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Leandro Vilar

domingo, 25 de maio de 2025

Condenados da terra: o garimpo de Serra Pelada (1978-1992)

Serra Pelada se tornou o maior garimpo a céu aberto do mundo, sendo massivamente explorado ao longo de uma década. Em seu auge era um formigueiro humano, onde milhares de garimpeiros em péssimas condições de trabalho e de insalubridade, trabalhavam muitas horas diárias no sonho de conseguir achar ouro para ficarem ricos. Apesar que a maior parte do ouro coletado ia para as empresas e o governo. Serra Pelada foi o último caso da corrida do ouro ocorrida em território brasileiro. 

Garimpeiros escalando as escadas de madeira em Serra Pelada. 

Introdução

Serra Pelada consiste num distrito do município de Curionópolis, situado no sudeste do Pará. Porém, na época fazia parte das terras do município do Marabá. O local já era explorado comerciante por fazendeiros, até que em fins da década de 1970 teve início a atividade garimpeira. No ano de 1977 em plena Ditadura Militar (1964-1985), mais especificamente na época em que a economia andava ruim e ia piorando devido aos altos gastos do governo e a corrupção desenfreada e omitida, o governo federal decidiu emitir incentivos fiscais e econômicos. Em Serra Pelada alguns fazendeiros acharam ouro de aluvião, aquele encontrado em leitos de riachos e rios rasos. 

Assim, eles colocavam seus empregados para percorrer tais riachos e rios atrás de gramas de ouro. Tradicionalmente é creditado ao fazendeiro Genésio Ferreira da Silva o início do garimpo na localidade de Grota Rica, onde ele montou uma equipe de garimpo. De fato, ouro - mesmo em pouca quantidade - foi encontrado, assim, a notícia começou a se espalhar pelos municípios vizinhos. 

Localização de Serra Pelada, no Pará. 

Interessados nisso foram enviados para lá ou viajaram por conta própria para confirmar se realmente havia ouro ali. Em 1980 o fazendeiro Genésio começou a barrar os garimpeiros forasteiros, proibindo-os de ir garimpar em Grota Rica, porém, eles passaram a se dirigir para outras localidades, o que incluiu uma serra descampada que foi apelidada de Serra Pelada. Ali encontrou-se ouro e isso gerou uma "febre do ouro". 

Até o final do ano de 1980, milhares de homens tinham partido para Serra Pelada em busca de ouro. Um povoado formado de acampamentos improvisados foi se formando naquela localidade, vindo anos depois originar uma vila. Ao mesmo tempo em que muitos garimpeiros seguiam para Serra Pelada, a notícia da descoberta de ouro atraiu a atenção do governo. O Serviço Nacional de Informação (SNI) enviou funcionários para lá, depois chegou representantes da Receita Federal, Caixa Econômica, Polícia Federal, Polícia Militar, entre outras instituições públicas. 

A formalização do garimpo

No ano de 1981 o garimpo de Serra Pelada contava com milhares de trabalhadores e habitantes, havendo uma vila com mercearias, lojas, uma paróquia, posto de saúde, hospedarias, alojamentos, bares, prostíbulos, oficinas etc. O ouro encontrado superficialmente esgotou rapidamente no primeiro ano daquela exploração voraz. Assim, o governo designou a Rio Doce Geologia e Mineração (DOCEGEO) para realizar prospecções no terreno para encontrar novos locais para serem escavados. 

Isso levou Serra Pelada a ser dividia em várias zonas de garimpo (também referidas como covas ou cavas), as quais ganharam nomes coloquiais como: Babilônia I, Babilônia II, Bico de Papagaio, Boca da Grota Rica, Bucetinha, Buraco da Viúva, Igrejinha, PPO, Serrinha e Terra Preta. Cada uma dessas zonas contava com seus organizadores, fiscais, capatazes, empregados, equipamentos etc., embora todos se reportassem ao major Sebastião Curió (1934-2022), militar, engenheiro e jornalista, amigo do presidente Ernesto Geisel, designado como Interventor da Serra Leste, região administrativa criada para gerir a área garimpeira em Marabá. 

