apelar a honra e bom senso da Câmara dos Lordes, para que esse os apoiassem na guerra contra os escoceses. A ideia era que os nobres injetassem dinheiro naquele conflito e enviasse suas tropas também. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

Os parlamentares ingleses viram uma grande oportunidade de contestar a autoridade absolutista do monarca, então fizeram uma série de concessões as quais fossem cumpridas, eles iriam ajudar no conflito. Por sua vez, os parlamentares escoceses cobravam do rei que ele aceitasse os termos de paz. Carlos I se viu entre a cruz e a espada, tendo que a contragosto ceder as concessões de ambos os parlamentos, enquanto isso ocorria, revoltas na Irlanda eclodiram em 1641, mobilizadas entre católicos que se indignaram que deveriam ter que adotar o Anglicanismo como igreja oficial. Porém, as revoltas irlandesas não geraram uma guerra, mas ainda assim renderam alguns pequenos massacres. Porém, o governante da Irlanda, o nobre Thomas Wentworth, 1o Conde de Strafford (1593-1641) havia evitado o pior, embora nem todos concordassem com isso. (YOUNG; ROFF, 1973). 

Conde de Strafford por Anton van Dyck, 1633. 

Durante a rebelião na Irlanda, Carlos I seguia negociando com o Parlamento inglês e escocês para encerrar a guerra, porém, parte dos nobres culparam a incompetência do Conde de Strafford em não ter evitado aqueles massacres, assim, ele foi preso e enviado a Torre de Londres. Inimigos do conde cobraram sua execução alegando que os erros dele permitiram uma revolta grave na Irlanda comprometendo a ordem e a paz do reino. Carlos I negou-se a declarar pena de morte de Strafford, mas esse disse ao rei que seria o melhor a fazer, pois reconhecia seus erros e merecia morrer por conta deles. Abalado quanto a essa escolha, o monarca autorizou a sentença, então Strafford foi decapitado em 12 de maio de 1641. Porém, sua execução foi considerada um ato cruel do rei, o qual simpatizava com o conde. (YOUNG; ROFF, 1973). 

Católicos ingleses e irlandeses se enfureceram com a execução do Conde Strafford, que era católico, acusando que sua morte foi um ato de crueldade autorizado pelo rei Carlos I. Assim, um levante popular e militar ocorreu em ambos os lugares iniciando uma guerra civil. 

A guerra civil inglesa (1642-1651)

Diante da série de problemas ocorridos ao longo de 1641, uma nova guerra estava tendo início. Carlos I encurralado por ter cedido as concessões dos dois Parlamentos, havia perdido o direito de fechar os parlamentos, o que permitiu que ambos pudessem se posicionar contrários ao monarca. Assim, os nobres que não gostavam do governo autoritário do rei aproveitaram para formar alianças e exigir a abdicação dele, mas Carlos I recusou-se a deixar o trono e abandonou Londres, dando início a uma guerra entre os parlamentos e o rei. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

O rei refugiou-se em Nottingham com seus apoiadores, enquanto o Parlamento inglês tinha suas tropas lideradas por Thomas Farifax, Oliver Cromwell, Phillip Skippon, Edward Montagu (2o Conde de Manchester), Robert Devereux (3o Conde de Essex), William Waller. Por sua vez, do lado escocês liderava Alexander Leslie (1o Conde de Leven). Tais nobres se uniram para liderar as forças opositoras contra Carlos I, considerado fugitivo da lei por ter se recusado a aceitar a denúncia pública contra seu abuso de poder e outros crimes, já que foi pedido que ele abdicasse do trono. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

A primeira parte da guerra que ocorreu entre 1642 e 1646, acabou demorando mais do que se imaginava. Inicialmente alguns parlamentares acreditavam que o rei não teria tanto apoio assim da nobreza e do povo, então em poucos meses sua resistência seria desbaratada, mas isso foi engano. O conflito estendeu-se por quatro anos. Em 1645 as tropas parlamentares lideradas por Fairfax e Cromwell venceram as tropas realistas em Naseby (14 de junho) e Langport (10 de julho), vitórias importantes que enfraqueceram consideravelmente o exército realista. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

Pintura retratando a vitória do exército parlamentarista sobre o exército realista na Batalha de Naseby. Na imagem podemos ver em destaque Fairfax a cavalo e Cromwell diante dele. 