Assim, o major Curió possuía sua equipe de gestão para fiscalizar a produção aurífera. Assim, o ouro encontrado era enviado para ser pesado, limpo, armazenado e tributado pela Receita Federal, por sua vez, a Caixa Econômica pagava as empresas e garimpeiros o valor pelo ouro coletado. Mesmo que essa medida do governo para evitar o contrabando de ouro, esse ainda ocorria. Empresas estrangeiras enviavam negociantes para comprar o precioso minério, fato esse que uma pista pouso foi construída na região. Além disso, os próprios funcionários do governo também possuíam esquemas para desviar pequenas quantidade dos dourado metal. 

Em 1982 o major Curió deixa o cargo de interventor para se candidatar ao de deputado federal, em seu lugar ele designou Ari Santos, homem seu de confiança. Curió defendendo um discurso em prol dos latifundiários e dos garimpos, somado ao enorme curral eleitoral formado pelos garimpeiros e todos que tinham ligação com esse negócio, foi eleito deputado federal naquele ano. Sua vitória foi importante para prorrogar a exploração aurífera, já que o DOCEGEO comunicou que a fonte de ouro em Serra Pelada estava próxima do esgotamento e sugeriu encerrar a atividade garimpeira para o ano de 1983.

Todavia, o Sindicato dos Garimpeiros através do deputado Sebastião Curió pleiteou em Brasília uma medida para adiar o fechamento do garimpo. Assim, com os seus contatos, o presidente João Figueiredo assinou a lei n. 7.914, de 11 de junho de 1984, que autorizava medidas orçamentárias que liberavam verbas para a atividade de garimpagem, autorizando a criação do Grupo de Trabalho para reorganizar os garimpos em Serra Pelada, além de cobrar melhorias na fiscalização e nas condições de trabalho. O artigo terceiro da lei também prorrogava a exploração dos garimpos até 1988, podendo inclusive ser renovada caso houvesse necessidade. Dessa forma, as empresas e organizações garimpeiras conseguiram do governo federal autorização para seguirem com suas atividades por mais quatro anos. 

O tal Grupo de Trabalho levou a criação da Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP), em teoria a organização representaria os garimpeiros, os quais passavam por uma série de problemas como exposição ao calor excessivo, riscos diversos, além de terem que trabalhar várias horas diárias em ambiente insalubre, exposto ao calor, lama, chuva, poeira, sujeira, mercúrio e dejetos. Além de haver casos de castigos físicos por parte dos capatazes. No entanto, a cooperativa na prática servia aos donos dos garimpos, fazendeiros, políticos e outras autoridades públicas. Apesar dessa lei postergar o prazo para atividade garimpeira, Serra Pelada visivelmente enfrentava em 1984 seu esgotamento.

Formigueiro humano dos garimpeiros enfileirados para subir as escadas. Fotografia de Sebastião Salgado. 

Declínio do garimpo

Em 1984 a população estimada na região era de 80 mil habitantes (o maior valor alcançado), além disso, em 1983, a mina resultou na extração de 14 toneladas de ouro (maior valor registrado), mas em 1984 o valor extraído foi de 3,9 toneladas. Especialistas em mineração falavam que a mina havia chegado a seu fim, para conseguir mais ouro teria que se fazer túneis com maquinário, adentrando cada vez mais profundamente a serra. Porém, outros sugeriam que os veios de ouro já tinham se esgotado ou estavam perto do fim. 

A DOCEGEO ainda em 1984 deixou de atuar em Serra Pelada, considerando que o garimpo não teria mais condições de seguir operando. Em seu lugar assumiu o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), que seguiu no monitoramento do garimpo até 1985, quando terminou a ditadura militar. Assim, ele deixou de realizar suas atividades, então a COOMIGASP assumiu sua função. Apesar da troca de governos com o término da ditadura, o governo de José Sarney manteve em vigência alguns decretos e leis, como a lei que favorecia os garimpos. 