Carlos I fugiu para Escócia no começo de 1646, mas acabou sendo traído pela sua tropa e foi preso, sendo transferido de volta a Londres, onde permaneceu três meses preso aguardando julgamento, porém, alguns aliados o libertaram e ele escapou para a Ilha Wight no sul da Inglaterra, onde permaneceu refugiado em 1647. Nesse período o país seguia em crise devido aos danos causados pela guerra, milhares de mortos, terras arrasadas, cidades invadidas, altos gastos dos cofres públicos, militares com soldo atrasado etc. No entanto, aproveitando-se dessa instabilidade, Carlos I decidiu negociar com o Parlamento escocês as escondidas tentando conquistar o apoio dele para poder contra-atacar e recuperar o trono. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

No ano de 1648 os escoceses decidiram aceitar o acordo de Carlos I, então o Parlamento escocês enviou um exército para invadir a Inglaterra e marcha rumo a Londres, para sitiar a capital, destituir o Parlamento inglês e permitir o rei reassumir o trono. O problema é que os planos fracassaram. As tropas escocesas sofreram sucessivas derrotas pelo caminho e o rei acabou sendo capturado novamente e enviado para a capital. Dessa vez reforçaram sua guarda e convocaram um tribunal para julgá-lo, incluindo a acusação de traição. 

Mais de 100 juízes foram convocados para presidir o julgamento dos crimes do rei, o processo demorou alguns meses e a votação foi acirrada, mas no final a sentença foi dada: devido aos crimes de traição, assassinato, guerra, tirania etc., o rei Carlos I foi condenado a pena de morte por decapitação. A execução ocorreu no Palácio Whitewall em 30 de janeiro de 1649. A morte do rei marcou a história inglesa do século XVII fragilizando o absolutismo da época. (HAYTHORNWAITE, 1994). 

Decapitação de Carlos I diante do Palácio Whitehall. Autoria desconhecida, 1649. 

Considerações finais

A chamada Revolução Puritana é o termo em língua portuguesa para designar a Guerra Civil Inglesa, por conta disso, alguns livros hoje em dia já não usam mais a nomenclatura puritana, optando em adotar a nomenclatura inglesa mesmo, pois o dito puritanismo que motivou a guerra civil, não foi o único fator para isso. De qualquer forma, a dita revolução marcou num primeiro momento, a queda do Absolutismo inglês representado pelo monarca Carlos I, que após anos de tirania que resultou na Guerra dos Bispos (1639-1641) e depois na Guerra Civil (1642-1651), acabou sendo condenado à morte aos 48 anos de idade. 

Ambas as guerras arruinaram a economia da Inglaterra e da Escócia, mas não o suficiente para afundar o país, no entanto, a crise legada deu brechas para que o Parlamento inglês e escocês restabelecesse seu prestígio, mas principalmente passasse a gerir ambos os reinos e foi nesse momento de crise política, econômica e social que Oliver Cromwell decidiu dar sua guinada ao poder. 

Cromwell surgindo como um herói da guerra civil, passou a manobrar seus aliados e outros parlamentares para conseguir ser nomeado Lorde Protetor e estabelecer o projeto de uma república, defendendo a suspensão indefinida da monarquia, enquanto um governo republicano parlamentar seria criado e estabelecido, mudando o curso da história inglesa. Entretanto, suas intenções bastante positivas e até apoiadas por parte dos parlamentares e do povo, acabariam se revelando desastrosas. O sonho republicano de Cromwell veio a se tornar uma ditadura. 

NOTA: Alguns autores defendem que a guerra civil não terminou com a morte do rei em 1649, mas estendeu-se até 1651 quando Oliver Cromwell foi feito Lorde Protetor, pondo fim aos conflitos restantes. 

NOTA 2: Alguns historiadores dividem a guerra civil em três fases: a primeira entre 1642 e 1646, em seguida o interlúdio da fuga do rei entre 1646-1647, a segunda fase entre 1648 e 1649, terminando com a morte do rei, mas começando a terceira fase que foi de 1649 a 1651, focada nas batalhas ocorridas na Escócia e Irlanda. 

Referências bibliográficas

HAYTHORNWAITE, Philip. The English Civil War 1642-1651. An Ilustrated Military History. London, Brockhampton, 1994. 

YOUNG, Peter; ROFF, Michael. The English Civil War. London: Osprey, 1973. 

Links relacionados: 

O Protetorado: A ditadura de Cromwell (1653-1658)

A Revolução Gloriosa (1688-1689)