Mesmo com a diminuição gradativa da extração de ouro, que levou milhares de pessoas a deixarem Serra Pelada, já considerando ser inviável continuar ali, ainda assim, a COOMIGASP seguiu em atividade nos anos seguintes. Em 1987 nova crise acometeu a região garimpeira, pois se aproximava o final do prazo dado por Figueiredo para manter o garimpo. O lucro obtido era pouco, mas ainda havia gente que insistia que novos veios poderiam ser descobertos se escavassem mais profundamente. 

Assim, alguns garimpeiros começaram a ameaçar com greves e protestos reivindicando melhores condições de trabalho e o pagamento de salários atrasados. Isso levou Jane Resende a liderar um bloqueio na ponte de Marabá, na BR-115, a mais importante daquela região, em 29 de dezembro de 1987. O governador do Pará, Hélio Gueiros considerou inadmissível tal protesto e ordenou que a polícia militar usasse a força para remover os garimpeiros. Pelo menos 79 homens foram mortos na ocasião. O ocorrido ficou conhecido como Massacre da Ponte ou Massacre de São Bonifácio

Notícia sobre o massacre de garimpeiros de Serra Pelada, mortos em protesto na ponte de Marabá. 

Após o massacre, nenhum grane protesto voltou a ocorrer. No entanto, isso acabou influenciando o governo a reconhecer a autonomia política daquele território, levando em 1988 a criação do município de Curionópolis (uma homenagem ao major Curió). Apesar disso, a situação problemática para os garimpeiros não se resolveu, além de que a atividade garimpeira foi suspensa, pois o prazo tinha chegado ao fim.

O fim do garimpo

Garimpeiros ainda continuaram a escavar ilegalmente em Serra Pelada pelos anos de 1989 e 1990, a realidade mudou em 1991, quando Fernando Collor de Mello autorizou alguns decretos orçamentários para liberar os garimpos no país, além de outras atividades. Assim, legalmente Serra Pelada voltou a ser explorada, mas dessa vez por alguns meses, pois as empresas mineradoras tinham interesses na área e não queria que aquela cooperativa de garimpeiros seguisse ali gerindo o local, além de que Collor recebeu impeachment em 1992, sendo destituído da presidência. 

Com isso, o garimpo em Serra Pelada foi encerrado novamente e foi ordenado que a cratera de quase 200 metros de profundidade, fosse alagada, tornando-a um pequeno lago artificial, cujas águas são contaminadas com mercúrio. No entanto, mesmo com o fechamento novamente do garimpo em 1992, garimpeiros ilegalmente continuaram a frequentar os arredores de Serra Pelada em busca de veios de ouro, atividade que se manteve ao longo de anos, havendo conflitos e denúncias. Em 2007 o governo federal cogitou retomar o garimpo legal permitindo que empresas estrangeiras atuassem na área. Estudos e instalações foram realizadas, mas ouro não foi encontrado. 

A vila de Serra Pelada ao lado do lago onde ficava a cratera do garimpo. 

Dessa forma, a história de Serra Pelada foi marcada por muita riqueza, pois estima-se que pelo menos 40 toneladas de ouro foram extraídas principalmente entre 1980 e 1984, o auge esse garimpo, por outro lado, centenas morreram devido a acidentes, brigas e outros crimes. Vale ressalvar que em dados momentos alguns garimpeiros ficaram rapidamente ricos, mas gastaram todo o dinheiro em apostas, prostíbulos, bares, comprando carros e outros objetos supérfluos. De outro lado, a maior parte das dezenas de milhares de garimpeiros que foram trabalhar em Serra Pelada não conseguiram enriquecer, tampouco juntar um dinheiro considerável. Muitos voltaram frustrados para suas cidades e estados. Outros acabaram insistindo por mais tempo, vindo a adoecer e contrair muitas dívidas. 

Também se desconhece quanto ouro foi perdido ilegalmente pela sonegação e contrabando, além e que boa parte dessa riqueza obtida durante a ditadura militar, que deveria quitar dívidas do governo federal, jamais foi empregada, fato esse que quando a ditadura chegou ao fim, a dívida interna e externa seguia alta, e a inflação estava gigantesca. 

NOTA: A maior pepita de ouro encontrada no Brasil, que se tem registro, adveio de Serra Pelada, pesando 7 kg. 

NOTA 2: O filme Os Trapalhões na Serra Pelada (1982) foi o primeiro filme a abordar o contexto desse famoso garimpo, apesar de ser uma produção de comédia. 

NOTA 3: O filme Serra Pelada (2013) consiste numa produção dramática que explora os problemas e sofrimentos dos garimpeiros. 

NOTA 4: Serra Pelada: A Lenda da Montanha de Ouro (2013) é um documentário que conta a história do maior garimpo do Brasil. 

NOTA 5: Serra Pelada: A Saga do Ouro (2014) é uma minissérie da Globo que aborda o período do garimpo, mesclando fatos e ficção. 

Referências bibliográficas: 

MONTEIRO, Maurílio de Abreu [et al]. Ouro, empresas e garimpeiros na Amazônia: o caso emblemático de Serra PeladaRevista Pós Ciências Sociais, v. 7, n. 13, 2010, 131-158.

SILVA, Tallyta Suenny Araujo da. Áureo carmesim: conflitos e disputas pela exploração de ouro em Serra PeladaSecuencia, n. 109, 2021, p. 

domingo, 4 de maio de 2025

Filmes sobre história do Brasil

A presente postagem apresenta uma lista de filmes sobre história brasileira, com alguns comentários pontuais acerca dessas produções. A ideia é servir de guia para as pessoas terem contato com essas produções, seja para vê-las por lazer ou para trabalho. Vale ressalvar que muitas das produções aqui apresentadas são obras de ficção histórica, embora algumas tenham mais embasamento histórico do que outras.  

O descobrimento do Brasil (1936)

Produzido para fins políticos do governo de Getúlio Vargas (1930-1945), a obra contou com consultoria de renomados historiadores da época como Afonso de Taunay, Edgar Roquette Pinto e Bernardino José de Souza, citações da Carta de Pero Vaz de Caminha e trilha sonora de Heitor Villa-Lobos, sendo dirigido por Humberto Mauro. O filme buscou retratar como teria sido a chegada da armada de Pedro Álvares Cabral em 22 de abril de 1500

Ganga Zumba (1964)

O filme reúne aspectos históricos e de ficção histórica para contar alguns momentos da vida de Ganga Zumba (c. 1630-1678), um dos proeminentes líderes do Quilombo dos Palmares, situado na Serra da Barriga, hoje em Alagoas. Pouco se sabe sobre sua história, mas ele teria sido filho bastardo de uma princesa congolense, assim, após viver como escravo num engenho na Capitania de Pernambuco, fugiu e foi morar em Palmares. Na década de 1670 documentos portugueses relatam Ganga Zumba como então rei dos Palmares, o qual em 1678 negociou um acordo de paz com o governador-geral, porém, um de seus parentes, Zumbi (1655-1695) foi contrário, iniciando uma revolta no quilombo, levando a morte de Ganga Zumba. O filme foi dirigido por Cacá Diegues, baseado no livro Ganga Zumba (1962) de José Felício dos Santos, estrelando Antônio Pitanga como o protagonista, além de contar com atuação de atores negros famosos da época, assim como, a trilha sonora de Cartola e Dona Zica da Mangueira


Independência ou Morte (1972)

A proposta do filme foi celebrar o sesquicentenário da Independência do Brasil, estrelando Tarcísio Meira (1935-2021) no papel de Dom Pedro I, além de vários outros atores famosos na época nos papéis principais. Apesar da boa ideia, o filme trata-se de uma produção mais voltada para a ficção, já que ele reconta de forma própria e bem resumida, o processo de independência do Brasil, culminando no simbólico 7 de setembro de 1822, o Grito do Ipiranga e a abdicação do monarca em 1831. O filme foi produzido por Oswaldo Massiani.


Os Inconfidentes (1972)

Lançado em resposta ao sesquicentenário da Independência do Brasil, o filme é uma produção franco-brasileira dirigida por Joaquim Pedro de Andrade, com roteiro dele em parceria a Eduardo Escorel, inspirado no livro de Cecília Meireles, Romanceiro da Inconfidência (1953). Assim, a obra retrata o movimento da Inconfidência Mineira (1789) que tentou iniciar uma revolução para conquistar a independência da Capitania de Minas Gerais, porém, os inconfidentes foram traídos por um de seus membros. A produção mostra o contexto, planos, o fracasso o intento e a execução de Tiradentes (interpretado por José Wilker), condenado a servir de exemplo máximo. 


Xica da Silva (1976)

Baseado no livro homônimo de João Felício dos Santos, dirigido por Carlos Diegues, com roteiro dele e de Antônio Callado, estrelando Zezé Motta no papel principal, a produção conta a história de Francisca da Silva Oliveira (c. 1732-1796) que conquistou a alforria devido ao relacionamento com o rico comerciante e negociador de diamantes João Fernandes de Oliveira (1720-1779), em Diamantina. Chica viveu com João por mais de vinte anos, tendo treze filhos. Devido a ter se tornada uma senhora da elite, apesar de negra e ex-escrava, ainda assim, ela causou alvoroço na sociedade colonial e até originou lendas sobre sua vida. 


Tiradentes, o mártir da independência (1977)

Inspirado no relativo sucesso de Os Inconfidentes (1972), Geraldo Vietri dirigiu e roteirizou ao lado de Sérgio Galvão, um filme sobre Tiradentes (interpretado por Adriano Reys), difundindo a imagem dele como "herói revolucionário", algo comum ainda naquele tempo. Assim, a produção mescla acontecimentos históricos com fictícios para construir a ideia de que Tiradentes realmente teve uma importância significativa para os planos da Inconfidência Mineira (1789). 


Anchieta, José do Brasil (1977)

O filme narra alguns momentos da vida de São José de Anchieta (1534-1597), padre, missionário, dramaturgo, gramático e poeta espanhol, o qual chegou ao Brasil em 1553 na missão jesuítica do padre Manoel da Nóbrega (1517-1580), seu mentor e amigo ao longo dos anos. A produção foi dirigida por Paulo César Sarecini, com roteiro dele e Marcos Konder Reis, estrelando Ney Latorraca (1944-2024) como o missionário. Anchieta foi figura religiosa importante no Brasil colonial do século XVI, elogiado por seu trabalho missionário, literário e gramático, mas envolto em controversas na forma de tratar os indígenas e escravos. 

Batalha dos Guararapes, o Príncipe de Nassau
(1978)

Produção brasileira dirigida por Paulo Thiago, roteirizado por Miguel Borges e Armando Costa, filmado em Pernambuco. Apesar do título, a obra apresenta momentos distintos da história do Brasil holandês (1630-1654) em Pernambuco, a começar pelo fato que João Maurício de Nassau-Siegen (1604-1679) deixou o Brasil em 1644 e as batalhas em Guararapes ocorreram em 1648 e 1649. De qualquer forma, o filme usando personagens históricos e fictícios resume alguns momentos dos 24 anos de colonização holandesa, focando-se principalmente no governo de Nassau e nas batalhas dos Guararapes que marcaram uma forte derrota para a dominação holandesa. 

Quilombo (1984)

A produção dirigida por Cacá Diegues novamente se baseou no livro de José Felício dos Santos, trazendo Tony Tornado como Ganga Zumba, mostrando seu governo conciliador e depois o governo de Zumbi dos Palmares (1655-1695), interpretado por Antônio Pômpeo, que culminou na derrocada do Quilombo dos Palmares em 1695Curiosamente Antônio Pitanga participou desse filme, mas interpretou outro personagem. Apesar de ser baseado no mesmo livro usado por Diegues para fazer o filme Ganga Zumba, o diretor aproveitou para dar maior espaço a figura de Zumbi nessa segunda produção. A produção também contou com outros artistas famosos como Zezé Mota e Grande Otelo


Guerra de Canudos (1996)

O filme centra-se a contar o trágico fim do Arraial de Canudos situado no sertão da Bahia, que no final do século XIX passou a ser governado pelo líder religioso Antônio Conselheiro (1830-1897), interpretado por José Wilker (1944-2014). Após alguns anos como uma simples comunidade rural, Canudos (renomeada para Belo Monte) começou a crescer rapidamente sob governo de Conselheiro, irritando os fazendeiros da região levando a boatos de ali ser antro de revolucionários, criminosos e monarquistas, no que resultou na famigerada Guerra de Canudos (1896-1897). O filme produzido por Mariza Leão e dirigido por Sérgio Rezende, foi lançado para celebrar o centenário do terrível conflito, contando essa história a partir da personagem fictícia Luíza (Cláudia Abreu), a qual se muda com a família para Canudos em meio a época da guerra. 

Hans Staden (1999)

Produção luso-brasileira dirigida por Luiz Alberto Pereira, contou com investimento significativo na época, além de esmero na parte técnica, como uso de uma réplica de caravela, construção de uma aldeia tupinambá, além da contratação de historiadores e especialistas em língua tupi para ensinar algumas palavras aos atores. O filme também foi gravado em Ubatuba, localidade onde o alemão Hans Staden (1525-1576) foi capturado por tupinambás e mantido prisioneiro. Tal condição resultou num livro que ele escreveu, o qual contribuiu bastante para difundir uma imagem negativa dos indígenas brasileiros, considerados todos como sendo selvagens canibais. 

Mauá - O Imperador e o Rei (1999)

A obra acompanha a trajetória de Irineu Evangelista de Sousa (1813-1889), empresário gaúcho que ficou conhecido na história brasileira como Barão de Mauá (embora ele fosse visconde), responsável por construir portos, fábricas, mas principalmente por introduzir a ferrovia no país. Interpretado por Paulo Betti, o filme apresenta alguns aspectos da vida de Irineu, centrando-se em sua carreira empresarial, sua relação com D. Pedro II, culminando na falência de seus negócios. A produção foi dirigida por Sérgio Rezende, com roteiro dele, Paulo Halm e Joaquim Vaz de Carvalho


Netto perde sua alma (2001)

Baseado no livro homônimo de Tabajara Ruas, o filme é uma produção do autor com o diretor Beto Souza, o qual narra a polêmica carreira do general Antônio de Sousa Neto (1803-1866), o qual foi a segunda liderança durante a Revolução Farroupilha (1835-1845) e mais tarde participou da Guerra do Paraguai (1864-1870). O filme é narrado a partir das memórias do general Netto ao se recordar durante seu exílio no Uruguai as participações na revolução e na guerra. O general foi interpretado por Werner Schünemann

Carandiru (2003)

Baseado no livro Estação Carandiru (1989) do médico Drauzio Varela que atuou como médico voluntário na Casa de Detenção de São Paulo, mais conhecido como Carandiru, o maior presídio da América Latina, que funcionou de 1920 a 2002. O local foi palco de muitos crimes e atrocidades contra os direitos humanos. Em 1992, Drauzio Varela trabalhava no local quando testemunhou o grande massacre naquele ano, resultando no assassinato de 102 detentos pela polícia e outros 10 mortos durante a rebelião. A partir de sua vivência ele escreveu seu livro que baseou o filme dirigido por Hector Babenco, o qual gravou o filme no Carandiru, chegando até usar funcionários e detentos nas filmagens. O filme foi elogiado pelo seu realismo nu e cru do maior massacre de presos na história do Brasil recente. 

Olga (2004)

Filme dirigido por Jayme Monjardim, que conta a história da judia alemã Olga Benário Prestes (1908-1942), que na adolescência aderiu a resistência comunista na Alemanha, mais tarde mudou-se para Moscou, depois foi designada para auxiliar o militar Luís Carlos Prestes (1898-1990) numa tentativa de revolução no Brasil que ficou conhecida como Intentona Comunista (1935), a qual foi rechaçada pelo governo de Getúlio Vargas. Olga acabou sendo presa em 1936, vindo a ser deportada para a Alemanha Nazista por ser judia. Lá ela ficou presa no Campo de Concentração de Barnimstrasse, onde teve sua filha Anita Leocádio Prestes, depois foi transferida para o Campo de Bernburg, onde foi executada. O filme foca na fase final da vida de Olga, quando ela conheceu Prestes, o ajudou, se apaixonou por ele e depois foi condenada aos campos de concentração. 

Xingu (2011)

Dirigido por Cao Hamburger, a produção narra a história dos irmãos Orlando (1914-2002), Cláudio (1916-1998) e Leonardo (1918-1961) Villas-Bôas, que participaram da Expedição Roncador-Xingu (1941) enviada por Getúlio Vargas, para fazer reconhecimento do interior do Mato Grosso. O contato dos irmãos com as comunidades indígenas do Xingu os levaram a lutar pelo direito de demarcação daquele território indígena, resultando na criação dessa reserva somente em 1961. A produção foi elogiada na época por sua ambientação realista e representação apurada dos povos indígenas. 


Vermelho Brasil (2014)

Produção da Globo Filmes e Conspiração Filmes (Brasil), RTP e Stopline (Portugal), France 2 e Pampa Productions (França), CD Films (Canadá), dirigida por Sylvain Archambault adaptando o livro Vermelho Brasil (2001) do escritor Jean-Christophe Rufin, cujo enredo dramatiza a história da colônia da França Antártica (1555-1565), fundada pelos franceses na ilha Serigipe (atual ilha de Villegagnon) na Baía de Guanabara, sob comando do militar Nicolas Durand de Villegagnon (1510-1571) em acordo com tamoios e tupinambás, na época hostis aos portugueses. A colônia perdurou por dez anos até ser desmantelada pela campanha de Estácio de Sá que resultou na fundação do Rio de Janeiro em 1565. O filme resume esse período, centrando-se no começo e fim da colônia. 


Getúlio
(2014)

Dirigido por João Jardim com roteiro de George Moura, a produção aborda os 19 dias que antecederam o suicídio de Getúlio Vargas (1882-1954), interpretado por Tony Ramos, o qual diante de uma crise política profunda e ameaça de golpe de estado, se isolou no Palácio do Catete definhando mentalmente até decidir se matar. Assim, a produção explora o final do último mandato do governo de Vargas, que anteriormente havia governado initerruptamente de 1930 a 1945 como ditador. O filme recebeu críticas favoráveis pela atuação de Ramos, figurino e roteiro. 


Joaquim
(2017)

Produção luso-brasileira dirigida por Marcelo Gomes, o filme aborda a história de Joaquim José da Silva Xavier (1746-1792) - interpretado por Júlio Machado -, conhecido pelo seu apelido de Tiradentes e mártir da Inconfidência Mineira (1789). Apesar de se saber que Joaquim não foi uma liderança no movimento inconfidente e toda aura heroica sobre ele foi um mito político desenvolvido durante a República Velha (1889-1930), o filme procura dialogar com isso, mostrando Joaquim principalmente na época que atuava como militar, chegando a patente de alferes, no entanto, a trama acaba levando a ideia de que ele realmente foi uma liderança importante, contrariando sua proposta. Todavia, o roteiro toma uma série de liberdades para narrar essa história, a qual dividiu opiniões. Além disso, a produção também sofreu críticas quanto ao quesito técnico e desenvolvimento do roteiro. 

O Paciente - O Caso de Tancredo Neves (2018)

Baseado no livro homônimo do historiador Luís Mir, o filme foi dirigido por Sérgio Rezende e roteirizado por Gustavo Lipsztein, estrelando Othon Bastos como Tancredo Neves (1910-1985), presidente eleito, mas que não chegou a tomar posse por estar gravemente doente. O filme resume bastante a trama do livro e tentou criar um thriller médico centrando-se no quadro de saúde preocupante de Tancredo, primeiro presidente eleito após o término da Ditadura Militar (1964-1985), todavia, ele acabou falecendo, sendo sucedido por seu vice José Sarney. O filme inclusive aborda a polêmica de que Neves já estivesse doente algum tempo e com pouca expectativa de vida, e foi escolhido apenas por ter mais carisma do que Sarney. O filme acabou passando despercebido na época, sendo ignorado pela imprensa e o público. 


Doutor Gama (2021)

O filme aborda três momentos da vida de Luiz Gonzaga Pinto da Gama (1830-1882) escravizado quando criança e adolescente, conseguiu sua alforria, assumiu outros ofícios como jornalista e escritor até se formar como advogado, quando passou a lutar pelo abolicionismo e ajudar escravizados a conseguirem sua liberdade. O filme foi dirigido por Jefferson De e roteirizado por Luiz Antônio, baseado em biografias e livros sobre a história de Luiz Gama. 


Ainda Estou Aqui (2024)

Baseado no livro homônimo de Marcelo Rubens Paiva, o qual narra sua vivência na época da Ditadura Militar (1964-1985), quando seu pai o ex-deputado e engenheiro Rubens Paiva (1929-1971) foi preso, sendo torturado e morto no DOI da Tijuca, sob acusação de espionagem, apoiar guerrilheiros, terrorismo e acobertar Carlos Lamarca (1937-1971), na época militar rebelde que se tornou contrário ao governo ditatorial e era inimigo público. O corpo de Paiva jamais foi encontrado e ele foi dado como desaparecido pelas autoridades. No entanto, além dele, sua esposa Eunice Paiva (1929-2018) foi presa por 12 dias sofrendo maus-tratos e tortura psicológica, assim como, sua filha mais velha também ficou 24 horas presa para interrogatório. Depois disso o enredo acompanha a dureza de Eunice para criar cinco filhos, mudando-se para São Paulo, indo estudar Direito e lutando para provar que o marido foi morto na ditadura. O filme foi dirigido por Walter Salles, com roteiro de Murilo Hauser e Heitor Lorega, estrelando Selton Mello como Rubens e Fernanda Torres/Fernanda Montenegro como Eunice. A produção ganhou alguns prémios como o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e o Globo de Ouro de Melhor Atriz


NOTA: O filme Carlota Joaquina, Princesa do Brasil (1995) é uma sátira a nobre que se tornou rainha de Portugal e do Brasil, além de ser mãe de D. Pedro I, além de trazer várias imprecisões históricas. 

NOTA: O filme Estrada 47 (2015) conta uma narrativa fictícia que acompanha o drama e militares da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália, durante a Segunda Guerra Mundial

NOTA: O filme A Viagem de Pedro (2022) apesar de se basear no retorno de D. Pedro I a Portugal em 1831, trata-se de uma obra de ficção por inventar aspectos de como teria sido essa jornada, enquanto o soberano segue amargurado e reflexivo sobre seu reinado de nove anos no Brasil, assim como, suas desavenças com seu irmão Miguel, que o aguardava em Portugal.